Jurisprudência TSE 060176142 de 04 de outubro de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Benedito Gonçalves
Data de Julgamento
28/09/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, acolheu a preliminar de ilegitimidade passiva e extinguiu o processo sem julgamento de mérito quanto ao Diretório Nacional do Partido Liberal (PL), e julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na Representação quanto aos demais representados, Jair Messias Bolsonaro e Coligação Pelo Bem do Brasil, para: a) condená¿los ao pagamento de multa individual no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), em razão de impulsionamento vedado de conteúdos na internet; b) condená¿los ao pagamento de multa individual no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por ausência de informação, no impulsionamento, do CNPJ do responsável e da expressão propaganda eleitoral; e c) absolvê¿los quanto à prévia informação, no registro de candidatura, do sítio eletrônico de campanha, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes (substituto) e Alexandre de Moraes (Presidente).Falaram pela representante, Coligação Brasil da Esperança, o Dr. Miguel Filipi Pimentel Novaes; e pelos representados, Coligação Pelo Bem do Brasil e outros, o Dr. Eduardo Augusto Vieira de Carvalho. Impedimento da Ministra Edilene Lôbo (substituta). Não integraram a composição, justificadamente, os Ministros Nunes Marques e André Ramos Tavares.Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Gilmar Mendes (substituto), Benedito Gonçalves, Raul Araújo e Floriano de Azevedo Marques.
Ementa
REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2022. PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR.1. Representação ajuizada em desfavor do segundo colocado ao cargo de presidente da República nas Eleições 2022, de sua coligação e de seu partido político por suposta prática de propaganda irregular, haja vista o impulsionamento de conteúdo negativo na internet (art. 29, §§ 2º e 3º, da Res.–TSE 23.610/2019), a falta de menção à expressão "propaganda eleitoral" e ao CNPJ do responsável pelo impulsionamento (art. 29, § 5º), e, ainda, a ausência de prévia informação do endereço do site de campanha no registro de candidatura (art. 28, § 1º). PRELIMINAR. PARTIDO POLÍTICO COLIGADO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. ACOLHIMENTO.2. De acordo com o art. 6º, § 4º, da Lei 9.504/97, "[o] partido político coligado somente possui legitimidade para atuar de forma isolada no processo eleitoral quando questionar a validade da própria coligação, durante o período compreendido entre a data da convenção e o termo final do prazo para a impugnação do registro de candidatos".3. Na linha do parecer ministerial, é inequívoca a ilegitimidade do diretório nacional para figurar no polo passivo, uma vez que, no pleito de 2022, integrou a coligação também representada.TEMA DE FUNDO. IMPULSIONAMENTO. CONTEÚDO NEGATIVO. VEDAÇÃO. ART. 29, §§ 2º E 3º, DA RES.–TSE 23.610/2019. CONFIGURAÇÃO.4. Nos termos da jurisprudência desta Corte e do art. 29 da Res.–TSE 23.610/2019, a propaganda na internet, quando paga, somente pode ser realizada mediante impulsionamento e desde que atendidas as seguintes exigências: (a) contratação exclusiva por partidos políticos, coligações e candidatos; (b) finalidade única de promover o contratante, vedado seu uso para veicular conteúdo negativo contra adversários; (c) clara informação, ao eleitor, de que se trata dessa espécie de propaganda.5. Uma das modalidades de impulsionamento é a priorização paga de conteúdos em aplicações de busca na internet (art. 28, § 7º, da Res.–TSE 23.610/2019). O internauta acessa site de pesquisa (Google, Yahoo, Bing, etc) visando se informar sobre assunto de seu interesse e então é apresentado não apenas a resultados orgânicos (com base em algoritmos da plataforma), como também a resultados no topo da página de busca que correspondem a anúncios publicitários pagos pelos respectivos anunciantes, relacionados ao conteúdo objeto da pesquisa.6. O caso dos autos é sui generis. Os representados contrataram o impulsionamento de dez inserções no Google, de forma que o eleitor, ao pesquisar temas correlatos no buscador, era apresentado a anúncios como "Presidente Bolsonaro 2022. O Brasil precisa continuar a crescer. Juntos pelo bem do Brasil [...]", não havendo ilicitude neste ponto. Ato contínuo, ao clicar no anúncio, o eleitor era direcionado ao sítio eletrônico oficial da campanha dos representados. Porém, logo na parte superior desse site, com grande destaque, constava de imediato a imagem do principal adversário dos representados, com mensagens de tom negativo e referência ao site "Lulafix", onde notoriamente se divulgava conteúdo desabonador. Apenas mais abaixo é que se seguiam as matérias favoráveis ao anunciante do conteúdo pago.7. O foco da página inicial do site de campanha não recaiu apenas nos representados que contrataram o impulsionamento – que, reitere–se, deve ser feito apenas para promover a própria candidatura –, mas também no seu principal adversário político, em relação ao qual se veicularam conteúdos de natureza negativa, o que é proibido pelo art. 29 da Res.