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Recomendação CNMP nº 96 de 28 de Fevereiro de 2023

Recomenda aos ramos e às unidades do Ministério Público a observância dos tratados, convenções e protocolos internacionais de direitos humanos, das recomendações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos; e dá outras providências.

O CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO , no exercício das atribuições conferidas pelo art. 130-A, § 2º, inciso I, da Constituição Federal, e com fundamento nos arts. 147 e seguintes do seu Regimento Interno, em conformidade com a decisão plenária proferida na 1ª Sessão Ordinária, realizada em 14 de fevereiro de 2023, nos autos da Proposição n º 1.00326/2022-13; Considerando que a República Federativa do Brasil adota como princípios fundamentais a dignidade da pessoa humana e a prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais (art. 1º, inciso III, c/c. arts. 3º e 4º, inciso II, todos da CF); Considerando que a Constituição Federal estabelece, no § 2º do seu art. 5º, que os “direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”; Considerando que a Constituição Federal estabelece, no § 3º do seu art. 5º, que os “tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”; Considerando que o Brasil assinou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 10 de dezembro de 1948, bem como ratificou e incorporou à ordem jurídica interna os principais tratados internacionais do sistema global de proteção dos direitos humanos; Considerando que o Estado brasileiro ratificou o texto vigente da Constituição da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e seu anexo, correspondente à Declaração Referente aos Fins e Objetivos da Organização Internacional do Trabalho (“Declaração de Filadélfia”), tendo, ainda, aprovado declarações de direitos e ratificado e incorporado à ordem jurídica interna inúmeras convenções internacionais da OIT; Considerando que o Brasil, Estado-Membro da Organização dos Estados Americanos (OEA), submete-se ao sistema regional interamericano de proteção dos direitos humanos, por força de sua vinculação à Carta da OEA, promulgada pelo Decreto nº 30.544, de 14 de fevereiro de 1952, da aprovação de declarações interamericanas de direitos e da ratificação e incorporação à ordem jurídica interna de tratados interamericanos de direitos humanos, sobretudo da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, de 22 de novembro de 1969, também conhecida por Pacto de São José da Costa Rica, promulgada por meio do Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992; Considerando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos consagra, em seus artigos 1º e 2º, a obrigação estatal de respeitar e garantir os direitos humanos, bem como de adotar todas as medidas legislativas ou de outra natureza para tornar efetivos os direitos consagrados; Considerando que o artigo 33 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos reconhece a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) como “competentes para conhecer dos assuntos relacionados com o cumprimento dos compromissos assumidos pelos Estados-Partes nesta Convenção”; Considerando que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a teor dos artigos 41 a 51 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, tem por funções, entre outras, “formular recomendações aos governos dos Estados-Membros, quando o considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos” e “atuar com respeito às petições e outras comunicações” que reportem casos de violação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos por um Estado-Parte, podendo ensejar, em caso de apuração de procedência do ato violador, formulação de recomendações de reparação do dano e não repetição da prática reprovada, cuja inobservância pode levar o Estado-Parte violador a responder perante a Corte IDH; Considerando que a Corte IDH, nos termos do artigo 62.3 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, “tem competência para conhecer de qualquer caso relativo à interpretação e aplicação das disposições desta Convenção que lhe seja submetido, desde que os Estados-Partes no caso tenham reconhecido ou reconheçam a referida competência”; Considerando que a Corte IDH, de acordo com o artigo 64.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, pode emitir opiniões consultivas sobre a interpretação da Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos, as quais fornecem a interpretação internacionalista dos dispositivos de tais tratados; Considerando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos determina, em seu artigo 68, que os “Estados Partes na Convenção comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”; Considerando o teor do Decreto nº 4.463, de 8 de novembro de 2002, que promulgou a Declaração de Reconhecimento da Competência Obrigatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos; Considerando que a Corte IDH, na aplicação do artigo 29 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, consagrou o Princípio Pro Persona , segundo o qual toda interpretação deve ser ampliativa em direção à máxima proteção dos direitos humanos, critério hermenêutico a ser observado tanto na fixação do sentido de determinado dispositivo normativo quanto na solução de antinomia de normas; Considerando que a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, ratificada e incorporada pelo Estado brasileiro à ordem jurídica interna, por força do Decreto nº 7.030, de 14 de dezembro de 2009, consagra o Princípio da Boa-Fé em Direito Internacional, ao preceituar, em seu artigo 26, que “todo tratado em vigor obriga as partes e deve ser cumprido por elas de boa-fé”, e, em seu artigo 27, que “uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado”. Considerando-se que normas internacionais de direitos humanos são postas para cumprimento no âmbito interno dos Estados e que a jurisprudência da Corte IDH constitui-se para se fazer cumprir pelos meios proporcionados pelo aparato legislativo e jurisdicional doméstico; Considerando que a Corte IDH enfatiza, em sua jurisprudência, o dever primário dos Estados e de seus agentes públicos de realizar, de ofício, o controle de convencionalidade das normas e práticas internas, para se obter maior proteção ao ser humano; Considerando que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, nos artigos 33 a 78, estabelece meios de proteção do cumprimento de suas disposições, que possibilitam que a omissão dos agentes estatais na aplicação de suas disposições convencionais, em âmbito nacional, enseje um processo internacional que pode acarretar recomendações por parte da Comissão Interamericana de Direitos Humano, culminando com uma condenação internacional do Brasil pela Corte IDH; Considerando que da missão constitucional do Ministério Público, estabelecida pelo art. 127 da Constituição Federal, decorre a vinculação inexorável de sua atuação - agente e interveniente, judicial e extrajudicial, contra atores e instituições públicas e privadas - ao respeito, promoção e proteção dos direitos humanos em âmbito nacional, uma vez que a ordem jurídica cuja defesa é sua razão de existir é caracterizada pela centralidade desses direitos, que compõem um corpo normativo integrado por normas constitucionais e internacionais; Considerando que o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) tem por missão fortalecer, fiscalizar e aprimorar o Ministério Público, zelando pela unidade e pela autonomia funcional e administrativa, para uma atuação sustentável e socialmente efetiva; e Considerando que a Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais (CDDF) do CNMP, criada pela Emenda Regimental n° 6, de 27 de junho de 2012, tem por objetivo contribuir para o aprimoramento e unidade de atuação do Ministério Público na defesa dos direitos fundamentais, em coerência com as diversas previsões constitucionais e legais que conferem ao órgão o poder- dever de atuar como agente de transformação positiva da realidade social, RESOLVE:

Publicado por Conselho Nacional do Ministério Público

Brasília-DF, 28 de fevereiro de 2023.


Art. 1º

Esta norma recomenda aos ramos e às unidades do Ministério Público a observância dos tratados, convenções e protocolos internacionais de direitos humanos, das recomendações da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Art. 2º

Recomenda-se aos órgãos do Ministério Público que observem, em seus respectivos âmbitos de atribuição, em todas as esferas de atuação:

I

as normas dos tratados, convenções e protocolos internacionais de direitos humanos em vigor no Brasil e as demais normas imperativas do Direito Internacional dos Direitos Humanos;

II

o efeito vinculante das decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, nos casos em que o Brasil é parte, nos termos do artigo 68 da Convenção Americana sobre os Direitos Humanos;

III

a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, quando adequada ao caso; e

IV

as declarações e outros documentos internacionais de direitos humanos, quando adequados ao caso.

Art. 3º

Recomenda-se aos membros do Ministério Público, respeitada a independência funcional, que:

I

promovam o controle de convencionalidade das normas e práticas internas;

II

priorizem a atuação judicial e extrajudicial nos casos relacionados com recomendações ao Estado brasileiro expedidas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, especialmente quanto às medidas cautelares; e

III

priorizem a atuação judicial e extrajudicial a fim de garantir a reparação material e imaterial das vítimas de violações a direitos humanos, bem como o cumprimento das demais obrigações determinadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos ao Estado brasileiro, inclusive quanto às medidas provisórias.

Parágrafo único

É facultada a utilização de opiniões consultivas emitidas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos na fundamentação de manifestações, pareceres e peças processuais ou extrajudiciais.

Art. 4º

O Conselho Nacional do Ministério Público, por ato conjunto de sua Presidência e da Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais, instituirá prêmio de monografias e teses relacionadas à Corte Interamericana de Direitos Humanos e sua jurisprudência.

Art. 5º

O Conselho Nacional do Ministério Público, por ato conjunto de sua Presidência e da Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais, instituirá programa de residência de membros na Corte Interamericana de Direitos Humanos, mediante adesão de ramos e unidades do Ministério Público brasileiro.

Art. 6º

A Comissão de Acompanhamento Legislativo e Jurisprudência e a Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais desenvolverão projeto para divulgação e difusão dos atos da Corte Interamericana de Direitos Humanos, visando assegurar o pleno cumprimento desta Recomendação.

Art. 7º

A Unidade Nacional de Capacitação e a Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais promoverão cursos, seminários e atividades de formação sobre a Corte Interamericana de Direitos Humanos e sua jurisprudência.

Art. 8º

Esta Recomendação entra em vigor na data da sua publicação.


ANTÔNIO AUGUSTO BRANDÃO DE ARAS Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público

Recomendação CNMP nº 96 de 28 de Fevereiro de 2023