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Jurisprudência TSE 15368 de 09 de abril de 2021

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto

Data de Julgamento

25/03/2021

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, julgou desaprovadas as contas do Partido Republicano Progressista (PRP), referentes ao exercício financeiro de 2015, nos termos do voto do relator. Por maioria, vencidos os Ministros Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Alexandre de Moraes e Mauro Campbell Marques, majorou o valor das irregularidades apuradas, com a constatação de ausência de aplicação de recursos na política de fomento à participação feminina e determinou que fosse observado o valor do Fundo Partidário recebido pela agremiação na aplicação da sanção, nos termos do voto do Ministro Luís Roberto Barroso. Acompanharam a divergência os Ministros Edson Fachin, Luis Felipe Salomão e Sérgio Banhos. Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.

Ementa

PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO REPUBLICANO PROGRESSISTA. EXERCÍCIO DE 2015. FUNDAÇÃO PARTIDÁRIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO NA QO Nº 192-65 PARA O EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2021 E SEGUINTES. COMPROVAÇÃO DOS GASTOS PARTIDÁRIOS. ART. 18 DA RES.-TSE Nº 23.432/2014. AMPLOS MEIOS DE PROVA. RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. CHEQUES AO PORTADOR. TRÂNSITO EM CONTA DE EMPRESA DO TESOUREIRO. EXPRESSIVA QUANTIDADE DE CONTRATAÇÕES ENTRE PARTES RELACIONADAS. AUSÊNCIA DE REPASSE DE RECURSOS AOS DIRETÓRIOS ESTADUAIS. CONGRESSOS E ENCONTROS MULHER PRP. EVENTOS CONCOMITANTES. RATEIO DAS DESPESAS. CÔMPUTO PARCIAL PARA O INCENTIVO À PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA POLÍTICA. CONJUNTO DE IRREGULARIDADES: 9,69% DO TOTAL DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. NATUREZA DAS FALHAS. GRAVIDADE. COMPROMETIMENTO DO AJUSTE CONTÁBIL. DESAPROVAÇÃO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. SANÇÃO DE SUSPENSÃO DAS COTAS DO FUNDO PARTIDÁRIO POR 1 (UM) MÊS A SER CUMPRIDA DE FORMA PARCELADA EM 2 (DOIS) MESES. DETERMINAÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. RECURSOS PRÓPRIOS.Contas da fundação partidária1. Em 27.10.2020, no julgamento da QO-PC nº 192-65, prevaleceu o entendimento do voto divergente do Ministro Luis Felipe Salomão de que "a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar as contas anuais das fundações vinculadas aos partidos políticos envolvendo a aplicação de verbas do Fundo Partidário" a partir do exercício financeiro de 2021, em respeito à segurança jurídica, diante da necessidade de regulamentação da matéria por este Tribunal e da proximidade do fim do prazo prescricional para o julgamento das prestações de contas relativas ao exercício de 2015.Contas do PRP2. A análise das contas de partido envolve o exame da aplicação regular dos recursos do Fundo Partidário, a averiguação do recebimento de recursos de fontes ilícitas e de doações de origem não identificada e a vinculação dos gastos à efetiva atividade partidária.3. A Justiça Eleitoral, por meio do seu órgão técnico, analisa as contas partidárias, partindo dos dados apresentados e realizando as circularizações que se mostram necessárias. Tudo isso sem prejuízo de eventuais ilícitos civis e penais que porventura venham a ser identificados e apurados pelos demais órgãos de controle e investigação.4. Por se tratar de prestação de contas do exercício de 2015, é aplicável, quanto às irregularidades evidenciadas na espécie, a Res.-TSE nº 23.432/2014, consoante preconiza o art. 65, § 3º, II, das Res.-TSE nº 23.464/2015 e nº 23.546/2017. Irregularidades sujeitas a ressarcimento ao Erário Cheques da conta do Fundo Partidário compensados na conta corrente de empresa do tesoureiro do partido5. O pagamento de despesas partidárias mediante cheques ao portador, compensados em conta corrente de empresa do tesoureiro, em manifesta ofensa ao art. 18, § 4º, da Res.-TSE nº 23.432/2014 e à orientação jurisprudencial deste Tribunal, constitui irregularidade grave, pois compromete o acompanhamento do fluxo financeiro da agremiação. Irregularidade mantida6. A imposição de ressarcimento ao Tesouro Nacional será exigível apenas para os cheques que não encontram lastro em documentação apta a atestar a regularidade do gasto e sua vinculação com a atividade partidária, nos termos exigidos pela resolução de regência e pela jurisprudência desta Corte (AgR-REspe nº 0603515-73/RS, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 30.11.2020; REspe nº 0601242-89/PB, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 6.10.2020; e AgR-REspe nº 0602265-05/RS, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 1 9.6.2020).Comprovação dos gastos partidários7. Nos termos do art. 18 da Res.