Jurisprudência TSE 060042372 de 20 de marco de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Raul Araujo Filho
Data de Julgamento
27/02/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, julgou desaprovadas as contas do Diretório Nacional do SOLIDARIEDADE relativas ao exercício financeiro de 2017, impondo¿lhe determinações, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros: Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves e Alexandre de Moraes (Presidente). Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. SOLIDARIEDADE. DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. IRREGULARIDADES QUE TOTALIZAM R$ 869.083,60, EQUIVALENTE A 4,40% DOS RECURSOS RECEBIDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. VERBA PÚBLICA IRREGULARMENTE APLICADA. NÃO COMPROVAÇÃO DE GASTOS. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO. INSUFICIÊNCIA DE APLICAÇÃO DE RECURSOS PÚBLICOS NO FOMENTO À PARTICIPAÇÃO FEMININA NA POLÍTICA E NO ENTE FUNDACIONAL. IRREGULARIDADES GRAVES. CONTAS DESAPROVADAS.1. Trata–se da prestação de contas do Diretório Nacional do partido SOLIDARIEDADE relativa ao exercício financeiro de 2017, regida pela Res.–TSE nº 23.464/2015.1.1. O órgão técnico do TSE e o MPE opinaram pela desaprovação das contas.1.2. Nos termos do art. 18 da Res.–TSE nº 23.464/2015 e da jurisprudência desta Corte Superior, a comprovação do regular dispêndio de recursos do Fundo Partidário e da sua necessária vinculação ao rol de atividades do art. 44 da Lei nº 9.096/1995 requer, em regra, a juntada de documentação fiscal que contenha (a) elementos informativos referentes à data e ao valor da operação e à identificação das partes envolvidas e (b) descrição detalhada do objeto contratual, sendo facultada ao julgador a admissão de outros meios idôneos de prova.1.3. Conforme a pacífica jurisprudência do TSE, "consideram–se não comprovadas as despesas cujos documentos fiscais ou recibos, em razão dos termos genéricos em que redigidos, não permitem identificar a que se refere especificamente o pagamento realizado, bem como sua vinculação a atividades partidárias" (PC nº 290–21/DF, rel. Min. Luís Roberto Barroso, julgada em 23.4.2019, DJe de 21.6.2019).2. Insuficiência de documentação fiscal comprobatória e demais comprovações da execução e vinculação dos gastos à atividade partidária2.1. Despesas com serviços advocatícios2.1.1. Esta Corte Superior entende que "[...] a ausência de contrato não é circunstância per se a ensejar a irregularidade contábil, na medida em que o próprio art. 18 da Res.–TSE 23.464/2015 exige o documento fiscal idôneo como essencial à comprovação do gasto, quando acompanhado de justificativas que as associem ao art. 44 da Lei 9.096/1995" (PC nº 0601728–28/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgada em 26.8.2021, DJe de 13.9.2021).2.1.2. No caso, o órgão técnico atestou que "[...] o partido apresentou relatório de atividades e comprovação da execução dos serviços prestados [...]" (ID 157101520, fl. 16).2.1.3. Quanto à contratação de serviços com partes relacionadas, "este Tribunal não presume, de forma absoluta, a irregularidade nas contratações, custeadas com recursos públicos, de empresa cujo corpo societário mantenha vínculo com dirigente do partido ante a ausência de previsão legal ou regramento balizado por instrumento normativo. Nessas hipóteses, as reflexões têm obedecido a critérios, segundo as particularidades de cada caso. Constatado que foram atendidos os requisitos do art. 18 da Res.–TSE nº 23.432/2015 quanto à comprovação dos gastos partidários, não havendo elementos que revelem que a despesa é superfaturada e não tendo a situação descrita afetado a transparência da transação entre as partes nem se mostrado eivada de má–fé, é de ser afastada a irregularidade, não sendo devido o ressarcimento dos valores despendidos e regularmente comprovados. Ao contrário, evidenciado que a sobreposição de interesses comprometeu a lisura dos gastos com recursos públicos, deve ser imposta a devolução ao Erário" (PC–PP nº 153–68/DF, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgada em 25.3.2021, DJe de 9.4.2021).2.1.4. Na hipótese, além de não ter sido evidenciado nenhum elemento que indique ter ocorrido sobrepreço ou má–fé no uso dos recursos do Fundo Partidário, foi regularmente comprovada a realização dos serviços prestados pelo escritório. Irregularidade afastada.2.2. Despesas com serviços de consultoria2.2.1. Consoante dispõe o art. 18, § 7º, I, da Res.