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Jurisprudência TSE 16752 de 03 de maio de 2021

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Sergio Silveira Banhos

Data de Julgamento

15/04/2021

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, julgou desaprovadas as contas do Diretório Nacional do Partido Humanista da Solidariedade (PHS), referentes ao exercício financeiro de 2015, com determinações, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Edson Fachin (com ressalva de entendimento pessoal), Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Luís Roberto Barroso (Presidente). Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.

Ementa

PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO NACIONAL. PARTIDO HUMANISTA DA SOLIDARIEDADE (PHS). EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. DESAPROVAÇÃO.SÍNTESE DO CASO1. Trata–se de prestação de contas do Diretório Nacional do Partido Humanista da Solidariedade (PHS) referente ao exercício financeiro de 2015, apresentada em 29.4.2016 (ID 41355088, p. 2), com sugestões da Assessoria de Contas Eleitorais e Partidárias e do Ministério Público no sentido da desaprovação das contas.2. Em 19.9.2019, o TSE aprovou a incorporação do Partido Humanista da Solidariedade (PHS) ao Podemos (Pode).ANÁLISE DA PRESTAÇÃO DE CONTAS3. Por se tratar de prestação de contas partidária do exercício de 2015, é aplicável, no caso das irregularidades evidenciadas na espécie, a Res.–TSE 23.432, nos termos do que preceitua o art. 65, § 3º, II, das Res.–TSE 23.464.4. A despeito de ter sido determinada ao diretório nacional, em diversas oportunidades na tramitação do feito, a juntada aos autos dos instrumentos de mandato dos dirigentes responsáveis pelas contas, eles não foram colacionados aos autos.I – Impropriedades– Valores registrados em Obrigações a Pagar sem comprovação da origem das despesas5. Ficou constatada a existência de valores a título de Créditos de Terceiros a Pagar, registrado no Demonstrativo de Obrigações a Pagar, sem que fosse possível identificar qual foi a origem do gasto.– Despesas registradas contabilmente sem que fosse possível identificar a forma de pagamento e a origem dos recursos6. Não houve manifestação do partido quanto à forma de pagamento e à origem dos recursos de diversos recibos de pagamento autônomo, depósitos em dinheiro e DARFs autenticados atinentes ao pagamento de PIS sobre folha de pagamento.II – Irregularidades com recursos do Fundo Partidário– Recursos de origem não identificada7. Conforme firme jurisprudência, o recebimento de recursos de origem não identificada em conta do Fundo Partidário impossibilita o controle efetivo da Justiça Eleitoral sobre a origem do valor que transitou na conta da agremiação, impedindo que a movimentação financeira do partido seja aferida em sua completude. Ausência de documentos para comprovação das despesas e sua vinculação partidária7. "Nos termos do art. 44 da Lei nº 9.096/1995 e da pacífica jurisprudência deste Tribunal Superior, deve se exigir do prestador das contas, além da prova inequívoca da realização da despesa, a demonstração de sua vinculação com as atividades partidárias (PC nº 228–15/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgada em 26.4.2018, DJe de 6.6.2018)" (PC 304–05, rel. Min. Og Fernandes, DJE de 7.6.2019). – Despesas com serviços gráficos9.    Conforme o art. 18, caput, da Res.–TSE 23.432, a comprovação das despesas deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou pela razão social, pelo CPF ou pelo CNPJ e pelo endereço. Caso não colacionada a documentação fiscal hábil, o partido pode juntar documentação complementar para a prova da regularidade do gasto.– Despesas com passagens, hospedagens e eventos10.  É certo que a jurisprudência anterior deste Tribunal – alusiva às prestações de contas regidas pela Res.