Jurisprudência TSE 060259789 de 13 de dezembro de 2022
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Benedito Gonçalves
Data de Julgamento
13/12/2022
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao recurso ordinário, indeferindo o pedido de registro de candidatura de João Teixeira Júnior ao cargo de Deputado Estadual, nas eleições de 2022, determinando que os votos a ele atribuídos sejam contados em favor da respectiva legenda e que se comunique, de imediato, ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros: Raul Araújo, Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes (Presidente). Acórdão publicado em sessão.Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2022. DEPUTADO ESTADUAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. REJEIÇÃO DE CONTAS PÚBLICAS. ART. 1º, I, G, DA LC 64/90.1. Recurso ordinário interposto contra acórdão do TRE/SP em que se deferiu o registro do ora recorrido, candidato não eleito ao cargo de deputado estadual de São Paulo nas Eleições 2022 (obteve 6.990 votos), afastando–se a inelegibilidade do art. 1º, I, g, da LC 64/90 (rejeição de contas públicas), em decorrência da regra do § 4º–A do mesmo dispositivo legal.INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO DO § 4º–A DO ART. 1º DA LC 64/90. APLICAÇÃO APENAS NAS HIPÓTESES DE JULGAMENTO POR TRIBUNAIS DE CONTAS. MORALIDADE E PROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROTEÇÃO. ADEQUADA CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO.2. Consoante o art. 1º, inciso I, alínea g, da LC 64/90, são inelegíveis "os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário, para as eleições que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes [...]".3. De acordo com o art. 1º, § 4º–A, da LC 64/90, incluído pela LC 184/2021, "[a] inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do caput deste artigo não se aplica aos responsáveis que tenham tido suas contas julgadas irregulares sem imputação de débito e sancionados exclusivamente com o pagamento de multa".4. A Constituição brasileira prevê sistema de controle externo em que a fiscalização dos gestores públicos é exercida por dois órgãos autônomos – Poder Legislativo e Tribunais de Contas – com distintas competências estabelecidas no próprio texto constitucional (arts. 49, IX, 70 e 71 da CF/88).5. Nas hipóteses em que o Tribunal de Contas da União é competente para julgar as contas (art. 71, II, da CF/88), há previsão constitucional expressa de imposição de multa e de imputação de débito (art. 71, VIII e § 3º, da CF/88), o que também se aplica ao julgamento pelas demais Cortes de Contas. Por sua vez, o Poder Legislativo, ao julgar contas anuais de chefe do Executivo – e, no caso de prefeitos, também as contas de exercício – limita–se a decidir por sua aprovação, aprovação com ressalvas ou rejeição, não se prevendo qualquer espécie de penalidade.6. Impõe–se conferir interpretação conforme a Constituição ao § 4º–A do art. 1º da LC 64/90 a fim de que essa regra incida apenas nas hipóteses de julgamento de gestores públicos pelos tribunais de contas. Não se afigura razoável que o dispositivo seja aplicado de modo absolutamente incompatível com a proteção dos valores da probidade administrativa e da moralidade para exercício de mandato, especialmente destacados no art. 14, § 9º, da CF/88, o que ocorreria caso os chefes do Poder Executivo fossem excluídos de forma automática da incidência dessa causa de inelegibilidade, já que no julgamento de suas contas anuais e de exercício não há imputação de débito ou imposição de multa.CASO DOS AUTOS. CONTAS DE PREFEITO. JULGAMENTO PELA CÂMARA MUNICIPAL. § 4º–A DO ART. 1º DA LC 64/90. INAPLICABILIDADE. REJEIÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIOS FINANCEIROS DE 2018 E 2019. IRREGULARIDADES INSANÁVEIS. ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE. CARACTERIZAÇÃO. INELEGIBILIDADE CONFIGURADA.7. Na linha do que decidiu esta Corte em recentíssimo julgado, "a nova redação da Lei de Improbidade Administrativa passou a exigir o dolo específico para a configuração do ato de improbidade administrativa", o que se aplica à causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC 64/90 (RO 0601046–26/PE, redator para acórdão Min. Ricardo Lewandowski, publicado em sessão em 10/11/2022).8. Na espécie, é incontroverso que o recorrido, na qualidade de Prefeito de Rio Claro/SP, teve contas públicas relativas aos exercícios de 2018 e 2019 rejeitadas pelo Poder Legislativo do município.9. As contas do exercício de 2018 foram rejeitadas por meio do Decreto Legislativo nº 640, de 8/9/2021 em decorrência da falta de recolhimento de obrigações previdenciárias. As contas de 2019, por sua vez, foram desaprovadas por meio do Decreto Legislativo nº 662, de 29/6/2022, tendo em vista, entre outras irregularidades, déficit de execução orçamentária, elevação do endividamento e falta de pagamento de encargos previdenciários.10. Assume particular gravidade o déficit de execução orçamentária, tendo em vista o expressivo valor da irregularidade, superior a quatorze milhões de reais, bem como a circunstância apontada no parecer prévio do TCE/SP de que "o resultado orçamentário deficitário contribuiu para a elevação do déficit financeiro do exercício anterior, que passou a ser de R$ 53.051.868,31 (cinquenta e três milhões e cinquenta e um mil oitocentos e sessenta e oito reais e trinta e um centavos) em 2019".11. A presença de dolo específico do gestor público é patente no caso, pois se registrou no parecer prévio que "o Município foi alertado tempestivamente, por sete vezes, sobre desajustes em sua execução orçamentária e que o interessado não apresentou justificativas em relação aos apontamentos efetuados".12. Da mesma forma, constitui falha insanável que configura ato doloso de improbidade a reiterada falta de recolhimento de encargos sociais ao regime de previdência do município. Em 2018, identificou–se não terem sido recolhidas as contribuições patronais no valor total de R$ 14.191.299,08 e a ausência de aporte para cobertura do déficit atuarial no montante de R$ 12.888.310,51. Já em 2019, a irregularidade atingiu o elevado importe de R$ 65.019.530,29. 13. Impõe–se reconhecer o dolo específico do gestor também neste ponto, considerando–se a reiteração e o agravamento das condutas do exercício de 2018 para o de 2019 e, ainda, o fato de não terem sido realizados nem mesmo o pagamento de todas as parcelas vencidas no exercício em relação a dois acordos judiciais de parcelamento com o RPPS e o parcelamento junto ao FGTS.CONCLUSÃO. PROVIMENTO DO RECURSO. INDEFERIMENTO DO REGISTRO DE CANDIDATURA.14. Recurso ordinário a que se dá provimento para indeferir o registro de candidatura do recorrido ao cargo de deputado estadual de São Paulo nas Eleições 2022.