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Jurisprudência TSE 37354 de 30 de maio de 2023

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Sergio Silveira Banhos

Data de Julgamento

16/05/2023

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial interposto por Carlos Bouças Gabriel e por Talita Bernardo dos Santos, e deu parcial provimento ao recurso especial de Alessandro Alves Calazans, apenas para afastar a caracterização do abuso de poder político decorrente das ações sociais da administração pública executadas no ano da eleição por entidade nominalmente vinculada a candidato, mantendo as demais sanções impostas no acórdão recorrido, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros Carlos Horbach, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo e Alexandre de Moraes (Presidente).Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques (substituto), Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Ementa

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. IMPRENSA ESCRITA. JORNAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E POLÍTICO. ART. 22 DA LEI COMPLR 64/90. GRAVIDADE. INAUGURAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS. DESVIO DE FINALIDADE. CONDUTAS VEDADAS AOS AGENTES PÚBLICOS EM CAMPANHA. ART. 73, VI, B, E § 11, DA LEI 9.504/97. CANDIDATO NÃO ELEITO. PREFEITO À ÉPOCA DOS FATOS. RESPONSÁVEIS. INELEGIBILIDADE. MULTA. APLICAÇÃO.SÍNTESE DO CASO1. O Tribunal Regional Eleitoral confirmou a sentença proferida em ação de investigação judicial eleitoral e manteve a condenação dos recorrentes à sanção de inelegibilidade, em razão do uso indevido de meios de comunicação social e de abuso do poder econômico e político, e, por outro lado, aplicou somente ao candidato recorrente a sanção de multa em razão da prática de condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas, decorrentes dos seguintes fatos: (i) publicação do Jornal Gazeta de Nilópolis, com atuação voltada para favorecer o então prefeito e candidato à reeleição; (ii) veiculação de publicidade institucional e de propaganda eleitoral em locais públicos e em inaugurações de obras públicas; (iii) realização de ações sociais por meio de centro social com o nome do então candidato a prefeito.ANÁLISE DO RECURSO ESPECIALQUESTÕES PRÉVIAS2. As alegações de ofensa aos arts. 275 do Código Eleitoral, 489, 927, V, e 1.022 do Código de Processo Civil devem ser rejeitadas, pois o Tribunal de origem se manifestou, de forma clara e coerente, sobre todas as questões suscitadas nos embargos de declaração, ainda que em sentido diverso da pretensão das partes, o que não configura vício do acórdão embargado, cumprindo assinalar que:a) conforme pontuado pela Corte de origem, o presente caso comporta distinção em relação à jurisprudência deste Tribunal Superior referente à densidade do direito à liberdade de expressão de que gozam os veículos impressos de comunicação, tendo em vista as peculiaridades do caso, dentre elas a existência de vínculo entre o candidato demandado e o jornal Gazeta de Nilópolis, bem como a utilização de servidores públicos municipais, na maior parte ocupantes de cargos em comissão, para elaboração do referido periódico, de modo que não há omissão do acórdão regional quanto ao ponto ou inobservância de precedentes no sentido de que os veículos impressos de comunicação podem assumir posição em relação à eleição e a candidatos, sem que isso configure uso indevido dos meios de comunicação social;b) não há omissão ou obscuridade no acórdão regional quanto ao argumento de que, além da publicação de editoriais elogiosos aos atos do então prefeito, o jornal Gazeta de Nilópolis teria também divulgado matérias jornalísticas de interesse local, pois, de acordo com o Tribunal de origem, as matérias jornalísticas analisadas eram todas voltadas para o fim de enaltecer as ações da prefeitura, associando–as à atuação pessoal do prefeito, e essa linha editorial foi observada nas demais edições do jornal Gazeta de Nilópolis juntadas aos autos;c) a Corte de origem analisou e transcreveu, no acórdão recorrido, excertos de matérias jornalísticas publicadas no jornal Gazeta de Nilópolis, nos quais consta alusão direta e elogiosa ao candidato demandado, o que demonstra a improcedência das alegações recursais de que o Tribunal a quo não teria analisado se as matérias jornalísticas citadas no aresto regional fazem referência direta ao candidato e não teria indicado os trechos considerados como extrapolação da atividade da imprensa escrita;d) a conclusão do Tribunal de origem a respeito da configuração do