Jurisprudência TSE 17796 de 20 de abril de 2021
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto
Data de Julgamento
05/04/2021
Decisão
O Tribunal, por maioria, vencidos em parte os Ministros Mauro Campbell Marques, Luis Felipe Salomão e Luís Roberto Barroso (Presidente), aprovou com ressalvas as contas do Solidariedade, referente ao exercício de 2015, com determinações, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Sérgio Banhos, Edson Fachin e Alexandre de Moraes. Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS. SOLIDARIEDADE. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. FUNDAÇÃO PARTIDÁRIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO NA QO Nº 192–65 PARA O EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2021 E SEGUINTES. DESPESAS PARTIDÁRIAS. COMPROVAÇÃO. ART. 18 DA RES.–TSE Nº 23.432/2014. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE VÍNCULO COM A ATIVIDADE PARTIDÁRIA. PRECEDENTES. CONJUNTO DE IRREGULARIDADES: 8,22% DOS RECURSOS RECEBIDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. NÃO COMPROMETIMENTO DAS CONTAS EM SUA TOTALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. RECURSOS PRÓPRIOS. Contas da fundação partidária 1. Em 27.10.2020, no julgamento da QO–PC nº 192–65, prevaleceu o voto divergente do Ministro Luis Felipe Salomão no sentido de que "a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar as contas anuais das fundações vinculadas aos partidos políticos envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário" a partir do exercício financeiro de 2021, em respeito à segurança jurídica, diante da necessidade de regulamentação da matéria por este Tribunal e da proximidade do fim do prazo prescricional para o julgamento das prestações de contas relativas ao exercício de 2015. Contas do Solidariedade 2. A análise das contas de partido pela Justiça Eleitoral envolve o exame da aplicação regular das verbas do Fundo Partidário, a averiguação do recebimento de recursos de fontes ilícitas e de doações de origem não identificada e a efetiva vinculação dos gastos à atividade partidária. 3. A Justiça Eleitoral, por meio do seu órgão técnico, analisa as contas partidárias, partindo dos dados apresentados e realizando as circularizações que se mostram necessárias, sem prejuízo de eventuais ilícitos civis e penais que porventura venham a ser identificados e apurados pelos demais órgãos de controle e investigação. 4. Por se tratar de prestação de contas do exercício de 2015, é aplicável, no caso das irregularidades evidenciadas na espécie, a Res.–TSE nº 23.432/2014, nos termos do que preceitua o art. 65, § 3º, II, das Res.–TSE nº 23.464/2015 e nº 23.546/2017.Irregularidades na aplicação de recursos do Fundo Partidário sujeitas a ressarcimento ao Erário Comprovação de despesas 5. O art. 18 da Res.–TSE nº 23.432/2014 estabelece condições e critérios para comprovação de gastos partidários. Depreende–se do caput do citado artigo que a apresentação de documento fiscal é a regra, e os demais meios de provas são alternativos, razão por que a documentação complementar pode servir como meio de prova e confirmação da regularidade das despesas, sem perder de vista que "o dispêndio do dinheiro público pelo partido político, recebido por meio de recursos do Fundo Partidário, submete–se ao rol taxativo estabelecido no art. 44 da Lei nº 9.096/95, devendo todo e qualquer gasto ser voltado para a própria atividade partidária e comprovada sempre a sua vinculação" (PC nº 247–55, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 1º.3.2018). 6. São irregulares as despesas em que não comprovadas, por meio de documentação adequada, a efetiva prestação de serviços e sua vinculação com a atividade partidária, segundo a legislação de regência e a jurisprudência desta Corte. Irregularidades sanadas parcialmente. 7. A apresentação de documentos que se referem a fatos ocorridos em período anterior à constituição da própria empresa, somada à contratação desta em 2015 para evento que aconteceria somente em 2018 e à falta de comprovação da sua participação na realização do evento, foco principal da contratação do serviço, constitui elemento suficiente a comprometer a regularidade da despesa. Irregularidade mantida. 8. A contratação entre partes relacionadas é matéria instigante e sempre mereceu maior debate por parte desta Corte Superior quanto aos limites na contratação com pessoa jurídica com a qual o dirigente partidário mantenha vínculo societário, tendo em vista que os recursos do Fundo Partidário são, por natureza, públicos e, portanto, sujeitos aos princípios elencados no art. 37 da Constituição Federal (PC nº 228–15/DF, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 6.6.2018). 9. Este Tribunal não presume, de forma absoluta, a irregularidade nas contratações, custeadas com recursos públicos, de empresa cujo corpo societário mantenha vínculo com dirigente do partido ante a ausência de previsão legal ou regramento balizado por instrumento normativo. Nessas hipóteses, as reflexões têm obedecido a critérios, segundo as particularidades de cada caso. 10. No caso vertente, para além da discussão sobre o conflito de interesses em função de o proprietário da empresa prestadora de serviços integrar diretório estadual, os documentos juntados pela agremiação são insuficientes para chancelar a regularidade do gasto, uma vez que a grei não apresentou documentação que evidencie a concretização dos serviços contratados. Irregularidade mantida. 