-TSE nº 23.432/2014, a Justiça Eleitoral poderá admitir a comprovação de gastos partidários mediante apresentação de nota fiscal e por qualquer meio idôneo de prova, inclusive contrato, comprovante de entrega do material ou da prestação efetiva dos serviços e comprovante bancário de pagamento, além de, alternativamente, ser recepcionada, na hipótese de a legislação dispensar a emissão de documento fiscal, a exibição de qualquer outro documento que contenha os requisitos identificadores dos contraentes, consoante dispõem os §§ 1º e 2º desse instrumento normativo.8. A apresentação de documento fiscal é a regra, e os demais meios de provas são alternativos, razão por que a documentação complementar pode servir como meio de prova e confirmação da regularidade da despesa. Precedentes.9. A contratação entre partes relacionadas é matéria instigante e sempre mereceu maior debate por parte desta Corte Superior quanto aos limites na contratação com pessoa jurídica com a qual o dirigente partidário mantenha vínculo societário, tendo em vista que os recursos do Fundo Partidário são, por natureza, públicos e, portanto, sujeitos aos princípios elencados no art. 37 da Constituição Federal (PC nº 228-15/DF, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 6.6.2018).10. Este Tribunal não presume, de forma absoluta, a irregularidade nas contratações, custeadas com recursos públicos, de empresa cujo corpo societário mantenha vínculo com dirigente do partido ante a ausência de previsão legal ou regramento balizado por instrumento normativo. Nessas hipóteses, as reflexões têm obedecido a critérios, segundo as particularidades de cada caso.11. Constatado que foram atendidos os requisitos do art. 18 da Res.-TSE nº 23.432/2015 quanto à comprovação dos gastos partidários, não havendo elementos que revelem que a despesa é superfaturada e não tendo a situação descrita afetado a transparência da transação entre as partes nem se mostrado eivada de má-fé, é de ser afastada a irregularidade, não sendo devido o ressarcimento dos valores despendidos e regularmente comprovados. Ao contrário, evidenciado que a sobreposição de interesses comprometeu a lisura dos gastos com recursos públicos, deve ser imposta a devolução ao Erário.Irregularidades afastadas parcialmente.12. Adota-se na espécie o entendimento de que, ante o fato de a Lei nº 9.096/95 e a Res.-TSE nº 23.432/2015 não contemplarem óbice à contratação de prestadores de serviços integrantes da grei, não há como ser presumida, a priori, a irregularidade de tais gastos. Registrada a ressalva de que, à luz do instituto do overrulind, no caso de se entenderem como irregulares essas contratações, de forma absoluta, seus efeitos devem incidir a partir das contas dos exercícios futuros em função de ainda não terem sido jurisdicionadasIrregularidades nas obrigações relativas ao Fundo Partidário não sujeitas a ressarcimento ao ErárioInsuficiência de recurso na participação feminina na política13. Tem merecido atenção desta Justiça especializada a ausência de critérios objetivos para alcançar um julgamento preciso e justo sobre a matéria.14. Nos casos da realização simultânea de encontros de interesse do partido com eventos de fomento à participação da mulher na política, parte-se do pressuposto de que não é propósito da análise das contas julgar por conjecturas ou mesmo sindicar as decisões e autonomia do partido, ainda mais sob o pálio da economicidade, motivo pelo qual, consoante justificado pelo PRP, deve-se ponderar que a realização de um congresso pode ser vista também como ação afirmativa de incentivo à participação feminina na política.15. Na hipótese vertente, os eventos foram concomitantes e tudo indica que houve convocação do corpo feminino do partido e relação direta com a promoção da mulher, ainda que parcial. No entanto, seu custo foi global e, a princípio, imensurável individualmente, motivo pelo qual não se mostra razoável que seja computado somente como gasto relativo ao incentivo à participação da mulher na política, encobrindo as despesas ordinárias do partido com os congressos realizados.16. Partindo dessas premissas, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, deve o total de gastos com os eventos ser rateado igualmente e cada parte ser suportada pela rubrica orçamentária ordinária do partido e de incentivo à participação da mulher na política.17. O art. 55-A da Lei nº 9.096/95 não tem o condão de isentar a grei das sanções pelo descumprimento do art. 44, V, da Lei nº 9.096/95, porquanto o partido nem sequer aventou ou comprovou que os recursos não utilizados no programa de incentivo à participação política feminina em 2015 foram destinados para financiar candidaturas até as eleições de 2018.18. Por se tratar de irregularidade com recursos do Fundo Partidário, deve ser agrupada com os demais apontamentos referentes ao uso indevido desses recursos (PC nº 267-46/DF, Rel. Min. Luciana Lóssio, de 8.6.2017). Irregularidade sanada parcialmente.Outras irregularidades