Jurisprudência TSE 060136565 de 02 de outubro de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Benedito Gonçalves
Data de Julgamento
25/05/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, rejeitou as questões preliminares e, no mérito, julgou procedentes os pedidos da Representação, para aplicar à representada Carla Zambelli Salgado de Oliveira multa pecuniária no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) e determinou, ainda, a remoção dos conteúdos irregulares, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros Raul Araújo, Maria Claudia Bucchianeri Pinheiro, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e Alexandre de Moraes (Presidente). Falou pela representada Carla Zambelli Salgado de Oliveira, o Dr. Thiago Rocha Domingues. Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Maria Claudia Bucchianeri Pinheiro (substituta) e André Ramos Tavares (substituto).
Ementa
REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2022. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET.1. Representação ajuizada por coligação em desfavor de candidata ao cargo de deputado federal por São Paulo nas Eleições 2022, por propaganda irregular consubstanciada em vídeo de sua autoria, na plataforma YouTube, em que veiculou notícias falsas a respeito de suposta manipulação de urnas eletrônicas no Município de Itapeva/SP.PRELIMINARES. EXTEMPORANEIDADE. ILEGITIMIDADE ATIVA. INCOMPETÊNCIA. REJEIÇÃO.2. A demanda foi proposta em 5/10/2022, data anterior ao segundo turno, e o teor da postagem impugnada cinge–se à legitimidade do processo eleitoral como um todo. Preliminar de extemporaneidade rejeitada.3. A coligação autora é parte legítima, haja vista a revogação do art. 9º–A da Res.–TSE 23.610/2019 (que restringia a legitimidade ao Ministério Público). Ademais, os fatos podem vir a ensejar a do art. 57–D, § 2º, da Lei 9.504/97, o que por sua vez atrai o art. 96 da mesma Lei, segundo o qual são legitimados ativos "qualquer partido político, coligação ou candidato".4. Compete a esta Corte – e não ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo – julgar a representação, pois o teor da postagem abrange as eleições em âmbito nacional, notadamente porque as supostas irregularidades nas urnas compreenderiam, por óbvio, o pleito presidencial (art. 96, III, da Lei 9.504/97).TEMA DE FUNDO. CONTEÚDO FALSO E ATENTATÓRIO À LISURA DO PROCESSO ELEITORAL. ART. 57–D, § 2º, DA LEI 9.504/97.5. Lê–se no art. 27, § 1º, da Res.–TSE 23.610/2019 que "[a] livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos [...]".6. Nos termos da jurisprudência desta Corte, é cabível aplicar–se a multa prevista no art. 57–D, § 2º, da Lei 9.504/97 na hipótese de abuso na liberdade de expressão ocorrido por meio de propaganda veiculada na internet – como ocorre na divulgação de discurso de ódio, ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático, e de informações injuriosas, difamantes ou mentirosas. Nesse sentido, a decisão proferida na Rp 0601754–50/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, sessão de 28/3/2023.7. No caso, são inequívocos o conteúdo do vídeo impugnado e sua veiculação em 27/9/2022 na plataforma YouTube. Nele, a representada apresenta–se como Deputada Federal e afirma que estaria buscando esclarecimentos sobre suposta manipulação de urnas eletrônicas no Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção, do Mobiliário, Cimento, Cal, Gesso e Montagem Industrial de Itapeva/SP. Ademais, relata seu assombro com o fato de haver pessoas "manipulando" urnas eletrônicas em local irregular, sugerindo que estaria acontecendo algo grave na preparação do pleito, o que precisaria ser apurado. Consta, por fim, do vídeo: "Carla Zambelli Deputada Federal 2210".8. Tal como assentou esta Corte ao referendar a liminar deferida neste feito, o conteúdo transmite desinformação e apresenta situações gravemente descontextualizadas. Ressalte–se que, antes mesmo do vídeo, o TRE/SP veiculou nota em 25/9/2022 esclarecendo os fatos e, mesmo assim, a representada divulgou suspeita manifestamente infundada, além de omitir a resposta da autoridade competente, em ato de evidente má–fé.9. O sistema eletrônico de votação brasileiro, internacionalmente reconhecido, foi implementado nas Eleições 1996 e atendeu de forma inequívoca aos propósitos de segurança dos dados, de sigilo do voto e de celeridade na apuração, em contraposição a inúmeros os fatores que poderiam comprometer os pleitos em urnas de lona, tais como erros humanos na fase de contagem e manipulações em benefício de candidatos e legendas.10. A parceria entre órgãos institucionais de ponta na área de tecnologia, a constante busca por inovação e o contínuo diálogo propiciaram a plena segurança do sistema eletrônico de votação nos seus 27 anos, sem nenhuma prova de fraude de qualquer espécie, conforme inúmeras auditorias internas e externas e testes públicos de segurança promovidos pela Justiça Eleitoral.CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS. MULTA. REMOÇÃO DE CONTEÚDO.11. Comprovada a propagação de notícia inequivocamente falsa com aptidão para vulnerar a normalidade do processo eleitoral, incide a multa do § 2º do art. 57–D da Lei 9.504/97, in verbis: "[a] violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais)".12. Na espécie, impõe–se aplicar a multa em grau máximo, haja vista três fatores: (a) a notória má–fé da representada, que, mesmo após a nota do TRE/SP, livre e conscientemente produziu e divulgou o vídeo; (b) a gravidade das infundadas acusações à lisura do processo eleitoral, sem qualquer amparo no mundo dos fatos; (c) até 2/10/2022, o vídeo teve 86.554 visualizações.13. Excepcionalmente, não há falar em perda do objeto quanto à retirada do conteúdo após encerrado o período eleitoral, consequência prevista no art. 38, § 7º, da Res.–TSE 23.610/2019 e na jurisprudência desta Corte.14, O caso dos autos apresenta relevante particularidade, porquanto os infundados e reprováveis ataques tiveram como alvo central o próprio sistema eletrônico de votação. Assim, tem–se que os efeitos nefastos da conduta perpetuam–se para depois do término do período eleitoral e que o conteúdo do vídeo pode vir a ser usado para novas e descabidas agressões em pleitos futuros, o que justifica sua remoção.CONCLUSÃO. PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS.15. Pedidos julgados procedentes para aplicar à representada Carla Zambelli Salgado de Oliveira multa pecuniária no valor de R$ 30.000,00 e, ainda, determinar a remoção dos conteúdos indicados nos links contidos às fls. 33–34 da petição inicial.