Jurisprudência TSE 060178858 de 19 de setembro de 2022
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Mauro Campbell Marques
Data de Julgamento
02/09/2022
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao recurso ordinário, a fim de tornar insubsistente a pena aplicada ao recorrente, nos termos do voto do Relator. Falou pelo recorrente, Carlos Avalone Júnior, o Dr. Felipe Fernandes de Carvalho. Votaram com o Relator os Ministros: Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes (Presidente).Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
ELEIÇÕES 2018. RECURSO ORDINÁRIO. REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. CANDIDATO AO CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. APREENSÃO DE VULTOSA QUANTIA, EM DINHEIRO, EM VEÍCULO UTILIZADO NA CAMPANHA ELEITORAL. AGENDA MANUSCRITA E SANTINHOS. ALEGAÇÃO DE NULIDADES. DECADÊNCIA POR AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO NO MOMENTO OPORTUNO. ALTERAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR. ACOLHIMENTO. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.1. Na origem, o MPE ajuizou representação, embasada no art. 41–A da Lei nº 9.504/1997, por captação ilícita de sufrágio em desfavor de Carlos Avalone Junior, eleito deputado estadual de Mato Grosso no pleito de 2018, e pugnou pela procedência do pedido a fim de que fossem aplicadas as sanções previstas no mencionado dispositivo legal.2. O TRE/MT, rejeitando as preliminares arguidas, entendeu que não houve alteração da causa de pedir e julgou procedente o pedido formulado na representação para reconhecer que o representado incidiu na prática de captação ilícita de recursos, condenando–o à penalidade de cassação de seu mandato de deputado estadual, com fundamento no § 2º do art. 30–A da Lei nº 9.504/1997. Decretou, ademais, a perda dos valores apreendidos em favor da União.3. O recorrente, nas razões do recurso, alega nulidade do acórdão por ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário com os demais ocupantes do veículo abordado e no qual estava a quantia apreendida. Defende a necessidade de formação do litisconsórcio, ao menos, com Luiz da Guia, que afirmou que seria sua a referida quantia em dinheiro.4. Nos termos da jurisprudência desta Corte, não há obrigatoriedade de formação de litisconsórcio entre o candidato e todos aqueles que teriam participado da captação ilícita de sufrágio (art. 41–A da Lei da Eleição) e que o objeto da representação do art. 30–A da Lei nº 9.504/1997, nos termos do seu § 2º, consiste, tão somente, na negativa de outorga ou na cassação do diploma do candidato, o que afasta a formação de litisconsórcio passivo necessário entre o candidato beneficiado e terceiro envolvido nas práticas ilícitas. Cito precedentes do TSE nesse sentido: REspe nº 238–30/RS, rel. Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 3.9.2015, DJe de 22.10.2015; RO nº 47191–57/MT, rel. designado Min. Henrique Neves da Silva, julgado em 23.11.2010, DJe de 4.2.2011, e RO nº 2188–47/ES, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgado em 17.4.2018, DJe de 18.5.2018.5. Alega–se ofensa aos arts. 7º, 141 e 329, I e II, do CPC e 23 da LC nº 64/1990, aos princípios do contraditório e da ampla defesa, bem como ao disposto no Enunciado nº 62 da Súmula do TSE, tendo em vista que houve alteração da causa de pedir em âmbito de alegações finais.6. No caso, o MPE, verificando não haver elementos probatórios que denotassem a prática da captação ilícita de sufrágio (art. 41–A da Lei nº 9.504/1997), pugnou, em alegações finais, pela condenação pela prática do ilícito descrito no art. 30–A da Lei das Eleições.7. A Corte regional – embora tenha afirmado que "[...] não restou comprovado o ilícito de captação ilícita de sufrágio [...]", sendo certo que "[...] sequer houve a demonstração na petição inicial de elementos de prova mínimos para corroborar a imputação desse ilícito" – entendeu que "[...] assiste razão ao autor da ação quanto à comprovação da hipótese prevista no art. 30–A da Lei n° 9.504/97, bem como quanto à possibilidade de se aplicar as sanções correspondentes a essa hipótese, não obstante a imputação inicial tenha sido feita com fundamento no art. 41–A da mesma lei [...]" (ID 149603588).8. Embora o Enunciado nº 62 da Súmula do TSE estabeleça que "[...] os limites do pedido são demarcados pelos fatos imputados na inicial, dos quais a parte se defende, e não pela capitulação legal atribuída pelo autor", no caso, houve uma verdadeira alteração do ilícito imputado ao recorrente.9. Na hipótese, o devido processo legal foi lastreado na acusação da prática de captação ilícita de sufrágio, contudo a condenação se deu com base na prática da conduta descrita no art. 30–A da Lei das Eleições. Não fosse a alteração do ilícito, não haveria condenação alguma na presente representação, notadamente porque tanto o autor quanto a Corte regional se manifestaram no sentido de que não houve comprovação da prática da captação ilícita de sufrágio, o que revela a inegável relevância da modificação levada a efeito em alegações finais (após finda a fase de instrução e em sua última manifestação antes do julgamento da causa.10. Modifica a causa de pedir, afrontando–se o disposto no art. 329 do CPC, o pedido do autor da representação, formulado em alegações finais, para condenar o réu com base nas acusações de captação e gastos ilícitos de recursos na campanha eleitoral, consistente na movimentação de recursos fora da conta de campanha, sem a identificação da origem, na omissão de despesa com pessoal na prestação de contas e na extrapolação do limite de gastos, condutas estas passíveis de atrair a incidência de eventual sanção prevista no art. 30–A da Lei nº 9.504/1997.11. Esta Corte, por sua jurisprudência, já assentou que "o aporte de fatos diversos daqueles que constam da petição inicial após a estabilização da demanda constitui ampliação indevida da causa de pedir". Precedente.12. O cenário dos autos revela uma subversão dos princípios do contraditório e da ampla defesa, uma vez que o recorrente, embora tenha logrado êxito em afastar as alegações constantes da inicial, foi condenado pela prática de ilícito diverso.13. Recurso ordinário provido a fim de tornar insubsistente a condenação do recorrente.