JurisHand AI Logo
|

Revisão de cláusulas abusivas

Conceito

A revisão de cláusulas abusivas no âmbito do Direito do Consumidor não constitui faculdade excepcional, mas sim um instrumento de correção de desequilíbrios contratuais impostos pela manifesta superioridade técnica, econômica e jurídica do fornecedor em face do consumidor. O Código de Defesa do Consumidor, ao consagrar a possibilidade de revisão judicial das cláusulas contratuais, dá concretude ao princípio do equilíbrio nas relações de consumo e à função social do contrato, fundamentos estruturantes do microssistema de tutela consumerista.

Nos termos do art. 6º, inciso V, da Lei nº 8.078/1990, é direito básico do consumidor a modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas. Essa previsão legal rompe com a rigidez clássica do pacta sunt servanda e consagra, no plano das relações privadas, a cláusula rebus sic stantibus, permitindo que o Judiciário interfira para reequilibrar obrigações tornadas injustas ou desproporcionais diante de alterações relevantes nas condições fáticas ou econômicas que embasaram o contrato.

As cláusulas abusivas, por sua vez, são elencadas de forma exemplificativa no art. 51 do CDC. São consideradas nulas de pleno direito aquelas que importem em renúncia a direitos reconhecidos pelo sistema jurídico, que imponham obrigações desproporcionais, que estabeleçam vantagens excessivas ao fornecedor ou que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada. A legislação vai além ao prever a possibilidade de controle judicial e administrativo dessas cláusulas, mesmo nos contratos já executados parcialmente, o que reafirma o caráter protetivo e irrenunciável das normas de defesa do consumidor.

Importante observar que a nulidade da cláusula abusiva não invalida o contrato como um todo, salvo quando sua ausência comprometer a existência e a funcionalidade do vínculo contratual. Trata-se de aplicação do princípio da conservação do negócio jurídico, que visa preservar o equilíbrio contratual sem sacrificar a totalidade do instrumento.

A jurisprudência pátria tem reiteradamente afirmado a possibilidade de revisão judicial com base em cláusulas genéricas de onerosidade excessiva, ainda que não haja previsão expressa no contrato de cláusula compromissória nesse sentido. Isso revela a natureza de ordem pública da legislação consumerista e o caráter irrenunciável da proteção conferida ao consumidor, mesmo que este aceite espontaneamente os termos impostos pelo fornecedor.

No que tange aos contratos de adesão, que constituem a maioria dos pactos celebrados nas relações de consumo, a incidência da revisão contratual é ainda mais evidente. A ausência de negociação individualizada e a imposição unilateral de cláusulas tornam imprescindível o controle judicial, como mecanismo de equilíbrio e de proteção à dignidade do contratante vulnerável.

Assim, a revisão de cláusulas abusivas emerge não apenas como faculdade conferida ao consumidor, mas como um dever imposto ao julgador diante de situações que contrariem os princípios da boa-fé objetiva, da equidade e da função social do contrato. O Direito do Consumidor, ao permitir tal revisão, reafirma seu compromisso com a justiça contratual, com a cidadania e com a pacificação das relações privadas.

Remissões - Leis
Remissões - Decisões