Decreto nº 165 de 17 de Janeiro de 1890
Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos
Provê á organização de bancos de emissãos.
O Marechal Manoel Deodoro da Fonseca, Chefe do Governo Provisorio da Republica dos Estados Unidos do Brazil, constituido pelo Exercito e Armada, em nome da Nação: Decreta:
Publicado por Presidência da República
Sala das sessões do Governo Provisorio, 17 de janeiro de 1890, 2º da Republica.
Art. 1º
Poderão emittir bilhetes ao portador os bancos, que se fundarem com autorização do Governo, e cujo fundo social for constituido com apolices da divida publica, moeda corrente ou ouro, observadas as disposições seguintes:
§ 1º
O paiz dividir-se-ha em tres regiões, a saber:
a
a do Norte, comprehendendo desde o Estado da Bahia até ao do Amazonas;
b
a do Centro, comprehendendo os Estados do Rio de Janeiro, S. Paulo, Minas Geraes, Espirito Santo, Paraná e Santa Catharina;
c
a do Sul, comprehendendo os Estados do Rio Grande do Sul, Matto Grosso e Goyaz.
§ 2º
A cada uma destas regiões corresponderá um banco, cujo capital será: Norte, com séde na Bahia, até(...) 150.000:000$000 Centro, com séde no Rio de Janeiro, até(...) 200.000:000$000 Sul, com séde em Porto Alegre, até(...) 100.000:000$000 450.000:000$000 Esse capital será realizado em prestações, nunca inferiores a 10 %, e convertido em apolices, as quaes se averbarão em nome dos respectivos bancos, com a clausula de inalienaveis.
§ 3º
Os bancos terão succursaes ou agencias nos pontos, que, de accordo com o Governo, forem julgados convenientes.
§ 4º
O banco que se constituir encarregar-se-ha de fundar, de accordo com o Governo, caixas filiaes em Estados fóra da sua circumscripção, no caso de não se organizarem os correspondentes ás regiões respectivas.
§ 5º
A emissão de bilhetes ao portador não poderá exceder á importancia das apolices, que constituirem o fundo social dos bancos, nem a sua circulação ultrapassar os limites da circumscripção territorial de cada um. Os bancos, porém, terão conta entre si, para regularizar a passagem da moeda de praça á praça.
§ 6º
Quando a circulação for feita por um banco em região estranha á sua circumscripção, ex vi do § 4º do art. 1º, as respectivas notas, observadas as disposições do paragrapho anterior, conterão um carimbo com as lettras RN, RC ou RS, afim de facilitar a sua substituição pelas dos respectivos bancos, Jogo que se fundarem. Feita a substituição, as notas inutilisadas restituir-se-hão ao banco emissor; e, dado que nem todas se apresentem, marcar-se-ha um prazo para esse fim, sob pena de prescripção, devendo neste caso ser o banco emissor embolsado da somma dessas notas prescriptas pelo banco correspondente á região.
§ 7º
Os bilhetes emittidos em conformidade com as disposições deste decreto serão recebidos, e terão curso nas estações publicas, gozando das regalias conferidas às notas do Estado.
§ 8º
Os bancos poderão ter officinas proprias para impressão de seus bilhetes, as quaes ficarão sob a fiscalização do Governo. Emquanto, porém, não as houver, serão os bilhetes fornecidos pelo Governo, correndo toda a despeza por conta dos respectivos bancos. Os bilhetes conterão: O nome do banco emissor; A assignatura do chefe da emissão, ou do seu substituto, e rubrica do fiscal por parte do Governo. Os bilhetes serão dos mesmos valores que os actuaes do Estado.
§ 9º
A falsificação de bilhetes e a introducção de falsificados serão punidas com as penas comminadas pelo direito vigente ao crime de moeda falsa.
