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Jurisprudência TSE 060168239 de 11 de maio de 2022

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Mauro Campbell Marques

Data de Julgamento

19/04/2022

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, julgou desaprovadas as contas do Diretório Nacional do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB), relativas ao exercício financeiro de 2016, impondo¿lhe determinações, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros: Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos, Carlos Horbach (art. 7º, §2º, da Res.¿TSE nº 23.598/2019), Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Edson Fachin (Presidente).Composição: Ministros Edson Fachin (Presidente), Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Ementa

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. PRTB – DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2016. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA (RONI). RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EFETIVA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS E DA VINCULAÇÃO DESTES COM A ATIVIDADE PARTIDÁRIA. REITERADA NÃO APLICAÇÃO DO PERCENTUAL MÍNIMO PARA INCENTIVO DA PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA POLÍTICA. RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO NÃO REPASSADOS ÀS DEMAIS ESFERAS DA AGREMIAÇÃO. FALHAS GRAVES. IRREGULARIDADES QUE, DECOTADO O MONTANTE OBJETO DA ANISTIA CONCEDIDA PELA EC nº 117/2022, TOTALIZAM R$ 1.535.612,60, EQUIVALENTE A 32,44% DO TOTAL DE RECURSOS PÚBLICOS RECEBIDOS. FALHAS GRAVES. COMPROMETIMENTO DA TRANSPARÊNCIA, DA FISCALIZAÇÃO E DO CONTROLE SOCIAL. CONTAS DESAPROVADAS.1. Prestação de contas do Diretório Nacional do Partido Renovador Trabalhista Brasileiro (PRTB) relativa ao exercício financeiro de 2016, cujo mérito se submete às disposições da Res.–TSE nº 23.464/2015.2. Recursos de Origem não Identificada (RONI).2.1. O partido não esclareceu a origem dos depósitos recebidos nas contas bancárias da agremiação, o que contraria o disposto no art. 13 da Res.–TSE nº 23.464/2015. Irregularidade mantida.3. Recursos de fontes vedadas3.1. O partido recebeu depósitos advindos de câmaras municipais e prefeituras, tendo apresentado planilhas e afirmado se tratar de contribuições de detentores de cargos eletivos filiados à grei.3.1.2. O art. 31, II, da Lei nº 9.096/1995 veda o recebimento de recursos oriundos de entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, exceto daqueles provenientes do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).3.1.3. No julgamento das contas do PRTB relativas ao exercício financeiro de 2015 (PC–PP nº 171–89/DF), este Tribunal Superior enfrentou essa temática e assentou a irregularidade, tendo em vista que documentos unilaterais produzidos pelo partido não se prestam para comprovar que os depósitos realizados se referem a contribuições de detentores de mandato eletivo, bem como porque, ainda que se fosse possível superar esse óbice, não se admite o chamado "dízimo partidário", que se perfaz pelo desconto automático de valor em folha de pagamento. O contexto fático–jurídico é idêntico. Irregularidade mantida.4. Pagamentos com recursos do Fundo Partidário4.1. A fiscalização exercida por esta Justiça Eleitoral tem por escopo identificar a origem das receitas e a destinação das despesas com as atividades partidárias, mediante avaliação formal dos documentos contábeis e fiscais apresentados pelo partido político.4.1.2. Caso o Juízo Eleitoral verifique que a documentação constante aos autos é insuficiente para atestar a regularidade do gasto e o vínculo com as atividades partidárias, lhe é lícito determinar – inclusive por solicitação do MPE, do impugnante ou dos responsáveis – diligências necessárias ao exame das contas, tais como a requisição de esclarecimentos e a juntada de documentos ausentes e/ou complementares.4.1.3. A juntada de documento após a fase de diligências somente se justifica quando se tratar de documento novo, ou, sendo preexistente, quando o prestador de contas não teve a oportunidade de sobre ele se manifestar, sendo ônus do prestador demonstrar a presença de justo motivo ou circunstância relevante que autorize a juntada após os momentos previamente estabelecidos. Precedentes.4.2. Para justificar despesas com telefonia, cujas faturas estão em nome de terceiros, a agremiação afirma que, por ocasião das razões finais, apresentou termo de cessão de linha telefônica pessoal do presidente do partido em favor da grei.4.2.1. No caso, o partido foi regularmente intimado para apresentar esclarecimentos e/ou documentação complementar desde o primeiro exame das contas. Contudo, além de não existir nos autos indicação de que o documento por meio do qual o partido pretende comprovar a regularidade da despesa tenha sido apresentado na fase de cumprimento das diligências, não se verificou justo motivo ou circunstância relevante que autorize a juntada após finda a fase de instrução.4.2.2. A apresentação extemporânea de documentação fora das hipóteses legais