Jurisprudência TSE 060137257 de 17 de outubro de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Floriano De Azevedo Marques
Data de Julgamento
28/09/2023
Decisão
O Tribunal, por maioria, julgou procedente a representação para, confirmando a liminar, determinar a retirada definitiva do conteúdo impugnado e condenar a representada ao pagamento de multa na quantia R$ 15.000,00, em virtude da veiculação de propaganda eleitoral irregular, nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Raul Araújo. Acompanharam o Relator, os Ministros André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves e Alexandre de Moraes (Presidente). Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
ELEIÇÕES 2022. REPRESENTAÇÃO. CANDIDATO A PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. TWITTER. VÍDEO INTITULADO "RELEMBRE OS ESQUEMAS DO GOVERNO LULA". CARÁTER DESINFORMATIVO. INFRAÇÃO AO ART. 9º–A DA RES.–TSE 23.610. PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. LIMINAR DEFERIDA. CONFIRMAÇÃO. REMOÇÃO DE CONTEÚDO. ART. 57–D, § 2º, DA LEI 9.504/97. MULTA. APLICAÇÃO.SÍNTESE DO CASO1. Trata–se de representação ajuizada pela Coligação Brasil da Esperança em desfavor de Brasil Paralelo Entretenimento e Educação S/A, sob a alegação de que a demandada, no dia 5.10.2022, veiculou vídeo em seu perfil do Twitter, intitulado RELEMBRE OS ESQUEMAS DO GOVERNO LULA, difundindo fatos supostamente inverídicos e descontextualizados em desfavor de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à presidência da República, com o intuito de influenciar o eleitorado no segundo turno das eleições, mediante a promoção de propaganda negativa, com o dolo específico de manipular o pleito eleitoral, em infração aos arts. 9º–A e 27 da Res.–TSE 23.610.2. Por meio de acórdão proferido em 26.10.2022, o plenário desta Corte Superior deliberou por não referendar o indeferimento monocrático de medida liminar, decidindo em maioria pela sua concessão e determinando às empresas Twitter e Brasil Paralelo Entretenimento e Educação S/A a imediata remoção do conteúdo impugnado no prazo de 24 horas, sob pena de multa de R$ 10.000,00 por dia de descumprimento, além de determinar que a representada não realizasse novas postagens ou novos compartilhamentos dos conteúdos objetos da presente ação, também sob pena de multa de R$ 10.000,00 (ID 158258905).ANÁLISE DA REPRESENTAÇÃO3. O entendimento deste Tribunal Superior é no sentido de que o art. 9º–A da Res.–TSE 23.610 se insere no microssistema de tutela da propaganda eleitoral fixado nos arts. 36 e seguintes da Lei 9.504/97 e que é ampla a legitimidade ativa para ajuizamento de representações fundadas em ofensa ao referido dispositivo, razão pela qual as representações por propaganda eleitoral irregular, "independente da causa de pedir, podem ser movidas pelos legitimados ativos indicados no art. 96 da Lei nº 9.504/97 (e não apenas pelo Ministério Público)" (Rp 0600550–68, rel. Min. Maria Claudia Bucchianeri, PSESS em 30.9.2022).4. No tocante ao argumento de suposta violação ao devido processo legal, anoto que, diante do pedido de tutela provisória de urgência, presentes os requisitos da probabilidade do direito e do perigo do dano ou do risco ao resultado útil do processo, torna–se possível a concessão de liminar inaudita altera pars com fulcro no § 2º do art. 300 da Lei 13.105/2015, processualística aplicável subsidiariamente às ações eleitorais, conforme previsto no parágrafo único do art. 2º da Res.–TSE 23.478, devendo essa medida ser submetida à análise do colegiado em observância ao art. 2º da Portaria 791/2022 do TSE.5. A representada não trouxe elementos aos autos capazes de afastar as alegações da representante, ou aptos a alterar a conclusão desta Corte de que os referidos "esquemas", mencionados no vídeo veiculado, na verdade não são do "Governo Lula" como o nome do audiovisual sugere, uma vez que, a partir das premissas referenciadas, não é possível chegar à conclusão induzida pelo título, conforme detalhadamente analisado no acórdão concessivo da medida liminar.6. A argumentação da representada de que "o conteúdo é meramente informativo, e relembra de maneira jornalística os escândalos dos 'Bingos', dos 'Correios', 'Mensalão', 'Dólares na Cueca' e a 'Máfia dos sanguessugas'" não procede, na medida em que o enredo é encerrado sem completar a afirmação do título, ou seja, sem indicar a possível participação ou responsabilização do candidato da representante.7. A alegada produção meramente informativa se torna ainda mais controversa ao contextualizarmos que a produção é recente e aborda fatos remotos, excluindo propositalmente elementos que se sucederam aos fatos e que já eram de domínio comum.8. As narrativas ínsitas ao objeto da representação destoam do título RELEMBRE OS ESQUEMAS DO GOVERNO LULA, construção textual que se revela precária e confusa, reconhecidamente negativa, que, conforme consignado no acórdão, por ser divulgada durante o processo eleitoral no ambiente da "câmara de eco" da rede social, torna–se capaz de desorientar o eleitor e causar desordem informacional, de forma que a população "gradativamente perde a habilidade de distinguir verdade de falsidade, fatos de versões".9. Tal prática é coibida pelo art. 9º–A da Res.–TSE 23.610, em vigor à época dos fatos, segundo o qual "é vedada a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos, devendo o juízo eleitoral, a requerimento do Ministério Público, determinar a cessação do ilícito, sem prejuízo da apuração de responsabilidade penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)". Embora tal dispositivo tenha sido revogado pela Res.–TSE 23.714, de 20.10.2022, a novel resolução contém preceito de teor semelhante: "Art. 2º. É vedada, nos termos do Código Eleitoral, a divulgação ou compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos".10. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que "a garantia da livre manifestação de pensamento não possui caráter absoluto, afigurando–se possível a condenação por propaganda eleitoral negativa, no caso de a mensagem divulgada ofender a honra ou a imagem do candidato, dos partidos ou coligações, ou propagar fatos sabidamente inverídicos" (AgR–REspEl 0600502–68, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 15.12.2022).11. Por ocasião da análise do Rec–Rp 0601754–50, julgado em 28.3.2023, e do Rec–Rp 0601756–20, julgado em 18.4.2023, ambos da relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, este Tribunal Superior, por maioria, entendeu que é possível a aplicação da multa prevista no art. 57–D, § 2º, da Lei 9.504/97 às hipóteses de abuso na liberdade de expressão ocorrido na propaganda eleitoral veiculada por meio da internet, notadamente no caso de disseminação de conteúdo desinformativo.12. Na espécie, considerada a sua chamada desinformativa, o vídeo em questão registrava 213,7 mil visualizações desde a sua estreia no dia 5.10.2022 (ID 158201942) até pelo menos a data da propositura da representação (6.10.2022), o que denota o grande alcance do conteúdo audiovisual impugnado e, a meu sentir, justifica a fixação da multa em patamar acima do mínimo previsto em lei.13. Considerando o grande alcance do referido material audiovisual no período em que ficou disponível no Twitter, entendo que é razoável e proporcional a aplicação, aos representados, de multa na quantia de R$ 15.000,00, com base no § 2º do art. 57–D da Lei 9.504/97.CONCLUSÃORepresentação julgada procedente.