uso indevido dos meios de comunicação social se fundou, além do teor das notícias jornalísticas em si, em outros elementos reveladores da gravidade da conduta abusiva, a exemplo do desvio de função de servidores públicos exercentes de cargo em comissão para atuação no periódico, o que é suficiente para afastar a suscitada omissão do julgado a respeito da quantidade de edições, à tiragem, ao número de exemplares distribuídos e às respectivas datas de veiculação do jornal Gazeta de Nilópolis. Ademais, a Corte de origem também registrou que, embora tenha feito referência detalhada ao teor de apenas três edições do referido jornal, as demais edições do periódico acostadas aos autos seguiram a mesma linha editorial de enaltecimento do candidato a prefeito e, por outro lado, o referido jornal circulou no município por todo o ano da Eleição de 2016, era publicado semanalmente e distribuído gratuitamente;e) não assiste razão ao candidato recorrente no que se refere à alegação de que o Tribunal de origem não teria indicado se haveria prova nos autos de que os serviços prestados pelo centro social que ostentava o seu nome eram realizados em troca de votos, se algum eleitor identificado teria feito afirmação nesse sentido, bem como se haveria ligação entre os serviços prestados e as eleições ou se teria sido constatada a presença ou a ingerência dele na referida instituição. A esse respeito, o Tribunal de origem registrou que o centro social em questão continuou a prestar serviços à população durante o período eleitoral e consignou que, para fins de configuração de conduta vedada e de abuso do poder político, não se exige prova de que tais serviços seriam prestados em troca de voto, e, por outro lado, realçou a ligação do candidato recorrente com o referido centro social e o liame dos serviços com o pleito, assinalando que o instituto ostentava na fachada o sobrenome do então prefeito, era presidido pelo pai do citado candidato e, em diligência realizada por equipe do órgão ministerial, fora constatado haver propaganda eleitoral do citado postulante em veículo adesivado, o qual estava no estacionamento do instituto, assim como que a mãe do então prefeito trabalhava na recepção do estabelecimento e portava propaganda eleitoral do referido postulante por ocasião da diligência mencionada;f) não há omissão do acórdão regional acerca das alegações de que não teria havido aferição individualizada da gravidade das condutas e de que a aplicação das sanções não corresponderia à reprovabilidade de cada ato, pois a Corte de origem se manifestou acerca do caráter grave dos atos tidos como ilícitos, ainda que em relação ao conjunto de irregularidades apontadas, e, por outro lado, assentou haver proporcionalidade na sanção de multa por conduta vedada aplicada ao candidato recorrente.MÉRITOUso indevido dos meios de comunicação social. Publicação, em veículo da imprensa escrita, de matérias jornalísticas favoráveis a candidato.3. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é no sentido de que "o uso indevido dos meios de comunicação social caracteriza–se por se expor desproporcionalmente um candidato em detrimento dos demais, ocasionando desequilíbrio na disputa eleitoral" (AgR–REspe 442–28, rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJE de 3.5.2021). Na mesma linha de entendimento, já se decidiu que o "uso indevido dos meios de comunicação social na mídia escrita caracteriza–se apenas pela exposição massiva, repetitiva e duradoura ao longo do tempo" (AgR–REspEl 442–28, rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJE de 3.5.2021).4. Ainda quanto ao tema, a orientação desta Corte é no sentido de que os veículos impressos de comunicação podem se posicionar favoravelmente a determinada candidatura, inclusive divulgando atos de campanha, sem que isso caracterize, por si só, a utilização indevida dos meios de comunicação social, devendo ser punidos os eventuais excessos verificados, a fim de resguardar os bens jurídicos caros ao processo eleitoral, tais como a higidez do pleito em face da influência do poder econômico e a igualdade entre os candidatos (AgR–REspEl 442–28, rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJE de 3.5.2021; AIJE 0601823–24, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 26.9.2019; REspe 478–21, rel. Min. Admar Gonzaga, DJE de 3.10.2018; RO 797–22, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJE de 1º.12.2017; AgR–RO 758–25, red. para o acórdão Min. Luiz Fux, DJE de 13.9.2017 e RO 7569–30, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJE de 5.11.2015).5. Nesse