§ 10º
Os bancos ficarão sujeitos á fiscalização do Governo, especialmente no que respeita á emissão, substituição e resgate dos bilhetes, por intermedio de pessoas nomeadas pelo Ministerio da Fazenda, que lhes marcará attribuições fiscalizadoras e o respectivo vencimento, o qual não poderá exceder de 10:000$000;
§ 11º
O excesso da emissão de bilhetes além dos limites determinados neste decreto, importará:
a
para os bancos, a revogação do decreto de autorização e sua liquidação forçada e immediata;
b
para os directores e gerentes, as penas do art. 173 do codigo criminal, além da indemnização das perdas e damnos causados aos accionistas;
c
para os fiscaes conniventes em taes faltas, ou que, tendo dellas conhecimento, não as denunciarem em tempo, as mesmas penas acima mencionadas.
§ 12º
O prazo de duração destes bancos será de 50 annos, podendo ser prorogado, mediante autorização do Governo.
§ 13º
Dada a liquidação, forçada ou voluntaria, antes ou depois de expirado o prazo de duração do banco - observadas as disposições das leis vigentes - guardar-se-ha a seguinte ordem nas preferencias, em relação aos credores:
a
por notas em circulação que não tenham sido recolhidas;
b
o Estado pelas apolices que comportarem o fundo de reconstituição do capital do banco, as quaes serão abatidas do capital e entregues ao Thesouro Nacional, sem direito a indemnização alguma;
c
os credores preferenciaes nos termos do codigo commercial;
d
os credores chirographarios;
e
os accionistas. A assembléa geral do banco, com assistencia do fiscal do Governo, resolverá - quando se tornar necessaria a liquidação - o modo pratico de realizal-a, assignando os direitos e interesses dos credores e associados.
§ 14º
Os bancos teem o direito de substituir as suas notas em circulação por outras, sempre que o julgarem conveniente, fazendo para esse fim annuncios por editaes, publicados na imprensa de todos os Estados da sua circumscripção, nos quaes fixará um prazo nunca inferior a seis mezes. As notas, que deixarem de ser apresentadas, reputar-se-hão prescriptas, e as que forem substituidas serão incineradas em presença do fiscal do Governo.
Art. 2º
Os bancos constituidos nos termos deste decreto poderão operar: 1) em emprestimos, descontos e cambios; 2) em hypothecas a curto e longo prazo, emittindo letras hypothecarias; 3) em penhor agricola sobre fructos pendentes, colhidos e armazenados; 4) em adeantamentos sobre instrumentos de trabalho, machinas, apparelhos e todos os meios de producção das propriedades agricolas, engenhos centraes, fabricas e officinas; 5) em emprestimos de caracter e natureza industrial para construcção de edificios publicos e particulares, estradas de ferro e outras, cáes, dócas, melhoramentos de portos, telegraphos, telaphones e quaesquer emprehendimentos industriaes; 6) em comprar e vender terras, incultas, ou não, parcellal-as, e demarcal-as, por conta propria, ou alheia; 7) encarregar-se de assumptos tendentes á colonização, fazendo os adeantamentos necessarios, mediante ajuste o contracto com os colonos, ou terceiros interessados; 8) incumbir-se, por conta propria ou alheia, de deseccamento, drenagem e irrigação do sólo; 9) tratar do nivelamento e orientação de terrenos, abertura de estradas e caminhos ruraes, canalisação e direcção de torrentes, lagôas e rios, e facilitar os meios necessarios - mediante ajuste e condições - a qualquer cultura, criação de gado de todas as especies e exploração de minas, principalmente de carvão de pedra, cobre, ferro e outros metaes; 10) finalmente, poderão effectuar todas as operações de commercio e industria, por conta propria ou de terceiros.
