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Recomendação CNMP nº 44 de 27 de Setembro de 2016

Dispõe sobre a atuação do Ministério Público no controle do dever de gasto mínimo em educação.

O CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO , no exercício da competência fixada no artigo 130-A, §2°, I, da Constituição Federal, e com fundamento no artigo 147, inciso IV, do Regimento Interno do Conselho Nacional do Ministério Público – RICNMP, nos autos da Proposição n.° 1.00413/2016-22, julgada na 18ª Sessão Ordinária, realizada em 27 de setembro de 2016; Considerando que a educação é condição de concretização dos fundamentos e dos objetivos da República Federativa do Brasil, inseridos nos artigos 1º e 3º da Constituição Federal, sobretudo a dignidade da pessoa humana; Considerando que a dignidade da pessoa humana pressupõe o desenvolvimento mínimo das potencialidades individuais propiciados pela oferta de educação de qualidade e que, de acordo com o Relatório Nacional PISA1 2012 – Resultados Brasileiros, mais de 60% (sessenta por cento) dos alunos brasileiros, acima de 15 (quinze) anos de idade, não estavam plenamente habilitados, naquele ano, ao exercício da cidadania, por insuficiência de letramento e baixo nível de proficiência em matemática; Considerando que, de acordo com o artigo 9, item 1 da “Declaração Mundial sobre Educação para Todos: Satisfação das Necessidades Básicas de Aprendizagem”2, “o tempo, a energia e os recursos dirigidos à educação básica constituem, certamente, o investimento mais importante que se pode fazer no povo e no futuro de um país”; o que corrobora o fundamento da promoção da dignidade da pessoa humana e, consequentemente, o objetivo do desenvolvimento nacional, nos termos do art. 1º, III, e art. 3º, II, da Constituição de 1988; Considerando que a Constituição Federal, em seus artigos 6º e 205, determina que a educação é direito de todos e dever do Estado, devendo ser assegurada por meio de “ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas” na forma do seu art. 23, V, e do caput do art. 214, em regime de colaboração e responsabilidade solidária, tal como se depreende da leitura conjugada dos seus artigos 30, VI, e 211; Considerando que o dever estatal de manutenção e desenvolvimento do ensino – MDE visa, com a colaboração da sociedade, ao pleno desenvolvimento da pessoa, ao seu preparo para o exercício da cidadania e à sua qualificação para o trabalho, mediante o cumprimento dos princípios substantivos inscritos no art. 206 e das garantias operacionais de que trata o art. 208, ambos da Constituição Federal; Considerando que a universalização de oferta, até este ano de 2016, da educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade é determinada pelo inciso I do art. 208, da Constituição, combinado com o art. 6º, da Emenda Constitucional n.º 59/2009; Considerando que o acesso à educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assim definida no art. 208, I, da Constituição Federal, constitui, nos termos do §1º do mesmo dispositivo constitucional, direito público subjetivo; Considerando que o não oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente (art. 208, §2º, da Constituição Federal de 1988 e art. 54, §2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente); Considerando o dever de aplicação dos patamares mínimos de gasto em manutenção e desenvolvimento do ensino previstos no art. 212, da Constituição de 1988, bem como o dever de aplicação dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB, de que trata o art. 60, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT; Considerando que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996) regulamentou, em seus artigos 68 a 77, o dever constitucional de aplicação mínima de recursos governamentais em manutenção e desenvolvimento do ensino; Considerando que a Lei n.