–TSE nº 23.464/2015, "nos gastos com publicidade, consultoria e pesquisa de opinião, os respectivos documentos fiscais devem identificar, no seu corpo ou em relação anexa, o nome de terceiros contratados ou subcontratados e devem ser acompanhados de prova material da contratação".2.2.2. Nesse norte, esta Corte Superior já decidiu que "a prova material da execução de serviços configura requisito essencial para a demonstração da regularidade da despesa com propaganda e publicidade, consoante preceitua os arts. 18, § 7º, e 35, § 2º, da Res.–TSE nº 23.464/2015" (PC nº 0600405–51/DF, rel. Min. Carlos Horbach, julgada em 7.10.2021, DJe de 4.11.2021 – grifos acrescidos).2.2.3. No caso, apesar de regularmente intimado para comprovar a execução dos serviços prestados, nos termos da Res.–TSE nº 23.464/2015, o partido quedou–se inerte.2.2.4. Ademais, as notas fiscais, o contrato de prestação de serviços e o relatório de atividades apresentam descrições genéricas de atividades de consultoria, assessoria, além de outros serviços afetos a tais áreas sem nenhuma indicação relacionada às atividades partidárias. Essas circunstâncias impedem atestar a regularidade do gasto, conforme esta Corte Superior. Nesse sentido: PC–PP nº 0601682–39/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgada em 19.4.2022, DJe de 11.5.2022.Irregularidade mantida.2.3. Despesas pagas à empresa Editora Comunica Ação Ltda.2.3.1. A fim de sanar a irregularidade apontada pela unidade técnica, o partido apresentou relatório de atividades e notas fiscais. Dos documentos fiscais apresentados, relativos aos meses de agosto a dezembro de 2017, consta a discriminação dos serviços como "prestação de serviços de consultoria e assessoria de imprensa" e "prestação de serviços de assessoria e consultoria de mídia imprensa e eletrônica".2.3.2. Na espécie, o partido, além de não apresentar o contrato da prestação dos serviços, não se desincumbiu do ônus de comprovar a efetiva prestação dos serviços de consultoria, consoante dispõe o art. 18, § 7º, I, da Res.–TSE nº 23.464/2015, segundo o qual gastos com publicidade e propaganda demandam a prova material dos serviços realizados.Irregularidade mantida.2.4. Despesas pagas à empresa ML2 Roberto Carlos Dias – ME2.4.1. No ponto, o documento fiscal, o relatório de atividades, as provas materiais do serviço e o contrato de prestação de serviços de consultoria – em temas de gestão pública, ação política, análise de quadro conjuntural e riscos e desenvolvimento de plano estratégico político ao contratante – apresentado pela grei mantêm correlação entre si e atendem às exigências do art. 18 da Res.–TSE nº 23.464/2015.2.4.2. Nada obstante, o órgão técnico manteve a glosa sob o argumento de que "[o] partido apresentou contrato firmado entre as partes e relatório de prestação de serviços (ID–PJe nº 156902096 e 156902105), porém não apresentou justificativa para contratação de empresa cujo sócio era membro efetivo do partido" (ID 156902105).2.4.3. Conforme entendimento adotado por esta Corte Superior, não há presunção, de forma absoluta, de irregularidade nas contratações, custeadas com recursos públicos, de empresa cujo corpo societário mantenha vínculo com dirigente do partido (PC–PP nº 153–68/DF, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgada em 25.3.2021, DJe de 9.4.2021). No caso, não há elementos que revelem que a despesa é superfaturada ou que denotem malferimento à transparência da transação entre as partes, de modo que não há indício algum de má–fé.Irregularidade afastada.2.5. Despesas com passagens aéreas e hospedagens2.5.1. Consoante jurisprudência firmada por esta Corte Superior, os gastos com passagens aéreas e hospedagens devem vir acompanhados da documentação prevista nos incisos II e III do § 7º do art. 18 da Res.