Fundamento Constitucional
Conceito
O Direito do Consumidor encontra seu alicerce na própria Constituição Federal de 1988, que conferiu à proteção do consumidor status de princípio fundamental do Estado Democrático de Direito. A consagração do tema em dois dispositivos centrais — o art. 5º, inciso XXXII, e o art. 170, inciso V — revela o duplo papel atribuído à defesa do consumidor: como garantia fundamental e como princípio orientador da ordem econômica.
No art. 5º, XXXII, a Constituição dispõe que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”, vinculando diretamente os Poderes Públicos ao dever de desenvolver políticas e normativos destinados à proteção da parte mais vulnerável na relação de consumo. Esse mandamento constitucional foi imediatamente concretizado com a edição do Código de Defesa do Consumidor (CDC) em 1990, instituindo um microssistema normativo voltado à efetividade dos direitos dos consumidores.
O art. 170, por sua vez, ao organizar os princípios da ordem econômica, coloca a defesa do consumidor lado a lado com valores como a livre iniciativa, a função social da propriedade e a redução das desigualdades regionais. Isso demonstra que a atividade econômica não é neutra nem ilimitada, estando condicionada à observância de parâmetros que garantam o respeito à dignidade dos consumidores como destinatários finais do processo produtivo.
Tal estrutura constitucional rompe com o modelo meramente liberal de Direito Privado, em que o contrato era expressão de vontades soberanas e formalmente iguais. A nova ordem constitucional reconhece que, na sociedade de consumo de massa, os consumidores não possuem o mesmo poder de barganha, informação ou reação que os fornecedores. Assim, ao constitucionalizar a proteção do consumidor, o texto de 1988 legitima a existência de normas protetivas assimétricas, capazes de corrigir distorções e concretizar a igualdade material nas relações econômicas.
Essa base constitucional confere ainda maior estabilidade normativa e autoridade jurídica ao Direito do Consumidor, pois o coloca no patamar dos direitos fundamentais, ao lado da saúde, da educação, do meio ambiente e da segurança. Dessa forma, a proteção do consumidor não pode ser relativizada por interesses meramente comerciais ou argumentações formais de autonomia da vontade, pois se insere no núcleo essencial dos direitos da cidadania e da dignidade da pessoa humana.
O caráter constitucional do Direito do Consumidor também fortalece os órgãos de defesa, como o Ministério Público, os Procons, as Defensorias Públicas e as associações civis, assegurando-lhes respaldo para atuar de forma ativa na prevenção, fiscalização e repressão de condutas abusivas. Além disso, justifica a existência de mecanismos processuais coletivos e de políticas públicas orientadas à educação e conscientização do consumidor.
Em suma, o fundamento constitucional do Direito do Consumidor não apenas legitima o CDC e a atuação dos seus órgãos auxiliares, como também transforma a própria lógica das relações de consumo, impondo limites éticos e jurídicos à atuação dos fornecedores e promovendo uma economia mais justa, equilibrada e comprometida com os direitos humanos.
Referências principais
- ARAUJO, Luiz Alberto David, e JUNIOR, Vidal Serrano Nunes. Curso de direito constitucional. 23ª edição. São Paulo: Saraiva, 2021.
- BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo. 9ª edição. São Paulo: Saraiva, 2020.
- MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. 9ª edição. São Paulo: Forense, 2024.
- NUNES, Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 15ª edição. São Paulo: Saraiva Educação, 2024.