º 11.494, de 20 de junho de 2007, regulamentou o FUNDEB, a que se refere o art. 60, do ADCT, delimitando seu regime jurídico notadamente quanto à composição financeira, à distribuição, à transferência e à gestão dos seus recursos, bem como quanto ao seu acompanhamento, controle social, comprovação e fiscalização; Considerando que o dever de gasto mínimo em educação não se resume a aplicar formalmente os percentuais da receita de impostos e transferências previstos no caput do art. 212, da Constituição Federal, devendo, na forma do §3º do citado dispositivo constitucional, assegurar o atendimento das necessidades do ensino obrigatório, no que se refere à universalização, à garantia de padrão de qualidade e à equidade, nos termos do Plano Nacional de Educação – PNE previsto pelo art. 214, também da Carta de 1988; Considerando que a Constituição de 1988 identifica expressamente o conteúdo material das atividades de manutenção e desenvolvimento do ensino, para fins do art. 212, a partir das obrigações de fazer contidas nos princípios do art. 206, nas garantias do art. 208, nos dispositivos da Lei Federal n.º 13.005, de 25 de junho de 2014, e no rol de metas e estratégias do Plano Nacional de Educação, a que se refere o art. 214; Considerando que a Lei Federal n.º 13.005/2014, estabeleceu o Plano Nacional de Educação, para o período de 2014 a 2024, a fim de regulamentar as obrigações normativas de fazer extraídas dos comandos constitucionais dos artigos 206, 208, 212 e 214, detalhando-as e operacionalizando-as temporalmente, na forma de um conjunto de quatorze artigos, 20 (vinte) metas e 254 (duzentas e cinquenta e quatro) estratégias, a serem observadas pelos gestores de todas as esferas, sob pena de oferta irregular do ensino a que se refere o art. 208, §2º, da Constituição; Considerando que a equalização de oportunidades educacionais e o padrão mínimo de qualidade do ensino são as finalidades fixadas constitucionalmente para balizar o dever de colaboração entre os entes da Federação, à luz do art. 211, §1º, donde decorre a responsabilidade solidária entre eles, caso restem – material e faticamente – frustradas a ação supletiva e redistributiva da União e dos Estados de que trata o art. 75, da LDB e a cooperação técnica e financeira prevista no art. 30, VI, da Constituição de 1988; Considerando que o art. 4º, inciso IX, da LDB (Lei n.º 9.394/1996) inclui entre os deveres do Estado com educação pública garantir “padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem”; Considerando que os recursos financeiros vinculados ao custeio do direito fundamental à educação devem, segundo o art. 69, §§ 5º e 6º, da LDB, ser depositados em conta específica gerida pelo órgão responsável pela educação, na forma de repasses mensais inadiáveis e não suscetíveis de contingenciamento, que correspondam ao duodécimo das atividades públicas de manutenção e desenvolvimento do ensino, tal como tenham sido planejadas na lei orçamentária de cada ente; Considerando que, de acordo com o art. 10, da Lei n.º 13.005/2014, o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e os orçamentos anuais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios serão formulados de maneira a assegurar a consignação de dotações orçamentárias compatíveis com as diretrizes, metas e estratégias definidas no PNE e com os respectivos planos de educação, a fim de viabilizar sua plena execução; Considerando que a Lei n.º 13.249, de 13 de janeiro de 2016, que institui o Plano Plurianual (PPA) da União para o período de 2016 a 2019, dispõe, em seu art. 3º, inciso I, que as metas inscritas no Plano Nacional de Educação são prioridades orçamentárias da administração pública federal durante o seu período de vigência; Considerando que a Lei n.° 11.738, de 16 de julho de 2008, regulamentou o art. 206, VIII, da Constituição Federal, bem como a alínea “e” do inciso III do caput do art. 60, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sobre o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica; de modo a fixar como dever da União a integralização do valor do piso nacional nos casos em que o ente federativo, a partir da consideração dos recursos constitucionalmente vinculados à educação, não tenha disponibilidade orçamentária para cumprir o valor fixado; Considerando que a Lei n.