Art. 3º
E' concedido aos bancos fundados nos termos do presente decreto:
a
cessão gratuita, á discrição do Governo, de terras devolutas, na zona da sua circumscripção, para localisação de colonos e fundação de estabelecimentos industriaes de qualquer ordem;
b
preferencia, em igualdade de condições, na construcção de estradas de ferro e outras obras e melhoramentos projectados pelo Governo;
c
preferencia, em condições iguaes, para exploração de minas de qualquer especie, comprehendidas na sua circumscripção territorial, e bem assim para exploração de canaes e communicações fluviaes, que servirem ás ditas minas, ou dellas se avizinharem;
d
preferencia, em igualdade de condições, nos contractos com o Governo sobre objectos de colonisação e immigração na sua circumscripção territorial;
e
direito de desapropriação nos termos da lei n. 816 de 10 de julho de 1855 e seu regulamento, que baixou com o decreto n. 1.664 de 27 de outubro do mesmo anno , e bem assim isenção de decimas, impostos e direitos aduaneiros para os estabelecimentos industriaes, que fundarem, emquanto os houverem sob sua administração, e material de qualquer especie, que importarem com destino e applicação a esses estabelecimentos, estradas de ferro, exploração de rios, minas e outras fontes de producção.
Art. 4º
Para que os bancos possam pretender os favores do presente decreto, e gozar da faculdade da emissão de notas, devem obrigar-se, em favor do Estado: 1º a reduzir, a contar do começo das suas operações, 2 % no juro das apolices, que constituirem o seu fundo social, e a augmentar esta porcentagem mais 1/2 % annual até á completa extincção do referido juro; 2º a averbar como inalienaveis as apolices, que constituirem seu fundo social, das quaes não poderão dispôr, salvo accordo com o Governo; 3º a constituir, com uma quota, nunca inferior a 10 % dos lucros brutos, um fundo para representar o capital em apolices, que ficarão annulladas, para todos os effeitos, no fim do prazo de duração dos bancos. A essa quota serão contados, semestralmente, juros, na razão minima de 6 % ao anno. Cessará a formação deste fundo, logo que sua importancia attingir ao respectivo limite; 4º a emprestar á lavoura e industrias auxiliares, a juro nunca superior de 6 %, commissão de 1/2 % e prazo maximo de 30 annos, sobre hypotheca de immoveis ruraes, urbanos e industriaes, e bem assim a effectuar com ella transacções de penhor de productos e outros titulos, que offereçam garantia, a prazo nunca superior a tres annos. Para auxiliar taes emprestimos, o Governo concorrerá apenas com as sommas que receber dos bancos a titulo de reducção da taxa de juro das apolices, que constituirem seu fundo social; e, depois dessas sommas attingirem á totalidade do juro, ficará este auxilio reduzido á metade. Com este auxilio os bancos formarão um fundo especial, para garantir o serviço das letras hypothecarias, que emittirem em virtude de emprestimos á lavoura e industrias auxiliares; 5º á converter em especies metallicas, á vontade do portador e á vista, tão sómente as notas que emittirem, um anno depois do cambio attingir e manter a taxa par de 27, ou mais, tomando igual compromisso quanto ás notas do Governo, que houver em circulação, sem direito a indemnização alguma.
Art. 5º
Desde que, nos termos do numero anterior, começar a convertibilidade das notas em especies metallicas, á vontade do portador e á vista, os bancos terão sempre um encaixe metallico igual ás respectivas circulações de notas dessa natureza. O excesso da emissão além dos limites determinados pelo encaixe metallico acarreta as penas comminadas no art. 1º § 11 deste decreto. Paragrapho unico. A emissão de bilhetes sobre base metallica não inhibe os bancos de continuarem a fazer a sua circulação sobre base de apolices.
Art. 6º
Os bancos actuaes de circulação metallica continuarão no gozo de seu privilegio, observadas as disposições legaes.
Art. 7º
Os emprestimos aos agricultores nos termos do art. 10 da lei n. 3.172 de 5 de outubro de 1885 poderão ser feitos por prazo de um a tres annos, e ainda por escripto particular, assignado pelo devedor e duas testemunhas, cujas firmas serão reconhecidas antes do registro; revogados nesta parte o art. 107 e §§ 2º e 4º do decreto n. 9.549 de 23 de janeiro de 1886 .
Art. 8º
Os bancos instituidos segundo este decreto ficarão sujeitos ás leis vigentes, que regem a materia.
Art. 9º
Revogam-se as disposições em contrario.
Manoel Deodoro da Fonseca. Ruy Barbosa.
Este texto não substitui o original publicado na CLB de 1890