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Indelegabilidade

Conceito

A Constituição Federal de 1988, seguindo a tendência dos instrumentos constitucionais anteriores, também entende pela necessidade de repartição dos poderes estatais, a fim de evitar distorções e abusos estatais comuns em situações nas quais há concentração de poderes em uma única pessoa ou grupo.

Neste contexto, a jurisdição ou função jurisdicional é a porção de poder estatal correspondente ao dever de dizer, dentro de uma determinada situação litigiosa, o Direito mais adequado à solução daquele conflito. 

A atividade jurisdicional é, portanto, um meio de oferecer às partes conflitantes a melhor e mais justa solução jurídica para uma situação de pretensões jurídicas antagônicas sobre um mesmo bem jurídico. 

Logo, a principal finalidade atual do processo é a de ser um instrumento de oferta de segurança jurídica e pacificação social, permitindo a realização de direitos e garantias fundamentais.

As atribuições do Poder Judiciário decorrem diretamente da Constituição Federal (arts. 92 a 126) e não podem ser delegadas ou declinadas (MONTENEGRO FILHO, 2021) a outros poderes ou mesmo a outro órgão jurisdicional. 

Veja-se que tal regra, além de visar proteger a própria separação de poderes, também tem por escopo salvaguardar o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário (art. 5º, LIII, CF), combatendo assim o que poderia ser uma fuga oblíqua do exercício da função jurisdicional pelo magistrado.

Houve um momento em que predominava, especialmente na seara penal, que haveria algumas exceções à regra da indelegabilidade, como na hipótese de expedição de carta precatória/rogatória (p. ex., arts. 222 e 368, CPP). Nestes casos, entende-se que haveria uma parcial e temporária delegação de poderes de um juiz para o outro, a fim de ver cumprido um determinado ato processual (MIRABETE, 2006).

Contudo, tal posicionamento já se encontra há muito superado, estando consolidado o entendimento de que uma simples colaboração entre juízos não pode ser confundida com uma delegação de poderes, especialmente quando o escopo da cooperação se encontra bastante delimitado e restrito a realização de um ou outro ato processual (WAMBIER, Luiz Rodrigues. ALVIM, Teresa Arruda, 2016).

Neste sentido, veja-se a lição da doutrina:

“Na verdade, contudo, não se trata, na espécie, de delegação voluntária, mas de simples caso de colaboração entre órgãos judiciários, cada um dentro de sua natural e indelegável competência. O deprecante não delega poderes, já que o ato a ser praticado pelo deprecado nunca estaria compreendido nos limites da competência do primeiro. O que se pede é justamente que o único competente (o deprecado) pratique o ato que o deprecante não pode realizar, mas que é necessário para o prosseguimento do processo a seu cargo.” (THEODORO, 2021)

Logo, o magistrado deve sempre observar as causas sob seu comando e controle, sendo impossível a delegação de poderes, ainda que para um outro colega de magistratura.

Referências principais

  • CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 7ª ed., Rio de Janeiro: Atlas, 2021.
  • DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual Civil, Parte Geral e Processo de Conhecimento. 23 ed., Salvador: JusPodivm, 2021.
  • DIDIER JUNIOR, Fredie. Comentários ao novo Código de Processo Civil. 2 ed., rev. atual. e ampl., coord. Antonio do Passo Cabral, Ronaldo Cramer. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
  • DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 24 ed., São Paulo: Atlas, 2021.
  • MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal. 18 ed., São Paulo: Atlas, 2006.
  • MONTENEGRO FILHO, Misael. Direito Processual Civil. 14. ed., Rio de Janeiro: Atlas, 2019.
  • GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume I: parte geral. 19 ed., São Paulo: Saraiva, 2021.
  • THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil vol.1. 62 ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2021.
  • WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil: Teoria Geral do Processo vol 1. 20 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021.
  • WAMBIER, Luiz Rodrigues. ALVIM, Teresa Arruda. Temas Essenciais do novo CPC: análise das principais alterações do sistema processual civil brasileiro, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.
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