Jurisprudência TSE 060066284 de 01 de marco de 2024
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Floriano De Azevedo Marques
Data de Julgamento
20/02/2024
Decisão
(Julgamento conjunto dos AREspe's nº 0600.661¿02 e nº 0600.662¿84):O Tribunal, por unanimidade, não conheceu do recurso especial manejado pelo Ministério Público Eleitoral e deu provimento aos agravos em recursos especiais eleitorais interpostos por Heliosandro Mattos Silva e por Fábio Barcellos, a fim de, desde logo, prover os seus recursos especiais eleitorais, para reformar o acórdão regional e julgar procedentes os pedidos formulados nas ações de investigação judicial eleitoral por fraude à cota de gênero, determinando: a) a nulidade dos votos recebidos por todos os candidatos ao cargo de vereador do Município de Vila Velha/ES pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) Municipal, no pleito de 2020, e a desconstituição dos diplomas dos candidatos da legenda para o referido cargo; b) a declaração de inelegibilidade de Sonia Mara Silva da Silva Pereira; c) a desconstituição do Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários (DRAP) do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) Municipal e o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, e determinou, ainda, o cumprimento imediato da decisão, independentemente de publicação do acórdão, nos termos do voto do Relator.Acompanharam o Relator, os Ministros André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti e Alexandre de Moraes (Presidente).Registrou¿se a presença, na sala de videoconferência, do Dr. Ludgero Ferreira Liberato dos Santos, advogado do agravante Heliosandro Mattos Silva.Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
ELEIÇÕES 2020. AGRAVOS EM RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. ART. 10, § 3º, DA LEI 9.504/97. CANDIDATURA FICTÍCIA. CARACTERIZAÇÃO. PROVIMENTO DOS AGRAVOS E DOS RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. SÍNTESE DO CASO1. O Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo, por maioria, manteve as sentenças nas partes em que julgaram improcedentes os pedidos nas ações de investigação judicial eleitoral ajuizadas em desfavor do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) – Municipal, de Joel Rangel Pinto Junior e Sonia Mara Silva da Silva Pereira, por entender não comprovada a prática de fraude à cota de gênero no pleito para vereador do Município de Vila Velha/ES, nas Eleições de 2020.2. Os recursos especiais interpostos contra os acórdãos regionais tiveram seguimento negado, sobrevindo a interposição de agravos.3. Tendo em vista que as ações de investigação judicial eleitoral às quais se referem os AREspEs 0600654–10, 0600655–92, 0600661–02 e 0600662–84 versam sobre fraude no lançamento de candidaturas femininas ao cargo de vereador pelo Diretório Municipal do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), no Município de Vila Velha/ES, nas Eleições de 2020, é recomendável que os aludidos recursos sejam julgados em conjunto, não obstante em votos específicos para cada feito. ANÁLISE DOS AGRAVOS DAS RAZÕES PARA O PROVIMENTO DOS AGRAVOS4. O Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo negou seguimento aos recursos especiais eleitorais, por entender aplicáveis os verbetes sumulares 24 e 30 do TSE.5. Diante da impugnação dos fundamentos das decisões agravadas e da relevância da matéria em discussão, os agravos devem ser providos para análise dos recursos especiais. ANÁLISE DOS RECURSOS ESPECIAISINADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO MPE NOS AUTOS DO ARESPE 0600662–846. O recurso especial interposto pelo Ministério Público Eleitoral nos autos do AREspE 0600662–84 não deve ser conhecido em razão de ser inadmissível, pois: i) foi interposto após a decisão do Presidente em exercício do Tribunal de origem que negou seguimento ao primeiro apelo nobre manejado pelo órgão ministerial; ii) não se admite a interposição de mais de um recurso de idêntica natureza, pela mesma parte, em face de uma única decisão judicial, por força do princípio da unirrecorribilidade; e iii) a decisão denegatória do recurso especial é impugnável por meio do agravo previsto no art. 279 do Código Eleitoral. Precedentes.ANÁLISE DOS RECURSOS ESPECIAIS DOS AUTORES DAS AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL JURISPRUDÊNCIA DO TSE E DO STF7. A partir do leading case de Jacobina/BA (AgR–AREspE 0600651–94, red. para o acórdão Min. Alexandre de Moraes, DJE de 30.6.2022), a jurisprudência deste Tribunal tem reiteradamente assentado que a obtenção de votação zerada ou