° 11.738/2008, na fixação do regime de piso salarial a que se refere o art. 206, VIII, da Constituição Federal, delimitou que a jornada de trabalho do magistério da educação básica deve ser cumprida, no máximo, com 2/3 (dois terços) da carga horária nas atividades de interação com os educandos, reservando-se o restante para atividades de planejamento e preparação pedagógica; Considerando que os artigos 195, 198 e 212, da Constituição Federal operam como deveres estatais e também como garantias de financiamento mínimo, para que os orçamentos públicos não sejam omissos ou regressivos quanto à satisfação material dos direitos fundamentais, respectivamente, ao conjunto integrado de ações da seguridade social, à saúde e à educação; Considerando que, sob o pálio da Constituição de 1988, as receitas vinculadas à seguridade social (art. 195) e os pisos de gasto em saúde e educação (artigos 198 e 212) são instrumentos de proteção orçamentário-financeira de direitos que não podem ser minorados ou negados; Considerando que, a teor do art. 167, IV, em sua parte final, da Constituição, as vinculações orçamentárias asseguradoras de piso de custeio para os direitos fundamentais à saúde e à educação foram expressamente excetuadas do princípio geral de não afetação da receita de impostos, por força da sua condição de conteúdo mínimo de validade das leis orçamentárias anuais de cada ente da federação; Considerando que, nos termos dos artigos 34, VII, “e”, e 35, III, as mencionadas vinculações constituem princípios sensíveis inscritos na Constituição Federal, cuja violação pode ensejar, respectivamente, intervenção federal nos estados e no Distrito Federal e intervenção estadual em seus municípios; durante a qual é vedada, nos termos do art. 60, §1º, da CR/88, a apreciação de proposta de emenda constitucional; Considerando que o comando de imutabilidade que confere máxima proteção aos direitos fundamentais (art. 60, §4º, IV, da Constituição) também se estende às suas garantias estatuídas constitucionalmente, sendo esta a natureza jurídica das vinculações orçamentárias de receita e gasto mínimo protetivas da seguridade social, da saúde e da educação; Considerando que o quadro de recessão técnica, pelo qual a economia brasileira vem passando desde o segundo trimestre de 2014, impõe severas restrições orçamentário- financeiras em todos os níveis da federação e que eventuais medidas de ajuste fiscal sobre as políticas públicas de saúde e educação não podem desconhecer ou mitigar, ainda que parcialmente, as vinculações orçamentárias fixadas constitucionalmente nos artigos 198 e 212; Considerando que o art. 9º, §2º, da Lei Complementar n.º 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal), assegura que as despesas que constituam obrigações constitucionais e legais do ente não serão objeto de limitação de empenhos e de programação financeira, donde se revela desconforme com o ordenamento qualquer contingenciamento das despesas vinculadas ao piso constitucional em manutenção e desenvolvimento do ensino; Considerando que o descumprimento do art. 212, da Constituição Federal, do art. 60, do ADCT, da Lei n.º 9.394/1996, da Lei n.º 11.494/2007 e da Lei n.º 13.005/2014 pode ensejar a responsabilização pela prática de ato de improbidade administrativa, a rejeição das contas anuais de governo e a intervenção de que tratam o art. 34, VII, “e”, o art. 35, III, e o art. 36, III, da Constituição Federal, além de dar causa à suspensão das transferências voluntárias, na forma da alínea “b”, inciso IV, §1º, artigo 25, da LRF; Considerando que o Supremo Tribunal Federal admite o controle judicial para conter arbitrariedades no custeio dos direitos fundamentais, tal como assentado na ADPF 45/DF, oportunidade em que o Ministro Celso de Mello afirmou que “não se mostrará lícito, contudo, ao Poder Público, em tal hipótese, criar obstáculo artificial que revele – a partir de indevida manipulação de sua atividade financeira e/ou político-administrativa – o ilegítimo, arbitrário e censurável propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar o estabelecimento e a preservação, em favor da pessoa e dos cidadãos, de condições materiais mínimas de existência.”; Considerando que o Ministério Público tem os deveres institucionais de defender a ordem jurídica e de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos à máxima eficácia do direito fundamental à educação, bem como pela garantia do seu financiamento estatal em patamares de gasto mínimo; Considerando o papel do Conselho Nacional do Ministério Público na promoção da integração entre os ramos do Ministério Público, respeitada a independência funcional de seus membros e a autonomia da Instituição, RECOMENDA:

Publicado por Conselho Nacional do Ministério Público

Brasília-DF, 27 de setembro de 2016.


Art. 1º

Os Procuradores-Gerais e os Diretores dos Centros de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional devem empreender esforços para a inclusão do tema "Financiamento Constitucional do Direito à Educação de Qualidade" no ingresso vestibular da carreira, nos cursos de formação e atualização dos membros do Ministério Público, bem como a priorização da temática no planejamento estratégico das unidades.

Art. 2º

Os ramos do Ministério Público da União e dos Estados devem empreender esforços administrativos e institucionais para dar apoio e fomentar a atuação dos membros do Ministério Público na defesa do custeio constitucionalmente adequado do direito à educação.

Art. 3º

Os membros do Ministério Público com atribuições para atuação na Educação, na Infância e Juventude e no Patrimônio Público devem realizar ações coordenadas para evitar e reprimir quaisquer desvios e retrocessos quantitativos ou qualitativos no piso de custeio do direito à educação, acompanhando sua execução orçamentário-financeira e a respectiva prestação de contas, por meio da avaliação dos instrumentos de gestão e de planejamento setorial na educação (Plano Plurianual - PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO, Lei Orçamentária Anual - LOA, Planos Nacional, Estadual e Municipal de Educação), dentre outros.

Art. 4º

Para os fins previstos no artigo anterior, os membros do Ministério Público poderão realizar ações coordenadas de preservação da garantia fundamental de custeio mínimo do direito à educação, no sentido de:

I

representar pela inconstitucionalidade de leis orçamentárias que prevejam gasto mínimo em educação inferior ao ditame do art. 212, da Constituição Federal; II – fiscalizar quaisquer formas de contabilização como manutenção e desenvolvimento do ensino de despesas manifestamente contrárias às diretrizes da LDB, notadamente em seus artigos 70 e 71; irregularidades na aplicação dos recursos do FUNDEB, especialmente quando se verificar afronta aos artigos 21 a 23, da Lei n.º 11.494/2007, bem como irregularidades na aplicação da contribuição social do salário-educação;

III

questionar, com fulcro nos princípios da vedação de retrocesso e vedação de proteção insuficiente, bem como no art. 5º, §1º, da Constituição Federal, a conformidade da previsão e da execução de quaisquer montantes de valores no orçamento dos entes que impliquem descumprimento do art. 212, da Carta de 1988 e do art. 60, do ADCT, a pretexto de ajustamento de gestão ou instrumento congênere com o respectivo Tribunal de Contas e/ou Poder Legislativo;

IV

demandar medida compensatória do déficit diagnosticado no parecer prévio do respectivo Tribunal de Contas e/ou no julgamento das contas pelo Legislativo, sob pena de suspensão de transferências voluntárias, na forma do art. 25, §1º, IV, alínea "b", da LRF; intervenção na forma do art. 35, III, da CR/1988 e responsabilização no âmbito do art. 1º, I, alínea "g", da LC n.º 64/1990 e do art. 208, §2º, da Constituição de 1988, caso se verifique que a execução orçamentária deixou de cumprir o patamar de gasto mínimo em manutenção e desenvolvimento do ensino em suas cinco vertentes, a saber:

a

18% (dezoito por cento) da receita resultante de impostos para a União e 25% (vinte e cinco por cento), ou percentual maior estipulado nas respectivas constituições estaduais e leis orgânicas municipais, da receita de impostos, incluídas a proveniente de transferências para Estados, Distrito Federal e Municípios;

b

aplicação integral dos recursos recebidos do FUNDEB na forma do art. 21 da Lei n.º 11.494/2007;

c

60% (sessenta por cento) dos recursos recebidos do FUNDEB na valorização do magistério, nos termos do art. 22, da Lei n.º 11.494/2007;

d

aplicação integral dos recursos arrecadados e distribuídos à conta da contribuição social do salário-educação, nos termos dos parágrafos 5º e 6º do art. 212, da Constituição Federal;