–TSE 21.841 – adotou a compreensão assim sintetizada: "A partir do julgamento da PC nº 43, esta Corte firmou o entendimento de que ¿em relação às despesas com hospedagem, há que se considerar que as respectivas faturas – quando discriminados o nome do estabelecimento hoteleiro, do hóspede e as datas de estadia – também devem ser admitidas como provas que poderão ser ratificadas por outros documentos, ou, se em relação a elas houver dúvida, poderão ser conferidas por diligências de circularização'. (PC nº 43/DF, DJe de 4.10.2013)" (PC 242–96, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 18.6.2018).11. A prestação de contas de 2015, todavia, é examinada sob um novo regramento, constante da Res.–TSE 23.432, a qual prossegue admitindo, quanto às despesas de transporte aéreo e de hospedagem, a apresentação de faturas, mas exige notas explicativas do partido sobre essas espécies de gastos partidários, além da prova da vinculação do beneficiário com a agremiação e a de que a viagem foi realizada para atender aos propósitos partidários (art. 18, § 7º, II e alínea a).– Despesas realizadas com Fundo de Caixa12.  Extraem–se irregulares despesas realizadas com o Fundo de Caixa, as quais, além de importarem descumprimento do saldo máximo e dos valores individuais estabelecidos no art. 19, caput e § 3º, da Res.–TSE 23.432, não se fizeram acompanhadas de documentos com a identificação do passageiro, a indicação do veículo, o motivo do deslocamento, impossibilitando inclusive a verificação do vínculo do gasto com as atividades da agremiação.– Despesas com imóveis: locação e pagamentos de impostos13.  Por se tratar de gasto custeado com recursos públicos, cuja transparência e moralidade de utilização devem ser a regra, não há como entender comprovada a despesa com imóvel sem a apresentação de instrumento contratual apto a estabelecer as cláusulas específicas de locação.14.  Merece glosa o aluguel de imóvel de luxo pela agremiação partidária, reputando que o partido possui imóvel próprio e, ainda, não foi apresentada justificativa para o dispêndio extra efetuado, sem a nítida evidência da necessidade da despesa para a manutenção das atividades partidárias.15.  No que respeita ao pagamento de IPTU de imóvel próprio, os partidos políticos usufruem de imunidade tributária sobre o seu patrimônio, nos termos do art. 150, VI, c, da Constituição Federal, razão pela qual se afigura irregular o pagamento do indigitado tributo.– Ressarcimentos de despesas com viagens e hospedagens16.  Foram constatados: i) gastos fora do período e da cidade da viagem indicados no relatório, em finais de semana e feriados; ii) reembolso de gastos com hospedagem a dirigente na cidade em que reside; e iii) notas fiscais de hotéis sem nome do hóspede.17.  Não havendo apresentação de novos documentos aptos a demonstrarem a devida utilização dos recursos públicos quanto a ressarcimentos procedidos, não há como entender por sua regularidade.– Despesas com serviços advocatícios18.  Em relação a despesas com serviços advocatícios, o contrato apresentado pela agremiação com o escritório profissional é antigo e não foi apresentado aditivo contratual para demonstrar sua vigência durante o exercício financeiro das contas ou mesmo novo pacto vigente à época, além do que, mesmo considerando tal instrumento contratual, a descrição dos serviços é genérica, apenas indicando inúmeras áreas em que o escritório contratado deveria atuar, não se permitindo correlacionar o  gasto com a atividade partidária, o que enseja a persistência da irregularidade apurada.– Despesas com a aquisição de veículos19.  É certo que a autonomia dos partidos políticos garante independência na organização de sua estrutura, no desenvolvimento de suas atividades e de sua gestão administrativa, porém, não se pode olvidar que, indubitavelmente, eles devem zelar pela adequada e correta aplicação dos recursos públicos, em atenção ao disposto no art. 70 da Constituição Federal.20.  "Firmou–se nesta Corte Superior a compreensão de que a observância do princípio da economicidade na aplicação de recursos públicos pode ser objeto de controle em processo de prestação de contas, assim como se assentou que é possível considerar irregular a despesa que tenha caráter antieconômico. Nesse sentido, confiram–se os seguintes precedentes alusivos ao emprego de verbas do Fundo Partidário por partidos políticos: PC 305–87, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 12.8.2019; PC 290–21, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 21.6.2019; e PC 268–60, rel. Min. Admar Gonzaga, DJE de 6.6.2019" (REspe 0601163–94, rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 27.10.2020).21.  