sentido, já se decidiu que "os excessos que a legislação eleitoral busca punir, em relação à imprensa escrita, dizem respeito a elementos que desvirtuem o direito de liberdade de expressão, tais como, entre outros: o uso de recursos públicos ou privados, a fim de financiar campanhas elogiosas ou que tenham como objetivo denegrir a imagem de candidatos; a divulgação de notícias sabidamente inverídicas; a veiculação de mensagens difamatórias, caluniosas ou injuriosas ou o comprovado vínculo entre o meio de comunicação e o candidato" (REspe 584–65, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 23.10.2015, grifo nosso).6. Na espécie, é forçoso reconhecer, tal como entendeu o Tribunal de origem, que a hipótese dos autos guarda particularidade apta a configurar o excesso que a legislação eleitoral busca punir em relação à imprensa escrita.7. Como se infere dos fatos delineados no acórdão regional, houve patente desvirtuamento da liberdade de expressão da imprensa escrita, mediante aparelhamento do jornal Gazeta de Nilópolis com a finalidade de aumentar a exposição do candidato Alessandro Alves Calazans por meio de matérias jornalísticas manifestamente favoráveis a ele, as quais foram publicadas com periodicidade semanal por todo o ano da eleição e com distribuição gratuita, o que configura a exposição massiva, repetitiva e duradoura ao longo do tempo exigida pela jurisprudência deste Tribunal Superior para a caracterização do uso indevido dos meios de comunicação social, notadamente porque tais matérias foram produzidas com a utilização de servidores públicos municipais, ocupantes de cargos em comissão, os quais não tinham vínculo empregatício com a editora responsável pela publicação do periódico, o que evidencia o uso de recursos públicos municipais a serviço dos interesses eleitorais do então prefeito e candidato à reeleição.8. Diante do contexto verificado, ainda que não constem do acórdão regional dados mais detalhados acerca da distribuição e da amplitude do periódico, e mesmo considerando que a imprensa escrita tem menor alcance perante o eleitorado em comparação com o rádio e a televisão, as circunstâncias particulares apontadas no aresto recorrido são, no presente caso, suficientes para a comprovação da gravidade da conduta, considerando–se que os fatos censurados são aptos para gerar desequilíbrio na disputa eleitoral e acarretar prejuízo à lisura do pleito, nos termos do art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90, com a redação dada pela LC 135/2010.9. A moldura fática registrada no acórdão regional permite depreender as contribuições de cada um dos recorrentes para a conduta abusiva, nos termos do art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90, porquanto ficou demonstrado que: Carlos Bouças Gabriel era o administrador do jornal utilizado para a publicação de matérias jornalísticas manifestamente favoráveis ao prefeito e candidato à reeleição Alessandro Alves Calazans; Talita Bernardo dos Santos era a jornalista responsável pelo referido periódico e exercia também a função de assessora de imprensa da prefeitura; e, por sua vez, o candidato Alessandro Alves Calazans tinha vínculo com o jornal citado, mormente porque, entre outros fatores, a produção do periódico era feita exclusivamente por servidores comissionados da prefeitura e a empresa responsável pelo jornal tinha como suposta sede um imóvel de propriedade dos pais do referido candidato, no qual havia faixa contendo o seu nome e funcionava o antigo escritório do político.10. Deve ser rejeitado o argumento recursal de que a atividade do jornal Gazeta de Nilópolis não teria influenciado as eleições, por não ter sido eleito o candidato favorecido, pois, conforme já decidiu este Tribunal Superior, "a aferição do abuso do poder econômico, político ou do uso indevido dos meios de comunicação social independe do resultado do pleito, devendo ser aferida de acordo com a gravidade da situação revelada pela prova dos autos" (RO 1380–69, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 7.3.2017), a qual está devidamente demonstrada no presente caso.Abuso do poder político e conduta vedada a agentes públicos. Divulgação de publicidade institucional no período vedado e de propaganda eleitoral em locais públicos e em inaugurações de obras públicas.11. O Tribunal Regional Eleitoral, soberano no exame dos fatos e das provas, registrou que os eventos de inauguração das obras públicas atinentes ao Hospital Municipal Juscelino Kubitschek e à Vila Olímpica, ambas no Município de Nilópolis/RJ, foram utilizados para divulgação de propaganda