é inadmitida devido à preclusão. Nesse sentido: PC nº 185–73/DF, rel. Min. Edson Fachin, DJe de 11.5.2021; PC nº 191–80/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 30.4.2021; AgR–AI nº 175–77/GO, rel. Min. Admar Gonzaga, DJe de 20.11.2018. Irregularidade mantida.4.3. A agremiação adquiriu, com recursos públicos, uma máquina fotográfica por R$ 19.000,00, tendo se limitado a afirmar que não possui a nota fiscal porque "[...] trata–se de aquisição de máquina fotográfica de segunda mão (usada) da marca CANION [...]".4.3.1. Conforme entende esta Corte Superior, "a aquisição de bens ou serviços pelo partido, com recursos públicos, pode ser chancelada, desde que, da análise dos elementos comprobatórios da despesa, seja possível atestar a exclusiva vinculação aos fins partidários e a obediência aos princípios da transparência e da economicidade" (PC nº 0601766–40/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 11.11.2021).4.3.2. No caso, além da ausência de documento fiscal idôneo e da não localização, nos autos, do contrato de compra e venda mencionado pelo partido, a grei não esclareceu a razão de ter adquirido uma máquina fotográfica usada de tão relevante valor, tampouco explicou qual a finalidade partidária do equipamento.4.3.3. Ausente a documentação mínima para a aferição da regularidade do gasto custeado com recursos públicos, inviável atestar a sua regularidade. Irregularidade mantida.4.4. O partido fez diversos pagamentos para várias empresas, os quais não foram devidamente comprovados devido a falhas como: notas fiscais com descrição genérica; contratos que não estipulam os valores dos serviços; relatórios com informações divergentes das contidas nas notas fiscais; pagamentos de valores distintos daqueles acordados em contrato, sem o necessário esclarecimento; entre outros.4.4.1. Conforme entende o TSE, "Consideram–se não comprovadas as despesas cujos documentos fiscais ou recibos, em razão dos termos genéricos em que redigidos, não permitem identificar a que se refere especificamente o pagamento realizado, bem como sua vinculação a atividades partidárias" (PC nº 290–21, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 21.6.2019).4.4.2. A inexistência de convergência entre os elementos informativos constantes dos documentos relacionados aos gastos – mormente no que tange ao período e ao valor pactuado – impede chancelar a regularidade das despesas custeadas com recursos públicos. Precedentes.4.5. Pagamentos de diversas despesas com cheque "guarda–chuva"4.5.1. Consoante dispõe o art. 18, § 4º, da Res.–TSE nº 23.464/2015, os gastos partidários devem ser pagos mediante a emissão de cheque nominativo cruzado ou por transação bancária que identifique o CPF ou CNPJ do beneficiário.4.5.2. No caso, o partido fez uso de uma única folha de cheque para efetuar vários pagamentos, circunstância que, além de contrariar a forma prescrita na legislação, prejudica a fiscalização dos recursos públicos aplicados. Irregularidade mantida.4.6. Despesas com eventos4.6.1. Fotografias de um mesmo evento e sem data, por si só, não se prestam para a comprovar a realização de dois eventos que, supostamente, ocorreram em datas distintas.4.6.2. No julgamento das contas do PRTB relativas ao exercício financeiro de 2015 (PC–PP nº 171–89/DF), este Tribunal Superior enfrentou o mesmo contexto fático–jurídico e assentou a ausência de documentação hábil a comprovar a efetiva prestação do serviço e a vinculação com as atividades partidárias. O contexto fático–jurídico é idêntico. Irregularidade mantida.4.7. Manutenção e Serviços de Equipamentos Eletrônicos4.7.1. No caso, os endereços constantes das notas fiscais emitidas pela empresa Dialarme Comércio Manutenção e Serviços de Equipamentos Eletrônicos não correspondem àqueles informados como sede ou escritório do partido. O contrato de prestação de serviço não especifica o valor, o volume nem o local da execução. Ademais, os relatórios de atividades são genéricos. Irregularidade mantida.4.8. Despesas com serviços de hospedagem4.8.1. Na espécie, o partido apresentou recibos de pagamento emitidos por imobiliária com indicação dos nomes dos hóspedes, períodos da hospedagem e nome do estabelecimento, bem como o contrato de locação celebrado com o partido, cuja vigência encerrou em 2019. O instrumento contratual descreve o objeto do contrato, o valor a ser pago e o período de vigência. No caso, foi comprovada a efetiva prestação do serviço. Precedente. Irregularidade afastada.4.9. Despesas com lavanderia4.9.1. Consoante preceitua o art. 17 da Res.