Jurisprudência TSE 060095730 de 15 de dezembro de 2022
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Raul Araujo Filho
Data de Julgamento
15/12/2022
Decisão
Preliminarmente, o Tribunal, por unanimidade, indeferiu o pedido de ingresso nos autos, como amicus curiae, formulado por terceiro interessado, e no mérito, negou provimento ao recurso ordinário interposto pela Federação Brasil da Esperança e ao recurso especial interposto por Thiago de Sousa Bagatin, e não conheceu do recurso ordinário interposto pelo Partido da Mobilização Nacional (PMN) Estadual, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves e Alexandre de Moraes (Presidente). Falaram: pela recorrente Federação Brasil da Esperança (FE BRASIL) Estadual, o Dr. Luiz Eduardo Peccinin; pelo recorrente Partido da Mobilização Nacional (PMN) Estadual, a Dra. Juliana Bertholdi; e pelo recorrido Sergio Fernando Moro, o Dr. Gustavo Bonini Guedes. Acórdão publicado em sessão. Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
ELEIÇÕES 2022. RECURSO ESPECIAL. RECURSOS ORDINÁRIOS. RRC. SENADOR. DEFERIMENTO NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA. 1.INTERVENÇÃO DE TERCEIROS. AMICUS CURIAE. IMPOSSIBILIDADE. PEDIDO INDEFERIDO. MÉRITO. 2.CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE. 2.1.FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. TERRITORIALIDADE. VINCULAÇÃO À CIRCUNSCRIÇÃO DO CARGO ELETIVO. DESNECESSIDADE. INFORMATIZAÇÃO. CARÁTER NACIONAL DOS PARTIDOS POLÍTICOS. FILIAÇÃO PERANTE MÚLTIPLOS ÓRGÃOS PARTIDÁRIOS. ESCOLHA. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 14, § 3º, V, DA CF, C/C ART. 9º DA LEI DAS ELEIÇÕES. 2.2.DOMICÍLIO ELEITORAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO DE TRANSFERÊNCIA DE DOMICÍLIO. INDEFERIMENTO PELO TRE DE DESTINO. MANUTENÇÃO DO VÍNCULO DOMICILIAR ANTERIOR. STATUS QUO. 3.INELEGIBILIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. ALÍNEA Q. MAGISTRADO. EXONERAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR STRICTO SENSU. MENS LEGIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. JURISPRUDÊNCIA ITERATIVA. 4.CONCLUSÃO. PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE. NÃO INCIDÊNCIA DE CAUSA DE INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, Q, DA LC Nº 64/90. ACÓRDÃO REGIONAL. ACERTO. RECURSOS ESPECIAL E ORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. SEGUNDO RECURSO ORDINÁRIO. ERRO GROSSEIRO. NÃO CONHECIMENTO.1. Preliminar: É inviável o acolhimento do pedido de ingresso de terceiro, ante a incompatibilidade da figura do amicus curiae com a celeridade tipicamente reclamada pelos feitos eleitorais (art. 5º da Res.–TSE nº 23.478/2016). Precedente.2. Na espécie, o Tribunal local, ao rejeitar as impugnações apresentadas, deferiu o RRC do candidato ao fundamento de que foram satisfeitas as condições de elegibilidade de (I) filiação partidária e de (II) domicílio eleitoral, ao tempo em que não se verificou a incidência da suscitada causa de inelegibilidade delineada no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990.3. Os recursos manejados ancoram–se, essencialmente, na ausência de preenchimento das preditas condições de elegibilidade, ante a pretensa falta de higidez na relação do candidato recorrido com a agremiação pela qual se sagrou eleito, considerando a existência de pedido de transferência de domicílio eleitoral para outra unidade da Federação, bem como o seu ulterior cancelamento pelo Tribunal regional de destino, havendo, ainda, suposta incidência do candidato na hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990, ante o seu pedido de exoneração da magistratura na alegada pendência de resolução de expedientes disciplinares.4. Um dos recursos ordinários não há de ser conhecido. Não obstante o aresto regional tenha se debruçado tanto sobre condições de elegibilidade quanto sobre causa de inelegibilidade, seu objeto versa somente sobre capítulo específico do acórdão, qual seja, condição de elegibilidade (filiação partidária), cenário que desafia a interposição de recurso especial –, e não de recurso ordinário, como manejado pela parte, conforme o art. 63, II, da Res.