Jurisprudência TSE 433 de 09 de maio de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Benedito Gonçalves
Data de Julgamento
27/04/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, rejeitou as questões preliminares e, no mérito, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros Raul Araújo, Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Alexandre de Moraes (Presidente).Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques (substituto), Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
AGRAVO INTERNO. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2014. DEPUTADO ESTADUAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ART. 41–A DA LEI 9.504/97.1. No decisum monocrático, proveu–se o recurso ordinário do Ministério Público, em Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), para condenar os agravantes (suplente de Deputado Estadual pelo Piauí eleito em 2014 e seus coordenadores de campanha) pela prática de captação ilícita de sufrágio, aplicando–lhes multa de 20 mil Ufirs (art. 41–A da Lei 9.504/97).PRELIMINARES. PERDA DE OBJETO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. NULIDADE. REJEIÇÃO.2. Inexiste perda de objeto na apuração do ilícito. Tal como já decidiu esta Corte, "a viabilidade da representação por captação ilícita de sufrágio não está adstrita à possibilidade de promover a cassação do registro ou do diploma, uma vez que é possível o prosseguimento da ação para fins de eventual aplicação de multa, sanção cuja incidência não depende de haver registro deferido, diploma ou mandato" (REspEl 0000385–19/MA, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 31/3/2022).3. Não há falar em supressão de instância. Na espécie, a ação teve seu curso regular, houve fase instrutória e, ao fim, o TRE/PI julgou improcedentes os pedidos, prestando a jurisdição. A posterior circunstância de esta Corte Superior, em recurso ordinário, firmar a condenação a partir de prova não considerada no acórdão a quo – mas que consta do caderno processual e fora objeto de contraditório – não implica qualquer nulidade.4. Consoante a jurisprudência do c. Superior Tribunal de Justiça, a quebra do sigilo das comunicações telefônicas não demanda fundamentação extensa e exauriente, mesmo porque impossível exigir que se descrevam as minúcias dos fatos (ainda por apurar) ou que o magistrado esgote a análise de todas as situações hipotéticas que, em tese, poderiam apontar para a possibilidade da produção da prova por outro meio.5. No caso, a decisão judicial de deferimento da quebra fundou–se, dentre outros aspectos, nos "elementos de prova até então amealhados, notadamente o auto circunstanciado emanado da polícia civil do Piauí", a evidenciar a validade e adequação da medida.TEMA DE FUNDO. CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO. AMPLO ESQUEMA DE COMPRA DE VOTOS.6. Nos termos do art. 41–A da Lei 9.504/97, "constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter–lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive".7. Conforme jurisprudência desta Corte Superior, para se configurar a captação ilícita de sufrágio, é necessária a presença dos seguintes elementos: (a) prática de qualquer das condutas previstas no art. 41–A; (b) o dolo específico de obter o voto do eleitor; (c) ocorrência dos fatos entre a data do registro de candidatura e a eleição; (d) a participação, direta ou indireta, do candidato beneficiado, concordância ou conhecimento dos fatos que caracterizam o ilícito.8. Na espécie, o conjunto probatório – formado pelas conversas obtidas nas interceptações telefônicas e por elementos colhidos em buscas e apreensões – revela–se convergente e coeso, não deixando dúvidas a respeito da prática ilícita.9. A partir da transcrição das interceptações telefônicas fica claro o grandioso esquema de compra de votos perpetrado em benefício da candidatura do primeiro agravante ao cargo de deputado estadual em 2014, no qual operadores locais recebiam valores repassados por coordenadores de campanha para, em seguida, cooptarem eleitores.10. Destaquem–se os seguintes trechos dos diálogos travados entre os coordenadores de campanha e os operados locais: "é quinhentos contos as duas que estão querendo, duzentos e cinquenta pra cada"; "Valdeir diz que hoje fez mais uns dois ou três compromissos lá ainda. Márcio pergunta na faixa de quanto. Valdeir diz que é coisinha pequena, quatro, cinco votos aqui, um cimento, cem reais, duzentos reais que acaba indo"; "quem tem dez votos quer dois milheiros de alvenaria"; "votos em Gilbués e Corrente são os mais caros".11. As interceptações revelam, ainda, de forma inequívoca, que o esquema contava com plena ciência, anuência e financiamento do candidato. Em conversa com um dos coordenadores de campanha, o próprio candidato se reportou a tratativas que haviam sido realizadas diretamente por ele.12. As interceptações telefônicas são corroboradas por elementos materiais encontrados no momento das buscas e apreensões. No dia do pleito, o coordenador financeiro da campanha foi preso em flagrante portando R$ 11.080,00 em espécie, material de propaganda política, relação de eleitores, documentos de cunho eleitoral, bem como um mapa do Piauí com relação de cidades e anotações de números manuscritos. Além disso, em sua residência, foram encontrados "relação de eleitores, cópias de títulos eleitorais, anotações de contabilidade, além de equipamentos eletrônicos e cerca de R$ 30.000,00 em espécie".13. Ainda na data das eleições, foram apreendidos no escritório de outro coordenador de campanha a importância de R$ 10.000,00 em cédulas de R$ 100,00, santinhos, "dois pedaços de papel (folhas de caderno) contendo nomes supostamente de eleitores, zona e seção de votação", "um caderno de anotações contendo nomes, endereços e CPF de pessoas diversas".14. O conjunto probatório demonstra de modo ostensivo a atuação de uma rede capilarizada de operadores, em diversos municípios, aos quais cabia arregimentar eleitores visando deles obter voto em troca de dinheiro ou outras benesses. Confirmou–se, ainda, que os recursos foram injetados na prática ilícita com ciência e anuência do candidato, que incumbiu os coordenadores da campanha de fazer os repasses e as operações de campo.15. A reprovabilidade da conduta marcada pelo elevado números de eleitores cooptados, o liame direto do candidato nas transações, o planejamento e a estruturação capilarizada das atividades justifica manter a multa de 20 mil Ufirs.CONCLUSÃO16. Agravo interno a que se nega provimento.