–TSE nº 23.464/2015, constituem gastos partidários todos os custos e despesas utilizados pelo órgão do partido político para sua manutenção e consecução de seus objetivos e programas. No ponto, há que se ter parcimônia e de se realizar análise ponderada quando se trata da utilização de recursos públicos no custeio de despesas. Além da comprovação do vínculo do gasto com a atividade partidária, este deve observar os princípios da razoabilidade e da economicidade.4.9.2. Na hipótese, o partido não se desincumbiu de demonstrar como a despesa de R$ 833,57 com serviços de lavanderia – de um único hóspede – atendeu aos ditames básicos que regem os gastos custeados com os recursos do Fundo Partidário. Irregularidade mantida.4.10. Despesas com impostos, juros e multa4.10.1. No caso, o partido pagou, com recursos públicos, IPVA e IPTU de bens pertencentes à agremiação, além de juros e multas, despesas que não se encontram amparadas pela legislação nem pela jurisprudência desta Corte Superior. Irregularidade mantida.4.12. Manutenção de veículo particular4.12.1. A grei juntou aos autos digitais contrato de cessão de uso de veículo, porém não apresentou o Certificado de Registro de Veículo (CRV), documento de confirmação de propriedade. Irregularidade mantida.5. Incentivo à participação da mulher na política5.1. A EC nº 117/2022 não excluiu a possibilidade desta Justiça Eleitoral, no exercício de sua competência fiscalizatória, de aferir a regularidade do uso das verbas públicas relacionadas ao programa de promoção e difusão da participação política das mulheres e ao financiamento das candidaturas de gênero. A gravidade dessa espécie de falha, aliás, se tornou ainda mais evidente com a constitucionalização da ação afirmativa.5.2. Atividades de natureza administrativa, por constituírem meio para a consecução dos fins previstos pelo 44, V, da Lei nº 9.096/1995, não se prestam para a contabilização do percentual mínimo de 5% determinado pela política afirmativa em apreço.5.3. Na espécie, a agremiação recebeu do Fundo Partidário, no exercício financeiro de 2016, R$ 4.732.616,06 e deveria ter destinado aos fins do art. 44, V, da Lei dos Partidos Políticos, o valor de R$ 236.630,80 – que corresponde a 5% da quantia recebida do fundo público. Como só comprovou a aplicação do montante de R$ 159.400,00, deixou de aplicar, portanto, R$ 77.230,80.6. Repasse à Fundação Presidente Jânio Quadros6.1. Na sessão jurisdicional de 27.10.2020, na questão de ordem suscitada pelo MPE na PC nº 192–65/DF (rel. Min. Sérgio Banhos, rel. designado Min. Luis Felipe Salomão), o Plenário desta Corte decidiu, por maioria, que, a partir do exercício financeiro de 2021, caberá também à Justiça Eleitoral fiscalizar as contas da fundação, não sendo, portanto, aplicável esse novo entendimento ao caso dos autos, tendo em vista que se trata de prestação de contas do exercício financeiro de 2016. Irregularidade afastada.6.2. Afastada a tese ministerial de que as contas da fundação devem ser analisadas pelo TCU. "As fundações são pessoas jurídicas de direito privado que se regem pelas normas de direito civil, detendo autonomia administrativa e patrimonial, sendo atribuição para a fiscalização de suas contas do Ministério Público Estadual, nos termos do art. 66 do Código Civil" (AgR–PC nº 261–34/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgado em 18.12.2019, DJe de 4.3.2020).7. Ausência de repasse aos diretórios regionais7.1. O Diretório Nacional do PRTB não distribuiu recursos para a manutenção das atividades desenvolvidas pelos diretórios regionais, sob as alegações de que o repasse de recursos é matéria interna corporis e de que os diretórios estavam com suas contas suspensas por determinação judicial.7.2 A agremiação, contudo, não comprovou a alegação de que os seus diretórios estaduais e municipais estariam com restrições judiciais para receber recursos do Fundo Partidário.7.3 Este Tribunal também já decidiu que "[...] a ausência desse repasse tem reflexo direto no exercício das atividades partidárias nos âmbitos regional e municipal, o que não pode ser admitido como regular, ainda que a agremiação goze de autonomia para a sua organização interna" (PC–PP nº 171–89/DF, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgada em 25.3.2021, DJe de 16.4.2021). Irregularidade mantida.8. Conclusão8.1. O total de irregularidades encontrado nas contas, já decotado o montante objeto da anistia da EC nº 117/2022 (R$ 77.230,80), é de R$ 1.535.612,60, o que representa 32,44% dos recursos do Fundo Partidário recebidos no exercício de 2016 (R$ 4.732.616,06).8.2. No caso, além do alto valor absoluto das irregularidades e do percentual das falhas, houve o recebimento de recursos de origem não identificada e de fonte vedada, o descumprimento do incentivo mínimo à participação política da mulher (irregularidade que se repete nas contas do PRTB desde o exercício financeiro de 2010), e a ausência de repasse de recursos do Fundo Partidário às demais esferas da agremiação, falhas que se revestem de notória gravidade.8.3. Contas desaprovadas. Determinações: (a) ressarcimento do valor de R$ 1.485.501,71 ao erário, atualizado e com recursos próprios; (b) recolhimento do montante de R$ 50.110,89 ao Tesouro Nacional; (c) incidência de multa de 15% sobre a importância apontada como irregular, a ser paga mediante desconto nos futuros repasses do Fundo Partidário; (d) aplicação do valor de R$ 77.230,80, atualizado, nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão (art. 2º, EC nº 117/2022).


Jurisprudência TSE 060168239 de 11 de maio de 2022