Jurisprudência TSE 060156870 de 25 de agosto de 2022
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Sergio Silveira Banhos
Data de Julgamento
23/06/2022
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, admitiu o ingresso dos interessados como assistentes simples do Ministério Público Eleitoral, nos termos do voto do Relator. No mérito, por maioria, negou provimento ao recurso ordinário eleitoral para manter o acórdão regional, que julgou procedente a ação de investigação judicial eleitoral, cassando o mandato de deputado estadual de Talysson Barbosa Costa e declarando a inelegibilidade de ambos os recorrentes pelo período de oito anos, a contar das Eleições de 2018, e determinou a comunicação ao Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe, para o cumprimento imediato das sanções, com a retotalização dos votos, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Carlos Horbach, Alexandre de Moraes e Benedito Gonçalves. Votaram com o Relator os Ministros Kassio Nunes Marques, Mauro Campbell Marques e Edson Fachin (Presidente). Não participou, justificadamente, deste julgamento, o Senhor Ministro Ricardo Lewandowski.Composição: Ministros Edson Fachin (Presidente), Alexandre de Moraes, Kassio Nunes Marques (em substituição), Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
RECURSO ORDINÁRIO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E POLÍTICO. USO DA MÁQUINA ADMINISTRATIVA MUNICIPAL. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR.SÍNTESE DO CASO1. A Corte Regional Eleitoral julgou improcedentes os pedidos formulados na AIJE 0601313–15 e na RP 0601393–76 e, por maioria, julgou parcialmente procedentes os pedidos deduzidos na AIJE 0601568–70, ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral, para, nos termos do art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90, cassar o mandato de Talysson Barbosa Costa, deputado estadual eleito em 2018 e decretar a inelegibilidade dele e de Valmir dos Santos Costa, prefeito do Município de Itabaiana/SE, ambos pelo período de oito anos, a contar da data das Eleições de 2018, julgando improcedentes as postulações relativas aos demais investigados.2. O Tribunal de origem concluiu que ficou caracterizada a prática de abuso do poder econômico e político, por meio da realização de propaganda eleitoral irregular, reconhecida em múltiplas representações eleitorais já julgadas, e por meio do uso da máquina administrativa municipal, por parte de Valmir dos Santos Costa, prefeito do Município de Itabaiana/SE, no intuito de beneficiar a candidatura de Talysson Barbosa Costa, seu filho, ao cargo de deputado estadual.3. Seguiu–se a interposição de recurso ordinário por Talysson Barbosa Costa e Valmir dos Santos Costa.ANÁLISE DO RECURSO ORDINÁRIO4. Ficou amplamente comprovado nos autos, por meio de vídeos e de fotos constantes da página oficial da prefeitura na internet e do perfil oficial da prefeitura no Facebook, que Valmir dos Santos Costa, segundo recorrente, prefeito do município, atuou como protagonista da campanha eleitoral do primeiro recorrente, Talysson Barbosa Costa, seu filho, ao cargo de deputado estadual – que adotou em campanha o nome "Talysson de Valmir" e os slogans "Tal Pai, Tal Filho" e "Depois de nóis é nóis de novo. #2018", com dois patos (em referência ao pai e ao filho) –, utilizando a máquina pública municipal, por meio do uso da cor azul, – marca da campanha eleitoral de Talysson, denominada "Onda Azul" – na pintura de prédios públicos, praças, escolas, canteiros de avenidas, bem como em uniformes escolares, sítios eletrônicos oficiais, publicações e eventos oficiais do Município, e pedindo ostensivamente votos em seu favor, com a mensagem de que ele iria dar continuidade ao seu trabalho, bem como por meio da veiculação de inúmeros atos de propaganda eleitoral irregular, reconhecidos em, ao menos, 20 representações julgadas procedentes pela Justiça Eleitoral.5. O argumento de que a "Onda Azul" seria um movimento político tradicional da cidade, criado em 2012 e utilizado pela candidata a deputado estadual Maria Mendonça (opositora política dos Recorrentes), não afasta a evidência de que a campanha eleitoral do primeiro recorrente ficou amplamente conhecida com esta denominação.6. Não procede o argumento dos recorrentes, que também constitui a versão relatada pelas testemunhas, de que "os prédios públicos do Município de Itabaiana são pintados há muitos anos nas cores azul, branco e verde, pois fazem menção às cores da bandeira da cidade, bem como ao seu time de futebol", nem a alegação de que "a cor da campanha do investigado é azul, em clara alusão a cor do Partido da República – PR, ao qual o candidato é filiado", pois é clara a predominância da cor azul na campanha, enquanto a bandeira, o time de futebol e o símbolo da agremiação