Jurisprudência TSE 13984 de 27 de abril de 2021
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Mauro Campbell Marques
Data de Julgamento
08/04/2021
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, rejeitou a preliminar de cerceamento de defesa e julgou desaprovadas as contas do Partido, com determinações, nos termos do voto do Relator. Quanto à sanção de suspensão de cotas do Fundo Partidário, após reajuste de voto do Relator, fixou-se, por unanimidade, como base de cálculo, o duodécimo recebido pelo Partido Político, em 2015, nos termos do que decidido pela Corte em Plenário Virtual e do voto do Ministro Luís Roberto Barroso (Presidente). Por maioria, vencido o Ministro Edson Fachin, determinou o seu cumprimento, de forma parcelada, em 4 (quatro) vezes, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão e Luís Roberto Barroso (Presidente). Ausência justificada do Senhor Ministro Tarcisio Vieira de Carvalho Neto. Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. PDT. DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2015. IRREGULARIDADES QUE TOTALIZAM R$ 4.477.445,05, VALOR EQUIVALENTE A 14,51% DO MONTANTE RECEBIDO DO FUNDO PARTIDÁRIO. CONTAS DESAPROVADAS.1. Preliminar de cerceamento de defesa1.1. Não é cabível, em prestação de contas, pedido de reconsideração, tampouco cabe recurso contra decisões interlocutórias proferidas em processos desta classe. Precedentes. No entanto, as matérias nele expostas, e reproduzidas nas razões finais, devem ser analisadas como preliminares.1.2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que, dada a natureza jurisdicional do processo de prestação de contas, a redação do art. 37, § 11, da Lei nº 9.096/1995 não é aplicável nos casos em que, intimada pela Justiça Eleitoral para apresentar documentos, a agremiação deixa de fazê–lo no momento oportuno, como se afigura na espécie, operando–se, portanto a preclusão.1.3. Conforme disposto no art. 40, parágrafo único, da Res.–TSE nº 23.604/2019, é vedada a juntada de documentos nas razões finais e, além disso, segundo afirma a própria agremiação, foram juntados os mesmos documentos e esclarecimentos que já haviam sido juntados a destempo e, por isso, desentranhados. O mesmo entendimento se aplica à documentação juntada após as razões finais.1.4. Preliminar de cerceamento de defesa afastada.2. Irregularidades nas receitas, sujeitas a ressarcimento ao erário2.1. Recursos de origem não identificada recebidos nas contas específicas do Fundo Partidário. Nos termos do disposto na Res.–TSE nº 23.432/2014, a ausência de informações acerca da origem dos recursos recebidos pelos partidos políticos acarreta a imediata vedação ao seu uso e o seu recolhimento ao Tesouro Nacional. Assim, ausente qualquer manifestação do partido a respeito do apontamento, persiste a irregularidade no valor de R$ 1.375,00, o qual deverá ser recolhido ao Tesouro Nacional.3. Irregularidades nas despesas, sujeitas a ressarcimento ao erário3.1. Irregularidade referente a despesas com pessoal3.1.1. O fato de a grei realizar pagamentos de forma sucessiva e ininterrupta mediante RPA, por si só, não compromete a análise contábil da prestação nesta seara eleitoral e demanda análise especializada no âmbito da Justiça do Trabalho. Precedente.3.1.2. Nos termos do art. 21, § 1º, da Res.–TSE nº 23.432/2014, as despesas relacionadas à prestação de serviços por autônomos somente serão incluídas para aferir os limites de despesa com pessoal nos casos em que seja comprovada fraude. Não havendo qualquer notícia de fraude nas contratações por meio de prestadores de serviços autônomos, tais despesas não devem ser incluídas no cálculo do percentual máximo de gastos de pessoal previsto no art. 44, I, a, da Lei nº 9.096/1995, devendo ser analisadas como outras despesas da agremiação.3.1.3. Determinação de remessa de cópia dos autos para o Ministério Público do Trabalho para exame de eventual lesão às normas trabalhistas.3.2. Repasses de recursos do Fundo Partidário para diretórios que tiveram as contas desaprovadas3.2.1. Esta Corte Superior firmou o entendimento de que "[...] a sanção de suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário imposta aos diretórios regionais e municipais, em razão da desaprovação das suas contas, deve ser cumprida pelo diretório nacional a partir da publicação da respectiva decisão, e não da data de sua comunicação pelos Tribunais Regionais [...]" (PC nº 301–50/DF, rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgada em 23.4.2019, DJe de 28.6.2019).3.2.2. O STF, por maioria, concluiu pela constitucionalidade do art. 28, IV, da Res.–TSE nº 21.841/2004, que autoriza a suspensão das cotas do Fundo Partidário a partir da data da publicação da decisão (ADI nº 6.395/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, rel. para o acórdão Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgada em 31.8.2020, DJe de 5.10.2020).3.2.3. Durante o julgamento da ADI, ficou consignado no voto vencedor do Ministro Edson Fachin que "[...] o diretório hierarquicamente superior tem apenas o ônus de deixar de efetuar o repasse, sendo prescindível, para fins de aplicação da cláusula do devido processo legal, a sua intimação específica".3.3. Não comprovação de despesas realizadas com hospedagens e com passagens aéreas3.3.1. O regramento das despesas com hospedagens e passagens aéreas está previsto no art. 18, § 7º, II, a, b e c, da Res.