Jurisprudência TSE 060202644 de 14 de novembro de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Floriano De Azevedo Marques
Data de Julgamento
17/08/2023
Decisão
Julgamento conjunto: REspEl nº 0600213-59 e TutCautAnt nº 0602026-44.Decisão: O Tribunal, por unanimidade, afastou a questão preliminar e, no mérito, por maioria, deu provimento aos recursos especiais interpostos por Celso Cota Neto e pela Coligação Avança Mariana, a fim de reformar o acórdão recorrido e deferir o pedido de registro de candidatura do primeiro recorrente ao cargo de prefeito do Município de Mariana/MG no pleito de 2020, determinando, em consequência, o cômputo dos respectivos votos e a diplomação dos eleitos, com a imediata execução do julgado, independentemente da publicação do acórdão, e determinou ainda que o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais adote as providências necessárias à diplomação e posse dos eleitos, mediante, entre outras providências, a comunicação ao Juízo Eleitoral da 171ª (centésima septuagésima primeira) Zona Eleitoral e à Câmara Municipal de Mariana/MG, e julgou procedente o pedido da tutela antecipada antecedente, nos termos do voto do relator, vencidos parcialmente a Ministra Cármen Lúcia e o Ministro Nunes Marques.Acompanharam integralmente o relator, os Ministros André Ramos Tavares, Benedito Gonçalves, Raul Araújo e Alexandre de Moraes.Composição: Ministros Alexandre de Moraes (presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares. Vice-Procurador-Geral Eleitoral: Paulo Gustavo Gonet Branco.
Ementa
RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. ELEIÇÕES 2020. INDEFERIMENTO. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. PLENO EXERCÍCIO DOS DIREITOS POLÍTICOS. CONDENAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ESCOAMENTO DO PRAZO DA SANÇÃO. FILIAÇÃO TIDA COMO REGULAR EM PROCESSO ESPECÍFICO. PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA. VIOLAÇÃO AO ART. 24 DA LINDB. PROVIMENTO.SÍNTESE DO CASO1. Trata-se de recursos especiais eleitorais interpostos em face de acórdão do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais que, por maioria, negou provimento a recurso eleitoral e manteve a sentença do Juízo da 171ª Zona Eleitoral daquele Estado que indeferiu o pedido de registro de candidatura do recorrente ao cargo de prefeito do Município de Mariana/MG, nas Eleições de 2020, por não atendimento das condições de elegibilidades previstas no art. 14, § 3º, II, III e V, da Constituição Federal, e declarou nula a filiação do impugnado ao MDB, com fundamento no art. 16 da Lei 9.096/95.2. Durante o processamento do feito, foi indeferido pedido de assistência formulado pelo Diretório Municipal do Partido Social Democrático do Município de Mariana/MG.3. Paralelamente, foi ajuizada a Tutela Antecipada 0602026-44.2022.6.00.0000, cujo pedido liminar foi parcialmente deferido pela Presidência desta Corte Superior, apenas para o fim de impedir a realização de novas eleições até o julgamento do apelo nesta instância especial.ANÁLISE DOS RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS4. Ficou consignado no acórdão atinente aos embargos de declaração que, em se tratando de sanção decorrente da prática de improbidade administrativa, deve ser observado o decreto condenatório do órgão competente para conhecer da matéria e decidir sobre ela, sob pena de invasão na esfera de competência de outros órgãos jurisdicionais.5. Devidamente enfrentada a matéria alusiva à autoaplicabilidade da suspensão dos direitos políticos, descabe falar em mácula ao art. 275 do Código Eleitoral, pois "a omissão apta a ser suprida pelos declaratórios é aquela advinda do próprio julgamento e prejudicial à compreensão da causa, não aquela deduzida com o fito de provocar o rejulgamento da demanda ou modificar o entendimento manifestado pelo julgador" (ED-AgR-AI 10.804, rel. Min. Marcelo Ribeiro, DJE de 1º.2.2011).6. Das premissas do acórdão recorrido, extrai-se o seguinte:i. o candidato foi condenado à pena de suspensão de direitos políticos pelo prazo de 7 anos, no Processo 0054955-40.2002.8.13.0400, por ato de improbidade administrativa, com sentença cujo juízo de origem certificou que a AIA teria transitado em julgado em 9.11.2009, o que se tornaria originalmente o termo inicial da contagem do prazo, nos termos do art. 20 da Lei 8.429/92;ii. em 2.6.2010, foi concedida tutela antecipada em ação rescisória, suspendendo os efeitos da condenação na ação de improbidade;iii. o pedido da ação rescisória foi julgado improcedente em 2.6.2015, data em que foi revogada a liminar antes deferida;iv. em 28.3.2016, o Juízo da 1ª Vara Cível Criminal e da Infância e da Juventude da Comarca de Mariana/MG, órgão competente para o acompanhamento da execução das sanções impostas na ação de improbidade, comunicou a suspensão dos direitos políticos do candidato, ocasião em que certificou, novamente, que a data do trânsito em julgado seria 9.11.2009, bem como ressaltou o entendimento, de sua lavra, de que deveria ser decotado o lapso temporal em que os efeitos da sentença ficaram suspensos, por força da tutela antecipada concedida na ação rescisória, ou seja, entre 2.6.2010 e 2.6.2015;v. em 22.2.2021, foi exarada decisão, em sede de reclamação perante