Jurisprudência TSE 060071064 de 11 de setembro de 2024
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Raul Araújo Filho
Data de Julgamento
23/05/2024
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, julgou aprovadas com ressalvas as contas do Diretório Nacional do Partido Progressistas (PP), relativas ao exercício financeiro de 2019, nos termos do voto do Relator. E, por maioria, determinou: i) o recolhimento ao erário do total de R$ 406.780,00 (quatrocentos e seis mil setecentos e oitenta reais); e ii) a aplicação de R$ 2.172.015,90 (dois milhões, cento e setenta e dois mil, quinze reais e noventa centavos) em candidaturas femininas nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado, nos termos do voto divergente do Ministro Alexandre de Moraes (presidente), vencidos, parcialmente, o relator e o Ministro Nunes Marques, que determinavam o recolhimento de R$ 283.000,00 (duzentos e oitenta e três mil reais) ao erário, atualizado e com recursos próprios. Votaram com a divergência, a Ministra Isabel Gallotti e os Ministros Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares e Cármen Lúcia.Composição: Ministros Alexandre de Moraes (presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. PP - DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2019. IRREGULARIDADES QUE TOTALIZAM R$ 283.000,00, VALOR EQUIVALENTE A 0,52% DOS RECURSOS RECEBIDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS. DETERMINAÇÃO DE DEVOLUÇÃO AO ERÁRIO DO VALOR CONSIDERADO IRREGULAR.1. Prestação de contas do Diretório Nacional do PP relativa ao exercício financeiro de 2019, cujo mérito se submete às disposições da Res.-TSE nº 23.546/2017.1.1. O órgão técnico do TSE e o MPE opinaram pela aprovação com ressalvas das contas.1.2. A fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral tem por escopo identificar a origem das receitas e a destinação das despesas com as atividades partidárias, mediante avaliação formal dos documentos contábeis e fiscais apresentados pelo partido político.2. Falhas identificadas pelo órgão técnico2.1. Irregularidades nas receitas, sujeitas a ressarcimento ao erário2.1.1. Recursos de fonte vedada recebidos na conta do Fundo Partidário2.1.1.1. O partido recebeu doações de recursos financeiros oriundos do Fundo Partidário de outra agremiação.2.1.1.2. No julgamento da PC nº 0600441-93/DF, rel. Min. RAUL ARAÚJO FILHO, DJe de 13.9.2023, assentou-se que "doações de dinheiro do Fundo Partidário realizadas por partidos políticos devem restringir-se às campanhas eleitorais dos candidatos do próprio partido ou de candidatos de partido coligado, sendo, portanto, vedada a transferência de recursos do Fundo Partidário com o fim de custear gastos ordinários de outra agremiação". Na oportunidade, consignou-se a aplicabilidade do referido entendimento às contas partidárias posteriores a 2017. Portanto, aplicável a estas contas.2.1.1.3. Na espécie, conforme registraram a unidade técnica e o MPE, houve reiterados repasses de recursos do PSDB ao PP com fim de custear gastos ordinários de outra agremiação. Irregularidade mantida (R$ 165.000,00).3. Irregularidade nas despesas, sujeitas a ressarcimento ao erário3.1. Repasses a diretórios impedidos de receber recursos do Fundo Partidário3.1.1. A sanção de suspensão de repasses de recursos do Fundo Partidário pelo diretório nacional ao diretório regional, em virtude da desaprovação das suas contas, começa a contar a partir da publicação da respectiva decisão, e não da sua comunicação pelos tribunais regionais eleitorais. Precedentes.3.1.2. Em relação ao diretório da Bahia, o diretório nacional realizou o repasse em 26.3.2019, após a publicação da decisão que determinou a suspensão da transferência de cotas do fundo partidário no período de 2.3.2019 a 2.4.2019, que ocorreu em 20.9.2018.3.1.3. Quanto ao Diretório do Rio Grande do Norte, a publicação da decisão que determinou a suspensão do repasse (entre 14.8.2019 e 14.2.2020) ocorreu em 2.8.2019, tendo o partido realizado a transação em 28.8.2019.3.1.4. O partido se limita a argumentar que, nos termos do art. 37, § 3º-A, da Lei nº 9.096/1995, inserido pela Lei nº 13.877/2019, de 27.9.2019, a suspensão dos repasses do Fundo Partidário só deve ser efetivada após a juntada de comunicação ao órgão partidário responsável. Contudo, o TSE já decidiu que o referido dispositivo legal "somente é aplicável às sanções de suspensão impostas posteriormente à sua vigência, não tendo, assim, incidência retroativa, a teor do art. 