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Jurisprudência TSE 060155331 de 19 de agosto de 2022

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Mauro Campbell Marques

Data de Julgamento

30/06/2022

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao agravo interno, a fim de prover o recurso especial eleitoral com agravo e aprovar com ressalvas as contas da candidata, excluindo a determinação de devolução de valores ao erário, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros: Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e, com ressalva de entendimento, o Ministro Edson Fachin (Presidente). Ausência justificada do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski.Composição: Ministros Edson Fachin (Presidente), Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Ementa

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO INTERNO EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DEPUTADA FEDERAL. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PÚBLICOS VINCULADOS À PROMOÇÃO DE CANDIDATURAS FEMININAS EM SERVIÇOS COMPARTILHADOS COM CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL. "DOBRADINHAS". LICITUDE. RESULTADO DAS URNAS. PROVA TARIFADA. INEXISTÊNCIA. CONTROVÉRSIA JURÍDICA CUJA SOLUÇÃO NÃO DEMANDA O REVOLVIMENTO PROBATÓRIO. PROVIMENTO DOS AGRAVOS E DO RECURSO ESPECIAL.1. A Corte regional julgou desaprovadas as contas da candidata e determinou a devolução do valor de R$ 322.500,00 – oriundos da cota de gênero –, por entender que, embora a prestadora tenha comprovado a regularidade formal dos gastos eleitorais, não foi demonstrado o benefício para a campanha feminina em parte dos serviços em que houve a divulgação em conjunto com a candidatura do sexo masculino.2. O cerne da controvérsia gira em torno da configuração ou não de desvio de finalidade no custeio – com recursos públicos direcionados à candidata em razão da cota de gênero prevista no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/1997 – de gastos eleitorais que objetivaram, a um só tempo, a promoção de sua candidatura e a vinculação de sua imagem com a de candidato do sexo masculino, com vistas a alcançar o eleitorado deste.2.1. O Tribunal de origem assentou, expressamente, que os gastos controvertidos foram formalmente comprovados, de modo que não se faz necessário reexaminar o acervo probatório para dirimir a controvérsia jurídica objeto do apelo nobre, que versa sobre a configuração do desvio de finalidade na utilização de recursos advindos da cota de gênero quando há aproveitamento comum por candidatura do sexo masculino.2.2. O princípio do julgamento do mérito e a desnecessidade de se analisar eventual nulidade quando a decisão de mérito puder favorecer a parte recorrente recomendam o conhecimento do apelo nobre, a fim de que a controvérsia estritamente jurídica seja resolvida.3. Extrai–se do acórdão regional que a candidata buscou vincular a sua imagem à de Sérgio Motta Ribeiro, por ser o candidato "[...] pessoa pública, apresentador de televisão, religioso com trabalho amplamente divulgado e conhecido no Estado de Santa Catarina, sendo que ambos visavam ao público evangélico e defendiam causas semelhantes", razão pela qual pretendeu "[...] alcançar o eleitorado do candidato, já que suas campanhas eram compatíveis, uma vez que ela concorria à Câmara Federal e ele à Assembleia Estadual" (ID 107684438).3.1. Esta Corte Superior admite que os recursos advindos da cota de gênero sejam utilizados para despesas comuns e/ou coletivas que envolvem candidatos do gênero oposto, desde que haja benefício para a campanha feminina. Nesse sentido: AgR–RO–El nº 0601463–39/TO, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 16.9.2021, DJe de 14.10.2021; RO–El nº 0602634–91/PA, rel. designado Min. Alexandre de Moraes, julgado em 5.5.2022.3.2. Quanto aos materiais de campanha impressos em conjunto, o TRE/SC entendeu que foi demonstrado o benefício para a campanha da candidata. Contudo, em relação aos gastos com coordenadores de campanha, cabos eleitorais e serviços de fotografia, o Tribunal a quo considerou ausente o benefício para a campanha da candidata, ao argumento de que Rejane Teresinha Bueno obteve "[...] apenas 514 votos, ao passo que seu companheiro de campanha Sergio Motta conquistou 45.181 [...]" (ID 10768443).3.3. É ilógico assentar o benefício eleitoral na confecção de santinhos de candidaturas "dobradas", mas considerar inexistente em relação aos cabos eleitorais que distribuíram esses mesmos materiais publicitários, assim como em relação aos fotógrafos que registraram a panfletagem e os encontros, os quais, por certo, tiveram suas atividades coordenadas por pessoas contratadas para esse fim, haja vista que tais atividades, em última análise, materializam aquela na qual reconhecido o benefício para a campanha feminina.3.4. A Corte Regional elegeu como parâmetro para a configuração do desvio de finalidade na utilização de recursos advindos da cota de gênero o quantitativo de votos obtidos pela candidata e pelo candidato com o qual a recorrente quis vincular sua imagem. No entanto, embora o resultado nas urnas possa se qualificar como aspecto secundário para o fim de se avaliar o benefício eleitoral do gasto, não é, por si só, critério determinante para a confirmação do ilícito, mormente porque não há, no ordenamento jurídico eleitoral, a chamada "prova tarifada", em que o legislador estabelece previamente o seu valor probante.3.5. Ao considerar o resultado obtido nas urnas como prova contundente do desvio de finalidade na utilização de recursos da cota de gênero, o Tribunal Regional – além de emitir verdadeiro juízo de valor acerca dos serviços prestados pelos coordenadores de campanha, fotógrafos e cabos eleitorais contratados, haja vista a conclusão pela regularidade do gasto sob o aspecto documental – desconsiderou a vontade expressa da candidata em adotar como estratégia de campanha para o cargo de deputado federal a sua intenção de vincular sua candidatura à de candidato ao cargo de deputado estadual – que integrava a mesma legenda partidária e cujas propostas eram compatíveis com seus ideais políticos.3.6. No caso, os elementos informativos contidos no acórdão regional demonstram que todos os serviços custeados com recursos públicos de aplicação vinculada à candidatura de gênero da candidata (e não apenas os gastos com material impresso de campanha) foram realizados dentro da concepção de "dobradinha" estadual/federal. De outro lado, não há elementos que apontem que os recursos em debate foram empregados em benefício exclusivo da candidatura do sexo masculino.3.7. A estratégia de marketing eleitoral da candidata – que consistiu em campanha casada em comunhão de interesses com candidatura a cargo diverso de filiado ao mesmo partido político –, se tratou de mecanismo lícito para a promoção da sua candidatura feminina. Ademais, não há base normativa para considerar os votos obtidos como critério exclusivo para aferir eventual desvio da finalidade na utilização de recursos públicos de aplicação vinculada à ação afirmativa.4. Agravos e recurso especial providos, a fim de aprovar as contas da candidata e de excluir a determinação de devolução de valores ao erário.


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