eleitoral do candidato à reeleição ao cargo de prefeito Alessandro Alves Calazans e para veiculação de publicidade institucional da prefeitura durante o período vedado pelo art. 73, VI, b, da Lei 9.504/97, configurando conduta vedada aos agentes públicos em campanha e abuso do poder político, consideradas as seguintes premissas fáticas registradas no acórdão recorrido:a) no local em que foi realizado o evento de celebração da inauguração do Hospital Municipal Juscelino Kubitschek, ao qual o candidato não compareceu, mas os seus pais e esposa se fizeram presentes, havia adesivo de publicidade institucional com os dizeres "A mudança só começou! Novo Hospital", a qual guarda semelhança com o slogan utilizado na campanha eleitoral do recorrente Alessandro Alves Calazans, qual seja, "O trabalho só começou" e, na ocasião, foram distribuídas revistas contendo fotografia do então prefeito na capa e extensa entrevista;b) constatou–se, em 20.9.2016, a presença de publicidade institucional no interior do Hospital Municipal Juscelino Kubitschek, em locais de grande circulação do público;c) em 17.9.2016, data próxima às eleições, a prefeitura realizou show festivo em comemoração ao aniversário da cidade de Nilópolis/RJ, custeado pelo erário, o qual ocorreu no festival de Food Truck, tendo esse evento sido divulgado na página oficial da secretaria municipal no Facebook e noticiado no jornal Gazeta de Nilópolis;d) na inauguração da Vila Olímpica, realizada pela prefeitura em 25.8.2016, à qual não compareceu o candidato recorrente, estiveram presentes os seus pais e a sua esposa, além do político identificado como Neca – o qual é pai do candidato a vice–prefeito e notório apoiador do prefeito –, ocasião em que os políticos e as autoridades presentes fizeram discursos de enaltecimento das ações da prefeitura, vinculando–as ao chefe do Poder Executivo municipal e ao seu grupo político, inclusive com críticas à oposição e pedido de votos em favor do candidato da situação;e) na entrada do evento de inauguração da Vila Olímpica, foram distribuídos panfletos com natureza de propaganda institucional, divulgando a referida vila e a Casa da Luta, bem como panfletos contendo propaganda eleitoral, com fotos do então prefeito, do político conhecido como Neca e do ex–secretário de esportes, então candidato a vereador, chamado de "Careca do Neca".12. Não se configura a apontada ofensa ao art. 77 da Lei 9.504/97, pois a conduta vedada prevista nesse dispositivo legal não foi fundamento do acórdão regional, o qual consigna expressamente que o candidato Alessandro Alves Calazans não compareceu aos eventos de inauguração de obras públicas nos quais houve a veiculação de propaganda eleitoral a seu favor e de publicidade institucional em período vedado.13. Não merecem acolhimento as alegações de que não seria ilegal o uso de fotografias de hospital público na propaganda eleitoral e de que seria permitido a candidato mostrar as suas realizações, sem que isso caracterize abuso de poder, na medida em que tais questões não são fundamentos do acórdão recorrido.14. Embora o candidato recorrente alegue que a publicidade institucional veiculada no período vedado teria observado o princípio da impessoalidade, divulgando informações sobre as realizações da prefeitura, sem menção ao nome ou fotografia do prefeito, e aduza que não haveria ilegalidade na manutenção de publicidade institucional que não faça menção a autoridade ou a candidato, cumpre observar que tais argumentos não afastam a configuração da conduta vedada a agentes públicos na espécie, pois, conforme se colhe do aresto regional, a veiculação da publicidade institucional ocorreu dentro do período vedado pelo art. 73, VI, b, da Lei das Eleições.15. Incide a orientação deste Tribunal de que "a lei eleitoral proíbe a veiculação, no período de três meses que antecedem o pleito, de toda e qualquer publicidade institucional, excetuando–se apenas a propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado e os casos de grave e urgente necessidade pública reconhecida pela Justiça Eleitoral" (AgR–REspe 500–33, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJE de 23.9.2014), e de que "é vedado veicular publicidade institucional nos 3 meses que antecedem o pleito, independentemente de o conteúdo ter caráter informativo, educativo ou de orientação social", bem como que "a divulgação do nome e da imagem do beneficiário na propaganda institucional não é requisito indispensável para a configuração da conduta vedada pelo art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997" (AgR–AI 