Recomendação CNMP nº 93 de 13 de Setembro de 2022
Recomenda aos órgãos do Ministério Público brasileiro com atuação no enfrentamento à violência contra as mulheres a implementação de projetos de recuperação e reeducação do agressor e outras providências.
O CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO , no exercício das atribuições conferidas pelo art. 130-A, § 2°, inciso I, da Constituição Federal, e com fundamento nos arts. 147 e seguintes de seu Regimento Interno, em conformidade com a decisão Plenária tomada na 12 Sessão Ordinária, realizada em 23 de agosto de 2022, nos autos da Proposição nº 1.01225/2021-60; Considerando que o Ministério Público é garantia constitucional fundamental de acesso à Justiça (arts. 127 e 129, ambos da Constituição Federal), sendo necessário o aprimoramento da sua atuação judicial e extrajudicial visando a concretização e a efetivação dos direitos e garantias constitucionais fundamentais afetos às atribuições constitucionais da Instituição; Considerando que o enfrentamento a violência contra a mulher, além de constituir um dever legal, condizente com a própria vocação institucional do órgão, fomenta o desenvolvimento de uma cultura fundada nos direitos humanos e na defesa do respeito mútuo, com impacto direto na gestão de excelência; Considerando que lutar contra a reincidência de agressões cotidianas é uma forma de prevenir a morte de mulheres, uma vez que o feminicídio é, na maior parte dos casos, resultado de uma escalada de violência; Considerando que a recuperação e reeducação do agressor por meio de grupos reflexivos provou-se uma maneira altamente eficaz de reduzir ou eliminar a reincidência da violência doméstica (de 65% para 1-2%); Considerando que a recuperação e reeducação do agressor não se trata de forma de atenuar a responsabilização do agressor, mas uma estratégia baseada em dados para reduzir a violência na sua raiz, mudando as crenças e comportamentos que levam o homem a agir dessa forma; Considerando que apesar de quase todos os Estados possuírem projetos semelhantes, as iniciativas são isoladas e não atendem à demanda (aproximadamente apenas um projeto por Estado), sendo que no estado de São Paulo apenas seis municípios possuem projetos semelhantes; Considerando que, com a obrigatoriedade da medida, a demanda por esses projetos, que atualmente já é grande, vai se tornar ainda maior; Considerando que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já reconhece a necessidade de capacitação de todos os operadores de Direito que atuam nas varas especializadas de violência contra a mulher; Considerando a atuação ministerial no combate à violência contra a mulher, nos termos da Convenção sabre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de interesse público, RESOLVE:
Publicado por Conselho Nacional do Ministério Público
Brasília-DF, 13 de setembro de 2022.
Esta norma recomenda aos órgãos do Ministério Público brasileiro com atuação no enfrentamento à violência contra as mulheres a implementação de projetos de recuperação e reeducação do agressor, mediante união de esforços entre o Sistema de Justiça local e a rede de proteção, prevenção e enfrentamento à violência contra as mulheres existente em cada região.
Recomenda-se aos órgãos do Ministério Público brasileiro com atuação no enfrentamento à violência contra as mulheres que:
viabilizem a inclusão, no questionário de atendimento às vítimas nas delegacias de polícia e delegacias especializadas de atendimento à mulher, quando da realização dos boletins de ocorrência, especificamente no rol das medidas protetivas de urgência disponíveis, as seguintes medidas protetivas:
zelem pelo requerimento ao juiz competente, em qualquer fase da investigação ou processual, da medida protetiva que obriga o agressor a frequentar centros de educação e de reabilitação.
Nas delegacias em que não houver questionário como procedimento padrão, devem ser adotadas providências para que as vítimas sejam orientadas e possam requerer as medidas protetivas previstas nas alíneas "a" e "b" do inciso I deste artigo, no momento da lavratura do boletim de ocorrência ou na primeira oportunidade em que forem ouvidas.
Recomenda-se a capacitação de equipe técnica para a aplicação do projeto de recuperação e reeducação do agressor, mediante união de esforços entre o Sistema de Justiça local, a rede de proteção, prevenção e enfrentamento à violência contra as mulheres existente em cada região e o respectivo Centro de Estudos de Aperfeiçoamento Funcional ou Escola Superior do Ministério Público.
A capacitação deve abordar aspectos estruturais da violência, tendo como conteúdo mínimo:
O Programa de Recuperação e Reeducação do Agressor deve ser composto e realizado por meio de:
trabalho psicossocial de reflexão e reeducação, promovido por profissionais habilitados para desempenhar esse papel;
palestras e aulas expositivas, ministradas por profissionais com notório conhecimento sobre os temas abordados;
número mínimo de horas/encontros a ser cumprido por cada agressor, para promover a efetiva recuperação, reeducação e mudança comportamental.
ANTÔNIO AUGUSTO BRANDÃO DE ARAS Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público