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Jurisprudência TSE 060138964 de 13 de maio de 2021

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Sergio Silveira Banhos

Data de Julgamento

29/04/2021

Decisão

Julgamento conjunto: AgR no REspe 0600618-67 e AgR na AC 0601389-64O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial interposto por Wagner Feitoza e Maria Aparecida Ferreira, a fim reformar o acórdão regional para julgar improcedente a ação de investigação judicial eleitoral e para afastar a sanção de inelegibilidade; não conheceu do agravo regimental interposto pela Coligação Eu Quero Mais para Diadema; e julgou prejudicado o agravo regimental interposto por Wagner Feitoza nos autos da Ação Cautelar 0601389¿64.2020.6.00.0000, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Luís Roberto Barroso (Presidente).Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.

Ementa

ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. CANDIDATOS NÃO ELEITOS. PREFEITO E VICE–PREFEITO. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. INSTITUIÇÃO RELIGIOSA. CULTOS. VEICULAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL. PEDIDO DE VOTOS. GRAVIDADE. NÃO DEMONSTRAÇÃO. INELEGIBILIDADE. AFASTAMENTO. AGRAVO INTERNO. DECISÃO. MELHOR EXAME. RECURSO ESPECIAL. NÃO CONHECIMENTO. AGRAVO REGIMENTAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO. AÇÃO CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO. PREJUDICIALIDADE.SÍNTESE DO CASO1. Trata–se de recurso especial interposto por Wagner Feitoza e Maria Aparecida Ferreira, candidatos não eleitos aos cargos de prefeito e vice–prefeito do município de Diadema/SP nas Eleições de 2016, em face de acórdão regional que, por unanimidade, manteve a sentença que julgou procedente a ação de investigação judicial eleitoral ajuizada pela Coligação Eu Quero Mais para Diadema, com fundamento em uso indevido do poder econômico em contexto religioso, impondo–lhes a sanção de inelegibilidade pelo período de oito anos.2. Foram interpostos agravos regimentais: i) pela Coligação Eu Quero Mais para Diadema em desfavor da decisão por meio da qual foi dado provimento a agravo nos próprios autos para determinar a reautuação do feito como recurso especial; e ii) por Wagner Feitoza em face do decisum pelo qual foi negado seguimento a ação cautelar que visava à suspensão dos efeitos do acórdão recorrido.ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL DA COLIGAÇÃO3. De acordo com a jurisprudência deste Tribunal Superior, a decisão que dá provimento a agravo para melhor exame do recurso especial é irrecorrível, salvo quando discutir os pressupostos de admissibilidade do próprio agravo. Nesse sentido: AgR–REspe 1042–34, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 29.6.2015, e REspe 1564–59, rel. Min. Nancy Andrighi, DJE de 30.8.2011.4. O agravo regimental interposto pela Coligação Eu Quero Mais para Diadema em face da decisão que determinou a reautuação do agravo como recurso especial não merece conhecimento, pois as alegações apresentadas dizem respeito aos pressupostos de admissibilidade do apelo nobre, e não aos requisitos inerentes ao agravo nos próprios autos.ANÁLISE DO RECURSO ESPECIAL5. No caso, depreende–se da moldura fática do acórdão regional que:a) em três cultos realizados em datas próximas ao segundo turno das Eleições de 2016 (dias 21, 23 e 24 de outubro), na Igreja Universal do Reino de Deus no município de Diadema/SP, o pastor que presidia os atos religiosos em tela fez referências expressas ao nome e ao número de urna do candidato Wagner Feitoza, e conclamou os presentes a apoiar e a votar no referido candidato, realçando até mesmo que o citado postulante contaria com o apoio da instituição religiosa;b) em um dos cultos, o pastor fez menções depreciativas a respeito do candidato adversário, aludindo a ele como um incrédulo que estaria sendo usado pelo demônio para impedir a eleição de Wagner Feitoza, o qual, por sua vez, foi qualificado como um filho de Deus;c) em outro culto, a candidata a vice–prefeita Maria Aparecida Ferreira esteve presente e fez uso da palavra, ocasião em que aludiu ao adversário como "ser humano do lado do mal", afirmou que ele teria divulgado mentiras a respeito de Wagner Feitoza, pediu apoio político aos presentes e presenciou o pastor, que conduzia o ato religioso, afirmar que "no dia 30 a gente vai votar no 10", que corresponde ao número de urna da chapa composta pelos recorrentes;d) a prova testemunhal indica que houve distribuição de impressos de propaganda eleitoral de Wagner Feitoza no estacionamento da igreja, tendo um dos