o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reconheceu que a data correta de início do trânsito em julgado da condenação seria 20.10.2008, dada a deserção de recurso não a data registrada originalmente pelo juízo de piso, declarando então que o trânsito em julgado do acórdão proferido na ação de improbidade se iniciara mais de um ano antes;vi. em sede de embargos de declaração, a Corte Regional Eleitoral firmou entendimento de que a data reconhecida pelo Tribunal de Justiça de MG não deveria ser conhecida ¿ embora tivesse se tornado a data correta pela Justiça Comum competente para julgar a ação originadora da improbidade porquanto a decisão fora proferida após a data da diplomação, razão pela qual manteve o indeferimento do registro de candidatura.7. Nos termos da jurisprudência do TSE: "A Justiça Eleitoral não deve se imiscuir nas razões de decidir dos julgados, que importem causa de inelegibilidade, proferidos por outros órgãos julgadores, a fim de se manifestar acerca do acerto ou desacerto do decisum. Inteligência do Enunciado de Súmula nº 41 do TSE" (REspe 172-42, rel. Min. Luiz Fux, PSESS em 19.12.2016).8. Ocorre, porém, que a Justiça Comum decidiu que a fluência do prazo de suspensão dos direitos políticos se iniciara mais de um ano antes do originalmente demarcado posto ser incontroverso que houve deserção do recurso extraordinário interposto na ação de improbidade e que o édito condenatório proferido naquele feito alcançou a imutabilidade em 20.10.2008, circunstância fática passível de revaloração jurídica em sede de recurso especial eleitoral sem ultraje às Súmulas 24 e 41 desta Corte Superior.9. De acordo com o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, "os recursos excepcionais (extraordinário e especial), quando declarados inadmissíveis, não obstam a formação da coisa julgada, inclusive da coisa julgada penal, retroagindo a data do trânsito em julgado, em virtude do juízo negativo de admissibilidade, ao momento em que esgotado o prazo legal de interposição das espécies recursais não admitidas" (RE 921.449, AgR-segundo-ED-EDv-AgR, Pleno, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE de 2.4.2200), entendimento aplicável ao caso dos autos.10. Independentemente do debate acerca do conhecimento do fato superveniente que sobreveio após a data da diplomação, exsurge da moldura fática do acórdão recorrido que a pena de suspensão dos direitos políticos, fixada em 7 anos, teve como dies a quo a data 20.10.2008, permaneceu suspensa entre 2.6.2010 e 2.6.2015, e findou em 19.10.2020, antes da data do pleito de 2020, que ocorreu em 15.11.2020, nos termos do art. 1º da Emenda Constitucional 107/2020.11. No caso, há circunstâncias peculiares, verdadeiramente excepcionais, que impactam no exame do preenchimento da condição de elegibilidade alusiva ao prazo mínimo de filiação partidária, a saber:i. ainda antes do registro de candidatura, o recorrente buscou, no processo administrativo de filiação partidária, atestar a regularidade de seu vínculo com a grei;ii. inicialmente, o Juízo Eleitoral de piso indeferiu o pedido de anotação da filiação partidária, em razão da fluência de prazo de suspensão dos direitos políticos, tendo sido interposto recurso pelo interessado;iii. ao apreciar o recurso, o relator no Tribunal Regional Eleitoral constatou, após provocação da parte, que o vínculo partidário cujo reconhecimento se pretendia no apelo estava regular, válido e tempestivo, razão pela qual proferiu decisão extintiva sem resolução do mérito;12. A despeito da incontroversa suspensão dos direitos políticos à época da filiação ao MDB, é certo que o então pré-candidato, ora recorrente, tinha duas circunstâncias indicativas da validade da sua filiação, ou ao menos da razoável crença de que ela estaria válida, a saber: (i) a informação, extraída do sítio deste Tribunal Superior Eleitoral, de que estava regularmente filiado ao MDB, a qual, uma vez submetida ao descortino do Poder Judiciário eleitoral, foi corroborada pela (ii) decisão extintiva na qual se reconheceu a validade do vínculo conforme se requeria no recurso, bem como se assentou a respectiva anterioridade ao pleito.13. Segundo autorizadas doutrina e jurisprudência, os princípios da segurança jurídica e da proteção à confiança legítima podem ser aplicados para resguardar a perspectiva do cidadão em participar no prélio eleitoral, quando ele estiver secundado por justa expectativa decorrente de posturas contraditórias da administração.14. No caso, tendo a Justiça Eleitoral assentado, no processo específico de filiação, a validade, regularidade e tempestividade do vínculo partidário, a revisão dessa conclusão em sede de registro de candidatura conflitaria com a Súmula 52/TSE, segundo a qual: "Em registro de candidatura, não cabe examinar o acerto ou desacerto da decisão que examinou, em processo específico, a filiação partidária do eleitor".15. Deferido o registro de candidatura dos recorrentes, deve ser executado imediatamente o acórdão, independentemente de publicação, computando-se como válidos os respectivos votos e adotando-se as providências necessárias à diplomação e posse dos eleitos.CONCLUSÃORecursos especiais aos quais se dá provimento. Tutela Cautelar Antecedente cujo pedido se julga procedente.