11. O fretamento de aeronave encontra assento no postulado constitucional conferido às greis da liberdade de ação segundo suas necessidades, nos limites impostos pela Lei nº 9.096/95. Sobre o tema, esta Corte já reconheceu essa discricionariedade, ainda que se entenda como gasto discutível, à luz do princípio da economicidade (PC nº 265–76, Rel. Min. Rosa Weber, red. para o acórdão Min. Admar Gonzaga, DJe de 30.5.2017, e PC nº 254–47, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 16.10.2018). 12. Na espécie, a controvérsia não está atrelada necessariamente à onerosidade ou à necessidade da contratação, mas à ausência de informações que permitam aferir o alinhamento da contratação aos objetivos partidários, nos termos exigidos pela legislação de regência e pela jurisprudência (PC nº 247–55, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 1º.3.2018, e ED–PC nº 270–93, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 1º.9.2020). Irregularidade mantida. 13. Consoante previsão expressa do § 7º do art. 18 da Res.–TSE nº 23.432/2014, despesas com transporte aéreo e hospedagem poderão ser comprovadas mediante apresentação de nota explicativa, acompanhada das respectivas faturas emitidas pelas agências de viagem, desde que, concomitantemente, sejam apresentados: (i) prova da vinculação do beneficiário com a agremiação e de que a despesa foi realizada para atender propósitos partidários; (ii) bilhete da passagem, acompanhado dos comprovantes de sua utilização, e (iii) nota fiscal emitida pelo estabelecimento hoteleiro com identificação do hóspede. Sobre a necessária demonstração da relação da despesa com a atividade partidária: PC nº 298–95, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 9.5.2019. Irregularidade mantida. Irregularidades na aplicação de recursos do Fundo Partidário para o incentivo à participação da mulher na política 14. Segundo atesta a unidade técnica, a agremiação destinou R$ 890.804,43 (oitocentos e noventa mil, oitocentos e quatro reais e quarenta e três centavos) para a promoção da participação feminina na política, montante inferior ao percentual mínimo de 5% dos recursos do Fundo Partidário, que corresponderia a R$ 1.207.504,82 (um milhão, duzentos e sete mil, quinhentos e quatro reais e oitenta e dois centavos). O valor não empregado foi, portanto, de R$ 316.700,39 (trezentos e dezesseis mil, setecentos reais e trinta e nove centavos). 15. Nos termos do que preconiza o art 18, § 3º, da Res.–TSE nº 23.432/2014, "os documentos relativos aos gastos com a criação ou manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres devem evidenciar a efetiva execução e manutenção dos referidos programas, nos termos do inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096, de 1995, não sendo admissível mero provisionamento contábil". 16. Em recente julgado, PC nº 170–07, Rel. Min. Mauro Campbell, de 5.11.2020, ratificou–se o entendimento de que, nas prestações de contas relativas ao exercício de 2015, a sanção a ser aplicada nos casos de descumprimento do percentual destinado ao incentivo à participação da mulher na política é aquela prevista no art. 44, § 5º, da Lei nº 9.096/95, com a redação dada pela Lei nº 12.034/2009, em respeito aos princípios da isonomia e da segurança jurídica. 17. Por se tratar de irregularidade com recursos do Fundo Partidário, deve ser agrupada com os demais apontamentos referentes ao uso indevido desses recursos (PC nº 267–46/DF, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 8.6.2017. Conclusão 18. As irregularidades apuradas na presente prestação de contas, inclusive aquelas referentes a destinação de recursos para o incentivo à participação feminina na política, alcançam o montante de R$ 1.986.507,41 (um milhão, novecentos e oitenta e seis mil, quinhentos e sete reais e quarenta e um centavos), o que equivale ao percentual de 8,22% do total dos recursos do Fundo Partidário recebidos pela agremiação no exercício de 2015. 19. As falhas, no seu conjunto, não comprometem a regularidade das contas em sua totalidade, motivo pelo qual devem ser aprovadas, com ressalvas, as contas do Solidariedade referentes ao exercício de 2015. 20. As irregularidades sujeitas a ressarcimento ao Erário totalizam R$ 1.642.251,46 (um milhão, seiscentos e quarenta e dois mil, duzentos e cinquenta e um reais e quarenta e seis centavos), devendo o partido ser notificado para que devolva ao Tesouro Nacional o referido valor, devidamente atualizado e com recursos próprios. 21. Ante o descumprimento do art. 44, V, da Lei nº 9.096/95, a grei, nos termos do § 5º do citado instrumento legal, deverá acrescer 2,5% do Fundo Partidário, relativo ao exercício de 2015, ao valor não aplicado – R$ 316.700,39 (trezentos e dezesseis mil, setecentos reais e trinta e nove centavos) –, corrigido monetariamente, para a específica destinação de incentivo à participação política das mulheres, devendo essa implementação ocorrer no exercício financeiro seguinte ao trânsito em julgado dessas contas, a fim de garantir a efetiva aplicação da norma, sem prejuízo do valor a ser destinado a esse fim no ano respectivo (nesse sentido: PC nº 248–35, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 16.6.2020, e PC nº 264–86, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 19.6.2020). Na oportunidade, essa determinação só será inexigível se verificado que foi cumprido o disposto nos arts. 55–A e 55–B da Lei nº 9.096/95 e caso ainda estejam em vigência esses dispositivos, devendo, se assim for, ser concedida anistia à grei, decotando–se a determinação ora imputada (R$ 316.700,39 + 2,5%). Precedentes: ED–PC nº 273–06, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 14.9.2020, PC nº 260–49, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 29.4.2020, e PC nº 265–71, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 30.6.2020. 22. Contas aprovadas com ressalvas.