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Recomendação CNMP nº 103 de 12 de Setembro de 2023

Dispõe sobre o aprimoramento e a integração da atuação do Ministério Público para o enfrentamento à crise hídrica e estabelece estratégias jurídicas para prevenção, planejamento, previsão de cenários, mitigação e adequação às situações de escassez hídrica.

O CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO , no exercício das atribuições conferidas pelo art. 130-A, § 22º, I, da Constituição Federal, e com fundamento no art. 147, IV, de seu Regimento Interno, em conformidade com a decisão Plenária proferida na 1ª Sessão do Plenário Virtual de 2023, realizada em 31 de agosto de 2023, nos autos da Proposição n°1.01298/2021-43; Considerando que a Constituição Federal estabelece, em seus arts. 127 e 129, que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, sendo funções institucionais do Ministério Público promover a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; Considerando que o meio ambiente é um bem de uso comum do povo, ou seja, é um direito difuso por excelência a ser garantido para as presentes e futuras gerações, caracterizando-se como verdadeiro patrimônio público, nos termos da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981); Considerando que é fundamental a adoção de medidas positivas pelo Poder Público no sentido de promover a defesa, a preservação e a restauração dos bens ambientais, com o intuito de manter o meio ambiente ecologicamente equilibrado, nos termos do art. 225 da Constituição Federal; Considerando que, a partir da concepção do Estado Social de Direito ou Estado de Bem-estar Social e sua posterior evolução para a noção de Estado Ambiental de Direito, o acesso à água doce e potável foi colocado entre os direitos prestacionais, essenciais à dignidade da pessoa humana, e esse direito foi considerado pela Organização das Nações Unidas (ONU), na Resolução da Assembleia Geral nº 64/92, como direito humano fundamental; Considerando que a segurança hídrica é um tema de grande relevância social e ocupa uma posição de evidência em função de diversos episódios de crise hídrica que o Brasil enfrenta e deve ser trabalhada, em sua globalidade, para garantir a paz, a segurança, a dignidade da vida humana e a preservação dos recursos hídricos, com destaque na atuação das instituições responsáveis pela defesa ambiental, em função da premente necessidade de se combater os fenômenos extremos da seca e da crise hídrica, por ser o cenário de escassez hídrica um complexo problema que demanda, portanto, uma atuação planejada e integrada do Ministério Público e dos demais atores envolvidos no uso, gestão, regulação e proteção dos recursos naturais; Considerando que a segurança hídrica, de acordo com o conceito da ONU, existe quando há disponibilidade de água em quantidade e qualidade suficientes para o atendimento às necessidades humanas, à prática das atividades econômicas e à conservação dos ecossistemas, acompanhada de um nível aceitável de risco relacionado a secas e cheias, devendo ser consideradas as suas quatro dimensões como balizadoras do planejamento da oferta e do uso da água em um país; Considerando que os Objetivos do Desenvolvimento do Sustentável (ODS) foram estabelecidos pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e estabelece em seu Objetivo 06, no tema relacionado à água e ao saneamento, o dever dos países signatários de aumentar substancialmente a eficiência no uso da água em todos os setores e assegurar extrações sustentáveis e o abastecimento de água doce para enfrentar a escassez de água, e reduzir substancialmente o número de pessoas que sofrem com a escassez de água; Considerando ainda que no ODS 6 há as metas de proteger e restaurar ecossistemas relacionados com a água, incluindo montanhas, florestas, zonas húmidas, rios, aquíferos e lagos, e de ampliar a cooperação internacional e o apoio à capacitação para os países em desenvolvimento em atividades e programas relacionados à água e ao saneamento, incluindo extração de água, dessalinização, eficiência no uso da água, tratamento de efluentes, reciclagem e tecnologias de reutilização; Considerando que a Política Nacional do Meio Ambiente traz, entre os seus princípios, a manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo; Considerando que o direito-dever de todos de usufruir de forma sustentável e racional e de preservar a água para as presentes e futuras gerações está vinculado aos preceitos de solidariedade e fraternidade, no âmbito do conjunto de direitos