JurisHand AI Logo
|

Lei Estadual do Rio Grande do Sul nº 16174 de 28 de Agosto de 2024

Institui a Política Estadual de Fomento à Agropecuária Regenerativa, Biológica e Sustentável e dá outras providências.

O GOVERNADOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. Faço saber, em cumprimento ao disposto no artigo 82, inciso IV, da Constituição do Estado, que a Assembleia Legislativa aprovou e eu sanciono e promulgo a Lei seguinte:

Publicado por Governo do Estado do Rio Grande do Sul

PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 28 de agosto de 2024.


Art. 1º

A Política Estadual de Fomento à Agropecuária Regenerativa, Biológica e Sustentável visa a incentivar o desenvolvimento de um modelo agropecuário com base em uma nova matriz tecnológica de produção, utilizando, especialmente, insumos e tecnologias biológicas na perspectiva da transição agroecológica.

Art. 2º

São objetivos da Política Estadual de Fomento à Agropecuária Regenerativa, Biológica e Sustentável:

I

promover a transição agroecológica, os sistemas orgânicos de produção e o desenvolvimento sustentável, fortalecendo a agroecologia e a produção orgânica no Estado;

II

desenvolver a produção agropecuária em bases tecnológicas sustentáveis, utilizando bioinsumos e produtos minerais regionais de baixo impacto ambiental;

III

tornar a produção agropecuária mais resiliente frente às adversidades climáticas;

IV

promover a qualidade biológica e nutricional dos alimentos, a redução do uso de agrotóxicos e consolidar uma nova matriz tecnológica de produção agrícola, visando à proteção da saúde humana e do meio ambiente;

V

apoiar a ampliação de áreas agrícolas cultivadas que utilizam bioinsumos e outros insumos oriundos de matérias-primas regionais e de baixo impacto ambiental;

VI

fomentar e estimular a produção "on farm", associativa e cooperativada de bioinsumos para uso na agricultura na sua mais ampla abrangência, seja de técnicas de multiplicação em comunidade de micro-organismos, produção de micro-organismos isolados e macrobiológicos como agentes de controle de pragas;

VII

democratizar o acesso pelos agricultores e suas organizações às cepas de micro-organismos puros para multiplicação;

VIII

estimular o desenvolvimento da cadeia econômica da produção dos bioinsumos no Estado;

IX

fomentar e estimular o conhecimento e o uso de tecnologias populares para o manejo dos sistemas agropecuários, como as ciências da homeopatia, da biodinâmica e da fitoterapia;

X

desenvolver, no Estado, um polo de geração de pesquisa e de tecnologias com fortalecimento das cadeias produtivas de bioinsumos, visando a avançar na produção, comercialização e uso na produção agropecuária;

XI

promover o desenvolvimento e o uso de produtos e insumos que promovam o desenvolvimento da atividade biológica do solo para melhorar a fertilidade, nutrição de plantas e regeneração de solos e de sistemas agrícolas;

XII

inserir o tema da agricultura regenerativa, biológica e sustentável no processo educacional do Estado do Rio Grande do Sul, especialmente nas escolas técnicas agropecuárias, na formação dos agentes de extensão rural e em atividades de capacitação de agricultores familiares, especialmente jovens e mulheres;

XIII

promover a redução de custos de produção na agropecuária e contribuir para autonomia dos agricultores, segurança e soberania alimentar e nutricional;

XIV

promover a agropecuária como atividade que retém carbono, estimulando o desenvolvimento e o uso de tecnologias que contribuam para aumentar a retenção de carbono no sistema, especialmente no solo, de modo a contribuir para a superação redução da emissão de gases de efeito estufa e enfrentamento às mudanças climáticas;

XV

contribuir para o cumprimento dos 17 (dezessete) Objetivos do Desenvolvimento Sustentável - ODS - estabelecidos pela ONU na agenda global 2030.

