Jurisprudência TSE 060042105 de 14 de marco de 2024
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Raul Araujo Filho
Data de Julgamento
20/04/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, julgou aprovadas, com ressalvas, as contas do Diretório Nacional do DEMOCRATAS (atual União Brasil) relativas ao exercício financeiro de 2017 e determinou a) o recolhimento de R$ 1.495.193,00 (um milhão quatrocentos e noventa e cinco mil cento e noventa e três reais) ao Erário; e b) a aplicação da quantia de R$ 1.628.859,00 (um milhão seiscentos e vinte e oito mil oitocentos e cinquenta e nove reais) em candidaturas femininas, nos termos do voto reajustado do Relator.Acompanharam o Relator, os Ministros Sérgio Banhos, Maria Claudia Bucchianeri Pinheiro, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Benedito Gonçalves e Alexandre de Moraes (Presidente).Falou pelo requerente, União Brasil (União) - Nacional, o Dr. Fabrício Juliano Mendes Medeiros.Impedimento do Ministro Carlos Horbach.Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques (substituto), Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Maria Claudia Bucchianeri Pinheiro (substituta).
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. DEMOCRATAS (DEM). DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. IRREGULARIDADES QUE – DECOTADO O MONTANTE OBJETO DA ANISTIA CONCEDIDA PELA EC nº 117/2022 (R$ 1.628.859,00) – TOTALIZAM R$ 1.670.835,61, EQUIVALENTE A 5,6% DOS RECURSOS RECEBIDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. BAIXO PERCENTUAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.1. Trata–se de prestação de contas do Diretório Nacional do Democratas (DEM) relativa ao exercício financeiro de 2017, regida pela Res.–TSE nº 23.464/2015.1.1. O órgão técnico do TSE e o MPE opinaram pela desaprovação das contas.1.2. Esta Corte Superior ratificou a compreensão de que "[...] os partidos políticos devem apresentar documento fiscal idôneo que possibilite identificar com clareza todos os aspectos imprescindíveis da contratação, na forma do art. 18, caput, da Res.–TSE 23.464/2015, não sendo necessárias, porém, via de regra, provas adicionais, exceto se presente dúvida razoável (circunstâncias indiciárias) acerca da regularidade e/ou da efetividade da despesa" (PC nº 0601825–28/DF, rel. Min. Benedito Gonçalves, julgada em 26.4.2022, DJe de 17.6.2022). Ademais, faculta–se ao julgador a admissão de outros meios idôneos de prova.1.3. Também se exige que a legenda demonstre o vínculo das despesas com as atividades partidárias, de acordo com o art. 44 da Lei nº 9.096/1995. Precedentes.2. Preliminar2.1. Embora o partido afirme que a pretensão de ver analisados os documentos que anexou às razões finais encontra amparo no art. 435 do CPC, não se desincumbiu de demonstrar a relevância e a pertinência da produção de nova prova após o parecer conclusivo do órgão técnico, de modo que não é possível deferir o pedido para que seja analisada a vasta documentação juntada com base em um pedido genérico. Precedentes.2.2. O partido pede que desconsiderem as alegações finais do MPE, por terem sido apresentadas intempestivamente e também porque, "além da ratificar [sic] as irregularidades apontadas pelo órgão técnico – que representariam 35,16% dos recursos recebidos –, o Ministério Público Eleitoral foi além e, de forma inovadora, apontou inconsistências que corresponderiam a 49,95% do montante repassado ao Democratas" (ID 135102788, fl. 3).2.2.1. No ponto, conquanto o MPE tenha apresentado sua manifestação após o prazo concedido, o órgão ministerial foi intimado a apresentar razões finais como fiscal da lei, nos termos do art. 40, II, da Res.–TSE nº 23.604/2019. Conforme entende o TSE, "no processo de prestação de contas, o Ministério Público atua como custos iuris e, por essa razão, os prazos previstos para suas manifestações têm natureza imprópria e seu descumprimento não gera consequências processuais; em contrapartida, o candidato ocupa a posição de parte processual e o vencimento do prazo fixado para seu pronunciamento atrai a preclusão" (ED–AI nº 185–98/GO rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 29.10.2019).2.2.2. Quanto à alegação de que o órgão ministerial apontou, de forma inovadora, percentual de irregularidades superior ao registrado pela unidade técnica desta Corte, após o primeiro exame das contas pela Asepa, os autos foram encaminhados ao Parquet para que apontasse falhas não detectadas pela Justiça Eleitoral (art. 36, § 6º, da Res.–TSE nº 23.604/2019), ocasião em que o órgão ministerial ratificou as falhas indicadas pela unidade técnica e registrou outras irregularidades, não identificadas no parecer da Asepa (ID 41863638). Em seguida, o partido teve a oportunidade de se manifestar, apresentando documentação e esclarecimentos na fase de defesa (art. 36, § 7º, da mesma resolução). Ademais, "[...] o parecer técnico que examina as contas prestadas pelos partidos e candidatos não tem caráter vinculativo, sendo poder do julgador, à luz do princípio do livre convencimento, analisar os fatos e provas dos autos para, então, aplicar a solução adequada ao caso" (AgR–AI nº 177–52/PR, rel. Min. Edson Fachin, julgado em 8.10.2020, DJe de 20.10.2020), entendimento aplicável às manifestações do Parquet na condição de fiscal da lei, cujo caráter é meramente opinativo.Preliminares rejeitadas.3. Irregularidades com recursos do Fundo Partidário3.1. Despesas com passagens aéreas, hospedagens e locação de veículos3.1.1. Para a comprovação de despesa com passagens, é necessária a "[...] prova da vinculação do