reconhecidos como pertencentes a uma terceira dimensão; Considerando que o direito fundamental de acesso à água de qualidade, previsto na Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, em seu art. 2º, estabelece entre os objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; Considerando que, para atingir esse objetivo, é preciso buscar a utilização racional, a gestão integrada e participativa dos recursos hídricos e a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais; Considerando que a Política Nacional dos Recursos Hídricos (PNRH) brasileira, em relação ao aspecto quantidade da água, adota uma política reativa à situação de seca e escassez hídrica e são reduzidos os instrumentos jurídico-normativos que tratam do tema da seca e da escassez hídrica; Considerando que a Lei da Política Nacional dos Recursos Hídricos (PNRH) apresenta como um dos seus fundamentos a prioridade do uso dos recursos hídricos, em caso de escassez, para o consumo humano e a dessedentação de animais, e que no texto da principal legislação sobre os recursos hídricos brasileiros não há qualquer outra menção a instrumentos jurídicos e medidas para serem utilizadas em cenário de escassez hídrica; Considerando que, ao tratar do conteúdo do plano de recursos hídricos, a Lei da PNRH brasileira esclarece que o plano deve conter um equilíbrio entre a disponibilidade da água e as demandas futuras no planejamento dos recursos hídricos, com a identificação de conflitos potenciais, e ainda estabelece que o planejamento deve traçar metas para a economia no uso das águas, com o consequente aumento da disponibilidade de água; Considerando que, como incentivo econômico e financeiro, o inciso II e o § 2º do art. 22 da Lei da PNRH prescrevem a possibilidade de aplicação dos valores arrecadados na cobrança pelo uso dos recursos hídricos para projetos e obras benéficas ao aumento da quantidade de água de um corpo hídrico; Considerando que a PNRH determina a suspensão de outorga de uso dos recursos hídricos em caso de escassez e disciplina que poderá ser suspensa a autorização de uso em situação de necessidade, para atender a situações de calamidade, como as decorrentes de condições climáticas adversas e em situação de necessidade de se atender a usos prioritários, em que se impõe o interesse coletivo sobre o particular e, ainda, para os quais não se disponha de fontes alternativas; Considerando que para a nova Lei da Política Nacional de Saneamento Básico (PNSB) e para a Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) adquiriu novas competências: 1) Declarar a situação crítica de escassez quantitativa ou qualitativa de recursos hídricos nos corpos hídricos que impacte o atendimento aos usos múltiplos localizados em rios de domínio da União, por prazo determinado, com base em estudos e 17 dados de monitoramento, observados os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, quando houver (art. 4º, XXIII, da Lei nº 9.984/2000); 2) Estabelecer e fiscalizar o cumprimento de regras de uso da água, a fim de assegurar os usos múltiplos durante a vigência da declaração de situação crítica de escassez de recursos hídricos (art. 4º, XXIV, da Lei 9.984/2000); 3) Além dessas competências a Agência passa a instituir normas de referência para a regulação do setor por seus titulares e suas entidades reguladoras e fiscalizadoras, conforme diretrizes da Lei nº 9.984/2000 (art. 4º-A). Entre as normas de referência estão a redução progressiva e controle da perda de água e o reúso dos efluentes sanitários tratados, em conformidade com as normas ambientais e de saúde pública; Considerando que a Política Nacional de Saneamento Básico ( Lei nº 11.445, de 05 de janeiro de 2007 ) estabelece, entre os princípios fundamentais dos serviços públicos de saneamento básico, a redução e controle das perdas de água, inclusive na distribuição de água tratada, o estímulo à racionalização de seu consumo pelos usuários e o fomento à eficiência energética, ao reúso de efluentes sanitários e ao aproveitamento de águas de chuva; Considerando que conceito legal de saneamento básico, presente no inciso I do art. 3º da Lei nº 14.026/2020, engloba o reúso como um dos elementos essenciais do serviço, na medida em que estabelece que o saneamento básico é, entre outras coisas, o conjunto de serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais de esgotamento sanitário: constituído pelas atividades e pela disponibilização e manutenção de infraestruturas e instalações operacionais necessárias à coleta, ao transporte, ao tratamento e à