–TSE 23.610/2019.8. A hipótese revela notória burla às regras do impulsionamento, pois os representados se valeram de ardil para driblar a vedação legal e jurisprudencial, em afronta à boa–fé objetiva. Mediante subterfúgio, procuraram desviar a atenção do internauta e conduzi–lo a sítio eletrônico em que disponível vasto material propagandístico contra adversário político, ofendendo o art. 57–B, § 3º, da Lei 9.504/97, segundo o qual "é vedada a utilização de impulsionamento [...] para alterar o teor ou a repercussão de propaganda eleitoral, tanto próprios quanto de terceiros".9. Nos termos do art. 29, § 2º, da Res.–TSE 23.610/2019, os responsáveis e beneficiários pelo impulsionamento irregular estão sujeitos à multa de R$ 5.000,00 a R$ 30.000,00 ou, ainda, "em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa (Lei nº 9.504/1997, art. 57–C, § 2º)". No caso, a autora pugnou pela sanção apenas no teto de R$ 30.000,00, sem considerar os gastos dos anúncios.10. Fixação da multa no patamar máximo de R$ 30.000,00 diante das seguintes circunstâncias: (a) total de dez anúncios; (b) valores gastos que corresponderam a aproximadamente R$ 290.000,00; (c) alcance (número de exibições) de cerca de 4,4 milhões de pessoas; (d) anúncios que perduraram por quase um mês ou que foram veiculados durante o debate presidencial do 1º turno, faltando apenas dois dias para as eleições; (e) uso de manobra para conferir ar de licitude à propaganda.TEMA DE FUNDO. IMPULSIONAMENTO. AUSÊNCIA. INFORMAÇÃO. CNPJ DO RESPONSÁVEL. EXPRESSÃO "PROPAGANDA ELEITORAL". ART. 29, § 5º, DA RES.–TSE 23.610/2019. CONFIGURAÇÃO.11. O art. 29, § 5º, da Res.–TSE 23.610/2019 prevê que "todo impulsionamento deverá conter, de forma clara e legível, o número de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) ou o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) da pessoa responsável, além da expressão ¿Propaganda Eleitoral'".12. Independentemente do teor do conteúdo impulsionado, tem–se que o impulsionamento em si – no caso, o anúncio patrocinado em site de busca na internet – deve conter as informações exigidas no art. 29, § 5º, da Res.–TSE 23.610/2019.13. Os documentos anexos à petição inicial (prints) revelam que tais dados não constaram dos impulsionamentos. Já os representados não se desincumbiram do ônus de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora (art. 373, II, do CPC/2015), vindo apenas a trazer exemplos de anúncios anteriores que, na verdade, também eram irregulares.14. A multa do art. 57–C, § 2º, da Lei 9.504/97, de R$ 5.000,00 a R$ 30.000,00, "se aplica quando for descumprido qualquer dos requisitos exigidos para a veiculação lícita de propaganda eleitoral impulsionada na internet" (R–Rp 0601464–35/DF, Rel. Min. Raul Araújo Filho, DJE de 29/5/2023).15. Multa fixada em R$ 10.000,00 ante o total de dez anúncios.TEMA DE FUNDO. AUSÊNCIA. PRÉVIA INFORMAÇÃO. SÍTIO ELETRÔNICO DE CAMPANHA. REGISTRO DE CANDIDATURA OU DEMONSTRATIVO DE REGULARIDADE DE ATOS PARTIDÁRIOS (DRAP). ART. 28, § 1º, DA RES.–TSE 23.610/2019. NÃO CONFIGURAÇÃO.16. Conforme o art. 28, § 1º, da Res.–TSE 23.610/2019, "os endereços eletrônicos das aplicações de que trata este artigo [...] deverão ser comunicados à Justiça Eleitoral impreterivelmente no RRC ou no DRAP [...]".17. O objetivo primordial da regra contida no art. 28, § 1º, da Res.–TSE 23.610/2019 é conferir transparência, assegurando–se a esta Justiça Especializada e aos demais atores do processo eleitoral a fiscalização acerca da regularidade dos canais oficiais de propaganda.18. Na espécie, não se vislumbra prejuízo concreto. Apesar da ausência de informação inicial do endereço eletrônico nos autos do registro de candidatura do segundo representado, é inequívoco que fora ele especificado no Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários da coligação representada.CONCLUSÃO.19. Extinção do processo, sem julgamento do mérito, quanto ao Diretório Nacional do Partido Liberal, por ilegitimidade passiva, nos termos do art. 485, VI, do CPC/2015.20. Representação cujos pedidos se julgam parcialmente procedentes quanto aos demais representados, nos seguintes termos: (a) condená–los a pagar multa individual de R$ 30.000,00 com base no art. 29, caput, da Res.–TSE 23.610/2019; (b) condená–los a pagar multa individual de R$ 10.000,00 com esteio no art. 29, § 5º, da Res.–TSE 23.610/2019; (c) absolvê–los quanto à prévia informação, no registro de candidatura, do sítio eletrônico de campanha (art. 28, § 1º, da Res.–TSE 23.610/2019).