Art. 3º

Para os efeitos desta Lei e sua adequada aplicação, ficam adotados os seguintes conceitos:

I

bioinsumos: insumos de origem animal, vegetal ou microbiana, processos ou tecnologias, que interferem positivamente nos sistemas de produção da agricultura, pecuária, aquático ou florestal;

II

remineralizadores de solo: material de origem mineral que tenha sofrido apenas redução e classificação de tamanho por processos mecânicos e que altere os índices de fertilidade do solo por meio da adição de macro e micronutrientes para as plantas, bem como promova a melhoria das propriedades físicas ou físico-químicas ou da atividade biológica do solo, conforme a Lei Federal nº 12.890, de 10 de dezembro de 2013, também conhecidos como pós de rocha ou agrominerais;

III

agroecologia: ciência, movimento político e prática social, portadora de um enfoque científico, teórico, prático e metodológico que articula diferentes áreas do conhecimento de forma transdisciplinar e sistêmica, orientada a desenvolver sistemas agroalimentares sustentáveis em todas as suas dimensões;

IV

transição agroecológica: processo gradual de mudança de práticas e de manejo de agroecossistemas, tradicionais ou convencionais, por meio da transformação das bases produtivas e sociais do uso da terra e dos recursos naturais, que levem a sistemas de agricultura que incorporem princípios e tecnologias de base agroecológica com menor impactos para o meio ambiente e a saúde humana;

V

agricultura regenerativa: aquela que permite a um sistema agrícola que possa, permanentemente, se regenerar, proporcionado a produção de alimentos, fibras, madeira e outros, em determinada área, ao mesmo tempo em que cria as condições de manutenção e incremento da capacidade dos solos e do ambiente de se manter produtivo e ecologicamente saudável e diverso, ao longo do tempo;

VI

sistema orgânico de produção: aquele em que se adotam técnicas específicas, mediante a otimização do uso dos recursos naturais e socioeconômicos disponíveis e o respeito à integridade cultural das comunidades rurais, tendo por objetivo a sustentabilidade econômica e ecológica, a maximização dos benefícios sociais, a minimização da dependência de energia não renovável, empregando, sempre que possível, métodos culturais, biológicos e mecânicos, em contraposição ao uso de materiais sintéticos, a eliminação do uso de organismos geneticamente modificados e radiações ionizantes, em qualquer fase do processo de produção, processamento, armazenamento, distribuição e comercialização, e a proteção do meio ambiente, conforme estabelecido pela Lei Federal nº 10.831, de 23 de dezembro de 2003, e sua regulamentação;

VII

biofábricas: são estruturas com a finalidade de produção de micro-organismos, como bactérias ou fungos, para controle de pragas e doenças, bem como outros produtos para controle biológico e proteção de plantas e criações, e bioprodutos para induzir a resistência de plantas, bioestimuladores de plantas, entre outros;

VIII

produção "on farm": produção de insumos biológicos na própria unidade agrícola, que consiste na multiplicação de micro-organismos e outros agentes biológicos com a finalidade de uso do próprio agricultor ou de forma associativa para serem utilizados nos sistemas agropecuários;

IX

desenvolvimento sustentável: aquele capaz de suprir as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades;

X

produto para fertilidade de solo e nutrição de plantas: aquele utilizado para manutenção ou incremento da capacidade do solo de sustentar o crescimento e a produtividade das plantas, tais como os remineralizadores de solo ou pós de rochas, calcários e fosfatos naturais, incluídos os bioprodutos, como os inoculantes, os biofertilizantes e os bioestimulantes, que aportam substâncias ou fixam nutrientes, proporcionando equilíbrio nutricional e melhor desenvolvimento dos cultivos;

XI

atividade que retém carbono: atividade de agricultura, pecuária e florestal que, pela mudança no uso da terra, adota manejos e práticas que permitem a retenção de carbono na atividade agrícola, com incremento de matéria orgânica e ampliação da diversidade biológica nos solos, como a manutenção de solos cobertos com palhas, a escolha de plantas que aportam material orgânico, o plantio direto na palha, a rotação e consorciação de cultivos, a integração lavoura-pecuária-floresta, o uso de fertilizantes orgânicos, o enriquecimento do bioma do solo através de bioinsumos, entre outras práticas que evitam ou reduzem a emissão de dióxido de carbono - CO2 - para a atmosfera.