depoentes afirmado que obreiros distribuíram panfletos do citado candidato.6. A conclusão do Tribunal a quo, de que "no templo, o representante da pessoa jurídica – a igreja – fez propaganda e publicidade direta, destinada a conquistar votos para o candidato recorrente, durante culto religioso", não pode ser alterada sem o reexame do conjunto fático–probatório dos autos, o que não se admite em recurso especial, a teor do verbete sumular 24 deste Tribunal Superior.7. Dispõe o art. 24, VIII, da Lei 9.504/97 que é vedado a partido e candidato receber, direta ou indiretamente, doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, proveniente de entidades religiosas. Tal proibição legal é reforçada pelo entendimento do Supremo Tribunal Federal de que as pessoas jurídicas não podem contribuir para as campanhas eleitorais, conforme decidido no julgamento da ADI 4.650, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 24.2.2016. Por outro lado, a veiculação de propaganda eleitoral em templos encontra óbice no art. 37, § 4º, da Lei 9.504/97, o qual veda tal prática nos bens de uso comum, quais sejam, os assim definidos pelo Código Civil e aqueles a que a população em geral tem acesso, ainda que de propriedade privada.8. Este Tribunal Superior já manifestou a compreensão de que "a prática de atos de propaganda em prol de candidatos por entidade religiosa, inclusive os realizados de forma dissimulada, pode caracterizar a hipótese de abuso do poder econômico, mediante a utilização de recursos financeiros provenientes de fonte vedada" (RO 2653–08, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 5.4.2017).9. Na espécie, as premissas fáticas registradas no acórdão regional permitem depreender o emprego de recursos estimáveis em dinheiro em benefício da campanha eleitoral dos recorrentes, consistentes no uso do templo pelo pastor para a veiculação de propaganda eleitoral e de pedidos de apoio político e de votos, assim como na atuação de obreiros da igreja na distribuição de propaganda impressa, o que torna insubsistente o argumento recursal de que não haveria prova do uso da estrutura da Igreja Universal do Reino de Deus em benefício dos candidatos.10. A Corte de origem afirmou a gravidade das condutas considerando: i) as datas dos eventos ilícitos, próximas ao segundo turno; ii) a quantidade de fieis presentes; iii) a repetição da conduta; e iv) o teor dos pronunciamentos (discursos favoráveis ao candidato recorrente, incitação dos fiéis a votarem nele e a identificação do adversário como satanás).11. Da leitura do acórdão regional, infere–se que não foram apresentados fundamentos suficientes para justificar a conclusão de que os fatos narrados se revestem de gravidade a ponto de afetar a legitimidade do pleito e a igualdade de chances entre os candidatos, pois:a) embora o Tribunal de origem aponte a ocorrência dos cultos em datas próximas ao segundo turno e a repetição da conduta como aspectos indicativos da gravidade na espécie, é certo que os fatos tidos como abusivos ocorreram em apenas três cultos, número que carece de maior expressividade, ainda que tenham ocorrido as vésperas do segundo turno;b) não há no acórdão regional informações mínimas acerca de quanto tempo dos cultos foi destinado especificamente à promoção dos candidatos, por meio de pronunciamentos favoráveis e de incitação ao voto nos recorrentes e contrários ao seu adversário no pleito. Quanto ao ponto, observa–se que as falas transcritas no acórdão regional são curtas, o que permite concluir que o tempo utilizado para a prática dos atos ilícitos foi pequeno, ainda que não se possa indicá–lo com precisão;c) o aresto recorrido não demonstra que a quantidade de fiéis presentes nos cultos em tela seja relevante em relação ao eleitorado do município. A presença de, no máximo, 1.600 pessoas nos três cultos em que ocorreram os fatos narrados é irrelevante no contexto do município de Diadema/SP, cuja eleição foi, de acordo com o aresto regional, decidida em segundo turno, e, por conseguinte, contava mais de 200 mil eleitores à época das Eleições de 2016;d) não há demonstração de que os fatos narrados tenham representado gastos vultosos e excessivos de recursos patrimoniais, a fim de configurar o abuso do poder econômico, o qual se caracteriza "pelo emprego desproporcional de recursos patrimoniais (públicos ou privados), com gravidade suficiente para afetar o equilíbrio entre os candidatos e macular a legitimidade da disputa" (AIJE 0601864–88, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 25.9.2019).12. Na espécie, o Tribunal de origem não demonstrou que os fatos