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro" (ED-PC-PP nº 192-65/DF, rel. Min. SÉRGIO BANHOS, DJe de 3.8.2021).3.1.5. Irregularidade mantida (R$ 115.000,00).3.2. Despesas com pessoal3.2.1. O órgão técnico apontou irregularidade relativa à prestação de serviços de assessoria à presidência do partido, incluindo gastos com passagens aéreas, sob o argumento de que "[...] o prestador manteve vínculo empregatício com o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Piauí ¿ SEBRAE/PIAUI, no cargo de secretário executivo, com jornada de 44 horas semanais, até fevereiro de 2019, o que se mostra incompatível com a prestação de serviços na condição de assessor" (id. 157816193).3.2.2. Consta dos autos contrato especificando as atividades desenvolvidas, dentre elas: "a) Ficar à disposição do Gabinete da Presidência do Partido Progressista, exercendo as funções determinadas pelo Superior; b) Disponibilidade de deslocamento aos Estados da Federação sempre no interesse do Partido e na interrelação dos Diretórios Estaduais ou Municipais com o Diretório Nacional; c) Participar das reuniões dos membros da Comissão Executiva Nacional, sempre que for convocado; [...] g) Apresentar relatório mensal das atividades", bem como previsão de custeio, pelo partido, das "condições materiais para o exercício da função" (id 33328588). Além disso, o partido juntou recibo de pagamento a autônomo (RPA ) - com a descrição da "prestação de serviços de Assessoria ao Gabinete do Presidente do Partido Progressista", "[...] conforme contrato firmado em 01 de fevereiro de 2018" - e relatório contendo as atividades desenvolvidas - relacionadas ao marketing do partido (a exemplo do "fortalecimento de imagem partido e congressistas nas redes sociais" e "Contato com veículos de comunicação divulgando ações do partido") e ao acompanhamento do Presidente da agremiação em reuniões partidárias -, devidamente assinados pelo prestador (ids 33328588 e 33342438)3.2.3. Conforme o voto proferido pelo e. Min. ALEXANDRE DE MORAES, as circunstâncias fáticas do presente caso não se assemelham àquelas objeto de julgamento na PC nº 0600231-08/DF, rel. Min. ANDRÉ RAMOS TAVARES, em que foi afastada a incompatibilidade de jornada de trabalho de assessoria de imprensa pela particularidade de que o exercício da profissão não exige a presença física do contratado.3.2.4. No caso, consta do contrato com a agremiação a necessidade de disponibilidade ao Gabinete da Presidência, inclusive para deslocamentos nos estados da Federação, bem como de participação em reuniões com diretórios estaduais e municipais, condição que não somente exige a presença física do contratado, mas especialmente a sua disponibilidade integral.3.2.5. Irregularidade mantida (R$ 123.780,00).3.3. Indenização por danos morais3.3.1. A unidade técnica registrou despesa relativa a pagamento de indenização por danos morais, decorrente de acordo judicial firmado em processo cível envolvendo o partido e particular.3.3.2. Esta Corte Superior não admite o pagamento de indenizações com recursos oriundos do Fundo Partidário, uma vez que a despesa não se enquadra nas hipóteses do art. 44 da Lei nº 9.096/1995. Precedente.3.3.3. Irregularidade mantida (R$ 3.000,00).4. Irregularidades nas obrigações legais relativas ao Fundo Partidário, não sujeitas a ressarcimento ao erário4.1. Insuficiência na aplicação de recursos do Fundo Partidário no incentivo à participação da mulher na política4.1.1. O partido alega que devem ser deduzidos da base de cálculo do montante mínimo destinado à participação política das mulheres os repasses realizados aos diretórios inferiores e que "a lei não proíbe o uso dos recursos destinados às mulheres com despesas administrativas" (id.159630063).4.1.2. Como se sabe, a) "descabe [...] descontar da base de cálculo do percentual a ser aplicado pela esfera nacional na ação afirmativa [...] os valores do Fundo Partidário transferidos aos demais órgãos de direção da legenda" (ED-AgR-PC, nº 0601740-42/DF, Min. BENEDITO GONÇALVES, DJe de 2.8.2022); e b) "despesas administrativas como pagamento de pessoal, aluguéis e serviços de telefonia desvirtuam o propósito legal de mitigar a sub-representatividade feminina na política, visto serem gastos ordinários, ainda que relacionados às sedes ou aos órgãos voltados ao incentivo das mulheres na política" (PC nº 0600240-67/DF, rel. Min. ANDRÉ RAMOS TAVARES, DJe de 26.2.2024).4.1.3. O PP estava obrigado a aplicar no programa de incentivo à participação política feminina o mínimo de R$ 2.699.389,62, e aplicou efetivamente o valor de R$ 527.373,72, montante inferior ao mínimo de 5% estabelecido no art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995. Assim, o montante não aplicado na ação afirmativa é de R$ 2.172.015,90.5. Conclusão5.1.. O total de irregularidades encontrado nas contas do PP relativas ao exercício financeiro de 2019 - já decotado o valor objeto da anistia da EC n° 117/2022 - é de R$ 406.780,00, equivalente a 0,75% do total que o partido recebeu do fundo público em 2019 (R$ 53.987.792,48).5.2. Contas aprovadas com ressalvas, devendo o partido recolher o montante de R$ 406.780,00 ao erário, atualizado e com recursos próprios (uso irregular de verba pública) e aplicar o valor de R$ 2.172.015,90 em candidaturas femininas nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado destes autos, consoante dispõe a EC nº 117/2022.