Jurisprudência TSE 060055782 de 22 de setembro de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Sergio Silveira Banhos
Data de Julgamento
11/05/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros Carlos Horbach, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves, Raul Araújo e Alexandre de Moraes (Presidente).Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques (substituto), Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. EXTRAPOLAÇÃO DO LIMITE DE GASTOS COM PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. SANÇÕES PECUNIÁRIAS. INEXISTÊNCIA DE GRAVIDADE DAS CONDUTAS. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E POLÍTICO. NÃO CONFIGURADO. INCIDÊNCIA DOS VERBETES SUMULARES 28 E 30 DO TSE. NÃO PROVIMENTO.SÍNTESE DO CASO1. Trata–se de agravo interno apresentado em desfavor de decisão monocrática por meio da qual foi negado seguimento a agravo em recurso especial e, por conseguinte, mantido o acórdão regional.2. O Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais rejeitou a preliminar de nulidade do processo por cerceamento de produção de prova; deu parcial provimento ao recurso eleitoral da Coligação Confiança no Desenvolvimento – impondo aos agravados multas pela prática das condutas vedadas descritas no art. 73, I, II, VI, b, e VII, da Lei 9.504/97; e negou provimento ao recurso dos agravados mantendo a sentença na parte em que deixou de aplicar a sanção de cassação dos diplomas de William Parreira Duarte e Paulo Telles da Silva – candidatos eleitos aos cargos de prefeito e vice–prefeito no Município de Ibirité/MG, respectivamente, no pleito de 2020, bem como na parte em que não decretou a inelegibilidade de William Parreira Duarte, Paulo Telles da Silva, Etevaldo Sampaio de Oliveira Silva e Flávio Moreira Matos. 3. A Corte mineira aplicou as seguintes sanções:i) multa no valor de R$ 8.000,00 a William Parreira Duarte e multa individual no montante de R$ 5.320,50 a Etevaldo Sampaio de Oliveira Silva e Paulo Telles da Silva, pela prática de conduta vedada, nos termos do art. 73, VI, b, §§ 4º e 8º, da Lei 9.504/97;ii) multa individual na quantia de R$ 15.000,00 a William Parreira Duarte, Etevaldo Sampaio de Oliveira Silva e Paulo Telles da Silva, pela prática de conduta vedada, nos termos do art. 73, II, da Lei 9.504/97;iii) multa no valor de R$ 5.320,50 a William Parreira Duarte, por violação ao art. 73, VII, da Lei 9.504/97, com as alterações da Emenda Constitucional 107/2020, nos termos do art. 73, § 4º, da Lei 9.504/97;iv) multa aplicada a William Parreira Duarte, no montante de R$ 60.000,00, e a Flávio Moreira Matos, na quantia de R$ 20.000,00, bem como multa a Paulo Telles da Silva, no valor de R$ 20.000,00, em virtude de ter sido caracterizada a conduta vedada descrita no art. 73, I, da Lei 9.504/97, de acordo com os §§ 4º e 8º do mesmo dispositivo legal.ANÁLISE DO AGRAVO REGIMENTAL4. Extraem–se do voto condutor do aresto regional as seguintes premissas fáticas do caso concreto, realçando–se, ainda, algumas circunstâncias do julgamento tomado por maioria na Corte mineira:i. divulgação de obras na página pessoal do Facebook de William Parreira Duarte, com menção a slogan da prefeitura, configurando a conduta vedada disposta no inciso VI, b, do art. 73, da Lei 9.504/97;A maioria da Corte de origem entendeu que "a divulgação da propaganda, em período vedado, pela página pessoal do candidato, não retira seu caráter institucional", embora e na linha da compreensão do Juízo Eleitoral no caso concreto, "nos termos da jurisprudência do TSE, ¿a veiculação de postagens sobre atos, programas, obras, serviços e/ou campanhas de órgãos públicos federais, estaduais ou municipais em perfil privado de rede social não se confunde com publicidade institucional autorizada por agente público e custeada com recursos públicos, a qual é vedada nos três meses que antecedem as eleições (art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/1997)" (REspe 376–15/ES, rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJE de 17.4.2020), como recentemente reafirmado por este Tribunal no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial 0600069–29, rel. Min. Carlos Horbach, DJE de 5.5.2023.ii. criação e divulgação pelo Município de Ibirité/MG do Jornal Ibirité em Ação, lançado em 27.5.2020, de periodicidade mensal, com três edições digitais e impressas (30.000 exemplares da primeira edição no mês de junho; 20.000 na segunda edição no mês de julho e 50.000 na terceira edição no mês de agosto), nos quais se apontavam qualidades da gestão municipal, além de, na segunda e na terceira edições, expor o prefeito e o vice–prefeito, incluindo fotografias dos agentes públicos, vinculando–os aos feitos da administração, o que configurou a conduta disposta no art. 73, II, da Lei 9.504/97;Quanto ao fato alusivo à publicidade impressa, o voto do relator Juiz Bruno Teixeira Lino (o qual foi acompanhado pelo voto vencedor) considerou as três edições do periódico para assentar a infração em tela. Todavia, em seu voto parcialmente divergente, o Juiz Vaz Bueno, igualmente na esteira da sentença, contrapôs a análise do relator quanto à questão, asseverando o seguinte: "Em relação às matérias publicadas no Jornal "Ibirité em Ação", apenas a 2ª edição (ID 13348799) contém o nome do recorrente, fato admitido pelos apelantes. Assim, não se mostra razoável a retribuição ao fato com a aplicação da multa afastada do mínimo legal sem que as circunstâncias fáticas que revelem tal necessidade sejam declinadas objetivamente".iii. gastos com publicidade, no primeiro semestre de 2020, extrapolando o valor da média dos últimos semestres em 2,90%, o