–TSE nº 23.464/2015, de modo a possibilitar a aferição do vínculo do beneficiário com as despesas custeadas com recursos públicos, bem como a pertinência e relação dos gastos com as atividades partidárias (PC nº 0601826–13/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgada em 7.4.2022, DJe de 11.5.2022).2.5.2. Inviável atestar a regularidade dessa espécie de gastos quando "ausentes [...] notas explicativas pormenorizadas e prova da vinculação dos hóspedes à atividade partidária (a exemplo de registros fotográficos, notícias jornalísticas, listas de participantes etc)" (167–52/DF, rel. Min. Sérgio Silveira Banhos, julgado em 15.4.2021, DJe de 3.5.2021). No mesmo sentido: PC–PP nº 193–50/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 7.4.2021). Ademais, é certo que, "[...] por se tratar de recursos públicos, não é admissível que o julgador decida pela regularidade do dispêndio apenas por presunção, pois cabe ao responsável pela despesa a prova de que os recursos pagos se destinaram efetivamente ao objeto vinculado ao interesse público, por determinação legal" (ED–PC nº 0601859–03/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgados em 17.2.2022, DJe de 20.4.2022).2.5.3. No caso, o partido tenha apresentado faturas expedidas pela agência de viagem com a discriminação dos beneficiários, inexistem elementos que comprovem o efetivo vínculo desses com o partido e nem que os serviços prestados decorreram da atividade partidária, tendo a grei se limitado a afirmar que "todas as viagens se deram para participação em reuniões e eventos partidários" (ID 156901210, fl. 7). A agremiação não se desincumbiu do ônus de comprovar quais eventos ensejaram o dispêndio de recursos públicos para deslocamento dos beneficiários e respectivas estadas nos estabelecimentos indicados nas faturas e tabelas juntadas aos autos digitais.2.5.4. À míngua da apresentação de notas explicativas pormenorizadas e da exigida prova da vinculação do beneficiário com a agremiação e a de que a viagem foi realizada para atender aos propósitos partidários, é de rigor manter a irregularidade.2.6. Despesas com serviços gráficos e impressões2.6.1. No caso, foram realizados pagamentos relativos a impressões em bonés, camisetas, bandeiras e calendários. O partido apresentou notas fiscais que descrevem os produtos e especificam a quantidade fornecida, de modo que foi atendida a exigência do art. 18 da resolução que rege as presentes contas.3.6.2. Consoante entende esta Corte Superior, "é desnecessária a juntada de documentação acessória quando o serviço contratado e a sua vinculação à atividade partidária forem comprovados por notas fiscais" (AgR–PC–PP nº 0601828–80/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgado em 11.11.2021, DJe de 26.11.2021)Irregularidade afastada.2.7. Despesas com serviços diversos2.7.1. Quanto aos serviços de consultoria e assessoria técnico–política, conquanto tenham sido apresentados contrato firmado entre as partes e comprovada a execução do serviço prestado, a unidade técnica e o MPE sugeriram que fosse mantida a irregularidade, em razão de o sócio da empresa contratada ser membro efetivo do diretório nacional do partido no período de setembro de 2017 a abril de 2022.2.7.2. Tal circunstância não enseja, por si só, a caracterização de uso irregular dos recursos públicos, mormente quando ausentes elementos que indiquem sobrepreço ou má–fé no uso dos recursos do Fundo Partidário. Precedente.2.7.3. Estando comprovada a efetiva prestação dos serviços e a sua vinculação às atividades partidárias, mediante a apresentação de documentos idôneos para tais fins, a conclusão pela regularidade da despesa é medida que se impõe.Irregularidade afastada.2.8. Despesas com aluguel e condomínio2.8.1. No ponto, a grei apresentou contrato de locação (ID 156902598) firmado com a empresa Visão Empreendimentos Imobiliários Ltda, cujo objeto é a "[¿] locação do Imóvel situado na SRTVS, QD 701 BL. O Nº 110 SALA GARAGENS 239, 240 E 88 do 3º SUBSOLO – ASA SUL – BRASÍLIA–DF", Asa Sul".2.8.2. Consoante a documentação indicada na tabela de ID 157101520, fls. 21–22, observa–se que os valores considerados irregulares pela unidade técnica referem–se a taxas de condomínio, cujas faturas indicam como beneficiário "COND do Ed Novo Centro Multiempresarial CNPJ/CPF: 04.171.036/0001–99", bem como fazem expressas referências à "Unidade: SL 278", "Unidade: V240–3ºS", "Unidade: V239–3ºS", "Unidade: V88–3ºS".2.8.3. A documentação constante dos autos possui perfeita correlação entre si, tendo sido demonstrado que as taxas condominiais custeadas com recursos públicos se referiam às unidades previstas no contrato de locação.Irregularidade afastada.2.9. Despesas com serviços de escritório e apoio administrativo2.9.1. No caso, o relatório das atividades