Jurisprudência TSE 060063814 de 11 de maio de 2021
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Sergio Silveira Banhos
Data de Julgamento
13/04/2021
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, rejeitou as preliminares e, por maioria, vencidos os Ministros Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão e Mauro Campbell Marques, julgou improcedente o pedido de declaração de justa causa para desfiliação partidária, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros Edson Fachin, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Luís Roberto Barroso (Presidente). Falaram: pelo requerente, Felipe Rigoni Lopes, o Dr. Cristiano Vilela de Pinho; e pelo requerido, Partido Socialista Brasileiro (PSB) Nacional, o Dr. Rafael Carneiro. Composição: Ministros Luís Roberto Barroso (Presidente), Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luis Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Tarcisio Vieira de Carvalho Neto e Sérgio Banhos.
Ementa
DEPUTADO FEDERAL. PEDIDO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA. JUSTA CAUSA. DISCRIMINAÇÃO PESSOAL.SÍNTESE DO CASO1. O requerente pretende exercer a prerrogativa tipificada no inciso II do parágrafo único do art. 22–A da Lei 9.096/95, pertinente à hipótese de discriminação política pessoal como justa causa para desfiliação partidária, sustentando, em síntese, que, em julho de 2019, após o voto que proferiu favorável à Reforma da Previdência (Proposta de Emenda Constitucional 6/2019), foi surpreendido com duras repreensões e perseguição pelo partido, tendo seu espaço dentro da agremiação diminuído.QUESTÕES PRÉVIAS2. Não procede a preliminar de inadequação da via eleita, pois não consta da inicial nenhum pedido de revisão ou suspensão da sanção imposta pelo Diretório Nacional no processo administrativo instaurado contra o requerente, que postula, na presente ação declaratória, expressamente prevista na Res.–TSE 22.610, a declaração da existência de justa causa para sua desfiliação partidária. A questão atinente à imposição de sanção de natureza disciplinar ao requerente foi utilizada, na realidade, apenas com um dos fundamentos para o reconhecimento da justa causa na espécie.3. Embora a defesa tenha sido apresentada após o prazo de cinco dias previsto no art. 4º da Res.–TSE 22.610, não podem ser aplicados à espécie os efeitos previstos no art. 344 do Código de Processo Civil, presumindo–se como verdadeiros os fatos narrados pelo autor, pois estão em discussão direitos indisponíveis, incidindo a ressalva do art. 345, II, do CPC.4. Ainda que a defesa fosse desconsiderada, o requerido reiterou, em suas alegações finais, os argumentos nela aduzidos, que devem, de todo modo, ser examinados por esta Corte, tendo em vista o disposto no art. 346, parágrafo único, do CPC, que dispõe: "O revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo–o no estado em que se encontrar".5. As testemunhas Francisco Tadeu Barbosa e Alessandro Lucciola Molon foram ouvidas como informantes, pois são filiadas ao partido requerido e exercem mandato de deputado federal, sendo evidente seu possível interesse na manutenção do mandato do requerente, uma vez que isso contribuirá para o aumento do acesso do partido aos recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, bem como ao tempo de rádio e televisão (direito de antena).MÉRITO6. Este Tribunal já assentou que "a hipótese de discriminação pessoal que caracteriza justa causa para desfiliação exige a demonstração de fatos certos e determinados que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações claras de desprestígio ou perseguição" (RO 2–63, rel. Min. Henrique Neves, DJE de 31.3.2014).7. O requerente alega que sofreu grave discriminação pessoal por parte do partido, em razão dos seguintes fatos: a) foi perseguido dentro do próprio partido, tendo seu espaço e comunicação diminuídos; b) foi tratado como "traidor" da agremiação, imputação que seria inaceitável e desproporcional à conduta por ele praticada, e houve declarações na imprensa com críticas ao seu comportamento; c) o procedimento administrativo disciplinar (Representação 005/2019) contra ele instaurado tomou enorme repercussão na mídia em seu desfavor, tendo lhe sido impostas graves sanções, como a suspensão das suas atividades como representante do PSB nas comissões da Câmara por 12 meses e a suspensão do seu direito de voto.8. A jurisprudência desta Corte é uníssona no sentido de que "a hipótese de discriminação pessoal que caracteriza justa causa para a desfiliação exige a demonstração de fatos certos e determinados que tenham o condão de afastar o mandatário do convívio da agremiação ou revelem situações claras de desprestígio ou perseguição" (REspe 