Para demonstrar a adequada realização de despesa, de montante expressivo, é necessário que se evidencie, de forma pormenorizada, a motivação da escolha do bem e a economicidade da aquisição, porquanto a transparência e a moderação na efetivação do gasto são essenciais para demonstrar a apropriada utilização dos recursos públicos pelos partidos.22.  O partido não se desincumbiu do ônus de comprovar a necessidade da aquisição de automóveis de custo tão significativo, evidenciando má gestão dos recursos oriundos do Fundo Partidário.– Despesas com publicidade, assessoria de comunicação, pesquisa de opinião e material gráfico23.  "Na hipótese de produto ou serviço ser incompatível com o objeto social do fornecedor, cabe à legenda comprovar a regularidade do gasto mediante documentação adicional" (PC 319–71, rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 25.4.2019, DJE de 31.5.2019). No mesmo sentido: PC 241–43, rel. Min. Og Fernandes, DJE de 24.9.2020.24.  As irregularidades detectadas pela unidade técnica devem ser mantidas em razão da realização de despesas, em relação às quais foram apresentados documentos fiscais com descrição genérica, não possibilitando a verificação do vínculo com as atividades partidárias.25.  "Conforme o art. 44 da Lei nº 9.096/1995 e a pacífica jurisprudência deste Tribunal Superior, deve se exigir do prestador das contas, além da prova inequívoca da realização da despesa, que seja demonstrado o vínculo com as atividades partidárias (PC nº 228–15/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgada em 26.4.2018, DJe de 6.6.2018)" (PC 248–35, rel. Min. Og Fernandes, DJE de 16.6.2020).– Despesas com veículos próprios – IPVA e outras despesas26.  A jurisprudência desta Corte Superior firmou–se no sentido de que "o pagamento de Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) por parte dos partidos políticos com recursos do Fundo Partidário é gasto indevido, porquanto as agremiações gozam de imunidade tributária quanto ao seu patrimônio, conferida pelo art. 150, VI, c, da Constituição Federal (PC nº 262–19, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 24.8.2020)" (PC–PP 190–95, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 12.3.2021).27.  Subsistente a glosa quanto à aquisição de dois veículos pela agremiação, as despesas acessórias e correlatas de tais bens igualmente devem ser glosadas.– Insuficiência de aplicação de recursos FP Fundação/Instituto28.  Em 27.10.2020, no julgamento da QO–PC 192–65, prevaleceu a compreensão externada no voto do Ministro Luis Felipe Salomão de que a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar as contas anuais das fundações vinculadas aos partidos políticos envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário, o que ocorrerá somente "a partir do exercício financeiro de 2021, em respeito à segurança jurídica, diante da necessidade de regulamentação da matéria por este Tribunal e da proximidade do fim do prazo prescricional para o julgamento das prestações de contas relativas ao exercício de 2015" (PC 169–22, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 2.2.2021).29.  Ao julgar a PC 0000170–07, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJE de 23.11.2020, atinente ao exercício de 2015, esta Corte assentou a necessidade de devolução ao erário dos valores não aplicados na fundação, por se tratar de irregularidade na aplicação dos recursos públicos, tendo em vista que a agremiação deixou de transferir à fundação o percentual legalmente previsto.30.  Igualmente no julgamento da PC 0000171–89, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgada em 26.3.2021, este Tribunal considerou que, não obstante o entendimento firmado na PC 170–07 tenha se fundado em caso de ausência de repasse por falta de criação de fundação, não se pode afastar tal compreensão da hipótese em que a agremiação igualmente não repasse o percentual mínimo de 20% da verba recebida do Fundo Partidário, porquanto a legislação de regência determina a obrigatoriedade de sua destinação.