Jurisprudência TSE 1186 de 20 de setembro de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Benedito Gonçalves
Data de Julgamento
08/09/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Alexandre de Moraes (Presidente).Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSOS ESPECIAIS. ELEIÇÕES 2016. PREFEITO. AÇÃO PENAL. CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO PARA FINS ELEITORAIS. ART. 353 DO CÓDIGO ELEITORAL. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. AFRONTA. NÃO CONFIGURAÇÃO. QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA. ILICITUDE PROBATÓRIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. INVIABILIDADE. MÉRITO. CÓPIA NÃO AUTENTICADA. TIPICIDADE DA CONDUTA. MATERIALIDADE DELITIVA E AUTORIA. COMPROVAÇÃO. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. OBSCURIDADE. AUSÊNCIA. REJEIÇÃO.1. Em aresto unânime, esta Corte Superior confirmou acórdão do TRE/GO em que se condenaram ex–prefeito de Rio Quente/GO e seu sobrinho pelo crime do art. 353 do Código Eleitoral, por terem utilizado documento falso – decreto fictício de exoneração do primeiro embargante de cargo público comissionado (médico perito) – em processo de registro de candidatura ao pleito de 2016 com objetivo de forjar sua desincompatibilização, o que induziu a erro aquele Colegiado. As penas foram fixadas em quatro anos de reclusão e 25 dias–multa e, ainda, três anos de reclusão e 20 dias–multa, ambas substituídas por prestação pecuniária e serviços comunitários.2. No aresto que se embarga, assentou–se a ausência de violação ao princípio do juiz natural, visto que o juízo da 7ª ZE/GO é, de fato, o competente para o feito. Como se demonstrou, na denúncia se imputaram, além do uso de documento falso, sua falsificação e o crime de fraude processual, condutas praticadas naquela comarca. De todo modo, a suposta incompetência territorial foi aduzida pela primeira vez em sede de declaratórios opostos no Tribunal a quo, ou seja, quando já havia ocorrido preclusão, nos termos do art. 108 do CPP.3. Também se destacou ser inviável conhecer da suposta nulidade por quebra da cadeia de custódia, tendo em vista a falta de demonstração de eventual prejuízo advindo da perícia indireta, nos termos do art. 219, caput, do Código Eleitoral. Na espécie, a perícia feita sobre imagem estática (printscreen) do suposto decreto municipal não foi determinante para se concluir pelo cometimento do crime, visto que a materialidade delitiva foi comprovada por meios indiretos, com base em "documentos oficiais, depoimentos judicializados e até pela relação oficial dos decretos expedidos pelo Prefeito municipal" e, a esse respeito, não se alegou prejuízo.4. Quanto ao indeferimento do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), expôs–se que a jurisprudência dos Tribunais Superiores é de que a regra do art. 28–A do CPP, incluída pela Lei 13.964/2019, não retroage nos casos em que a denúncia já tinha sido recebida ao tempo da inovação legislativa. No caso, inaplicável o novo instrumento jurídico, uma que vez já havia até sentença de mérito quando publicada referida Lei.5. No que concerne à matéria de fundo, explanou–se que o c. Superior Tribunal de Justiça, em julgado inteiramente aplicável ao caso, já assentou que cabe distinguir a falsificação de uma simples fotocópia (algo destituído de relevância penal) daquela engendrada "por meio" de uma fotocópia, como na espécie, sempre que essa cópia, convertida em documento distinto e autônomo, possuir potencialidade lesiva, por se mostrar apta a produzir o resultado almejado com a falsidade. No mesmo sentido, esta Corte já decidiu que cópia reprográfica inautêntica, se for apta a iludir, macula a fé pública, bem jurídico protegido contra a falsificação documental, de modo que o seu uso torna típica a conduta.6. Na espécie, o documento falsificado consiste em cópia de um suposto decreto que teria sido emitido pelo então prefeito de Rio Quente–GO (Decreto 109, de 19 de abril 2016), em que se exonera João Pena de Paiva do cargo comissionado de médico perito do instituto de previdência social do município em tempo hábil para concorrer ao cargo majoritário no pleito de 2016.7. Conforme se exibiu no aresto, dentro dos limites fáticos delineados no aresto regional, a materialidade do crime de uso de documento falso para fins eleitorais ficou sobejamente comprovada, haja vista que a adulteração do escrito foi demonstrada por meio de exame de corpo de delito indireto, nos termos do art. 158 do CPP, em que a polícia constatou que a cópia do suposto Decreto 109 "consiste em uma reprodução impressa de um documento montado com aproveitamento de partes do decreto n° 106". Além disso, depoimentos testemunhais e a lista de decretos oficiais do município entre janeiro a setembro de 2016 permitiram concluir, com segurança, que o referido Decreto 109 nunca existiu.8. Ressaltou–se que o potencial lesivo da cópia do escrito adulterado e a sua utilização com fins eleitorais também são incontestes, na medida em que ele foi juntado a processo judicial e efetivamente serviu para ludibriar o TRE/GO, que, com fundamento nele, reformou decisum anterior para deferir o registro de candidatura do primeiro recorrente ao cargo majoritário de Rio Quente/GO em 2016.9. Destacou–se, ainda, que as diversas e contraditórias versões dos fatos apresentadas pelo ex–prefeito confirmam que ele não apenas sabia da inexistência do suposto decreto, como anuiu com o uso do documento fictício no processo judicial, por meio de seus advogados, configurando–se a sua autoria mediata. Quanto ao seu sobrinho, corréu, que também é profissional da advocacia, revelou–se nos autos que ele remeteu a cópia do papel sabidamente falso para ser juntado, por outro advogado, no processo que tramitava no TRE/GO. Não há dúvida, portanto, da materialidade do crime nem de sua autoria.10. Por fim, em relação ao alegado excesso na dosimetria da pena, sublinhou–se a falta de demonstração, de forma objetiva, da maneira como o aresto regional contrariou os arts. 59 e 60 do Código Penal de modo a incidir em bis in idem, o que impossibilita o processamento do recurso por impossibilidade de se compreender a controvérsia (Súmula 27/TSE).11. Os supostos vícios apontados denotam propósito de rediscutir matéria já decidida, providência inviável na via aclaratória. Precedentes.12. A interposição de recursos de caráter manifestamente protelatório, insistindo–se no debate de teses julgadas e esclarecidas de modo exaustivo, pode vir a ensejar multa com base nos arts. 80, VII, e 81 do CPC/2015 ou do art. 275, § 6º, do Código Eleitoral.13. Embargos de declaração rejeitados.