disposição final adequados dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até sua destinação final para produção de água de reúso ou seu lançamento de forma adequada no meio ambiente; Considerando que a União, no estabelecimento de sua Política de Saneamento Básico, observará as seguintes diretrizes: redução progressiva e controle das perdas de água, inclusive na distribuição da água tratada, estímulo à racionalização de seu consumo pelos usuários e fomento à eficiência energética, ao reúso de efluentes sanitários e ao aproveitamento de águas de chuva, em conformidade com as demais normas ambientais e de saúde pública; Considerando que a Lei da PNSB determina no inciso I do seu art. 10-A, que os contratos de prestação de serviços de saneamento devem conter, expressamente, sob pena de nulidade, além das cláusulas essenciais previstas no art. 23 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, metas de expansão dos serviços, de redução de perdas na distribuição de água tratada, de eficiência e de uso racional da água, da energia e de outros recursos naturais, do reúso de efluentes sanitários e do aproveitamento de águas de chuva, em conformidade com os serviços a serem prestados; Considerando que, conforme determina o inciso II do art. 11 da Lei nº 14.026, de 15 de julho de 2020, são condições de validade dos contratos que tenham por objeto a prestação de serviços públicos de saneamento básico a inclusão, no contrato, das metas progressivas e graduais de redução progressiva e controle de perdas na distribuição de água tratada, de qualidade, de eficiência e de uso racional da água, da energia e de outros recursos naturais, em conformidade com os serviços a serem prestados e com o respectivo plano de saneamento básico; Considerando que os contratos de prestação dos serviços públicos de saneamento básico deverão definir metas qualitativas, entre elas a redução de perdas e, no caso do não atingimento das metas, deverá ser iniciado procedimento administrativo pela agência reguladora com o objetivo de avaliar as ações a serem adotadas, incluídas medidas sancionatórias, com eventual declaração de caducidade da concessão, segundo determina o art.11-B da Lei nº 14.026/2020; Considerando que o Meio Ambiente é um sistema natural, que funciona de forma interdependente, dotado de características sensíveis e sujeito a um delicado equilíbrio ecológico, fundamental para a manutenção da vida, e que o Ministério Público deve considerar essas características para traçar, institucionalmente, as melhores estratégias de atuação para a sua maior proteção; Considerando que, em conformidade com esses valores e conceitos, a Comissão do Meio Ambiente, criada pela Resolução CNMP nº 145, de 14 de junho de 2016 , tem como objetivo principal fomentar a atuação dos Órgãos do Ministério Público na proteção do Meio Ambiente, de modo a facilitar a integração e o desenvolvimento da instituição; Considerando que, para atingir resultados mais eficientes na esfera da defesa ambiental, o Ministério Público, como instituição regida pelos princípios da unidade e da indivisibilidade, segundo preceitua o § 1º do art. 127 da Constituição Federal, deve agir de forma integrada e em harmonia com técnicas e métodos difundidos entre todas as unidades da federação e que garantam a maior proteção dos recursos ambientais; Considerando que o acesso e a preservação dos recursos hídricos são direitos fundamentais, essenciais à manutenção da vida humana intergeracional e de todo o equilíbrio social e ambiental, e, ainda, que a água doce, subterrânea ou superficial, é um recurso ambiental limitado e finito que deve ser necessariamente priorizado e preservado; Considerando que é de suma importância a integração da atuação do Ministério Público no sentido de proteger o direito fundamental de acesso do cidadão à necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade e quantidade adequados aos respectivos usos; Considerando que a presente Recomendação busca, respeitando a independência funcional dos membros do Ministério Público, estabelecer critérios de atuação para integração do Ministério Público no enfrentamento à crise hídrica e estratégias jurídicas para a prevenção, planejamento, previsão de cenários, mitigação e adequação às situações de escassez hídrica; e Considerando a necessidade de se compatibilizar a capacidade de iniciativa, a independência funcional dos membros do Ministério Público, a autonomia funcional e administrativa, a unidade do Ministério Público e a necessidade de uma atuação coordenada, RESOLVE:

Publicado por Conselho Nacional do Ministério Público

Brasília-DF, 12 de setembro de 2023.


Capítulo I

DA FINALIDADE

Art. 1º

Esta Recomendação dispõe sobre o aprimoramento e a integração da atuação do Ministério Público para o enfrentamento à crise hídrica e estabelece estratégias jurídicas para prevenção, planejamento, previsão de cenários, mitigação e adequação às situações de escassez hídrica.

Parágrafo único

A finalidade do presente ato normativo é fortalecer a atuação do Ministério Público no enfrentamento à crise hídrica.

Capítulo II

DAS DEFINIÇÕES

Art. 2º

Para fins do disposto nesta Recomendação, considera-se:

I

segurança hídrica: disponibilidade de água em quantidade e qualidade suficientes para o atendimento às necessidades humanas, à prática das atividades econômicas e à conservação dos ecossistemas, acompanhada de um nível aceitável de risco relacionado a secas e cheias, devendo ser consideradas as suas quatro dimensões como balizadoras do planejamento da oferta e do uso da água em um país (ONU);

II

saneamento básico: conjunto de serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais de abastecimento de água potável; de esgotamento sanitário, com disposição final adequada dos esgotos sanitários, desde as ligações prediais até sua destinação final para produção de água de reúso ou seu lançamento de forma adequada no meio ambiente; de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e de drenagem e manejo das águas pluviais urbanas (art. 3º, I, "b", da Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007);

III

pagamento por serviços ambientais: transação de natureza voluntária, mediante a qual um pagador de serviços ambientais transfere a um provedor desses serviços recursos financeiros ou outra forma de remuneração, nas condições acertadas, respeitadas as disposições legais e regulamentares pertinentes (art. 2º, IV, da Lei nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021);

IV

melhores técnicas disponíveis (MTD): são consideradas MTD as práticas (que incluem procedimentos/técnicas e tecnologias/equipamentos) mais eficazes em termos ambientais, evitando ou reduzindo as emissões, o esgotamento e o impacto nos recursos ambientais da atividade que possam ser aplicadas em condições técnica e economicamente viáveis.

Capítulo III

DOS EIXOS DE ATUAÇÃO

Art. 3º

O trabalho estratégico do Ministério Público de combate à escassez hídrica poderá ser composto pelos seguintes eixos de atuação preventiva e repressiva:

I

segurança hídrica nos Planos de Bacia;

II

segurança hídrica nos Planos Municipais de Saneamento;

III

segurança hídrica nas Outorgas de Uso da Água;

IV

segurança hídrica nos Contratos de Concessão de Saneamento;

V

instrumentos econômico-financeiros de proteção da água;

VI

recuperação da Cobertura Florestal; e

VII

grupos de atuação integrada por bacia hidrográfica.

Capítulo IV

DAS RECOMENDAÇÕES

Art. 4º

Recomenda-se aos órgãos de apoio e aos centros operacionais, respeitadas as autonomias administrativa e financeira dos ramos e das unidades do Ministério Público, e respeitada a independência funcional dos membros, que estabeleçam critérios de atuação integrada no enfrentamento à crise hídrica e estratégias jurídicas para a prevenção e adequação à situação de escassez hídrica, conforme orienta a presente Recomendação. Seção I Das Normas de Segurança Hídrica nos Planos de Bacia Hidrográfica

Art. 5º

Recomenda-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público, especialmente aqueles com atribuições nas áreas de Meio Ambiente e Consumidor, zelem pela inclusão, nos Planos de Bacia Hidrográfica, das normas de segurança hídrica contidas na Política Nacional de Recursos Hídricos (art. 7º, III e IV, e art. 22, II e § 2º, da Lei nº 9.433, de 08 de janeiro de 1997), nos princípios fundamentais do serviço público de saneamento básico (art. 2º, XIII, da Lei nº 11.445/2007), nas diretrizes da Política de Saneamento Básico da União (art. 48, XII, da Lei nº 11.445/2007), nas normas de referência da Agência Nacional de Água e Saneamento (ANA) (art. 4º-A, VI e IX, da Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000) e na Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei nº 14.119/2021), referentes à:

I

inclusão, entre os princípios dos planos de bacias, do princípio da segurança hídrica da região hidrográfica;

II

inclusão de áreas de restrição de uso para proteção dos recursos hídricos;

III

inclusão de normas relacionadas aos pagamentos por serviços ambientais de proteção da água que determinem a aplicação dos valores arrecadados na cobrança pelo uso dos recursos hídricos para serviços ambientais benéficos ao aumento da quantidade e da qualidade de água da bacia hidrográfica;

IV

inclusão de normas que zelem pelo equilíbrio entre disponibilidade de quantidade da água e demandas futuras dos recursos hídricos presentes na bacia, metas para aumento da quantidade e da qualidade da água e identificação de futuros conflitos;

V

inclusão de normas relacionadas ao reúso, ao aproveitamento de águas pluviais, à redução de perda hídrica e ao uso racional da água;