com recursos do Fundo PartidárioAusência de repasse de recursos para as demais esferas partidárias19. Embora apenas 17 (dezessete) representações estaduais estivessem proibidas de receber repasses do Fundo Partidário, a grei deliberou pela centralização desses recursos no diretório nacional, fato que atingiu a totalidade dos diretórios estaduais, independentemente de estarem ou não cumprindo sanção.20. Quanto ao tema, a jurisprudência desta Corte é no sentido de que "a ausência de repasse de recursos do Fundo Partidário pelo diretório nacional aos diretórios estaduais consubstancia grave violação ao art. 44, I e III, da Lei 9.096/95, apta a ensejar a desaprovação das contas e o sancionamento do partido" sendo tal conduta causadora de "enorme gravame ao exercício da democracria nos âmbitos regional e municipal, pois inviabiliza a própria existência dos órgãos inferiores da agremiação, bem como prejudica a realização de campanhas eleitorais" (PC nº 237-74, Rel. Min. Admar Gonzaga, de 13.4.2018). Nessa mesma linha: PC nº 257-94, Rel. Min. Sérgio Banhos de 22.6.2020, e PC nº 300-65, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 13.5.2019.Conclusão21. As irregularidades com as receitas do Fundo Partidário alcançam o montante de R$ 725.035,17 (setecentos e vinte e cinco mil, trinta e cinco reais e dezessete centavos), o que equivale ao percentual de 9,69% do total dos recursos do Fundo Partidário recebidos pela agremiação no referido exercício.22. As falhas, no seu conjunto, comprometem a lisura e a higidez das contas, porquanto verificados elevado grau de desorganização contábil por parte da grei e irregularidades de natureza grave, decorrentes de: (i) grande emissão de cheques ao portador, em descumprimento reiterado do art. 18, § 4º, da Res.-TSE nº 23.432/2015; (ii) expressiva quantidade de contratação entre partes relacionadas; e (iii) concentração de recursos públicos pelo diretório nacional. Diante disso, devem ser desaprovadas as contas do PRP referentes ao exercício de 2015, com a determinação de recolhimento ao Erário do montante de R$ 503.136,12 (quinhentos e três mil, cento e trinta e seis reais e doze centavos) , atualizado e com recursos próprios.23. Considerando a gravidade do conjunto de irregularidades e observada a aplicação da sanção de forma proporcional e razoável, determina-se a suspensão do repasse de novas cotas do Fundo Partidário, nos termos do art. 37, § 3º, da Lei nº 9.096/95, com a redação dada pela Lei nº 12.034/2009, e da jurisprudência desta Corte Superior, por 1 (um) mês, a ser cumprida de forma parcelada, em 2 (dois) meses, com valores iguais e consecutivamente (PC nº 260-54/DF, Rel. Min. Henrique Neves, julgada em 28.3.2017). Na execução do julgado, deve-se considerar o montante recebido do Fundo Partidário no momento da presente decisão, consoante previsão expressa no art. 48, § 4º, da Res.-TSE nº 23.432/2014.24. Ante o descumprimento do art. 44, V, da Lei nº 9.096/95, o partido, nos termos do § 5º do citado instrumento legal, deverá acrescer 2,5% do Fundo Partidário, relativo ao exercício de 2015, ao valor não aplicado - R$ 219.221,12 (duzentos e dezenove mil, duzentos e vinte e dois reais e doze centavos) -, corrigido monetariamente, para a participação política das mulheres, devendo essa implementação ocorrer no exercício seguinte ao do trânsito em julgado dessas contas, a fim de garantir a aplicação da norma, sem prejuízo do valor a ser destinado a esse fim no ano respectivo. Tal determinação só será inexigível se verificado que cumprido o disposto no art. 55-B da Lei nº 9.096/95 e caso ainda esteja em vigência esse dispositivo, devendo, se assim for, ser concedida anistia à grei, decotando-se a determinação imputada (R$ 219.221,12 + 2,5%) (ED-PC nº 273-06, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 14.9.2020, PC nº 260-49, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 29.4.2020, e PC nº 265-71, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 30.6.2020).25. A grei não atingiu, nas eleições de 2018, o mínimo da cláusula de desempenho. Essa circunstância não deve impedir a completude do título judicial formado em processo de conhecimento (PC nº 302-35, Rel. Min. Admar Gonzaga, julgada em 23.4.2019). Eventuais questões associadas à efetividade do cumprimento da sanção, em razão da circunstância assinalada, deverão ser objeto de exame por ocasião da fase de execução (PC nº 300-65, Rel. Min. Og Fernandes, de 11.4.2019).26. Em 28.3.2019, este Tribunal aprovou a incorporação do PRP ao Patriota, destacando-se, naquela ocasião, que o Patriota, ao incorporar o PRP, assumiria todos os débitos relativos a essa legenda, especialmente os relacionados a condenações havidas em prestações de contas (Pet nº 0601953-14, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 28.3.2019).27. Contas desaprovadas com determinações.


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