apresentado detalha a prestação de outros serviços, além daquele que foi expressamente objeto do contrato apresentado.2.9.2. Conforme entende esta Corte Superior, o contrato cujo conteúdo se encontra dissociado dos elementos informativos da nota fiscal é imprestável para comprovar a regularidade da despesa. Nesse sentido: PC nº 0601763–85/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgada em 19.8.2021, DJe de 14.9.2021 – o que não se amolda à presente hipótese, na qual, dentre os serviços discriminados no documento fiscal, consta aquele que foi objeto do pacto contratual.2.9.3. O contrato apresentado e os documentos fiscais estão em conformidade com o art. 18 da Res.–TSE nº 23.464/2015, de modo que a divergência parcial entre o contrato e o relatório de atividades juntado ao feito, no caso, não enseja a manutenção da glosa. Soma–se a isso o fato de o serviço ter sido efetivamente prestado e haver vinculação às atividades partidárias.Irregularidade afastada.2.10. Despesas com IPVA2.10.1 Na espécie, verifica–se que o partido juntou aos autos digitais requerimento de restituição dos valores pagos a título de IPVA em 2015, 2016 e 2017 apenas em 14.2.2020, conforme documento de ID 156902673.2.10.2. Apesar de o partido haver informado, em alegações finais, que recebeu em 27.10.2021 os valores indevidamente pagos, não há comprovação nos autos do efetivo crédito em conta bancária. Ademais, em consulta ao site da Receita Federal, consta a informação de que o número do CNPJ indicado no pedido de restituição apresentado pelo partido – qual seja: 18.325.307/0001–07 (ID 156902651) – não é valido.2.10.3. Na linha da jurisprudência firmada por este Tribunal Superior, "[...] o valor indevidamente pago a título de IPVA de veículo pertencente à agremiação deve ser devolvido ao erário, sem prejuízo da obtenção do posterior ressarcimento da importância pelo diretório nacional" (PC nº 237–74/DF, rel. Min. Admar Gonzaga, julgada em 1º.3.2018, DJe de 13.4.2018). No mesmo sentido: PC nº 0000169–22/DF, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgada em 10.12.2020, DJe de 2.2.2021.Irregularidade mantida.2.11. Pagamento de multas2.11.1. Esta Corte Superior já firmou entendimento de que é irregular o pagamento de juros e multas com recursos do Fundo Partidário. Nessa linha: PC nº 309–27/DF, rel. Min. Admar Gonzaga, julgada em 25.4.2019, DJe de 28.5.2019.Irregularidade mantida.2.12. Programa de incentivo à participação das mulheres na política2.12.1. A Justiça Eleitoral, antes de atestar se as despesas atendem à finalidade do inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096/1995, verifica se o gasto se encontra comprovado à luz do art. 18 da Res.–TSE nº 23.464/2015. Somente após o reconhecimento da regularidade da despesa é que se confirma se foi atendida a específica finalidade do fomento à participação política feminina (PC nº 0601850–41/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgada em 23.9.2021, DJe de 7.10.2021).2.12.2. Recursos do Fundo Partidário indicados pela agremiação como aplicados no programa de fomento à participação feminina na política, cuja documentação, além de não comprovar essa específica finalidade, é insuficiente para atestar a regularidade do gasto, devem ser devolvidos ao erário (PC–PP nº 159–75/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgada em 6.5.2021, DJe de 18.5.2021).2.12.3. A jurisprudência desta Corte Superior é pacífica no sentido de que "[...] constitui ônus da Agremiação a demonstração da efetiva aplicação dos recursos em políticas de incentivo da atuação da mulher no cenário político, sendo insuficiente o mero aprovisionamento dos recursos em conta específica" (AgR–PC nº 0601829–65/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 14.9.2021).2.12.4. Gastos com salários pagos a funcionária e pagamento de vale–alimentação, conquanto regulares, não atendem à finalidade da ação afirmativa, consoante preceitua o art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995. Nesse sentido: PC nº 261–34/DF,rel. Min. Edson Fachin, julgada em 14.5.2020, DJe de 4.6.2020. 2.12.5. Nos termos do art. 18, § 7º, I, da Res.