Jurisprudência TSE 19095 de 12 de marco de 2021
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto
Data de Julgamento
11/02/2021
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, julgou aprovadas, com ressalvas, as contas do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) Nacional, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Sérgio Banhos, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques e Luís Roberto Barroso (Presidente). Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA. EXERCÍCIO DE 2015. DESPESAS PARTIDÁRIAS. COMPROVAÇÃO. ART. 18 DA RES.–TSE Nº 23.432/2014. AMPLOS MEIOS DE PROVA. DOCUMENTOS FISCAIS. CONTRATOS. EXEMPLARES DO MATERIAL. INCENTIVO À PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA POLÍTICA. PERCENTUAL MÍNIMO. DESCUMPRIMENTO. CONJUNTO DE IRREGULARIDADES. 4,25% DO TOTAL DE RECURSOS RECEBIDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. NÃO COMPROMETIMENTO DAS CONTAS. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. RECURSOS PRÓPRIOS.1. A análise das contas de partido pela Justiça Eleitoral envolve o exame da aplicação regular dos recursos do Fundo Partidário, a averiguação do recebimento de recursos de fontes ilícitas e de doações de origem não identificada e a vinculação dos gastos à efetiva atividade partidária.2. A Justiça Eleitoral, por meio do seu órgão técnico, analisa as contas partidárias, partindo dos dados apresentados e realizando as circularizações que se mostram necessárias. Tudo isso sem prejuízo de eventuais ilícitos civis e penais que porventura venham a ser identificados e apurados pelos demais órgãos de controle.3. Por se tratar de prestação de contas do exercício de 2015, é aplicável às irregularidades a Res.–TSE nº 23.432/2014, à luz do art. 65, § 3º, II, das Res.–TSE nº 23.464/2015 e nº 23.546/2017.Irregularidades com recursos do Fundo Partidário sujeitas a ressarcimento ao ErárioPagamento de IPTU e IPVA4. O pagamento de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) por parte dos partidos políticos com recursos do Fundo Partidário é gasto indevido, porquanto as agremiações gozam de imunidade tributária quanto ao seu patrimônio, conferida pelo art. 150, VI, c, da Constituição Federal (PC nº 262–19, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 24.8.2020). Irregularidade mantida.5. É regular o pagamento de Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) de imóvel locado pela grei, porquanto não incide na espécie a isenção prescrita na alínea c do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal, na medida em que se trata de regra de natureza personalíssima e de efeitos exclusivos ao patrimônio dos entes descritos no dispositivo constitucional (PC nº 305–87, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe 12.8.2019). Irregularidade afastada.Serviços contábeis. Sócio majoritário da empresa prestadora de serviço vinculado ao diretório regional6. A contratação entre partes relacionadas é matéria instigante e sempre mereceu maior debate por parte desta Corte Superior quanto aos limites na contratação com pessoa jurídica com a qual o dirigente partidário mantenha vínculo societário, tendo em vista que os recursos do Fundo Partidário são, por natureza, públicos e, portanto, sujeitos aos princípios elencados no art. 37 da Constituição Federal (PC nº 228–15/DF, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 6.6.2018).7. Este Tribunal não presume, de forma absoluta, a irregularidade nas contratações, custeadas com recursos públicos, de empresa cujo corpo societário mantenha vínculo com dirigente do partido ante a ausência de previsão legal ou regramento balizado por instrumento normativo. Nessas hipóteses, as reflexões têm obedecido a critérios, segundo as particularidades de cada caso.8. Diante das peculiaridades assinaladas e do cenário vertido nos presentes autos, em que atendidos os requisitos do art. 18 da Res.–TSE nº 23.432/2015 quanto à comprovação dos gastos partidários, não havendo elementos que revelem que a despesa é superfaturada e não tendo a situação descrita afetado a transparência da transação entre as partes nem se mostrado eivada de má–fé, é de ser afastada a irregularidade, não sendo devido, na hipótese, o ressarcimento dos valores despendidos e regularmente comprovados.9. Adota–se na espécie o entendimento de que, ante o fato de a Lei nº 9.096/95 e a Res.–TSE nº 23.432/2015 não contemplarem óbice à contratação de prestadores de serviços integrantes da grei, não há como ser presumida, a priori, a irregularidade de tais gastos. Registrada a ressalva de que, à luz do instituto do overruling, no caso de se entenderem como irregulares essas contratações, de forma absoluta, seus efeitos devem incidir a partir das contas dos exercícios futuros em função de ainda não terem sido jurisdicionalizadas. Irregularidade afastada.Serviços de consultoria e assessoria. Ausência de contrato, relatórios, pareceres e pesquisas. Demonstração de vínculo com a atividade partidária10. A presente prestação de contas é regida pela Res.