292–93, rel. Min. Og Fernandes, DJE de 8.6.2020).16. É insubsistente o argumento de que seria lícita a permanência de publicidade institucional que não mencione autoridade ou candidato, pois, conforme já decidiu este Tribunal Superior, "salvo as hipóteses autorizadas em lei, a permanência de propaganda institucional durante o período vedado é suficiente para que se aplique a multa do art. 73, § 4º, da Lei nº 9.504/97, sendo irrelevante que a peça publicitária tenha sido autorizada e afixada em momento anterior" (AgR–REspe 618–72, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 27.10.2014).17. Para alterar a conclusão do Tribunal de origem de que não apenas ocorreu veiculação de propaganda institucional em período vedado, mas também houve patente ato de propaganda partidária, com nítido caráter de promoção pessoal, sob a roupagem de propaganda institucional, seria necessário o revolvimento do conjunto fático–probatório dos autos, o que não se admite em recurso especial eleitoral, nos termos do verbete sumular 24 do TSE.18. As alegações de que o recorrente Alessandro Alves Calazans não teria mandado distribuir revistas durante as inaugurações de obras públicas e de que seria indispensável a sua notificação prévia para fins de aplicação de sanção esbarram nos óbices dos verbetes sumulares 24 e 72 do TSE, uma vez que tais questões não foram especificamente debatidas e decididas pelo Tribunal de origem e o acórdão recorrido não contém elementos que corroborem tais afirmações. De qualquer sorte, a responsabilidade do recorrente pela divulgação de publicidade institucional no período vedado não poderia ser afastada na espécie, pois a orientação deste Tribunal Superior é no sentido de que "o chefe do Poder Executivo é responsável pela divulgação da publicidade institucional, independentemente da delegação administrativa, por ser sua atribuição zelar pelo seu conteúdo (AgR–RO 2510–24, rel. Min. Maria Thereza, DJe de 2.9.2016)" (RO 1723–65, rel. Min. Admar Gonzaga, DJE 27.2.2018).19. Na linha da jurisprudência deste Tribunal Superior, "o abuso do poder político, de que trata o art. 22, caput, da LC 64/90, configura–se quando o agente público, valendo–se de sua condição funcional e em manifesto desvio de finalidade, compromete a igualdade da disputa e a legitimidade do pleito em benefício de sua candidatura ou de terceiros. Precedentes" (RO 1723–65, rel. Min. Admar Gonzaga, DJE de 27.2.2018). No mesmo sentido: AgR–REspe 833–02, rel. Min. João Otávio de Noronha, DJE de 2.9.2014.20. Na espécie, a Corte de origem concluiu que foi uma estratégia do grupo político do então prefeito e candidato à reeleição o seu não comparecimento às inaugurações de obras públicas em que houve desvio de finalidade, a fim de que ele não incidisse na conduta vedada prevista no art. 77 da Lei das Eleições, e, por outro lado, assinalou–se no acórdão regional que os pais e a esposa do referido candidato estiveram presentes nos eventos e foram apontados na ocasião como representantes do chefe do Poder Executivo municipal.21. Tal como se depreende do acórdão recorrido e conforme concluiu o Tribunal de origem, ficou caracterizado o abuso do poder político na espécie, em razão de as inaugurações das obras públicas do Hospital Municipal Juscelino Kubitschek e da Vila Olímpica terem sido desvirtuadas para angariar benefício eleitoral a favor do candidato Alessandro Alves Calazans, por meio de promoção pessoal e da divulgação de publicidade institucional da prefeitura no período vedado, assim como pela realização de propaganda eleitoral do referido postulante, inclusive com a veiculação de críticas a adversários e pedido de votos em discursos proferidos por integrantes do mesmo grupo político, assim como pela realização e custeio de show pelo erário municipal em evento patrocinado pela prefeitura, denominado Festival de Food Truck, ocorrido em data muito próxima às eleições e que foi divulgado com destaque no Jornal Gazeta de Nilópolis.22. As circunstâncias em que ocorreram os fatos registrados no acórdão regional evidenciam a gravidade das condutas em tela, na medida em que a estrutura administrativa destinada à inauguração de obras públicas foi utilizada para promoção pessoal e eleitoral do então prefeito e candidato à reeleição Alessandro Alves Calazans, com aptidão suficiente para interferir na normalidade e na legitimidade das eleições.23. A conclusão do Tribunal de origem – de que ficou evidenciada a responsabilidade subjetiva do candidato recorrente pela utilização do cargo público de prefeito e das inaugurações de obras da administração municipal