e

destinação exclusiva para educação de 75% (setenta e cinco por cento) dos recursos previstos nos incisos I a II do art. 2°, da Lei n.° 12.858, de 9 de setembro de 2013, que dispõe sobre a destinação para as áreas de educação e saúde de parcela da participação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no resultado ou da compensação financeira pela exploração de petróleo e gás natural, com a finalidade de cumprimento da meta prevista no inciso VI do caput do art. 214 e no art. 196 da Constituição Federal; assim como o cumprimento das vinculações específicas de receita da União estipuladas nos incisos III e IV do art. 2º da mesma Lei, aí incluídos 50% (cinquenta por cento) dos recursos recebidos pelo Fundo Social do Pré-Sal regulado na Lei n.° 12.351, de 22 de dezembro de 2010;

V

recomendar aos Chefes do Executivo o depósito permanente – no respectivo fundo de educação, onde houver, ou em conta específica gerida pelo órgão da educação – dos repasses mensais inadiáveis e não suscetíveis de contingenciamento, que correspondam ao duodécimo das atividades de manutenção e desenvolvimento do ensino, tal como planejadas na lei orçamentária de cada ente à luz do art. 10, do PNE, no que se incluem as transferências de recursos no âmbito do FUNDEB, por força do art. 69, §§5º e 6º, da Lei n.º 9.394/96;

V

sugerir dos Chefes do Executivo que a gestão do fundo/conta específica da educação seja de responsabilidade exclusiva do titular do Ministério ou Secretaria de Educação, para impedir a multiplicidade de ordenadores de despesas da educação e a centralização e o controle operacional dos recursos vinculados à educação pelo Ministério ou pela Secretaria da Fazenda, bem como evitar o remanejamento das transferências de recursos do FUNDEB para a conta única do tesouro do ente, conforme o art. 69, §§5º e 6º, da LDB;

VII

refutar a contabilização, pelo regime de caixa, das disponibilidades financeiras do fundo/conta específica de educação e do FUNDEB que estiverem vinculadas às despesas empenhadas no piso constitucional em manutenção e desenvolvimento do ensino como um falseado saldo positivo parcial do resultado primário do ente; VIII – recomendar a compensação, como aplicação adicional no exercício imediatamente subsequente, de quaisquer déficits de aplicação em manutenção e desenvolvimento do ensino, sob pena de responsabilização pessoal; IX – refutar a classificação como "despesa obrigatória sujeita à programação financeira" e, por conseguinte, a inclusão das despesas vinculadas ao piso constitucional da educação ou amparadas pelos recursos do FUNDEB em limites de pagamento inferiores aos respectivos limites de empenho, na medida em que tal programação deficitária de pagamento atenta contra o fluxo tempestivo e regular de repasses de que trata o art. 69, §§5º e 6º, da LDB e o art. 9º, § 2º, da Lei de Responsabilidade Fiscal; X – demandar motivação circunstanciada dos gestores que derem causa ao agravamento dos indicadores de gestão, de avaliação institucional e de resultados em educação no âmbito de sua atuação governamental, para que se possa avaliar, diante das hipóteses de caso concreto, a necessidade de eventual responsabilização pela má ou ineficiente gestão dos recursos de manutenção e desenvolvimento do ensino e do FUNDEB; XI – verificar se, a despeito do cumprimento contábil-formal do art. 212, da Constituição e do art. 60, do ADCT, houve o descumprimento de obrigações normativas de fazer, fixadas pelo legislador com prazo determinado de execução, hipótese em que cabe análise de eventual discussão de improbidade administrativa pela omissão na adequada aplicação dos recursos públicos educacionais diante do inadimplemento das metas e estratégias do PNE e do Plano de Educação do respectivo ente, cujo lapso temporal para seu atendimento já tenha se escoado;

