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Jurisprudência TSE 060400451 de 13 de dezembro de 2021

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Luis Felipe Salomão

Data de Julgamento

19/10/2021

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao recurso ordinário para julgar procedente o pedido formulado na representação e cassar os diplomas dos recorridos, determinando a imediata comunicação ao Tribunal Regional para que, independentemente da publicação de acórdão, proceda à retotalização das eleições para os cargos de deputado estadual e deputado federal do Paraná, computando¿se como anulados os votos atribuídos aos recorridos, nos termos do voto do Relator. Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Ementa

RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. SUPLENTE DE DEPUTADO FEDERAL. CAPTAÇÃO E GASTOS ILÍCITOS DE RECURSOS DE CAMPANHA. ART. 30–A DA LEI 9.504/97. DOAÇÃO. PESSOA JURÍDICA. ASSOCIAÇÃO. FONTE VEDADA. CUSTEIO. INFORMATIVO. PROPAGANDA OSTENSIVA. CIÊNCIA. PARTICIPAÇÃO ATIVA. CANDIDATOS. GRAVIDADE. OMISSÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. NÚMERO EXPRESSIVO DE EXEMPLARES. PERCENTUAL ELEVADO. GASTOS DE CAMPANHA. PROVIMENTO. 1. Recurso ordinário interposto pelo Ministério Público contra acórdão prolatado pelo TRE/PR, que, por maioria de votos, julgou improcedente o pedido em representação por arrecadação e gastos ilícitos de recursos de campanha (art. 30–A da Lei 9.504/97), proposta em desfavor de Deputado Estadual e de suplente de Deputado Federal pelo Paraná eleitos em 2018, envolvendo o recebimento de receita de fonte vedada (pessoa jurídica). 2. O bem jurídico tutelado pelo art. 30–A da Lei 9.504/97 é a lisura da campanha, tendo como propósito assegurar que a disputa seja financiada de modo transparente e equânime, dentro dos parâmetros e vedações legais. Nesse cenário, o Supremo Tribunal Federal, na ADI 4.650, Rel. Min. Luiz Fux, de 17/9/2015, assentou a impossibilidade de pessoas jurídicas contribuírem de forma direta ou indireta – inclusive mediante propaganda – em pleitos eleitorais, entendimento incorporado na reforma empreendida pela Lei 13.165/2015. 3. No caso, não se discute que a Associação dos Militares da Reserva, Reformados e Pensionistas das Forças Armadas do Paraná (ASMIR/PR) divulgou informativo impresso, faltando menos de um mês para o pleito, com tiragem de 19.800 exemplares, contendo ostensiva propaganda dos recorridos. 4. A natureza eleitoreira da publicação foi reconhecida pela própria entidade ao assentar, em resposta a ofício do Ministério Público, que houve "propaganda eleitoral constante no Boletim de setembro/2018" e que "o material contendo a propaganda foi divulgado na sede da Associação e aos seus associados através de mala direta". 5. As oito laudas do informativo corroboram a vasta propaganda: (a) já na capa constam os nomes, cargos e números de urna dos recorridos; (b) o presidente da entidade, em sua coluna, pediu votos a eles; (c) na terceira e quarta laudas, há duas cartas, em nome de cada um dos candidatos, contendo suas fotografias e mais uma vez os números de campanha e pedidos de votos; (d) reproduziram–se santinhos das candidaturas em duas laudas. 6. Ao contrário do que se assentou na origem, as provas dos autos revelam a ciência e a participação ativa dos recorridos. Nos termos do art. 23 da LC 64/90, "o Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos [...]", ao passo que, de acordo com esta Corte, o conjunto de indícios harmônico, convergente e dotado de lastro documental autoriza reconhecer os fatos alegados. 7. É inequívoco que os recorridos compareceram pessoalmente à assembleia–geral da entidade em 21/7/2018, quando se decidiu apoiar as candidaturas. A respectiva ata revela que "foi dada a palavra aos dois candidatos para que apresentassem seus planos de campanha, pleiteando o apoio dos sócios da ASMIR/PR". 