com o fim de favorecer a própria candidatura à reeleição e ao seu grupo político – não pode ser alterada sem indevido reexame do acervo fático–probatório dos autos, o que não se admite em recurso especial eleitoral, nos termos do verbete sumular 24 do TSE.24. Consideradas as premissas registradas no acórdão regional quanto ao ponto, deve ser mantida a condenação do recorrente Alessandro Alves Calazans à sanção de inelegibilidade por abuso do poder político e ao pagamento de multa por conduta vedada a agentes públicos, nos termos do art. 73, VI, b, e § 4º, da Lei 9.504/97.Abuso do poder político e conduta vedada a agentes públicos. Ações sociais da administração pública executadas no ano da eleição por entidade nominalmente vinculada a candidato.25. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que "a vedação de que trata o § 11 do art. 73 da Lei nº 9.504/97 tem caráter absoluto e proíbe, no ano da eleição, a execução por entidade vinculada nominalmente a candidato ou por ele mantida de qualquer programa social da Administração, incluindo os autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior" (REspe 393–06, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE de 13.6.2016).26. Na espécie, o Tribunal a quo, mediante premissas fáticas insuscetíveis de alteração na instância especial, assentou que o centro social ostentava o nome do então candidato Alessandro Alves Calazans, ora recorrente, e era presidido pelo seu pai Alcebíades dos Santos Calazans, assim como foi comprovada a prestação à população, no ano do pleito, de serviços de caráter social da administração municipal, de forma que a conclusão da Corte de origem de que a conduta apontada se enquadra na vedação prevista no § 11 do art. 73 da Lei 9.504/97 não pode ser modificada sem indevido reexame do conjunto fático–probatório dos autos, razão pela qual é correta a aplicação ao candidato da multa prevista no § 4º do artigo citado.27. Deve ser rejeitada a alegação recursal de que não haveria benefício eleitoral ao então candidato à reeleição ao cargo de prefeito, sob o argumento de que o centro social que ostentava o seu nome estaria localizado em São João de Meriti/RJ, pois o Tribunal de origem, soberano no exame de fatos e provas, registrou que a referida entidade é sediada em rua limítrofe entre municípios.28. As alegações de que o candidato a prefeito não teria ingerência no centro social, tampouco teria estado no local, não afastam os fatos que, de acordo com o acórdão regional, foram provados nos autos, notadamente que a referida entidade era nominalmente vinculada a ele e prestava à população serviços sociais da administração no ano do pleito de 2016.29. A despeito de estar suficientemente demonstrada no acórdão regional a prática da conduta vedada prevista no § 11 do art. 73 da Lei 9.504/97, o aresto recorrido não contém elementos suficientes para a configuração do abuso do poder político, com gravidade suficiente para interferir na legitimidade das eleições e para atrair a aplicação da grave sanção de inelegibilidade quanto ao ponto, na medida em que, embora tenha ficado comprovado que o centro social em questão era vinculado nominalmente ao candidato a prefeito Alessandro Alves Calazans e prestava, no ano da eleição, diversos serviços de interesse da população, observa–se que a propaganda eleitoral encontrada na referida instituição durante as diligências realizadas pelo órgão ministerial limita–se a um adesivo portado pela mãe do candidato, a qual trabalhava na recepção da entidade na ocasião, a um veículo adesivado, que se encontrava no estacionamento do instituto, e a uma placa estampando o nome do referido postulante, cabendo observar, por outro lado, que o acórdão regional registra apenas uma ocorrência de matrícula, de uma única pessoa, em dois cursos oferecidos pelo centro social em tela, a qual, aliás, era agente do grupo de fiscalização do órgão ministerial.Gravidade das condutas e proporcionalidade. Sanções. Inelegibilidade e multa.30. As circunstâncias registradas no aresto recorrido são suficientes para a demonstração da gravidade das condutas na espécie, com aptidão suficiente para macular a normalidade e a legitimidade do pleito, e para ensejar a aplicação aos recorrentes da sanção de inelegibilidade decorrente do uso indevido dos meios de comunicação social e de abuso do poder político, assim como a multa imposta apenas a Alessandro Alves Calazans pela prática de condutas vedadas aos agentes públicos em campanha.31. Com relação ao uso do jornal Gazeta de Nilópolis, os elementos descritos no acórdão regional evidenciam