–TSE nº 23.609/2019.5. A jurisprudência deste Tribunal Superior perfilha sentido de ser manifestamente incabível o recurso ordinário interposto exclusivamente para impugnar a parte do acórdão que tratou da condição de elegibilidade, de forma que sua interposição é considerada erro grosseiro, sendo inaplicável o princípio da fungibilidade. Precedente.6. No mérito, argui–se que o requerimento de transferência de domicílio realizado pelo candidato tem o condão de, per si, romper seu vínculo domiciliar anterior, fato que seria obstativo do atendimento à condição de elegibilidade de domicílio eleitoral no Estado de origem, notadamente porquanto a comunicação de desligamento feita ao partido anterior teria sido realizada a destempo, em violação ao art. 21 da Lei nº 9.096/1995. Ainda, o candidato filiou–se perante órgão nacional do partido pelo qual se sagrou eleito, em situação em que buscava modificar sua situação domiciliar.7. O quadro, portanto, é de coexistência de filiações partidárias, situação especificamente prevista em lei eleitoral e que tem, portanto, solução própria, com a prevalência da relação partidária mais recente, por força do art. 22 da Lei nº 9.096/1995, sendo despicienda a comunicação de desfiliação prevista no art. 21 da Lei nº 9.096/1995. Precedente.8. A Res.–TSE nº 23.659/2021, – que versa sobre cadastro eleitoral –, ao regulamentar o instituto do domicílio eleitoral, estatui que para fins de fixação do domicílio é imprescindível que a operação de transferência tenha sido devidamente concluída.9. A não perfectibilização da transferência requerida pelo candidato torna de rigor a conclusão de que o domicílio eleitoral a ser considerado por esta Justiça especializada é o de origem, sob pena de se assentir com a lógica de que o candidato não fixou qualquer vínculo de nenhuma ordem em lugar algum – o que não se admite. É dizer: há a manutenção do vínculo originário. Inteligência do art. 56, II, da Res.–TSE nº 23.659/2021.10. A tese de que a filiação deve, necessariamente, ser processada perante o órgão partidário do domicílio eleitoral do eleitor não encontra ressonância na atual sistemática eleitoral. O art. 88, parágrafo único, do CE, além de fazer remissão expressa às eleições proporcionais – o que não ocorre no caso –, perfaz normativo preexistente à Constituição que não encontra campo de incidência quando se leva em conta o teor do art. 14, § 3º, V da CF c/c art. 9º da Lei das Eleições: dispositivos que desvinculam a filiação aos limites territoriais da circunscrição – ao contrário da redação dos mesmos artigos que expressamente relaciona a territorialidade ao domicílio eleitoral. Destarte, o regime jurídico da Lei nº 9.096/1995 não impõe que a inscrição da filiação se dê, necessariamente, junto ao órgão partidário correspondente ao seu domicílio eleitoral (art. 3º, caput, § 1º, da Res.–TSE 23.596/2019).11. Não há falar na incidência da causa de inelegibilidade delineada no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990. Articula–se tal tese por força do pedido de exoneração da magistratura federal formulado pelo recorrido, ainda na pendência de pretensos expedientes disciplinares instaurados no CNJ.12. Os preditos expedientes correram sob a forma de Pedido de Providências e de Reclamação Disciplinar. É forçosa, portanto, a conclusão pela ausência de instauração de Processo Administrativo Disciplinar, elementar reclamada pela legislação eleitoral para a configuração do impedimento temporário. Isso porque não é qualquer espécie de procedimento disciplinar que leva à aplicação de penalidades ao magistrado.13. É iterativa a jurisprudência deste Tribunal Superior no sentido de que normas delineadas na Lei de Inelegibilidade (LC nº 64/1990), por serem de ordem restritiva, também devem ser interpretadas restritivamente, sob pena de se incorrer em indevida analogia, desnaturando o comando legal. Precedentes.14. Inexistência de malferimento à mens legis, visto que a norma impugnada imbrica–se com a noção de alijar da vida política membro do Poder Judiciário que, ardilosamente, procura evadir–se do desfecho de processo administrativo. No caso, é público e notório que o desligamento da atividade judicante se deu para início dos preparativos de futura assunção a cargo público no Executivo Federal. Tal fato, aliado a uma interpretação restritiva do termo Processo Administrativo Disciplinar, não leva a outra conclusão senão à de que não houve a configuração da causa de inelegibilidade.15. Inviável o acolhimento do pedido subsidiário de aplicação do princípio da anualidade (art. 16 da CF), seja porque a matéria de fundo é aqui analisada pela primeira vez, seja porque as antigas consultas administrativas não se prestam como precedentes, não havendo falar, portanto, em overruling. Precedentes.16. Uma vez satisfeitas as condições de elegibilidade de (I) domicílio eleitoral e de (II) filiação partidária, bem como não havendo falar na incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, q, da LC nº 64/1990, a manutenção do aresto regional é medida que se impõe.17. Recursos especial e ordinário a que se negam provimento. Não conhecimento do segundo recurso ordinário.