VI

inclusão de normas para estimular os grandes usuários a utilizar as melhores técnicas disponíveis (MTD), que possam ser aplicadas em condições técnica e economicamente viáveis, para a promoção do uso eficiente, econômico, sustentável e racional da água;

VII

inclusão de normas que estimulem o planejamento, dos grandes usuários, para a diminuição da quantidade de água usada, com a adoção e a incorporação de novas tecnologias de economia de uso, para a promoção do uso eficiente, econômico, sustentável e racional da água;

VIII

inclusão de normas que estimulem, na agricultura, a adoção de prioridade de uso para técnicas econômicas de irrigação e reúso da água, como forma de garantir a utilização racional da água no meio agrícola e dar prioridade aos usos sustentáveis;

IX

inclusão de normas que fomentem os grandes usuários a apresentar o planejamento prévio de adaptação do uso da água à situação de escassez hídrica, para obter um uso econômico sustentável e compatível com a manutenção da integridade dos recursos hídricos e dos seus usos múltiplos em períodos de crise hídrica;

X

inclusão de normas que estimulem a prioridade para a utilização economicamente mais equilibrada, racional e sustentável dos recursos hídricos, sem prejuízo da proteção dos recursos hídricos. Seção II Das Condicionantes de Segurança Hídrica nas Outorgas de Usos de Recursos Hídricos

Art. 6º

Recomenda-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público com atribuições nas áreas de Meio Ambiente e Consumidor zelem pela inclusão, nas outorgas de uso de água para grandes usuários, das seguintes condicionantes de segurança hídrica:

I

para os grandes usuários, superiores a 2.000ha, condicionante de metas para atingir uma eficiência mínima global de uso da água a ser fixada no projeto;

II

condicionantes de eficiência, necessárias para dar indicativo ao outorgado de que as estruturas hidráulicas, os sistemas e o manejo da irrigação deverão ser projetados e mantidos visando o uso racional e econômico da água, considerando índices de eficiências de uso da água compatíveis e preconizados pelas boas práticas de irrigação, visando estimular a diminuição da quantidade de água usada ao longo do prazo da outorga, com a adoção e a incorporação de novas tecnologias de economia de uso;

III

condicionantes de periodicidade de verificação do cumprimento da meta de eficiência definida, vez que, nos termos da Nota Técnica Nº 16/2019/COOUT/SER, documento nº 02500.072519/2019-01, o titular da outorga deverá encaminhar, a cada 5 (cinco) anos ou quando de um eventual pedido de alteração de outorga, relatório com dados anuais referentes às áreas irrigadas e respectivas culturas;

IV

planejamento prévio de adaptação do uso da água a situações de escassez e crise hídrica, para obter um uso econômico sustentável e compatível com a manutenção da integridade dos recursos hídricos e seus usos múltiplos; e

V

a inclusão de cobrança pelos usos dos recursos hídricos, nos termos do art. 17 da Resolução ANA nº 1.941, de 30 de outubro de 2017, dos arts. 19 a 21 da Lei nº 9.433/1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, e do inciso VIII do art. 4º da Lei nº 9.984/2000.

Parágrafo único

A cobrança de uso pelos recursos hídricos prevista no inciso V deste artigo poderá financiar, prioritariamente na bacia hidrográfica em que foram gerados, estudos, programas, projetos e obras incluídos nos Planos de Recursos Hídricos, e os valores arrecadados poderão ser aplicados em projetos e obras que alterem, de modo considerado benéfico à coletividade, a qualidade, a quantidade e o regime de vazão de um corpo de água.

Art. 7º

Orienta-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público com atribuições nas áreas de Meio Ambiente e Consumidor empreendam esforços para acompanhar o cumprimento, nos processos de outorgas de uso de água, das determinações presentes nos arts. 7º e 8º da Resolução IBAMA nº 1.938, de 30 de outubro de 2017, documento nº 00000.072503/2017-33, alterada pela Resolução ANA nº 25, de 08 de maio de 2020, nos seguintes termos:

I

o processo de outorga deverá avaliar a adequação dos quantitativos (demanda) ao porte e à finalidade do empreendimento e o balanço hídrico quali-quantitativo do corpo hídrico, com o objetivo de alcançar a utilização racional e a garantia do uso múltiplo dos recursos hídricos;