–TSE nº 23.432/2014, segundo o qual, além da identificação dos hóspedes e dos passageiros nas faturas, da origem, do destino, da data da viagem e da estadia, do valor das passagens e das diárias, também deve ser comprovado que estes gastos realizados estejam atrelados às atividades partidárias, explicitando–se o motivo que ensejou àquelas viagens e a relação destas com os beneficiários e com o partido, o que, contudo, não ocorreu na espécie. Irregularidade mantida.3.4. Da capacidade operacional de empresa para a prestação de serviços e da ausência de empregados na RAIS3.4.1. A apuração da existência de capacidade operacional de uma empresa extrapola a competência do processo de prestação de contas, que deve se ater à análise do balanço contábil da agremiação partidária.3.4.2. Quanto à ausência de empregados na RAIS, esta Corte Superior fixou o entendimento de que tal circunstância não caracteriza irregularidade contábil que deva ser analisada no processo de prestação de contas, de modo que supostos ilícitos de natureza diversa devem ser apurados em âmbito próprio. Precedente.3.5. Insuficiência de documentação para comprovar os gastos e a sua vinculação com a atividade partidária3.5.1. Nos termos do art. 18, caput, da Res.–TSE nº 23.432/2014, a comprovação das despesas se perfaz com a apresentação de documento fiscal idôneo, contendo a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário.3.5.2. No entanto, quando a descrição contida em tal documentação se mostra incompleta ou insuficiente para demonstrar a regularidade dos gastos ou a sua vinculação com a atividade partidária, o art. 37, § 1º, da Lei nº 9.096/1995 e o § 1º do art. 18 da Res.–TSE nº 23.432/2014 autorizam a apresentação de outros documentos. Precedente.3.5.3. Conforme preceitua o art. 44 da Lei nº 9.096/1995 e a pacífica jurisprudência desta Corte Superior, deve–se exigir do prestador das contas, além da prova inequívoca da realização da despesa, que seja demonstrado o vínculo com as atividades partidárias (PC nº 228–15/DF, rel. Min. Rosa Weber, julgada em 26.4.2018, DJe de 6.6.2018), o que, contudo, não ocorreu em relação a parte das despesas apontadas pelo órgão técnico.3.5.4. Conforme sustentado pelo partido, alguns gastos foram apontados mais de uma vez pela unidade técnica, motivo pelo qual as despesas em duplicidade foram analisadas em um único tópico e afastadas no outro.3.6. Despesas com aluguéis, condomínios e IPTU3.6.1. Embora o partido afirme que apresentou toda a documentação inerente às mencionadas despesas, não aponta onde ela está localizada nos autos; medida necessária, uma vez que a unidade técnica afirma que não foi juntada. Irregularidade mantida.3.6.2. A afirmação do partido de que os imóveis foram utilizados para hospedar seus membros – em prestígio ao princípio da economicidade, pois tal medida economiza com gastos em hotelaria – mostra–se incompatível com a juntada, nestes autos, de documentos com hospedagens (analisado em tópico distinto deste voto), inclusive em estabelecimentos localizados na Capital Federal, onde também se localiza o imóvel residencial que, supostamente, atenderia a esse fim. Irregularidade mantida.3.7. Despesas com serviços jurídicos. Este Tribunal já assentou que o gasto realizado com serviços advocatícios em favor de integrantes do partido, em processo referente à prática de improbidade administrativa, não denota vínculo com a atividade partidária, na medida em que configura defesa pessoal. Precedentes.4. Insuficiência na aplicação de recursos do Fundo Partidário no programa de incentivo da participação da mulher na política4.1. O PDT recebeu, no exercício de 2015, R$ 30.850.195,23 do Fundo Partidário e deveria ter aplicado, no mínimo, 5% desse valor para promover a participação das mulheres na política – o que equivale a R$ 1.542.509,76.4.2. Contudo, na referida rubrica, a agremiação apresentou despesas que somam apenas R$ 81.327,86. Dessa quantia de R$ 81.327,86, o montante de R$ 61.365,75 não foi devidamente comprovado. Assim, apenas o valor de R$ 19.962,11 ficou comprovado, deixando o partido de empregar a quantia de R$ 1.522.547,65 em programas de incentivo à participação das mulheres na política.5. Conclusão: contas desaprovadas5.1. Conforme a jurisprudência deste Tribunal Superior, a irregularidade no incentivo à participação feminina na política, que foi de R$ 1.522.547,65, deve ser somada às demais falhas referentes ao Fundo Partidário, de forma que se possa chegar ao percentual tido por irregular.5.2. O art. 55–C da Lei nº 9.096/1995, embora não permita a desaprovação das contas em virtude do descumprimento do art. 44, V, não revogou a obrigação em apreço e, por isso, quando não observada a disposição cogente, o valor não destinado deve compor o cálculo das irregularidades.5.3. O total de irregularidades encontradas nas contas do PDT relativas ao exercício financeiro de 2015 alcança o valor de R$ 4.477.445,05 (que se refere aos recursos do Fundo Partidário irregularmente utilizados ou que não foram devidamente comprovados, além dos que não foram aplicados no programa previsto no art. 44, V, da Lei dos Partidos Políticos), o que representa aproximadamente 14,51% do total que o partido recebeu do Fundo Partidário em 2015 (R$ 30.850.195,23).6. Determinação6.1. Devolução ao erário do valor de R$ 2.954.897,40, referente à utilização irregular do Fundo Partidário ou dos valores que não foram suficientemente comprovados, a ser devidamente atualizado e pago com recursos próprios.6.2. Aplicação, no exercício seguinte ao trânsito em julgado desta decisão, do valor não empregado no exercício de 2015, devidamente atualizado, salvo se em exercícios posteriores já o tiver feito, acrescidos 2,5% do valor recebido do Fundo Partidário, relativos a essa destinação no exercício de 2015.6.3. Suspensão do repasse de uma cota do Fundo Partidário, a ser cumprida de forma parcelada, em quatro vezes, com valores iguais e consecutivamente, a fim de manter o regular funcionamento do partido.