descritos no acórdão regional ostentariam gravidade suficiente para afetar a legitimidade do pleito e a isonomia entre os candidatos, o que é necessário para a caracterização do abuso do poder econômico, nos termos do art. 22, XVI, da Lei Complementar 64/90.13. A orientação deste Tribunal Superior é no sentido de que, para a imposição da inelegibilidade decorrente da prática de abuso do poder econômico, exige–se a comprovação de que o beneficiário tenha participado direta ou indiretamente nos fatos tidos como abusivos. Nesse sentido: REspe 458–67, rel. Min. Luiz Fux, DJE de 15.2.2018.14. De acordo com a moldura fática do acórdão regional, a recorrente Maria Aparecida Ferreira não pode ser considerada mera beneficiária de atos praticados por terceiros, pois a então candidata a vice–prefeita esteve presente em um dos cultos religiosos, ocorrido no dia 23.10.2016, ocasião em que ela fez uso da palavra, pediu apoio político aos presentes e presenciou o pastor, que conduzia o ato religioso, afirmar que "no dia 30 a gente vai votar no 10", que corresponde ao número de urna da chapa encabeçada por Wagner Feitoza, o que também afasta a alegação de que as práticas tidas como abusivas seriam resultado de conduta isolada do líder religioso.15. A tese recursal de que teria havido apenas referência a candidatura, sem pedido de votos, não tem amparo no quadro fático fixado pela Corte de origem, o qual registra pedido de apoio a favor dos recorrentes e referências reiteradas ao número correspondente ao do candidato Wagner Feitoza, com o uso de frases como "nós estamos aqui para eleger o Vaguinho", "Vaguinho é o quê? 10!", "No dia 30 a gente vai votar no 10", "Então é 10 tá! É 10 pessoal. 10 na cabeça".16. No que se refere ao recorrente Wagner Feitoza, é patente a fragilidade da prova acerca da sua participação, anuência ou ciência quanto aos fatos descritos no acórdão regional. Isso porque:a) a Corte de origem assenta, de forma genérica, a existência de íntima relação entre o Partido Republicano Brasileiro e a Igreja Universal do Reino de Deus, mas não demonstra eventual liame entre o candidato e o pastor que presidiu os cultos ou com a citada instituição religiosa, para além do apoio político declarado pelo representante da igreja;b) o aresto recorrido não indica nenhum outro elemento de prova que evidencie a ciência, a anuência ou a participação do candidato Wagner Feitoza nas práticas tidas como abusivas, a não ser o depoimento da testemunha Thiago Matioli da Silva, o qual gravou cultos, salvo aquele no qual, segundo afirma, o candidato estaria presente e teria presenciado pedido de voto em seu benefício.17. A alegação de afronta ao art. 368–A do Código Eleitoral foi prequestionada e, quanto ao tema, esta Corte Superior já teve oportunidade de, no julgamento do AgR–REspe 364–24, rel. Min. Jorge Mussi, DJE de 25.2.2019, afastar, com base no citado dispositivo legal, a inelegibilidade imposta a candidato a vice–prefeito por falta de prova robusta da sua participação ou anuência quanto às condutas abusivas, embora tenha mantido a cassação do mandato em virtude da indivisibilidade da chapa.18. O recurso especial merece ser provido, a fim de reformar o acórdão recorrido e julgar improcedente a ação de investigação judicial eleitoral em relação aos recorrentes Wagner Feitoza e Maria Aparecida Ferreira, afastando quanto a eles a sanção de inelegibilidade aplicada pelas instâncias ordinárias, pelos fundamentos a seguir sintetizados:a) no que tange ao candidato a prefeito Wagner Feitoza, em virtude da ausência de gravidade das condutas descritas no acórdão regional e da fragilidade da prova a respeito da sua suposta participação, anuência ou ciência quanto aos fatos tidos como abusivos;b) no que se refere à candidata a vice–prefeita Maria Aparecida Ferreira – em relação à qual ficou demonstrada a participação em somente um dos três cultos utilizados para promoção da candidatura dos recorrentes –, em razão apenas da ausência de gravidade das condutas.ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO CAUTELAR19. Julgado o recurso especial ao qual se pretendia conferir efeito suspensivo, fica prejudicado o exame do agravo interno manejado em face da decisão individual que negou seguimento à ação cautelar ajuizada para agregar eficácia suspensiva ao apelo nobre.CONCLUSÃORecurso especial a que se dá provimento.Agravo regimental da Coligação Eu Quero Mais para Diadema não conhecido.Agravo regimental de Wagner Feitoza manejado nos autos da Ação Cautelar 0601389–64.2020.6.00.0000 a que se julga prejudicado.


Jurisprudência TSE 060138964 de 13 de maio de 2021