II

na avaliação do pedido de outorga, quanto ao uso racional da água, deverá ser verificada a compatibilidade da demanda hídrica com as finalidades pretendidas, no que se refere à eficiência no uso da água, nos termos do art. 8º da Resolução IBAMA nº 1.938/2017, documento nº 00000.072503/2017-33, alterada pela Resolução ANA nº 25/2020 . Seção III Das Normas de Segurança Hídrica nos Planos Municipais de Saneamento

Art. 8º

Orienta-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público com atribuições nas áreas de Meio Ambiente e Consumidor zelem pela inclusão, nos Planos Municipais de Saneamento, nas Leis de Uso e Parcelamento do Solo, nos Planos Diretores e nos Códigos de Obras, das normas de segurança hídrica contidas nos princípios fundamentais do serviço público de saneamento básico (art. 2º, XIII, da Lei nº 11.445/2007), nas diretrizes da Política de Saneamento Básico da União (art. 48, XII, da Lei nº 11.445/2007), nas normas de referência da Agência Nacional de Água e Saneamento (ANA) (art. 4º-A, VI e IX, da Lei nº 9.984/20) e na Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei nº 14.119/2021), referentes a:

I

normas relacionadas ao reúso;

II

normas relacionadas ao aproveitamento de águas pluviais;

III

normas relacionadas ao racionamento e a redução de perda hídrica;

IV

normas relacionadas aos pagamentos por serviços ambientais para serviços e atividades benéficas ao aumento da quantidade e qualidade de água de um corpo hídrico;

V

normas que exijam a aplicação de melhores técnicas disponíveis (MTD), que possam ser aplicadas em condições técnica e economicamente viáveis, para a promoção do uso eficiente, econômico, sustentável e racional da água;

VI

normas que exijam o planejamento dos prestadores de serviço de saneamento para a diminuição da quantidade de água usada, com a adoção e a incorporação de novas tecnologias de economia de uso; e

VII

normas que exijam apresentação de planejamento prévio de adaptação do uso da água a situações de escassez hídrica, para obter um uso econômico sustentável e compatível com a manutenção da integridade dos recursos hídricos e seus usos múltiplos. Seção IV Das Cláusulas de Segurança Hídrica nos Contratos de Concessão de Saneamento

Art. 9º

Recomenda-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público, especialmente aqueles com atribuições nas áreas de Meio Ambiente e Consumidor, zelem pela inclusão de cláusulas de segurança hídrica nos contratos de concessão do serviço de saneamento, nos termos dos incisos I e II do art. 10-A, do inciso I do art. 11, do inciso II e dos §§ 5º e 7º do art. 11-B, todos da Lei n° 11.445/2007, e na Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei nº 14.119/2021), nos seguintes termos:

I

os contratos relativos à prestação dos serviços públicos de saneamento básico deverão conter, expressamente, sob pena de nulidade, nos termos dos incisos I e II do art. 10-A e do inciso II do art. 11, todos da Lei nº 11.445/2007, cláusulas essenciais relacionadas às metas de redução de perdas na distribuição de água tratada, de eficiência e de uso racional da água, da energia e de outros recursos naturais, do reúso de efluentes sanitários e do aproveitamento de águas de chuva, em conformidade com os serviços a serem prestados;

II

inclusão de cláusulas de adoção das melhores técnicas disponíveis (MTD), que possam ser aplicadas em condições técnica e economicamente viáveis, para a promoção do uso eficiente, econômico, sustentável e racional da água;

III

inclusão de cláusulas com metas de diminuição da quantidade da água usada ao longo do prazo da outorga, com a adoção e a incorporação de novas tecnologias de economia de uso;

IV

inclusão de cláusulas de adaptação do uso da água às situações de escassez hídrica, para obter um uso econômico sustentável e compatível com a manutenção da integridade dos recursos hídricos e seus usos múltiplos; e

V

inclusão de cláusulas de medidas compensatórias pelo uso da água, com previsão de pagamentos por serviços ambientais de proteção das nascentes, áreas de preservação permanentes, áreas de recargas hídricas e demais serviços que impactem na preservação dos recursos hídricos da bacia hidrográfica, frisando-se que a inclusão do custo marginal social de preservação dos recursos hídricos nas atividades desenvolvidas deve respeitar o princípio da modicidade de tarifas.

