Jurisprudência TSE 060121356 de 02 de maio de 2022
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Mauro Campbell Marques
Data de Julgamento
29/03/2022
Decisão
O Tribunal, por maioria, julgou desaprovadas as contas do Podemos (PODE) Nacional, referentes ao pleito de 2018, nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Carlos Horbach e Edson Fachin (Presidente). Por unanimidade, determinou a) o ressarcimento do valor de R$ 1.143.725,01 ao erário, atualizado e com recursos próprios (art. 82, §§ 1º e 2º, da Res.¿TSE nº 23.553/2017); b) o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 83.822,26, atualizado e com recursos próprios (art. 33, I, §§ 3º e 4º, da Res.¿TSE nº 23.553/2017); e c) a suspensão do recebimento de novas cotas do Fundo Partidário pelo período de 2 meses, a ser cumprida, de forma parcelada, pelo período de 4 meses, nos termos do voto do Relator. Falou pelo requerente Podemos (PODE) Nacional, o Dr. Joelson Costa Dias. Composição: Ministros Edson Fachin (Presidente), Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. PODEMOS. DIRETÓRIO NACIONAL. ELEIÇÕES 2018. IRREGULARIDADES QUE TOTALIZAM R$ 1.227.547,27. DESCUMPRIMENTO DA NORMA REFERENTE AO FINANCIAMENTO DAS CANDIDATURAS FEMININAS. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO COMPROBATÓRIA DE DESPESAS COM SERVIÇOS GRÁFICOS E MATERIAIS IMPRESSOS. OMISSÃO DE DESPESA COM SERVIÇO PRESTADO POR PESSOA JURÍDICA. PAGAMENTO NÃO IDENTIFICADO. DOAÇÃO POR FONTE VEDADA. FALHAS GRAVES. COMPROMETIMENTO DA TRANSPARÊNCIA, DA FISCALIZAÇÃO E DO CONTROLE SOCIAL. DESAPROVAÇÃO.1. Impropriedade: descumprimento do prazo para entrega do relatório financeiro. Nos termos do art. 50, I e II, da Res.–TSE nº 23.553/2017, os partidos políticos e os candidatos são obrigados, durante as campanhas eleitorais, a entregar a esta Justiça especializada, para divulgação em página criada na internet para esse fim, os dados relativos aos recursos financeiros recebidos para o financiamento da campanha, em até 72 horas contadas do recebimento, e o relatório parcial com a discriminação das transferências do Fundo Partidário e do FEFC, dos recursos financeiros e dos estimáveis em dinheiro recebidos, bem como dos gastos realizados. Impropriedade mantida.2. Impropriedade: omissão de receitas na prestação de contas parcial. Confronto com a prestação de contas final. Na linha da jurisprudência firmada no âmbito desta Corte para as eleições ocorridas antes de 2020, a omissão de informações na prestação de contas parcial não configura irregularidade, visto que é possível o saneamento do vício na prestação de contas final. Princípio da segurança jurídica. Precedente. Impropriedade mantida.3. Impropriedade: omissão de despesas na prestação de contas parcial. Na linha do entendimento deste Tribunal Superior, para as prestações de contas relativas às eleições anteriores a 2020, a omissão de informações nas parciais, desde que sanadas na prestação de contas final, não será classificada como irregularidade. Mera falha formal. Princípio da segurança jurídica. Impropriedade mantida.4. Impropriedade: registro incorreto de despesas. Não correção dos erros pelo prestador com a apresentação da prestação de contas retificadora. Impropriedade mantida.5. Irregularidade: descumprimento da norma referente ao financiamento das candidaturas de gênero.5.1. No caso, a agremiação deixou de aplicar o valor de R$ 1.050.555,01 (equivalente a 2,91% dos 30% que deveria ter aplicado), em descumprimento ao art. 19 ,§ 3º, da Res.–TSE nº 23.553/2017.5.2. A irregularidade é de notória gravidade, por desnaturar a ação afirmativa especialmente criada para promover a igualdade de gênero no cenário político nacional, conforme ratificou esta Corte Superior no recente julgamento da PC nº 0601236–02/DF, ocorrido em 17.2.2022, em que fui designado redator para o acórdão.5.3. O montante mínimo não aplicado em candidaturas de gênero constitui aplicação indevida dos recursos, impondo–se a necessidade da sua devolução ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 82, §§ 1º e 2º, da Res.