JurisHand AI Logo
|

Jurisprudência TSE 224193 de 10 de junho de 2021

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Mauro Campbell Marques

Data de Julgamento

06/05/2021

Decisão

O Tribunal, por maioria, vencidos os Ministros Luis Felipe Salomão e Sérgio Banhos, deu parcial provimento aos recursos ordinários, tão somente para afastar a caracterização do uso indevido dos meios de comunicação, mantendo, contudo, as penalidades, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso (Presidente). Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.

Ementa

ELEIÇÕES 2014. RECURSOS ORDINÁRIOS. AIJE. ATOS DE CAMPANHA POLÍTICA PRATICADOS NO INTERIOR DE TEMPLOS RELIGIOSOS EM PROL DE CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL. ABUSO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL ENTRELAÇADO COM ABUSO DO PODER ECONÔMICO. RECONHECIMENTO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. CASSAÇÃO DO MANDATO E DECLARAÇÃO DE INELEGIBILIDADE. ART. 22 DA LC Nº 64/1990. PRELIMINARES DE NULIDADE E DE NECESSIDADE DE EXTINÇÃO DO PROCESSO POR AUSÊNCIA DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. REJEIÇÃO. MÉRITO: ACERVO PROBATÓRIO CONDIZENTE COM A PRÁTICA DE ABUSO DO PODER ECONÔMICO. EXISTÊNCIA DE GRAVIDADE. PROVIMENTO PARCIAL DOS RECURSOS ORDINÁRIOS, TÃO SOMENTE PARA AFASTAR A IMPUTAÇÃO QUANTO AO USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO, MANTENDO–SE, CONTUDO, INCÓLUME A CONDENAÇÃO NO QUE SE REFERE AO ABUSO DO PODER ECONÔMICO.1. Ao recorrente João Luiz Rocha, então candidato ao cargo de deputado estadual pelo Estado de Alagoas nas eleições de 2014, foram imputadas as práticas de abuso do poder econômico e de uso indevido dos meios de comunicação social (art. 22, caput, da LC nº 64/1990), consistentes no fato de ele ter se valido de sua qualidade de pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular para realizar propaganda eleitoral no interior de templos religiosos dessa denominação evangélica, utilizando–se dos espaços de culto e reuniões como autênticos comitês de campanha política, além de ter persuadido fiéis da igreja para atuar como cabos eleitorais.2. Esta Corte Superior já assentou não estar "[...] acobertada pelas garantias constitucionais de privacidade e intimidade (art. 5º, X, da CF/88) reunião de grande publicidade, onde ¿no local da gravação encontravam–se centenas de pessoas' [...]" (AgR–REspe nº 256–17/MA, rel. Min. Rosa Weber, julgado em 20.3.2018, DJe de 26.4.2018). Hipótese dos autos em que, a despeito de um dos eventos ter sido supostamente fechado, acessível apenas a pastores da Igreja do Evangelho Quadrangular devidamente identificados, contou ele com a presença de 200 a 300 integrantes da igreja, denotando, com isso, a ausência da intenção de manter o conteúdo das gravações em esfera restrita. Licitude das provas.3. "[...] Não há se falar em negativa de prestação jurisdicional quando as questões levantadas pelo embargante foram devidamente enfrentadas pelo Tribunal de origem, embora de forma contrária ao interesse da parte recorrente" (AgR–REspe nº 1256–96/PA, rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 5.11.2013, DJe de 4.12.2013).4. O material obtido anonimamente foi avaliado pelo órgão ministerial e, posteriormente, corroborado por outros elementos de prova testemunhais e documentais (vídeos e fotografias) que, em seu conjunto, não foram objeto de impugnação pela parte investigada. Inexiste, assim, nulidade processual no tocante ao ponto. Precedentes desta Corte e do STJ.5. O indeferimento do pedido de produção de prova pericial não acarreta cerceamento de defesa quando a providência é considerada, pelo julgador, manifestamente despicienda para a solução da demanda e a parte nela interessada não demonstra a sua real e efetiva necessidade. Precedentes.6. A jurisprudência desta Corte Eleitoral, até o pleito de 2014, era assente no sentido da inexistência de litisconsórcio passivo necessário entre o beneficiário e o praticante da conduta abusiva, em âmbito de AIJE, especialmente quanto à apuração da infração classificada como abuso de poder. Necessidade de observância da segurança jurídica.7. Embora não exista, no ordenamento jurídico, a figura autônoma do "abuso do poder religioso", tal constatação não impede o combate, com base no art. 22, XIV, da LC nº 64/1990, a eventuais excessos advindos da atuação abusiva de organizações religiosas, prática que não implica a subtração da liberdade de participação política e de manifestação do pensamento de líderes religiosos. 8. Hipótese em que, apesar de não ser possível enquadrar – tal como o fez o Tribunal de origem – as indigitadas reuniões em templos religiosos como veículos de comunicação para fins do art. 22 da LC nº 64/1990, o arcabouço probatório delineado nos autos, composto, inclusive, por áudios e fotografias, mostrou–se suficiente para comprovar a conduta abusiva levada a efeito pelo recorrente por meio do uso dos recursos e das estruturas físicas dos templos da Igreja do Evangelho Quadrangular no Estado de Alagoas, para fins de realização de shows de música gospel e de eventos voltados à conquista de votos e à promoção irregular de sua campanha eleitoral ao cargo de deputado estadual no pleito de 2014.9. As condutas apuradas na AIJE apresentaram gravidade suficiente para macular a lisura e a legitimidade das eleições estaduais de 2014 para o cargo de deputado estadual no Estado de Alagoas, quer em razão da pequena diferença proporcional de votos entre o recorrente e o primeiro suplente eleito pela mesma coligação (1.829 votos), em um colégio que contava, à época, segundo o sistema de estatísticas desta Justiça especializada, com 1.995.727 eleitores aptos a votar em todo o estado, quer pelo fato de os indigitados eventos religiosos terem tido, efetivamente, o condão de influenciar parcela significativa do eleitorado, mormente se considerada a presença de pastores da Igreja do Evangelho Quadrangular em, aproximadamente, 40% dos municípios alagoanos.10. Conquanto o resultado da eleição não seja, isoladamente, revelador da gravidade do ato abusivo, tal aspecto assume relevância no presente caso, pois os fatos apurados, considerada, inclusive, a referida diferença de votos, tiveram o condão, como ficou demonstrado, de gerar desequilíbrio na disputa eleitoral e prejuízo à lisura do pleito.11. Parcial provimento aos recursos ordinários, tão somente para afastar a conclusão a que chegou o Tribunal de origem quanto à caracterização do uso indevido dos meios de comunicação, mantendo, contudo, incólumes as penalidades de cassação de diploma e de inelegibilidade aplicadas com base na prática de abuso do poder econômico.


Jurisprudência TSE 224193 de 10 de junho de 2021