XII

alertar aos gestores, por recomendação, que a omissão da União e dos Estados em assegurar assistência técnica e financeira, no exercício das suas funções redistributiva e supletiva para fins de equalização das oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade de que trata o art. 211, §1º, da Constituição Federal, enseja responsabilidade solidária pelos sistemas de ensino demandados, para além do dever formal de colaboração entre eles, sob pena de lesão ao direito à educação pública de qualidade e ao pacto federativo, bem como de afronta aos artigos 23, V; 30, VI e 212, §3º, todos da Constituição de 1988, aos artigos 74 a 76, da LDB e ao art. 7º, do PNE;

XIII

avaliar possível responsabilização dos entes federados que se omitirem quanto ao impositivo dever de efetiva assistência técnica e financeira, no exercício das suas funções redistributiva e supletiva para fins de equalização das oportunidades educacionais e garantia padrão mínimo de qualidade de que trata o art. 211, §1º, da Constituição Federal, hipótese em que se insere a ausência de regulamentação do art. 74, da LDB e do art. 206, VII, da Carta de 1988, nos termos em que determinam as Estratégias 20.6, 20.7, 20.8 e 20.10 do PNE;

XIV

recomendar ao gestor, no bojo das funções de controle interno de que trata o art. 74, I e II, da Constituição Federal, que avalie, quantitativa e qualitativamente, a evolução intertemporal do processo de cumprimento das metas e estratégias previstas no Plano Nacional da Educação, em seus aspectos de governança, tempestividade e operacionais, de modo a assegurar a legalidade, legitimidade, eficácia, eficiência, efetividade e economicidade da aplicação dos recursos destinados à manutenção e ao desenvolvimento do ensino e do FUNDEB, considerando-se – ao longo do processo – as avaliações e o monitoramento dos fóruns, conselhos de educação e demais instâncias de que trata o inciso XIX deste artigo;

XV

requisitar que o gestor comprove anualmente a compatibilidade entre o PNE e os planos estadual e/ou municipal de educação, de modo a atestar também se as metas nacionais foram desdobradas adequadamente nos âmbitos estadual e municipal e nas respectivas leis orçamentárias de cada ente, na forma dos artigos 8º e 10, do PNE, hipótese em que deverá ser atestada a existência de dotações orçamentárias que permitam executar as diretrizes, metas e estratégias do PNE, notadamente por meio do teste de consistência do diagnóstico de beneficiários com os respectivos custos mínimos de alocação para satisfação suficiente das obrigações de fazer fixadas pela Lei n.º 13.005/2014 e na Constituição de 1988, em conteúdo e prazo;

XVI

priorizar o controle concomitante sobre a aplicação de recursos educacionais dos entes que não atingirem as metas e estratégias educacionais nos termos e prazos definidos legalmente, que não cumprirem com a aplicação do percentual mínimo de recursos de que tratam o art. 212, da Constituição de 1988 (ou respectiva Constituição Estadual ou Lei Orgânica, quando for definido percentual maior) e/ou, ainda, que não efetivarem outras obrigações de fazer que decorram dos comandos constitucionais;

XVII

recomendar aos gestores o acompanhamento da implantação do Sistema Nacional de Educação, previsto no art. 13, da Lei n.º 13.005/2014, na perspectiva do federalismo educacional que distribui competências e, concomitantemente, aloca recursos suficientes para a consecução das metas e estratégias do Plano Nacional de Educação de forma equitativa em todo o território nacional;

XVIII

fomentar o aperfeiçoamento da metodologia de lançamento, validação, comparabilidade e fiscalização dos dados disponíveis no Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Educação - SIOPE, em busca do seu cruzamento sistêmico com os dados apurados pelos Tribunais de Contas para fins de resolução tempestiva de eventuais divergências na análise dos gastos mínimos em educação e da aplicação dos recursos do FUNDEB; XIX – exigir o regular e autônomo funcionamento dos conselhos e fóruns (municipais, estaduais e nacional) de acompanhamento e controle social da área de educação, para que lhes sejam garantidas condições materiais e finalísticas de cumprir tempestivamente seu papel institucional, avaliando, no mínimo, o perfil da sua composição, o número de reuniões realizadas no último período de 12 meses, a natureza do Conselho e do Fórum quanto à formulação dos planos e à gestão dos recursos da educação (se deliberativo, consultivo, normativo e/ou fiscalizador), sua capacitação periódica e a sua estrutura de apoio (importa saber, por exemplo, se o Conselho possui contador e recursos para formação e intercâmbio);

