Jurisprudência TSE 060190261 de 18 de outubro de 2022
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Benedito Gonçalves
Data de Julgamento
29/09/2022
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros: Raul Araújo, Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes (Presidente).Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
AGRAVO INTERNO. RECURSO ORDINÁRIO. ELEIÇÕES 2018. DEPUTADO ESTADUAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97.1. No decisum monocrático, manteve–se aresto do TRE/RR em que se julgaram procedentes os pedidos formulados em Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) por fraude à cota de gênero (art. 10 § 3º, da Lei 9.504/97), cassando–se o mandato do candidato eleito e os diplomas dos suplentes, além de se anularem os votos recebidos pela coligação e se determinar o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário.PRELIMINARES. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AJUIZAMENTO DE AIME PARA APURAR FRAUDE À COTA DE GÊNERO. AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. DECADÊNCIA. REJEIÇÃO.2. Não há falar em inadequação da via eleita, pois, conforme entende esta Corte Superior, "[é] cabível o ajuizamento da AIME para apurar fraude à cota de gênero. Entendimento contrário acarretaria violação ao direito de ação e à inafastabilidade da jurisdição" (AgR–REspEl 1–62/RS, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 29/6/2020).3. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, a coligação ou o partido político não é litisconsorte passivo necessário em Ações de Impugnação de Mandato Eletivo (AIMEs) em que se discute fraude à cota de gênero. Isso porque a legitimidade passiva ad causam nessa espécie de ação restringe–se aos candidatos eleitos.PRELIMINAR. DECISÃO SURPRESA. ART. 10 DO CPC/2015. OFENSA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. INOCORRÊNCIA.4. Nos termos do art. 10 do CPC/2015, "[o] juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício".5. O agravante aduz que a procedência dos pedidos na AIME deu–se "com base em fundamentos estranhos aos autos e sobre os quais não se oportunizou aos réus o direito ao contraditório". No entanto, como se verá no exame do tema de fundo, é inequívoco que foram levados em conta fatos e provas aduzidos desde a exordial.MÉRITO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CANDIDATURAS FICTÍCIAS. VOTAÇÃO INEXPRESSIVA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. FALTA DE ENVOLVIMENTO COM A CAMPANHA. FRAUDE CONFIGURADA.6. De acordo com a jurisprudência desta Corte, a prova de fraude na cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias fáticas do caso a denotar o incontroverso objetivo de burlar o mínimo de isonomia entre homens e mulheres que o legislador pretendeu assegurar no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97.7. Na espécie, o TRE/RR reconheceu a fraude à cota de gênero com base em dois fundamentos: indicação de candidaturas femininas em número insuficiente e lançamento de candidaturas fictícias. Contudo, no decisum agravado, consignou–se, quanto ao número de candidaturas femininas apresentadas, a inexistência de elementos aptos a caracterizar a fraude no DRAP. Dessa forma, a irresignação do agravante limita–se ao lançamento das candidaturas fictícias.8. Quanto ao ponto, o TRE/RR reconheceu a fraude, considerando que, para além da votação inexpressiva, as prestações de contas das candidatas revelam que a maior parte dos recursos recebidos foi destinada à contratação de parentes para suposta militância e nem "sequer apontam gastos que indiquem a prática efetiva de campanha eleitoral, não havendo qualquer dispêndio, ainda que mínimo, com material publicitário, revelando a ausência de engajamento".9. Embora o agravante alegue que o TRE/RR baseou a condenação em fundamentos estranhos aos autos, não há falar em decisão surpresa. É absolutamente inequívoco que, desde a inicial, alegaram–se as teses de votação inexpressiva, de falta de confecção de material de propaganda e de ausência de declaração de gastos dessa natureza nas contas de campanha.10. Desse modo, não se trata de alegações que surgiram apenas no curso do processo, mas de teses a respeito das quais a parte contrária teve conhecimento e oportunidade de se manifestar desde o início. Assim, não há falar em decisão surpresa.11. Ademais, a despeito de a relatora do aresto a quo ter consignado em seu voto que era necessário juntar aos autos o inteiro teor dos processos de contas das candidatas, os documentos para embasar as conclusões a que se chegou foram juntados já na inicial.12. Constam dos autos os documentos referentes ao demonstrativo de receitas e despesas e ao relatório de despesas efetuadas da candidata Wandna Fernandes Taveira da Silva, os quais permitem concluir que não houve nenhum gasto com material publicitário e que o valor de R$ 810,00 foi usado para atividades de militância e mobilização de rua, com a contratação do cabo eleitoral Vandi Fernandes Taveira, parente da candidata.13. Já no que se refere à candidata Michele Andrade Giordani, constam o demonstrativo de receitas e despesas e o relatório de despesas efetuadas, os quais revelam que também não houve gastos com material publicitário e que foram utilizados R$ 2.096,00 com supostas atividades de militância, sendo que destes R$ 1.096,00 e R$ 1.000,00 se destinaram, respectivamente, para contratar os cabos eleitorais Marco Rodrigo Giordane e Augusto Macedo de Andrade, também parentes da candidata.14. A conclusão da Corte de origem, no sentido de que se está "diante de eleição cujas candidatas praticamente não receberam votos, não praticaram atos de campanha e gastaram o pouco recurso que receberam com a contratação de parentes, o que afasta qualquer dúvida quanto ao caráter fictício de tais candidaturas", ampara–se nas provas colacionadas aos autos desde a inicial, a que o agravante teve acesso e sobre as quais poderia ter se manifestado.15. Considerando a votação inexpressiva obtida pelas candidatas (zero e um voto), a falta de envolvimento em suas campanhas eleitorais, sem nenhum dispêndio com material publicitário, e a mera contratação de parentes para suposta atividade de militância, há elementos robustos o bastante para se reconhecer a fraude à cota de gênero.16. Caracterizada a fraude, tem–se como consequência a cassação de toda a coligação beneficiada, sob pena de perpetuar a burla à previsão de mínima isonomia de gênero prevista no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97, nos termos do remansoso entendimento desta Corte Superior.CONCLUSÃO. 17. Agravo interno a que se nega provimento.