Art. 4º

A Política Estadual de Fomento à Agropecuária Regenerativa, Biológica e Sustentável se orienta pelas seguintes diretrizes:

I

o apoio à inovação tecnológica, ao desenvolvimento de insumos biológicos e minerais para uso agrícola na agropecuária caracterizados como de baixo impacto ambiental, por meio de financiamento público e firmando parcerias com instituições de pesquisa, universidades e de assistência técnica e extensão rural e social;

II

o fomento à produção regional e o uso de bioinsumos no Estado, com incentivo especial ao desenvolvimento, à criação e à adaptação de tecnologias para a produção nas próprias propriedades rurais e de instalação de pequenas e médias biofábricas e "startups" nos municípios, com prioridade às iniciativas coletivas de organizações ligadas à agropecuária;

III

estimular a formação de redes de centros populares de multiplicação e reprodução de micro-organismos isolados e macro-organismos, usados para o controle biológico a partir das organizações coletivas, principalmente da agricultura familiar;

IV

articular instituições de pesquisa e organizações da sociedade para criar alternativas regionais para fornecer cepas puras de micro-organismos para multiplicação, de forma especial, para a agricultura familiar e suas organizações;

V

o fomento à produção regional e o uso de remineralizadores de solo na produção agropecuária, com investimentos públicos, fazendo prospecção de fontes minerais regionais no Estado e em pesquisa agronômica, visando a dotar de melhor eficiência no uso em cultivos e criações;

VI

o fomento ao uso de plantas de cobertura de solo, ampliando a proteção física, a diversidade biológica, e viabilizando a ciclagem de nutrientes;

VII

o incentivo ao desenvolvimento e consolidação de cadeias produtivas de insumos biológicos;

VIII

o apoio com linhas de crédito diferenciadas e subsidiadas, de custeio e investimentos, para incentivar a adoção de tecnologias sustentáveis de baixo impacto ambiental por parte dos agricultores, de cooperativas, de associações e demais organizações que orientarem seus sistemas de produção para a transição regenerativa, biológica, sustentável e agroecológica;

IX

o apoio financeiro, técnico e de gestão de negócios para a instalação de biofábricas no território estadual, de forma regionalizada, com prioridade às iniciativas cooperativadas de agricultores através de suas organizações;

X

a construção de uma rede de suporte técnico, científico e tecnológico com instituições públicas, privadas e organizações sociais para a implementação das ações regenerativas e na produção de bioinsumos, bem como para o controle de qualidade da produção "on farm";

XI

a articulação de ações de órgãos públicos, empresas estatais e programas governamentais, no sentido de potencializar os objetivos desta Política;

XII

a prioridade nas aquisições governamentais ou com recursos públicos para alimentos e produtos oriundos de sistemas produtivos sustentáveis, de acordo com esta Política;

XIII

o apoio ao desenvolvimento e adoção de tecnologias sustentáveis adaptadas e adequadas à agricultura regenerativa e à transição agroecológica;

XIV

o estímulo às cooperativas e associações de produtores que implementem projetos de acordo com os objetivos desta Política;

XV

o incentivo à adoção de práticas e manejos sustentáveis dos solos, proteção de nascentes e mananciais, visando à conservação e proteção dos recursos naturais;

XVI

o apoio à produção e à pesquisa de sementes e variedades adaptadas a condições de solo e clima regionais e aos sistemas regenerativos, sustentáveis e agroecológicos;

XVII

a prioridade das ações e recursos públicos para atender a agricultura familiar e suas organizações e demais públicos estabelecidos pela Lei Federal nº 11.326, de 24 de julho de 2006, e da agricultura urbana e periurbana;

XVIII

o incentivo a ações de separação, coleta e reciclagem de resíduos orgânicos para transformação em fertilizantes por meio de compostagem nos municípios;

XIX

a capacitação de técnicos, agricultores e estudantes, com prioridade para jovens e mulheres, para promover a ampliação do conhecimento sobre a agricultura regenerativa, a produção e a utilização de bioinsumos, de mineralizadores de solo e de outras alternativas de insumos capazes de diminuir o impacto ambiental na produção agrícola e expandir a produção de alimentos saudáveis;

XX

estruturar as políticas públicas e demais ações a partir do olhar territorial, construindo soluções regionalizadas juntamente com organizações sociais para produção de bioinsumos, de remineralizadores e demais tecnologias regenerativas, biológicas e sustentáveis.

