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Recomendação CNMP nº 68 de 18 de Dezembro de 2018

Sugere parâmetros para a atuação do Ministério Público no dever constitucional de defesa do acesso e da qualidade da Atenção Básica de Saúde e na execução das atividades relacionadas à Ação Nacional da Saúde, e dá outras providências.

O CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO , no exercício da competência fixada no art. 130-A da Constituição Federal, com fundamento no art. 147 e seguintes do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público – RICNMP, e em conformidade com a decisão proferida nos autos da Proposição n° 1.00752/2017-53, julgada na 15ª Sessão Ordinária, realizada em 25 de setembro de 2018; Considerando a instituição de um Estado Democrático de Direito destinado a assegurar, dentre outros, os direitos sociais como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, conforme preâmbulo da Constituição Federal de 1988; Considerando ser indissociável o direito fundamental à saúde da concretude dos fundamentos da República Federativa do Brasil, em especial da cidadania e da dignidade da pessoa humana, bem como dos objetivos republicanos da construção de uma sociedade livre, justa e solidária e da redução das desigualdades sociais e regionais, inseridos, respectivamente, nos artigos 1º e 3º da Constituição Federal; Considerando que as normas definidoras dos direitos e das garantias fundamentais têm aplicação imediata, conforme § 1º do artigo 5º da Constituição Federal; Considerando a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em regime de solidariedade, de cuidar da saúde por meio de efetivas políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos, na forma do artigo 23, inciso II, e 196 da Constituição Federal; Considerando que compete aos Municípios prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e dos Estados, serviços de atendimento à saúde da população, conforme artigo 30, inciso VII, da Constituição Federal; Considerando a existência dos princípios do direito administrativo constitucional, expressamente descritos no artigo 37 da Constituição Federal e de observância obrigatória pela administração pública direta ou indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em especial o da eficiência; Considerando a não aplicabilidade da vedação do princípio constitucional da não afetação de receitas de impostos a órgão, fundos ou despesas nos casos da destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, dentre outros, na forma do artigo 167, inciso IV da Constituição Federal; Considerando ser indissociável o finalismo da Constituição Econômica, prevista no título da Ordem Econômica e Financeira (artigo 170 da Constituição Federal) com a Constituição Social, embasada nos fundamentos e objetivos republicanos (preâmbulo e artigos 1º e 3º da Constituição Federal), nos direitos e garantias fundamentais (artigos 5º e 6º da Constituição Federal) e na Ordem Social (artigo 193 da Constituição Federal); Considerando que a Constituição Econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, somente se justifica, no paradigma do Estado Democrático de Direito, se assegurar a todos, como precípua finalidade, a existência digna, conforme os ditames da justiça social e observados, dentre outros, os princípios da redução das desigualdades regionais e sociais (artigo 170, VII da Constituição Federal); Considerando que a Constituição Social, justificada pelo paradigma do Estado Democrático de Direito, assegura a seguridade social, compreendida por um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a garantir os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social, conforme artigo 194 da Constituição Federal; Considerando a importância dos princípios da seguridade social, de observância cogente, com repercussão imediata para a Constituição Econômica, e, dentre outros, o da garantia da universalidade da cobertura e do atendimento e da sua irredutibilidade, denotando, com clareza, a coexistência dos princípios da vedação da proteção insuficiente e do retrocesso (assistencial e financeiro) constitucional, conforme artigo 194, parágrafo único da Constituição Federal; Considerando que o artigo 196 da Constituição Federal, irradiador de efeitos para todo o sistema jurídico, político e social, determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos, devendo ser assegurada por todos os entes da Federação; Considerando que as ações e serviços de saúde foram categoricamente guindados ao status de relevância pública, na forma do artigo 197 da Constituição Federal, único assim assegurado pelo legislador constituinte; Considerando que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com diretrizes, como a da participação da comunidade e do atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais, conforme artigo 198 da Constituição Federal; Considerando que o Ministério Público possui o dever institucional de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os interesses sociais e individuais indisponíveis, conforme artigo 127 da Constituição Federal; Considerando que, no tocante às ações e serviços públicos de saúde, o legislador constitucional incumbiu ao Ministério Público o dever de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos à máxima eficácia do direito fundamental à saúde, de relevância pública, bem como pela garantia do seu financiamento estatal em patamares de gasto mínimo, conforme artigo 129, inciso II, da Constituição Federal; Considerando que a utilização do verbo “zelar” e não “promover”, propositadamente utilizado pelo legislador constitucional quanto ao dever de atuação do Ministério Público na garantia do direito fundamental à saúde, único assim expresso dentre os demais direitos fundamentais, exige-lhe um comportamento positivo, de corresponsabilização pelos seus resultados, na perspectiva da consecução prática dos fundamentos e objetivos republicanos; Considerando que a Lei Federal nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, em seu artigo 2º, dispõe ser a saúde um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício; e, em seu artigo 6º, inciso V, estabelece que está incluída, no campo de atuação do Sistema Único de Saúde, a colaboração na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho; Considerando a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que a interpretação da norma programática do direito à saúde não pode transformá-la em promessa constitucional inconsequente, não podendo esse seu caráter, que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro, não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado (STA 174 – AgR – j. 17/03/2010); Considerando que a Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, que regulamenta o § 3º do artigo 198 da Constituição Federal, dispõe sobre a transparência, visibilidade, fiscalização, avaliação e controle dos órgãos gestores da saúde da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; Considerando que, no tocante à fiscalização da gestão da saúde, a Seção IV da Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, é determinante em apontar o Ministério Público como um dos destinatários das informações sobre o descumprimento de quaisquer de suas disposições legais; Considerando a existência da Recomendação CNMP nº 54, de 28 de março de 2017, que dispõe sobre a Política Nacional de Fomento à Atuação Resolutiva do Ministério Público; Considerando a instituição do Plano Nacional de Atuação do Ministério Público em Saúde Pública, aprovado pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG), na sua reunião ordinária, ocorrida em Salvador/BA, nos dias 25 a 27 de agosto de 2004, bem como I Encontro Nacional do Ministério Público em Defesa da Saúde (AMPASA), conforme documento intitulado “Carta de Salvador”; Considerando o papel do Conselho Nacional do Ministério Público na promoção da integração entre os ramos do Ministério Público, respeitada a independência funcional de seus membros e a autonomia da instituição e observada a disponibilidade orçamentária e financeira, RECOMENDA:

Publicado por Conselho Nacional do Ministério Público

Brasília-DF, 18 de dezembro de 2018.


Art. 1º

Os membros do Ministério Público, incumbidos do dever de zelar pelo direito fundamental à saúde, de relevância pública constitucional, respeitadas suas especificidades regionais e sua independência funcional, empreenderão esforços na execução das atividades da Ação Nacional em defesa do direito à saúde, por meio de projetos ou ações coordenadas, assegurada a formação de parcerias e de trabalhos em rede de cooperação com setores público e privado, com a sociedade civil organizada e com a comunidade em geral.

Art. 2º

As unidades do Ministério Público devem empreender esforços para remessa das informações dos resultados das atividades desenvolvidas na Ação Nacional, em especial das fiscalizações e/ou inspeções da gestão pública de saúde, para sistematização e publicação pela Comissão de Planejamento Estratégico (CPE) e pela Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais (CDDF).

Art. 3º

Recomenda-se, ao Ministério Público da União e dos estados, a adoção de efetivas providências que fortaleçam a atuação constitucional dos órgãos de execução na tutela do direito à saúde, em especial:

I

criar unidades especializadas na defesa da saúde, inclusive do trabalhador, observadas as peculiaridades de cada instituição;

II

criar Centros de Apoio Operacional de Defesa da Saúde, ou órgãos equivalentes, para proporcionar o devido suporte técnico aos órgãos de execução;

III

regulamentar a atuação prioritariamente na tutela coletiva, observadas as peculiaridades de cada instituição.

Art. 4º

Fica criada a estratégia da "Semana Nacional de Mobilização do Ministério Público na defesa do acesso e da qualidade da Atenção Básica e na defesa do meio ambiente do trabalho nas atividades da saúde", como Ação Nacional, coordenada pela Comissão de Planejamento Estratégico (CPE) e pela Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais (CDDF) do Conselho Nacional do Ministério Público, a ser executada anualmente.

Art. 5º

Para facilitação na construção desses projetos e ações, com vistas à sua execução planejada, coordenada e integrada, o Fórum Nacional de Saúde, instituído pela Portaria CNMP-PRESI nº 200, de 28 de outubro de 2014, integrado à Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais (CDDF), elaborará e aprovará instrumentos que poderão ser utilizados em fiscalização/inspeção, e disponibilizará, no sítio do Conselho Nacional do Ministério Público, instruções para a utilização desses instrumentos.

Art. 6º

Esta recomendação produz efeitos a partir da sua publicação.


RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público