–TSE nº 23.553/2017.6. Irregularidade: ausência de documentação comprobatória de despesas com serviços gráficos e materiais impressos.6.1. No caso, o partido não apresentou a documentação fiscal relativa a despesas que totalizaram R$ 93.170,00, documento indispensável para comprovar a regularidade do gasto eleitoral, nos termos do art. 56, II, c, da Res.–TSE nº 23.553/2017.6.2. Ademais, ainda que a nota fiscal tivesse sido apresentada, para essa espécie de gasto eleitoral, a comprovação de sua regularidade também depende da análise do material publicitário impresso, haja vista a necessidade de se aferir a vinculação do material produzido com a empresa e/ou responsável pela confecção, conforme se extrai do art. 38, § 1º, da Lei 9.504/1997 c.c o § 4º do art. 37 da Res.–TSE nº 23.553/2017, providência que o partido também não se desincumbiu de demonstrar.7. Irregularidade: omissão de registro com gastos eleitorais cujos pagamentos não foram identificados.7.1. No caso, verificou–se, por meio de convênio entre as secretarias de Fazenda estaduais e municipais, a emissão de várias notas fiscais, no período de agosto a outubro de 2018, por pessoas jurídicas que prestaram serviços ao partido. Todavia, tais despesas não foram registradas e nem comprovadas pela agremiação, não havendo nos autos extratos bancários, o registro dos pagamentos e nem a origem dos recursos utilizados.7.2. Esta Corte Superior, ao analisar essa específica irregularidade, entendeu que, "configurada a emissão de nota fiscal referente a serviços prestados [...] sem o correspondente pagamento, deve ser reconhecida a existência de doação de fonte vedada, nos termos do art. 33, I, da Res.–TSE 23.553" (PC nº 0601188–43/DF, rel. Min. Sérgio Silveira Banhos, DJe de 3.2.2022)7.3. Ademais, "a ausência de registro de despesas constitui irregularidade grave apta a macular a confiabilidade das contas" (PCE nº 444–68/DF, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 26.5.2021. No mesmo sentido: PC nº 0000425–62, de minha relatoria, DJe de 10.11.2021.8. Conclusão8.1. A soma das irregularidades atingiu o valor de R$ 1.227.547,27, que equivale a 2,83% dos recursos arrecadados na campanha.8.2. O elevado valor absoluto das irregularidades também constitui critério balizador do julgamento das contas. Nesse sentido: PCs nºs 159–75/DF, 162–30/DF, 165–82/DF, 0601752–56/DF, 0601829–65/DF, 0601728–28/DF, 0601763–85/DF e 0600416–80/DF, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, respectivamente publicadas no DJe de 18.5.2021, 2.6.2021, 4.6.2021, 3.8.2021, 13.9.2021, 14.9.2021 e 17.3.2022; PCs nºs 0601850–41/DF, 0600411–58/DF e 0601236–02/DF, de minha relatoria, respectivamente publicadas no DJe 7.10.2021; 15.12.2021 e 17.3.2022.8.3. No caso, além do alto valor absoluto das irregularidades (R$ 1.227.547,27), o partido descumpriu o repasse do percentual mínimo de 30% dos recursos do FEFC para a cota de gênero e omitiu gastos eleitorais que configuraram doação por fonte vedada, falhas de natureza grave. Precedentes.8.4. As falhas verificadas, de incontroversa gravidade, denotam o malferimento à transparência, à lisura e ao indispensável zelo no uso dos recursos públicos.8.5. Contas desaprovadas. Determinações: a) ressarcimento do valor de R$ 1.143.725,01 ao erário, atualizado e com recursos próprios (art. 82, §§ 1º e 2º, da Res.–TSE nº 23.553/2017); b) recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 83.822,26, atualizado e com recursos próprios (art. 33, I, §§ 3º e 4º, da Res.–TSE nº 23.553/2017); e c) suspensão do recebimento de novas cotas do Fundo Partidário pelo período de 2 meses, a ser cumprida, de forma parcelada, pelo período de 4 meses, nos termos do art. 77, §§ 4º e 6º, da Res.–TSE nº 23.553/2017, c/c o art. 25, caput e parágrafo único, da Lei nº 9.504/1997.