XX

envidar esforços para que seja cumprido o art. 9º, da Lei n.º 13.005/2014, que impõe ao Distrito Federal, Estados e Municípios o dever de aprovar leis disciplinando a gestão democrática da educação pública nos respectivos âmbitos de atuação, ou para que se adeque, quando for o caso, a legislação local já adotada com essa finalidade, no prazo de dois anos contados da edição do PNE;

XXI

fomentar que as recomendações e ressalvas do controle social apresentadas pelo respectivo Conselho do FUNDEB, Conselho de Alimentação Escolar e Conselho Escolar sejam incorporadas, no que couber, como metas e balizas para a educação estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias do ente;

XXII

propor que as conclusões dos conselhos sociais da educação operem como critérios de avaliação de programas do controle interno para fins de correção das falhas e aprimoramento do planejamento orçamentário e do planejamento educacional, na esteira do art. 74, incisos I e II, da CF/88 e do art. 10, do PNE;

XXIII

propor, na forma do art. 11 e da estratégia 20.7 do PNE, a disponibilização de indicadores de rendimento escolar e de avaliação institucional para a aferição da qualidade do ensino e do gasto educacional, por meio da sua regular produção e atualizada alimentação dos bancos de dados do Ministério da Educação pelos gestores;

XXIV

verificar as efetivas conformidades formal e material entre o Plano de Educação, a Lei Orçamentária Anual - LOA, a gestão dos recursos recebidos do FUNDEB, as recomendações e ressalvas apontadas pelos conselhos de acompanhamento e controle social da área de educação e pelo respectivo Tribunal de Contas, bem como a aderência ao SIOPE e a própria aplicação do patamar de gasto mínimo em MDE como condições de manutenção do fluxo de transferências voluntárias para o ente, na forma do art. 25, §1º, IV, alínea "b", da LC n.º 101/2000;

XXV

recomendar que, enquanto não forem regulamentados os indicadores de gasto educacional previstos na estratégia 20.7 do PNE, os gestores federal e estaduais da educação anualmente disponibilizem, em portal de domínio público na internet, parâmetros nacionais e regionais de preços referenciais de obras, equipamentos e materiais da área educacional, bem como sejam fornecidos plantas, projetos básicos e executivos padronizados para diferentes tipos e tamanhos de escola, com seus respectivos custos estimados e regionalizados;

XXVI

requisitar aos gestores comprovação de que os gastos educacionais abaixo arrolados atendem aos parâmetros de legalidade, legitimidade e economicidade, na forma das seguintes diretrizes:

a

infraestrutura da rede de ensino acessível, sendo recomendável a existência de equipe própria, inclusive através de mecanismos de cooperação horizontal, para elaboração de projetos básicos e executivos de obras, bem como para seu acompanhamento e fiscalização, ao invés da sua terceirização;

b

transporte escolar, com a fixação de custo médio regional por quilômetro rodado, itinerários e horários a serem avaliados progressivamente de forma georreferenciada e consonância com as normas de trânsito brasileiras;

c

alimentação escolar, com parâmetros de consumo real e não estimado, distinguindo meses com aula e meses de férias, bem como mediante aferição de adequada logística de estoque, custo, validade e qualidade nutricional, levando-se em consideração as necessidades dos educandos em tempo integral;

d

livros didáticos e material de apoio, com a exigência de expressa motivação técnica pela assunção de custo pela aquisição de materiais similares aos cobertos gratuitamente pelo Programa Nacional do Livro Didático, levando-se em conta os critérios de eficácia, eficiência, efetividade, economicidade e legitimidade, bem como a garantia de "participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola" e o dever de implementar "progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira" às escolas, na forma dos artigos 14, II, e 15, da LDB;