são representados com três cores.7. O período de cinco anos entre a retomada da padronização da pintura na cor azul, em 2013, e as Eleições em 2018, não afasta o farto conjunto probatório, que demonstra os esforços de vinculá–la à cor da campanha eleitoral do primeiro recorrente, nem a gravidade da conduta, consistente na indevida utilização da máquina pública do Município, por meio de multiplicidade de ações, em violação ao princípio da impessoalidade e moralidade pública, e em manifesto desvio de finalidade, que levou o candidato a obter a maior votação para o cargo de deputado estadual.8. Na sessão de 21.9.2021, esta Corte analisou fato similar, também relativo às eleições estaduais de 2018, no julgamento conjunto dos Recursos Ordinários 0600818–68 e 0601576–47, de minha relatoria, os quais foram interpostos nos autos de ações de investigação judicial eleitoral por abuso de poder político e econômico, ajuizadas em face de Maria Valdina Silva Almeida e Diógenes José de Oliveira Almeida, respectivamente, Deputada Estadual eleita em 2018 e ex–prefeito do município de Tobias Barreto/SE.9. Naquele caso, um dos fatos apurados nas AIJEs citadas e que também ficou conhecido "Onda Azul" consistiu na similitude entre as logomarcas do município de Tobias Barreto/SE e da campanha, com a utilização simultânea da mesma cor (azul). Na ocasião, este Tribunal decidiu, por maioria, que "houve a prática de abuso de poder político na ostensiva utilização simultânea da cor azul pelo primeiro recorrente durante a campanha da segunda recorrente, potencializado a associação entre ambos e à administração local, mediante a pintura de bens públicos do município, especialmente durante o período eleitoral". Consignou, ainda, que "a constatação de que muitos logradouros públicos expunham as cores da campanha eleitoral representou a gravidade da conduta, configurando uma vantagem eleitoral indevida, antecipada e duradoura em favor da recorrente".10. Ficou caracterizada, na espécie, a gravidade das circunstâncias do caso concreto, a caracterizar tanto a prática de abuso de poder político quanto econômico, nos termos do inciso XVI do art. 22 da LC 64/90, uma vez que:a) houve o uso indevido da máquina pública pelos titulares do Executivo exatamente nas vésperas do pleito;b) houve multiplicidade de condutas, uma vez que se trata da pintura de inúmeros prédios públicos, praças, escolas, canteiros de avenidas, bem como da utilização da cor azul em uniformes escolares, sítios eletrônicos oficiais, publicações e eventos oficiais do Município;c) recursos do erário foram gastos, desde o ano de 2013, na pintura de bens públicos, o que veio a beneficiar a candidatura do primeiro recorrente, em violação ao princípio da impessoalidade e moralidade pública, e em manifesto desvio de finalidade, o que levou o candidato, jovem de 27 anos, que nunca havia se candidato a nenhum cargo público, a obter a maior votação para o cargo de deputado estadual;d) a procedência de inúmeras representações por propaganda eleitoral irregular demonstra que a campanha do candidato se desenrolou à margem da legislação eleitoral, a fim de beneficiar o primeiro recorrente;e) houve evidente desequilíbrio na igualdade entre os candidatos, tendo em vista que os concorrentes do primeiro recorrente ao cargo de deputado estadual não foram beneficiados com o mesmo tipo de estratégia.11. A Justiça Eleitoral tem competência para analisar condutas que podem consubstanciar atos de improbidade administrativa, desde que tais condutas estejam diretamente relacionadas com os pleitos eleitorais, como é o caso dos autos, em que a reiterada violação ao art. 37 da Constituição Federal implicou violação à igualdade entre os candidatos e à lisura das eleições.12. Determinado candidato pode ser apresentado à sua comunidade por alguém que o referencie, seja um familiar, um colega de profissão ou alguém que ocupe algum cargo político e que possa dar recomendações a seu respeito. Entretanto, tal participação não pode vir a gerar desequilíbrio na disputa eleitoral, causando exposição desproporcional de um determinado candidato em detrimento dos demais.13. Na espécie, o protagonismo de Valmir dos Santos Costa na campanha do seu filho, por meio de sua participação direta em atos de campanha, do uso de seu cargo de prefeito municipal, bem como de recursos do município, a fim de beneficiar sua candidatura e da veiculação de inúmeros atos de propaganda eleitoral, considerados irregulares pela Justiça Eleitoral em pelo menos 20 representações, caracterizou abuso de poder político e econômico, gerando desequilíbrio na disputa ao cargo de deputado estadual, em violação aos princípios da impessoalidade, da moralidade pública, da lisura do pleito e da igualdade entre os candidatos.CONCLUSÃORecurso ordinário ao qual se nega provimento.