–TSE nº 23.432/2014, cujo art. 18 estabelece os requisitos para a comprovação de gastos partidários.11. Além do documento fiscal, a Justiça Eleitoral poderá admitir a comprovação de gastos por qualquer meio idôneo de prova, inclusive contrato, comprovante de entrega do material ou da prestação efetiva dos serviços e comprovante bancário de pagamento, além de, alternativamente, na hipótese de a legislação dispensar a emissão de documento fiscal, lançar mão de qualquer outro documento que contenha os requisitos identificadores dos contraentes, consoante §§ 1º e 2º do dispositivo acima citado.12. A apresentação de documento fiscal é a regra, e os demais meios de provas são alternativos, razão por que a documentação complementar pode servir como meio de prova e confirmação da regularidade da despesa.13. A ausência de registro de funcionários é situação que não pode ser atribuída à grei nem servir para penalizá–la com a devolução dos valores contratados ao Erário. Eventual ilícito relativo às empresas contratadas não seriam fatos apuráveis em sede de prestação de contas. Nesse sentido: PC nº 227–30, Rel. Min. Admar Gonzaga, DJe de 5.4.2018, e PC nº 229–97, de minha relatoria, DJe de 19.4.2018.14. Não existindo indícios de que o partido é responsável por qualquer irregularidade pertinente às empresas ou de que tais contratos são fraudulentos, e se os serviços estão devidamente contabilizados mediante emissão de nota fiscal por empresas registradas com CNPJ e regularmente preenchida, deve–se atestar a sua regularidade. Irregularidades afastadas parcialmente.Fretamento de aeronaves. Ausência de relação de passageiros e itinerários e da demonstração de vínculo com a atividade partidária15. O fretamento de aeronave encontra assento no postulado constitucional conferido às greis da liberdade de ação segundo suas necessidades, nos limites impostos na Lei nº 9.096/95.16. Sobre o tema, esta Corte já reconheceu essa discricionariedade, ainda que se entenda como gasto discutível, à luz do princípio da economicidade (PC nº 265–76, Rel. Min. Rosa Weber, red. para o acórdão Min. Admar Gonzaga, DJe de 30.5.2017, e PC nº 254–47, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 16.10.2018).17. In casu, a controvérsia não está atrelada necessariamente à onerosidade ou à necessidade da contratação, mas à total ausência de informações que permitissem aferir o alinhamento da contratação aos objetivos partidários, conforme exige a jurisprudência (PC nº 247–55, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 1º.3.2018, e ED–PC nº 270–93, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 1º.9.2020). Irregularidade mantida.Ausência de comprovação da efetiva prestação de serviços pagos pelo Instituto Teotônio Vilela18. No julgamento da PC nº 271–78, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 24.9.2020, redator para o acórdão o Ministro Luis Felipe Salomão, este Tribunal entendeu pela competência da Justiça Eleitoral para análise das contas dos institutos. Ressalva do entendimento deste relator. Em primazia ao princípio da colegialidade, examinaram–se os gastos com recursos públicos efetuados pelo Instituto Teotônio Vilela.19. Documento fiscal com descrição genérica não se presta a comprovar despesa com recursos do Fundo Partidário, à luz da legislação de regência e da orientação jurisprudencial desta Corte (ED–PC nº 258–79, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 15.10.2020, e PC nº 301–50, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 28.6.2019). Irregularidades afastadas parcialmente.20. Nos termos do § 7º do art. 18 da Res.–TSE nº 23.432/2014, a apresentação de documento fiscal com o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário, o nome dos passageiros e o itinerário não é suficiente para a comprovação das despesas com passagens aéreas, pois necessário que se demonstrem, ainda, a vinculação do beneficiário com a agremiação e a relação da viagem realizada com os propósitos partidários. Nessa esteira: PC nº 298–95, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 9.5.2019. Irregularidade mantida.21. Por se tratar de prestação de contas do exercício de 2015, também é aplicável aos apontamentos relativos aos institutos a Res.–TSE nº 23.432/2014. Desse modo, para o instituto, há que ser observado o § 8º do art. 29 da Res.–TSE nº 23.432/2014.22. O detalhamento da documentação que deveria ser apresentada pelo instituto, consoante disposto no § 7º do art. 29 da Res.