Art. 5º

São instrumentos da Política Estadual de Fomento à Agropecuária Regenerativa, Biológica e Sustentável:

I

a desoneração fiscal e creditícia, as linhas de financiamentos subsidiadas, os incentivos para a aquisição de novas tecnologias agrícolas, insumos e equipamentos necessários ao desenvolvimento da Política de que trata esta Lei;

II

a pesquisa científica e tecnológica desenvolvida por órgãos estaduais, financiadas com recursos públicos ou em parcerias;

III

a formação e a capacitação técnicas de forma ampla e massiva;

IV

os programas públicos e das empresas estatais e privadas;

V

as campanhas informativas, educativas e de estímulo a essa nova matriz tecnológica para a agropecuária;

VI

os fundos públicos destinados ao fomento e ao desenvolvimento de setores da agropecuária, pesquisa, inovação e meio ambiente;

VII

a cooperação entre entes da federação, entre órgãos públicos e privados, com universidades e instituições de pesquisa;

VIII

a formatação de um Plano Estadual de Fomento à Agropecuária Regenerativa, Biológica e Sustentável e de um Plano Estadual de Bioinsumos;

IX

os dispositivos da Lei nº 14.486, de 30 de janeiro de 2014, e da Lei nº 15.222, de 28 de agosto de 2018.

Art. 6º

Visando a atingir os objetivos e as diretrizes desta Lei, o Estado poderá:

I

orientar a política agropecuária estadual a partir dos objetivos e diretrizes desta Lei;

II

criar um Plano Estadual de Fomento à Agropecuária Regenerativa, Biológica e Sustentável e um Plano Estadual de Bioinsumos;

III

criar linhas de crédito facilitadas, inclusive com subsídios, visando a estimular a implantação desta Política;

IV

estabelecer convênios, parcerias e projetos de cooperação com instituições públicas e privadas em âmbito nacional e internacional;

V

definir, regulamentar e certificar padrões de eficiência, idoneidade e sustentabilidade, no âmbito de suas competências, inclusive, disponibilizar ao público, na internet, catálogos de produtos com garantia comprovada por órgãos oficiais;

VI

estabelecer como prioridade o estímulo à produção e uso de bioinsumos em programas e financiamentos públicos;

VII

conceder tratamento tributário diferenciado e favorecido com desoneração da cadeia produtiva;

VIII

conceder incentivos à instalação de biofábricas nas propriedades rurais, prioritariamente, a organizações de agricultores familiares, cooperativas, associações e redes de cooperação, bem como às pequenas e médias empresas que produzam produtos e tecnologias para este fim;

IX

criar mecanismos de organização do mercado nacional e internacional dos produtos oriundos de sistemas regenerativos, biológicos e sustentáveis, articulando a produção e a comercialização;

X

apoiar, com recursos e outros instrumentos, a formação de redes entre instituições de pesquisa, ensino, extensão rural e organizações de agricultores, visando a avançar no processo de construção de conhecimento e transição agroecológica;

XI

estabelecer parcerias com municípios para desenvolver soluções de compostagem de resíduos orgânicos, com a finalidade de utilização nas atividades agropecuárias e florestais;

XII

apoiar a criação de polos de produção de bioinsumos.

Art. 7º

Esta Lei poderá ser regulamentada.

Art. 8º

Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.


EDUARDO LEITE, Governador do Estado.

Lei Estadual do Rio Grande do Sul nº 16174 de 28 de Agosto de 2024