que caracterizou a conduta prevista no art. 73, VII, da Lei 9.504/97;No que respeita a esse fato, é inequívoco que o ilícito do art. 73 da Lei 9.504/97, em caráter objetivo, ficou evidentemente configurado, embora se possa ponderar que a extrapolação do limite de gastos com publicidade do governo municipal ocorreu em percentual diminuto (2,90%), impondo–se a respectiva multa.iv. criação de linha de ônibus com o número da campanha do prefeito, Linha 7070, a qual destoava do padrão adotado pelo Município de Ibirité/MG, configurando a conduta vedada disciplinada no inciso I do art. 73 da Lei 9.504/97.Quanto ao fato em questão, considerou–se a criação da linha de ônibus 7070, fugindo, assim, ao padrão municipal e coincidindo com a numeração da nova agremiação pela qual os candidatos à reeleição iriam concorrer ao pleito de 2020, a denotar o intuito eleitoreiro da conduta. Em contraponto, o voto do Juiz Vaz Bueno ponderou que, "em relação à linha de ônibus 7070, consta dos autos documento nominado Comunicação Interna 653/2019 (ID 30505795), emitido pela Prefeitura Municipal, em 11/10/2019, estabelecendo Linhas Municipais, em razão da nova concessão do sistema de transporte coletivo de Ibirité. Sobressaem do documento as novas linhas, quais sejam: 1010, 2020, 3030, 4040, 5050, 6060, 7070. Dessa forma, revela–se frágil associar a linha 7070 a qualquer questão eleitoral, salientando a observação da sequência na numeração".5. Em face do cenário exposto, a maioria do TRE/MG entendeu, assim como decidiu o Juízo Eleitoral, que – apesar de comprovadas as condutas vedadas proibidas aos agentes públicos em campanha, com imposição de multas – não ficou configurado o abuso de poder capaz de atrair a incidência das penalidades previstas no inciso XIV do art. 22 da LC 64/90, porquanto não demonstrada gravidade suficiente a demonstrar o abuso.6. Considerando, sobretudo, as diversas circunstâncias reputadas relevantes e dissonantes indicadas pelo Juízo Eleitoral e, ainda, pelas correntes que se formaram no Tribunal Regional Eleitoral sobre a caracterização das próprias condutas vedadas (a potencializar, inclusive, a incidência do verbete sumular 24 desta Corte Superior), bem como o prevalente entendimento jurisprudencial desta Corte Superior quanto à necessidade de prova robusta para a configuração da conduta abusiva, não ficou demonstrada ofensa legal pelo Tribunal a quo, ao reconhecer a não caracterização do abuso do poder na espécie, recomendando–se a manutenção da decisão das instâncias ordinárias no sentido de não restar configurada a gravidade das condutas para imposição das severas sanções do art. 22 da LC 64/90.7. Por outro vértice, a Corte Mineira também consignou que "os fatos, em conjunto, não atingiram seriedade suficiente que mereçam suprimir a vontade popular expressa pelos 55,44% dos votos recebidos pela chapa vencedora". 8. Na linha do que foi afirmado pela Corte de origem, não há, na espécie, prova robusta que demonstre a configuração do abuso de poder, porquanto, embora esteja comprovado nos autos que os candidatos se utilizaram da máquina pública para divulgar sua candidatura, não ficou demonstrada a repercussão das condutas (ainda que em seu conjunto) no âmbito do pleito e sua influência perante o eleitorado, para fins de albergar a configuração do abuso de poder, mediante a imposição das graves sanções de cassação de diploma e de inelegibilidade.9. Consoante remansosa jurisprudência desta Corte Superior, não se admite reconhecer o abuso de poder com fundamento em meras presunções acerca do encadeamento dos fatos, porquanto "a configuração do abuso de poder demanda a existência de prova inequívoca de fatos que tenham a dimensão bastante para desigualar a disputa eleitoral" (AgR–AREspE 0600462–43, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE de 2.8.2022). 10. O TRE/MG consignou que as irregularidades reconhecidas nos autos "não tiveram o poder de influenciar de forma cabal nos votos apurados no pleito de 2020", portanto, entendeu–se não configurado o abuso de poder, uma vez que é "inexistente a gravidade suficiente, para interferir na legitimidade e normalidade do pleito".11. O entendimento desta Corte Superior é no sentido de que, "para se caracterizar o abuso de poder, impõe–se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). A mensuração dos reflexos eleitorais da conduta, não obstante deva continuar a ser ponderada pelo julgador, não constitui mais fator determinante para a ocorrência do abuso de poder, agora revelado, substancialmente, pelo desvalor do comportamento" (AIJE 0601779–05, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE de 11.3.2021).12. A revisão do entendimento da instância ordinária, soberana no exame de fatos e provas, para entender que ficou demonstrada a gravidade dos fatos, de forma a interferir na legitimidade e na normalidade do pleito de 2020, demandaria a reincursão no contexto fático–probatório, providência vedada em sede extraordinária, a teor do verbete sumular 24 do TSE.13. Não ficou demonstrada a similitude fática entre os julgados paradigmas e o recorrido, o que atrai a incidência do verbete sumular 28 do TSE.14. A orientação desta Corte Superior é no sentido de que "a utilização do fundamento da divergência jurisprudencial em recurso especial eleitoral exige que a parte faça o devido cotejo analítico e demonstre a similitude fática entre o acórdão paradigma e a decisão que pretende reformar, por força da Súmula nº 28/TSE" (AgR–AI 0603037–98, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 2.10.2020), o que não ocorreu na espécie.CONCLUSÃOAgravo regimental a que se nega provimento.