Art. 10

Recomenda-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público, especialmente aqueles co m atribuições nas áreas de Meio Ambiente e Consumidor, acompanhem os novos contratos de concessão de saneamento e a revisão dos antigos e zele pela inclusão das cláusulas e instrumentos de segurança hídrica, nos termos do art. 8º da presente Recomendação. Seção V Dos Instrumentos Econômico-Financeiros de Proteção da Água

Art. 11

Recomenda-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público com atribuições nas áreas de Meio Ambiente e Consumidor acompanhem e incentivem a implementação de instrumentos econômico-financeiros de proteção da água baseados nos princípios do protetor-recebedor, usuário pagador e poluidor- pagador e na Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei nº 14.119/2021) entre eles:

I

o incentivo econômico e financeiro, previsto na Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, que prescreve a possibilidade de aplicação dos valores arrecadados na cobrança pelo uso dos recursos hídricos para projetos e obras benéficas ao aumento da quantidade de água de um corpo hídrico (art. 22, II e § 2º, da Lei nº 9.433/1997);

II

o programa produtor de águas da Agência Nacional de Água s e Saneamento Básico (ANA), que fomenta a preservação das nascentes e das áreas de preservação permanente através de lei municipal e articulação com a iniciativa pública e privada local;

III

os financiamentos bancários rurais sustentáveis para produtores que comprovem a conservação da Reserva Legal, das Áreas de Preservação Permanente e, em caso de necessidade, a adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), com o regular registro no Cadastro Ambiental Rural (CAR);

IV

o pagamento por serviços ambientais para a preservação da quantidade e da qualidade da água, previsto no art. 47 da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000 (Lei do Sistema Nacional de Unidade de Conservação), que impõe ao responsável pelo abastecimento de água ou que faça uso de recursos hídricos, beneficiário da proteção proporcionada por uma unidade de conservação, contribuir financeiramente para a proteção e implementação da unidade;

V

internalização dos custos marginais sociais relacionados à preservação da quantidade e da qualidade da água pelas empresas que utilizem a água como insumo para prestar serviços ou produzir bens; e

VI

demais instrumentos econômico-financeiros possíveis segundo a legislação, em especial na Lei da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (Lei nº 14.119/2021). Seção VI Da Recuperação da Cobertura Florestal

Art. 12

Recomenda-se, respeitada a independência funcional, que os membros do Ministério Público com atribuições nas áreas de Meio Ambiente zelem pela recuperação da cobertura florestal das propriedades rurais que estejam localizadas às margens da calha principal e dos afluentes da Bacia Hidrográfica, podendo:

I

requerer junto ao Município e aos órgãos ambientais competentes relatório com a identificação dos proprietários rurais que estejam localizados às margens da calha principal e de seus afluentes;

II

articular junto aos Municípios, para que apresentem relatório das propriedades em desconformidade com as regras do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e em desacordo com a legislação em relação às áreas de nascentes, reservas legais e Áreas de Preservação Permanente (APP’s) previstas no CAR;

III

fiscalizar as propriedades que apresentarem alertas de desmatamento nessas áreas pelos sistemas de monitoramento remoto como o INPE e/ou Mapbiomas.

IV

adotar as medidas extrajudiciais e/ou judicias cabíveis para sanar as irregularidades relacionadas à cobertura florestal das nascentes, APP’s e das áreas de Reserva Legal. Seção VII Dos Grupos de Atuação Integrada por Bacia Hidrográfica

Art. 13

Recomenda-se a criação pelos Ministérios Públicos da União e dos comGrupos de Atuação Integrada na defesa dos recursos hídricos, constituídos preferencialmente de acordo com a abrangência territorial das bacias hidrográficas, sub bacias ou corpos hídricos identificados como vulneráveis e/ou prioritários para o abastecimento e equilíbrio hídrico das regiões onde se situam, nos termos da Recomendação CNMP nº 65, de 25 de junho de 2018 .

Capítulo V

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 14

As atividades relevantes desempenhadas pelos membros poderão ser registradas em ficha funcional, mediante requerimento dirigido à Administração Superior.

Art. 15

Todas as atividades desenvolvidas deverão ser documentadas, bem como armazenadas e disponibilizadas.

Art. 16

Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.


ANTÔNIO AUGUSTO BRANDÃO DE ARAS Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público

Recomendação CNMP nº 103 de 12 de Setembro de 2023