pífia das candidatas, a prestação de contas com idêntica movimentação financeira e a ausência de atos efetivos de campanha são suficientes para evidenciar o propósito de burlar o cumprimento da norma que estabelece a cota de gênero, quando ausentes elementos que indiquem se tratar de desistência tácita da competição (REspEl 0600001–24, rel. Min. Carlos Horbach, julgado em 18.8.2022). Precedentes.8. A jurisprudência desta Corte está alinhada ao entendimento do STF, firmado no julgamento recente da ADI 6.338/DF, rel. Min. Rosa Weber, Tribunal Pleno, sessão virtual, DJE de 4.4.2023.DOS ELEMENTOS INDICIÁRIOS CARACTERIZADORES DA FRAUDE À COTA DE GÊNERO9. Segundo as premissas registradas pela Corte de origem, afiguram–se patenteadas as circunstâncias evidenciadoras da fraude à cota de gênero, quais sejam: a) a candidata Sonia Mara Silva da Silva Pereira obteve votação inexpressiva (4 votos); b) ficou evidenciada a ausência de receitas e de gastos eleitorais; c) a candidata não promoveu atos de campanha, publicações em redes sociais, tampouco realizou despesas com propaganda eleitoral.10. O fundamento do acórdão recorrido de que a candidata Sônia Mara Silva da Silva Pereira pretendia realizar sua campanha de forma presencial, mas teria se sentido desestimulada a fazê–lo em razão do aumento da quantidade de infecções por Covid–19 em setembro de 2020 , não afasta a fraude à cota de gênero, pois, conforme a base fática do acórdão recorrido, não houve nem mesmo a realização de postagens nas redes sociais, tipo de campanha muito utilizado no pleito de 2020, justamente em razão da pandemia. Ademais, caso a pandemia fosse motivo para a desistência da candidatura, poderia ter a candidata desistido antes do início da campanha eleitoral, quando já era amplamente noticiado o elevado número de pessoas infectadas pelo vírus.11. Os problemas de enfermidade na família da candidata, na espécie, não são aptos a demonstrar a desistência tácita da candidatura, pois a infecção por Covid–19 da filha da investigada ocorreu em abril de 2020, muito antes do início do período de campanha eleitoral, além do que o acórdão recorrido não apresenta nenhuma informação acerca de que modo e em que extensão o desenvolvimento de síndrome do pânico pelo marido da postulante durante a pandemia teria contribuído para impedir a realização da campanha.12. A alegação de que a ausência de comunicação ao partido a respeito da suposta desistência da candidatura decorreria de a candidata estar envergonhada por desistir da campanha e de ter perdido contato com a agremiação desde a morte do presidente do Diretório Municipal do PTB não é crível, pois, como se depreende do voto divergente proferido pela Juíza Heloísa Cariello, a referida candidata era subordinada à esposa do dirigente falecido – a qual é mãe do atual presidente e da secretária adjunta da legenda –, que ao tempo era subsecretária de saúde do município, o que permite inferir que a postulante tinha contato com a agremiação e poderia ter formalizado a alegada desistência.13. Diante do conjunto probatório analisado pela instância ordinária, não há como afastar a presença de elementos indiciários da fraude à cota de gênero, porquanto a votação inexpressiva, a não realização de atos de campanha, nem mesmo nas redes sociais, assim como o não recebimento de receitas e a não realização de gastos eleitorais formam um conjunto probatório robusto o suficiente para comprovar a fraude, não havendo provas suficientes a demonstrar a tese de desistência tácita da candidatura. CONCLUSÃORecurso especial eleitoral do Ministério Público Eleitoral não conhecido.Agravos e recursos especiais eleitorais dos autores das AIJEs a que se dá provimento, para reformar o acórdão regional e julgar procedentes os pedidos nas ações de investigação judicial eleitoral, com base em ofensa ao art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97, determinando–se o seguinte:i) a nulidade dos votos recebidos por todos os candidatos ao cargo de vereador do Município de Vila Velha/ES pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) – Municipal nas Eleições de 2020 e a desconstituição dos diplomas conferidos aos candidatos da legenda para o referido cargo eletivo;ii) a declaração de inelegibilidade de Sonia Mara Silva da Silva Pereira;iii) a desconstituição do Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários (DRAP) do partido e o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário, nos termos do art. 222 do Código Eleitoral.Determina–se, ainda, o cumprimento imediato da decisão, independentemente de publicação do acórdão.