que houve exposição massiva, repetitiva e duradora, ao longo do tempo, de matérias jornalísticas manifestamente favoráveis ao então prefeito e candidato à reeleição Alessandro Alves Calazans e que desvirtuaram a liberdade de expressão inerente à imprensa escrita, em virtude do vínculo existente entre o referido candidato e o citado veículo de comunicação e, notadamente, em razão do emprego de dez servidores públicos municipais, ocupantes de cargos em comissão, na produção do periódico.32. No que se refere ao desvio de finalidade das inaugurações de obras públicas e ao custeio de show pelo erário municipal em evento patrocinado pela prefeitura em data próxima às eleições, o acórdão regional registra circunstâncias que evidenciam a gravidade das condutas, uma vez que a estrutura administrativa municipal foi utilizada para promoção pessoal e eleitoral do então prefeito e candidato à reeleição Alessandro Alves Calazans.33. Na espécie, a conclusão do Tribunal de origem acerca da configuração das condutas abusivas e da gravidade das circunstâncias que caracterizam os ilícitos foi tomada a partir da análise do conjunto de irregularidades, o que está de acordo com a orientação desta Corte Superior de que, ainda que algum dos fatos tidos como ilícitos alegadamente não tenha gravidade suficiente para autorizar a aplicação de sanção, é possível, no conjunto, o reconhecimento da gravidade. Nesse sentido, mutatis mutandis: "A apuração do abuso do poder econômico, nos feitos em que os fatos apontados são múltiplos, deve ser aferida a partir do conjunto de irregularidades apontadas. Assim, ainda que algumas delas não possua, em si, gravidade suficiente para autorizar a cassação do registro ou do diploma dos representados, é possível que, no conjunto, a gravidade seja reconhecida. Precedentes" (AgR–AI 302–51, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 17.4.2017).34. Para alterar a conclusão do Tribunal de origem que, com base nos fatos e nas provas dos autos, entendeu que ficou devidamente comprovada a responsabilidade subjetiva de cada um dos participantes das condutas abusivas, seria necessário o reexame do conjunto fático–probatório dos autos, o que não se admite em recurso especial eleitoral, nos termos do verbete sumular 24 do TSE.35. Afigura–se razoável a multa aplicada ao recorrente Alessandro Alves Calazans na quantia de 30 mil Ufirs, com base no § 4º do art. 73 da Lei 9.504/97, mormente porque decorre da prática de duas condutas vedadas diversas, consistentes em veiculação de publicidade institucional no período vedado e em execução, no ano do pleito, de serviço de natureza social da administração por entidade nominalmente vinculada ao candidato, previstas no art. 73, VI, b, e § 11, da Lei das Eleições, as quais não podem ser consideradas inexpressivas em termos eleitorais, pois tendem a afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos.36. Em que pese o afastamento do abuso de poder político decorrente das ações sociais da administração pública executadas no ano da eleição por entidade nominalmente vinculada a candidato, o juízo acerca da configuração das condutas abusivas e da gravidade das circunstâncias que as caracterizam são o quanto basta para manter o acórdão regional, tanto no ponto em que impôs aos recorrentes a sanção de inelegibilidade, em virtude do uso indevido dos meios de comunicação social e de abuso do poder político, quanto na parte em que aplicou multa ao recorrente Alessandro Alves Calazans pela prática de condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral.37. A divergência jurisprudencial apontada pelo candidato a prefeito não foi demonstrada, pois o recorrente se limitou a transcrever ementas de acórdãos, sem realizar o cotejo analítico dos julgados e sem demonstrar a existência de semelhança fática entre os arestos, de modo que não foram atendidos os requisitos do verbete sumular 28 deste Tribunal Superior, o que impede o conhecimento do recurso especial eleitoral com base no permissivo dos arts. 121, § 4º, II, da Constituição da República, e 276, I, b, do Código Eleitoral.CONCLUSÃORecurso especial de Carlos Bouças Gabriel e Talita Bernardo dos Santos a que se nega provimento.Recurso especial de Alessandro Alves Calazans a que se dá parcial provimento, apenas para afastar a caracterização do abuso de poder político decorrente das ações sociais da administração pública executadas no ano da eleição por entidade nominalmente vinculada a candidato, mantidas, entretanto, as demais sanções impostas no acórdão recorrido.


Jurisprudência TSE 37354 de 30 de maio de 2023