8. As duas cartas do informativo estão em nome dos recorridos e em primeira pessoa, empregando–se orações como "estamos com a oportunidade de decidir o que queremos"; "o Brasil precisa da nossa unidade"; "peço o seu [...] voto"; "este ano terei uma das missões mais importantes e desafiadoras dos meus 46 anos de existência"; "conto com o seu apoio, seu voto", dentre outras. Os candidatos aduzem que foi a entidade quem produziu as cartas a partir de material extraído de suas próprias redes sociais, porém em nenhum momento juntaram as supostas publicações. 9. O primeiro recorrido, candidato ao cargo federal, presidiu a entidade até janeiro de 2018, o que reforça sua plena ciência e efetiva participação. Além disso, seu sucessor na ASMIR/PR declarou em juízo – ainda que como informante – que era de conhecimento geral qual seria o conteúdo da publicação e que todos estavam de acordo. 10. Segundo esta Corte, "para a procedência do pedido formulado na representação pelo art. 30–A, é preciso, ainda, aferir a gravidade da conduta reputada ilegal, que pode ser demonstrada tanto pela relevância jurídica da irregularidade quanto pela ilegalidade qualificada, marcada pela má–fé do candidato. Precedentes" (AgR–REspe 310–48/RS, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 25/8/2020). No caso, uma série de fatores denota a gravidade dos ilícitos. 11. Como assentou a Procuradoria–Geral Eleitoral, chama a atenção a "ilegalidade qualificada do comportamento dos recorridos", visto que "a) receberam doação de pessoa jurídica, o que é vedado; e b) omitiram a doação indevida de suas prestações de contas de forma proposital, [...] o que denota a existência de má–fé" (ID 20.303.288). 12. Salta aos olhos a discrepância de tiragem entre o informativo contendo a propaganda e os pretéritos. A entidade possui pouco mais de 300 membros e os encartes anteriores tinham de 500 a 600 exemplares. Porém, em setembro de 2018, produziram–se 19.800, mais de 60 vezes o número de sócios, pois, segundo seu presidente, era necessário "atingir todo mundo". 13. Os recorridos invertem a presunção dos fatos ao afirmarem que o material não teve o "condão de alterar ou afetar os votos dos eleitores [...], pois estava sendo divulgado no meio militar e para pessoas que convivem e partilham desses mesmos ideais". As circunstâncias revelam cenário distinto, pois ao fim e ao cabo mais de 19.000 exemplares destinaram–se a não associados e a representação originou–se de denúncia ao Ministério Público de eleitor que recebeu o informativo. 14. A entrega ocorreu pelos correios e de forma presencial na sede da entidade, a qualquer pessoa que se interessasse em promover a campanha, conforme resposta da associação a ofício do Ministério Público e mensagem na própria publicação, no sentido de que "todos que quiserem ajudar procurem–nos na sede da ASMIR, pois disponibilizaremos material de divulgação e propaganda e sua contribuição será de grande valia". 15. O montante para produzir e distribuir o material, de R$ 12.382,00, equivaleu aos expressivos percentuais de 31,7% e 76,29% dos gastos de campanha dos recorridos. 16. O encarte foi distribuído faltando pouco mais de 20 dias para as Eleições 2018, em quantitativo superior ao número de votos do recorrido para o cargo de deputado estadual (13.047) e próximo ao de votos do outro recorrido (22.878). 17. Diante da inequívoca doação oriunda de fonte vedada, com ciência e participação dos candidatos, além das graves circunstâncias presentes, impõe–se a procedência dos pedidos. 18. Recurso ordinário provido para cassar os diplomas dos recorridos, com imediata execução do aresto, independentemente de publicação, e recálculo dos quocientes eleitoral e partidário.


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