–TSE 23.464/2015, "gastos com [...] consultoria [...] devem ser acompanhados de prova material da contratação". No mais, esta Corte Superior entende que "[...] nos casos de serviços advocatícios e de consultoria, que se revestem de natureza essencialmente intelectual, é necessária maior cautela na análise da comprovação do gasto, exigindo–se do prestador elementos que demonstrem, de forma inequívoca, a natureza do serviço realizado e o vínculo com a atividade partidária, sem que, contudo, nessa trilha investigativa, o julgador se desprenda por completo dos parâmetros legais, os quais devem sempre nortear a atividade judicante" (ED–PC nº 271–78/DF, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 10.12.2020). No caso, não foi localizada nos autos digitais documentação hábil a atestar a efetiva execução do serviço, o que impossibilitou aferir o vínculo do gasto com a ação afirmativa.2.12.6. No caso, o partido deveria ter aplicado no programa de incentivo à participação política feminina o mínimo de R$ 986.438,34. Contudo, o SOLIDARIEDADE declarou gastos no montante de R$ 328.146,61, sendo R$ 213.772,00 considerados irregulares (os quais devem ser devolvidos ao erário) e R$ 114.374,61 tidos por regulares, sem observância da finalidade. Assim, a insuficiência da destinação mínima de recursos a que se refere o art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995 é de R$ 986.438,34.Irregularidade mantida.3. Insuficiência de aplicação de recursos do Fundo Partidário na Fundação Primeiro de Maio3.1. O partido repassou à Fundação o montante de R$ 3.771.939,45, em vez de R$ 3.945.753,40, consoante consta do demonstrativo de receitas e gastos. Assim, constata–se a insuficiência de transferência de recursos no valor de R$ 173.813,95. Referida quantia deverá ser devolvida ao erário, por configurar irregularidade na aplicação do Fundo Partidário. Nesse sentido: PC–PP nº 186–58/DF, julgada em 15.4.2021, DJe de 30.4.2021, e PC nº 0600419–35/DF, julgada em 16.12.2021, DJe de 3.2.2022, ambas de relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques.4. Irregularidades apontadas pelo MPE4.1. Na sessão jurisdicional de 27.10.2020, na questão de ordem suscitada pelo MPE na PC nº 192–65/DF, rel. designado Min. Luis Felipe Salomão, o Plenário desta Corte decidiu que somente a partir do exercício financeiro de 2021 é que caberá à Justiça Eleitoral fiscalizar as contas da fundação, entendimento aplicável ao caso dos autos, tendo em vista que se trata de prestação de contas do exercício financeiro de 2017.5. Conclusão: contas desaprovadas5.1. O valor total das irregularidades encontradas nas contas do SOLIDARIEDADE relativas ao exercício financeiro de 2017 é de R$ 869.083,60, o que representa 4,40% da quantia total que a agremiação recebeu do referido fundo público em 2017 (R$ 19.728.767,00).5.2. Esta Corte Superior entende u que "[...] o percentual das falhas não é o único critério para a aferição da regularidade das contas, somando–se a ele a transparência, a lisura e o comprometimento do Partido em cumprir a obrigação constitucional de prestar contas de maneira efetiva, de modo que a gravidade da irregularidade serve apenas como unidade de medida para balizar a conclusão do ajuste contábil" (PC–PP nº 159–75/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgada em 6.5.2021, DJe de 18.5.2021). Assim, é certo que "o elevado valor absoluto das irregularidades também constitui critério balizador do julgamento das contas. Nesse sentido: PC nº 0601213–56/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 2.5.2022.5.3. Na espécie, além do alto valor absoluto das irregularidades, identificou–se a recalcitrância na insuficiência do fomento do programa de participação feminina na política e a insuficiência de aplicação de recursos do Fundo Partidário no ente fundacional ligado à agremiação, falhas de natureza grave. Precedentes.5.4. As irregularidades identificadas denotam inequívoca violação à transparência, à lisura, ao indispensável zelo no uso das verbas públicas e às regras que regem as contas partidárias, circunstâncias que, no conjunto, ensejam a desaprovação das contas.5.5. Contas desaprovadas com as seguintes determinações: ressarcimento do valor de R$ 869.083,60 ao erário (uso irregular de verba pública), atualizado e com recursos próprios; aplicação de multa de 6% sobre o montante tido por irregular (R$ 869.083,60), a ser paga mediante desconto nos futuros repasses do Fundo Partidário; e aplicação do valor de R$ 986.438,34 nas eleições subsequentes, consoante dispõe o art. 2º da EC nº 117/2022.