XXVII

recomendar que o controle interno de cada ente promova a análise de licitações e contratos de aquisição de bens, prestação de serviços e obras conforme a sua aderência finalística, temporal e substantiva ao cumprimento das metas e estratégias do Plano Nacional de Educação, devendo ser refutada a contabilização em manutenção e desenvolvimento do ensino e na aplicação do saldo do FUNDEB de despesas, ainda que pudessem ser formalmente admitidas nos artigos 70 e 71, da LDB, as quais não sejam comprovadamente capazes de atender ao aludido Plano, que tem força vinculante por força do art. 214, da CF/1988;

XXVIII

acompanhar os atos de admissão de pessoal na área educacional dos entes, sobretudo as admissões temporárias de pessoal, à luz da estratégia 18.1 do Plano Nacional de Educação, tendo em vista a necessidade de progressiva composição, até 2017, do quadro docente por, no mínimo, 90% (noventa por cento) de servidores efetivos e de que 50% (cinquenta por cento), no mínimo, dos respectivos profissionais da educação não docentes sejam ocupantes de cargos de provimento efetivo e estejam em exercício nas redes escolares a que se encontrem vinculados;

XXIX

recomendar aos Presidentes de Casas Legislativas que o diagnóstico, feito em sede de parecer prévio pelo respectivo Tribunal de Contas, sobre eventual déficit de aplicação em manutenção e desenvolvimento do ensino e/ou déficit de aplicação dos recursos do FUNDEB, no exercício financeiro apreciado, somente seja refutado no julgamento das contas anuais de governo dos Chefes de Poder Executivo, mediante expressa motivação quanto a fatos relativos ao comportamento da receita ou da despesa do ente;

XXX

recomendar aos Chefes do Executivo que, nos termos do art. 48, I, da Lei de Responsabilidade Fiscal, promovam o incentivo à participação popular e realizem, com ampla divulgação prévia, de audiências públicas, durante os processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos;

XXXI

envidar esforços administrativos e institucionais, nos termos do art. 29, §2º, da Lei n.º 11.494/2007, para que seja realizado, no que couber, litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados para a fiscalização da aplicação dos recursos dos Fundos que receberem complementação da União;

XXXII

recomendar aos Chefes de Executivo municipais que promovam, nos termos do PNE, a busca ativa:

a

de crianças em idade correspondente à educação infantil, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, preservando o direito de opção da família em relação às crianças de até 3 (três) anos;

b

de crianças e adolescentes fora da escola, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, adolescência e juventude;

c

de jovens fora da escola pertencentes a populações do campo, da região de menor escolaridade no País e dos 25% (vinte e cinco por cento) mais pobres, em parceria com as áreas de assistência social, saúde e proteção à juventude;

d

para a educação de jovens e adultos, em regime de colaboração entre entes federados e em parceria com organizações da sociedade civil;

XXXIII

recomendar aos Chefes de Executivo estaduais que promovam, nos termos do PNE, a busca ativa:

e

de crianças e adolescentes fora da escola, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância, adolescência e juventude;

f

da população de 15 (quinze) a 17 (dezessete) anos fora da escola, em articulação com os serviços de assistência social, saúde e proteção à adolescência e à juventude;

g

de jovens fora da escola pertencentes a populações do campo, da região de menor escolaridade no País e dos 25% (vinte e cinco por cento) mais pobres, em parceria com as áreas de assistência social, saúde e proteção à juventude;

h

para a educação de jovens e adultos, em regime de colaboração entre entes federados e em parceria com organizações da sociedade civil;

XXXIV

recomendar aos gestores, nos termos da estratégia 7.35 do PNE, a regulação da oferta de educação básica pela iniciativa privada, de forma a garantir a qualidade e o cumprimento da função social da educação.

Art. 5º

Esta Recomendação entra em vigor na data de sua publicação.


RODRIGO JANOT MONTEIRO DE BARROS Presidente do Conselho Nacional do Ministério Público