0600207–67, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 7.5.2020). Na mesma linha: REspe 1153–17, rel. Min. Luciana Lóssio, DJE de 31.10.2016; Pet 581–84, rel. Min. Henrique Neves da Silva, DJE de 1º.7.2016.9. No que diz respeito à alegação do requerente de que foi perseguido dentro do próprio partido, tendo seu espaço e comunicação diminuídos, não há nos autos nenhuma prova que demonstre, categoricamente, tal circunstância, tendo as testemunhas, ouvidas como informantes, afirmado que nunca presenciaram atos por parte dos dirigentes da agremiação ou de seu presidente que caracterizassem algum tipo de perseguição pessoal contra o requerente.10. Em relação ao argumento de que teria sido tratado como "traidor" do partido e que houve declarações na imprensa com críticas a seu comportamento, o requerente não indicou quais seriam as matérias divulgadas pela mídia que revelariam atos de discriminação pessoal e de perseguição pelo partido. Nenhuma das reportagens juntadas aos autos contém crítica ao deputado requerente ou menção a supostas afirmações por parte do partido que caracterizariam ato de desprestígio pessoal.11. O partido instaurou procedimento administrativo disciplinar (Representação 005/2019) contra o requerente e mais dez deputados federais eleitos pelo PSB, tendo decidido aplicar ao representado as sanções de "suspensão por 12 (doze) meses das funções partidárias, de suspensão do direito a voto nas reuniões partidárias e de destituição de todas as funções e cargos que ocupe em decorrência da proporcionalidade partidária na Câmara dos Deputados, com exceção da titularidade de uma comissão assegurada aos parlamentares" (ID 17659138, p. 9).12. As sanções foram impostas em decorrência do descumprimento, pelo requerente, da Resolução Política 3/2019 do Diretório Nacional do PSB, por meio da qual o partido resolveu fechar questão contra a PEC 6/2019 (Reforma da Previdência) e orientar suas bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal a atuarem no trâmite legislativo da referida PEC em conformidade estrita com a deliberação indicada.13. O requerente alega que o partido já tinha conhecimento da sua posição sobre a questão (a favor da Reforma) e que não houve a devida discussão da matéria pelos parlamentares filiados à agremiação. Todavia, o próprio requerente afirma, em seu depoimento pessoal, que não participou das reuniões organizadas pelo PSB para tratar do tema, embora para elas tenha sido convidado.14. Não cabe à Justiça Eleitoral examinar a correção da sanção imposta pelo partido, por se tratar de matéria interna corporis, mas, sim, averiguar se tal sanção é caracterizadora de grave discriminação pessoal.15. Não foi apresentada nenhuma prova acerca da mencionada repercussão midiática em desfavor do requerente, decorrente da instauração do procedimento disciplinar, não tendo sido juntada aos autos nenhuma publicação que trate da matéria.16. Nos termos do art. 17, § 1º, da Constituição Federal, os estatutos dos partidos devem estabelecer normas de disciplina e fidelidade partidária, e, na espécie, a sanção imposta foi devidamente fundamentada nos art. 10, b e c, do Estatuto Partidário e 28, caput, b e c, do Código de Ética e Fidelidade Partidária, c.c. o art. 9º, d, do Estatuto, tendo sido, inclusive, afastada a recomendação do Conselho de Ética de imposição da sanção mais grave, a saber, a sua expulsão do partido.17. Não ficou configurada a alegada discriminação ou perseguição pessoal, pois a sanção imposta ao requerente foi igualmente aplicada a outros 9 deputados federais do PSB em face dos quais também foi proposta a representação, não tendo ficado caracterizado ato personalizado de perseguição política especificamente contra o requerente.18. Conforme informado pelo próprio partido, a Comissão criada pelo Diretório Nacional do PSB para avaliar a atuação dos Parlamentares sancionados decidiu cessar todas as penalidades então aplicadas, viabilizando a completa reinserção do requerente no cotidiano da bancada.19. O requerente, ao prestar depoimento pessoal, afirmou que, tendo em vista a suspensão da sanção que lhe foi imposta, provavelmente retornará às atividades partidárias, o que indica a ausência de atos de perseguição pessoal por parte da agremiação partidária.20. Uma vez que o parlamentar contrariou frontalmente fechamento de questão realizado pelo diretório nacional do partido requerido, a aplicação de sanção pela referida agremiação, sem que tenham sido comprovadas outras circunstâncias caracterizadoras de grave discriminação pessoal, não configura a existência de justa causa para a desfiliação do requerente dos quadros do PSB.CONCLUSÃOPedido de declaração de justa causa julgado improcedente.