–TSE nº 23.546/2017, não se mostra aplicável à espécie, motivo pelo qual as exigências da área técnica relativas às comprovações dos gastos devem ser relativizadas, acolhendo–se como regulares as despesas evidenciadas por meio dos instrumentos fiscais emitidos pelos fornecedores ou prestadores de serviços, nos termos do caput do art. 18 da Res.–TSE nº 23.432/2014. Irregularidades afastadas parcialmente.Irregularidades nas obrigações relativas ao Fundo Partidário não sujeitas a ressarcimento ao ErárioInsuficiência do repasse de recursos ao Instituto23. Constando do Demonstrativo de Receitas e Gastos a inscrição do valor faltante em obrigações a pagar pertinente à criação e à manutenção de fundação de pesquisa e de doutrina e educação política e considerando a data em que se deu a transferência ao partido da última cota do Fundo Partidário, recebida em véspera de festejos natalinos e bastante próxima ao encerramento do exercício, deve ser considerada regular a transferência ao instituto do montante remanescente no mês de janeiro do exercício subsequente, uma vez que não há vedação para que essa transferência ultrapasse o exercício da prestação de contas em análise, tendo a agremiação feito o correto registro contábil nas contas do exercício de 2015.24. No entanto, a obrigação de repasse ao instituto não pode ser confundida nem compensada com os valores que devem ser destinados no exercício subsequente. Irregularidade afastada.Insuficiência de recursos no incentivo à participação da mulher na política25. Na hipótese, o art. 55–A não tem o condão de isentar a grei das sanções pelo descumprimento do art. 44, V, da Lei nº 9.096/95, porquanto o partido nem sequer aventou ou comprovou que os recursos não utilizados no programa de incentivo à participação política feminina em 2015 foram destinados para financiar candidaturas até as eleições de 2018.26. Em recente julgado, PC nº 170–07, Rel. Min. Mauro Campbell, de 5.11.2020, ratificou–se o entendimento de que, nas prestações de contas relativas ao exercício de 2015, a sanção a ser aplicada nos casos de descumprimento do percentual destinado ao incentivo à participação da mulher na política é aquela prevista no art. 44, § 5º, da Lei nº 9.096/95, com a redação dada pela Lei nº 12.034/2009, em respeito aos princípios da isonomia e da segurança jurídica.27. Por se tratar de irregularidade com recursos do Fundo Partidário, deve ser agrupada com os demais apontamentos referentes ao uso indevido desses recursos (PC nº 267–46/DF, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 8.6.2017). Irregularidade mantida.Conclusão28. As irregularidades atingem a quantia de R$ 1.268.558,61 (um milhão, duzentos e sessenta e oito mil, quinhentos e cinquenta e oito reais e sessenta e um centavos), a qual, acrescida do montante de R$ 2.789.053,90 (dois milhões, setecentos e oitenta e nove mil, cinquenta e três reais e noventa centavos) não aplicado no fomento da participação feminina na política, alcança o valor de R$ 4.057.612,51 (quatro milhões, cinquenta e sete mil, seiscentos e doze reais e cinquenta e um centavos), o que equivale a 4,25% do total dos recursos do Fundo Partidário recebidos pela agremiação no referido exercício.29. As falhas, no seu conjunto, não comprometem a totalidade do ajuste contábil e, à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, devem as contas ser aprovadas com ressalvas.30. O partido deverá ser notificado para que devolva ao Erário o valor de 1.267.036,11(um milhão, duzentos e sessenta e seis mil, trinta e seis reais e onze centavos), atualizado e com recursos próprios.31. Ante o descumprimento do art. 44, V, da Lei nº 9.096/95, a grei, nos termos do § 5º do citado instrumento legal, deverá acrescer 2,5% do Fundo Partidário, relativo ao exercício de 2015, ao valor não aplicado – R$ 2.789.053,90 (dois milhões, setecentos e oitenta e nove mil, cinquenta e três reais e noventa centavos) –, corrigido monetariamente, para a participação política das mulheres, devendo essa implementação ocorrer no exercício financeiro seguinte ao trânsito em julgado dessas contas, a fim de se garantir a efetiva aplicação da norma, sem prejuízo do valor a ser destinado a essa finalidade no ano respectivo. Na oportunidade, tal determinação só será inexigível se verificado que foi cumprido o disposto no art. 55–B da Lei nº 9.096/95 e caso ainda esteja em vigência esse dispositivo, devendo, se assim for, ser concedida anistia à grei, decotando–se a determinação ora imputada (R$ 2.789.053,90 + 2,5%). (Precedentes: ED–PC nº 273–06, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 14.9.2020, PC nº 260–49, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 29.4.2020, e PC nº 265–71, de minha relatoria, DJe de 30.6.2020).32. Contas aprovadas com ressalvas.