– Insuficiência de aplicação de recursos FP no incentivo à participação política das mulheres31. Em face da ausência de elementos aptos a comprovar a devida aplicação de recursos para incentivo da participação política da mulher, é de se reconhecer a insuficiência de aplicação de recursos, em descumprimento da determinação contida no inciso V do art. 44 da Lei 9.096/95, com exceção de uma única despesa cuja regularidade foi reconhecida.32.  O art. 55–A não pode ser aplicado para afastar as sanções pelo descumprimento do art. 44, V, da Lei 9.096/95, tendo em vista que o partido não comprovou tampouco sugeriu que os recursos não utilizados no incentivo à participação política feminina em 2015 tenham sido destinados para financiar candidaturas até as Eleições de 2018.33.  No julgamento da PC 0000170–07, de relatoria do eminente Ministro Mauro Campbell, DJE de 23.11.2020, relativa ao exercício de 2015, ficou assentado por este Tribunal Superior que a sanção a ser aplicada, no caso de descumprimento do percentual destinado ao incentivo da participação política da mulher, é a prescrita pelo art. 44, § 5º, da Lei 9.096/95, com redação dada pela Lei 12.034/2009, em atenção aos princípios da isonomia e da segurança jurídica.34.  Considerando que o PHS foi incorporado pelo Podemos, deverá essa agremiação partidária acrescer 2,5% do Fundo Partidário ao valor não aplicado, corrigido monetariamente, o que deverá ocorrer após o trânsito em julgado da decisão. Na oportunidade, tal determinação só será inexigível se verificado que foi cumprido o disposto no art. 55–B da Lei 9.096/95 e caso esteja em vigência esse dispositivo, devendo, se assim for, ser concedida anistia à grei, decotando–se a determinação ora imputada (Precedentes: ED–PC 273–06, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 14.9.2020; PC 265–71, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 30.6.2020).35.  "Por se tratar de irregularidade com recursos do Fundo Partidário, deve ser agrupada com os demais apontamentos referentes ao uso indevido desses recursos (PC nº 267–46/DF, Rel. Min. Luciana Lóssio, DJe de 8.6.2017)" (PC 190–95, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 12.3.2021).– Ausência de repasse de recursos para as demais esferas partidárias36.  O TSE já decidiu que a ausência de repasse dos recursos do Fundo Partidário aos diretórios estaduais configura irregularidade grave, que enseja a desaprovação das contas, pois inviabiliza a existência dos órgãos inferiores da agremiação e prejudica a realização das campanhas eleitorais.37.  Ainda que se possa argumentar que, nos termos da autonomia partidária, não seria da competência da Justiça Eleitoral se imiscuir em questões afetas à administração interna das agremiações partidárias, esta Corte Superior tem assentado, à guisa de exemplo, que, "ante os potenciais riscos ao processo democrático e os interesses subjetivos envolvidos (suposto ultraje a princípios fundamentais do processo), qualificar juridicamente referido debate dessa natureza como matéria interna corporis, considerando–o imune ao controle da Justiça Eleitoral, se revela concepção atávica, inadequada e ultrapassada: em um Estado Democrático de Direito, como o é a República Federativa do Brasil (CRFB/88, art. 1º, caput), é paradoxal conceber a existência de campos que estejam blindados contra a revisão jurisdicional, adstritos tão somente à alçada exclusiva da respectiva grei partidária. Insulamento de tal monta é capaz de comprometer a própria higidez do processo político–eleitoral, e, no limite, o adequado funcionamento das instituições democráticas" (REspe 103–80, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 30.11.2017).CONCLUSÃO38.  O total de irregularidades quantificáveis detectadas na presente prestação de contas (R$ 2.421.400,58), especificamente em face da integralidade dos recursos recebidos do Fundo Partidário (R$ 9.283.108,63), corresponde a 26,07% dessas receitas, o que justifica, reputadas as demais falhas, a desaprovação das contas, com determinações.


Jurisprudência TSE 16752 de 03 de maio de 2021