Acento constitucional
Conceito
A Constituição Federal é a primeira fonte principiológica do Código de Processo Civil de 2015 (art. 1º, CPC).
A preocupação do legislador infraconstitucional em destacar a Lei Maior como fundamento primário da norma adjetiva não é um exagero, mas sim a reafirmação do novo papel do processo, o qual, no cenário pós-Código de Processo Civil de 2015, pretende ser ferramenta para a realização dos direitos e garantias fundamentais.
Logo, a lei processual, em consonância com as preocupações e ambições constitucionais, quer garantir um acesso mais democrático ao Poder Judiciário, bem como um processo justo e seguro para todas as partes.
O princípio da ampla defesa desempenha relevante papel neste cenário ao garantir às partes o direito de se utilizar de todos os meios admitidos em direito para defender seus interesses (art. 5º, LIV e LV).
Corolário lógico do devido processo legal, sua origem histórica também está na Inglaterra e na “Magna Carta das Liberdades", quando o Rei João Sem Terra, pressionado pelos senhores de terra, garantiu a estes liberdades individuais fundamentais, em detrimento de uma inédita redução dos poderes estatais.
Consoante previsto naquele instrumento, os direitos individuais tidos como naturais (p. ex., o direito de propriedade) e previstos na Magna Carta só poderiam ser restringidos pelo Estado se observadas prévias regras e condições processuais, garantindo-se os particulares o direito de ser ouvido (embrião do contraditório), bem como de produzir provas para demonstrar suas alegações (início da ampla defesa).
O devido processo legal foi evoluindo conforme os processos de independência e de formação de novos Estados também foram ficando mais complexos, reconhecendo-se a necessidade de se conformar a atuação estatal às vontades e anseios da sociedade, não só para se garantir direitos, mas também para evitar abusos e arbitrariedades.
A indispensabilidade do “rule of law" foi se fortalecendo e se desenvolvendo, sendo o princípio da ampla defesa um dos mais atingidos.
Por exemplo, passou-se a compreender a ampla defesa como a possibilidade de se autodefender, ou seja, de dar sua versão dos fatos em juízo, ou mesmo de nada dizer e de não ter seu silêncio interpretado como algo prejudicial à sua defesa. Tal previsão também está no texto constitucional (direito a não autoincriminação, art. 5º, LXIII) e gera desdobramentos tanto no processo civil como em outros ramos do direito, como por exemplo para o direito penal (art. 186, CPP).
Mas, para que a parte possa de fato exercer seu direito à ampla defesa de forma efetiva, também se tornou imprescindível garantir o direito à defesa técnica, ou seja, de ver-se assistido por um advogado contratado ou por um defensor constituído pelo Estado (p. ex., advogado dativo ou Defensor Público).
A Constituição Federal igualmente assegura o direito à defesa técnica, especialmente para aqueles em posição de hipossuficiência, garantindo de forma democrática o acesso à Justiça (art. 5º, 5º, LXXIV, CF).
Todos estes desdobramentos do princípio da ampla defesa possuem um objetivo em comum: o de garantir de forma democrática o direito de acesso à justiça e a realização de um processo justo, bem como segurança àqueles que contendem, permitindo às partes defender-se de forma ativa na ação.
Referências principais
- CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 7ª ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2021.
- DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual Civil, Parte Geral e Processo de Conhecimento. 23 ed., Salvador: JusPodivm, 2021.
- DIDIER JUNIOR, Fredie. Comentários ao novo Código de Processo Civil. 2 ed., rev. atual. e ampl., coord. Antonio do Passo Cabral, Ronaldo Cramer. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
- DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 24 ed., São Paulo: Atlas, 2021.
- MONTENEGRO FILHO, Misael. Direito Processual Civil. 14. ad., Rio de Janeiro: Atlas, 2019.
- GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume I: parte geral. 19 ed., São Paulo: Saraiva, 2021.
- THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil vol.1. 62 ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2021.
- WAMBIER, Luiz Rodrigues. TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil: Teoria Geral do Processo vol 1. 20 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021.
- WAMBIER, Luiz Rodrigues. ALVIM, Teresa Arruda. Temas Essenciais do novo CPC: análise das principais alterações do sistema processual civil brasileiro, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.
Remissões - Leis
Constituição Federal, art. 5º, LIV - LV
- Constituição Federal, art. 5º, LXIII
- Constituição Federal, art. 5º, LXXIV
- Código de Processo Civil, art. 1º
- Código de Processo Civil, art. 7º
Código de Processo Civil, art. 9º - 10