beneficiário com a agremiação e a de que a viagem foi realizada para atender aos propósitos partidários [...]" (PC–PP nº 167–52/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgada em 15.4.2021, DJe de 3.5.2021). No caso, tal como consignou a Asepa, as despesas não possuem todas as informações exigidas pela legislação de regência, sobretudo porque não foi identificado o vínculo dos beneficiários com a agremiação e/ou não foi identificado o objetivo da viagem, não sendo possível extrair da documentação juntada pelo partido a exigida vinculação das viagens com a atividade partidária.3.1.2. Em relação às despesas com hospedagens, a Asepa fundamenta a glosa exclusivamente na ausência de apresentação da "[...] nota fiscal do estabelecimento hoteleiro com a identificação do hóspede [...]" (ID 128907988). Como se sabe, além da nota fiscal do estabelecimento hoteleiro, admite–se a apresentação de fatura de agência de viagem, a fim de se verificar a vinculação do gasto e dos beneficiários com a atividade partidária. No caso, as faturas apresentadas pelo partido permitiram ao órgão técnico identificar, em relação a cada uma das hospedagens, o estabelecimento hoteleiro, o hóspede, o período, o valor da despesa e, inclusive, o vínculo do beneficiário com o partido e o objetivo da viagem, o que cumpre o delineado no art. 18, § 7º, III, da Res.–TSE nº 23.464/2015. Precedentes.3.1.3. Quanto à locação de veículo, o partido não se desincumbiu de apresentar documentação hábil a identificar o usuário e sua vinculação com o partido, bem como a finalidade partidária do gasto, razão pela qual é inconteste a irregularidade. Precedente.3.2 Despesas com serviços administrativos3.2.1. No ponto, trata–se de custeio, pelo partido, com recursos públicos, de serviços administrativos prestados por duas empresas (no total de R$ 842.000,00), cujos proprietários compunham o órgão de direção nacional da agremiação, tendo o órgão técnico e o MPE apontado descrição genérica dos serviços nas notas fiscais e ausência de contrato e controle das atividades prestadas. Quanto à matéria, a jurisprudência deste Tribunal Superior já decidiu que despesas decorrentes de contratos firmados com partes relacionadas, embora não sejam vedadas, exigem, para a comprovação de sua regularidade, maior rigor e apurado detalhamento, considerando a possibilidade da indevida influência do contratado nos termos do contrato pactuado. Precedentes.3.2.1.1. No caso, as notas fiscais não estão preenchidas de acordo com o exigido pela legislação de regência, uma vez que a descrição dos serviços nelas contida é genérica. A título de exemplo, cita–se a nota fiscal de ID 223437, no valor de R$ 35.000,00, em cuja descrição do serviço consta "Coord. Cont. Adm. Financeiro". Ademais, mesmo diligenciado para que procedesse à complementação da documentação inicialmente juntada (notas fiscais com descrições genéricas), o partido apresentou apenas relatórios de atividades que não permitem acrescer ao parco conjunto probatório elementos indicativos da realização dos serviços. E mais, não obstante os proprietários das empresas exercessem atividades gerenciais no diretório nacional do partido, esses mesmos dirigentes admitem que suas empresas não possuem quadro próprio, a indicar que todo o serviço ora em análise fora realizado por uma única pessoa, isto é, por eles mesmos.3.2.1.2. Diante do quadro apresentado, era absolutamente necessário que os prestadores tivessem detalhado o horário de suas atividades como funcionários do partido e como prestadores de serviços, tendo em vista o custeio destes com recursos do Fundo Partidário, exigindo, portanto, um nível de detalhamento condizente com a responsabilidade inata aos gestores de recursos públicos. Irregularidade mantida. 3.3.Despesas com produções audiovisuais3.3.1. Na linha da jurisprudência recente do TSE, é suficiente à regularidade do gasto a descrição detalhada da nota fiscal, sendo facultativo, portanto, a apresentação de documentação complementar, especialmente para a análise da vinculação partidária. Na espécie, os serviços prestados encontram–se devidamente descritos nas respectivas notas fiscais. Além disso, os vídeos foram apresentados, de forma global, sem indícios de irregularidades. Irregularidades afastadas.3.4. Despesas com assessorias e marketing3.4.1. É desnecessária a apresentação da integralidade da prova material dos serviços contratados, especialmente quando comprovados com outros elementos harmônicos (entre eles, contratos, notas fiscais e relatórios de atividades). No caso, os serviços estão devidamente comprovados, ainda que não em sua integralidade, em prestígio à boa–fé dos envolvidos. Além disso, inexistem elementos que induzam a qualquer ilícito ou desvio de finalidade da despesa contratada. Irregularidades afastadas.3.5. Despesas com serviços contábeis3.5.1. No caso, além de haver a descrição dos serviços prestados ("Serviços contábeis – análise PC dos D. Estaduais"), a questão comporta peculiaridade, diante da destinação das atividades aos respectivos diretórios regionais, que, diante do porte diferenciado, justifica a dissonância dos valores pagos, sem que evidenciada qualquer prática acima do mercado ou antieconômica3.6. Despesas com refeições3.6.1. No primeiro exame das contas, a Asepa informou o pagamento de diversas despesas referentes a refeições, no montante de R$ 201.655,49, realizadas tanto em restaurantes quanto por meio de entregas na liderança do partido na Câmara dos Deputados, sem a devida comprovação dos beneficiários e da vinculação com a atividade partidária. Após a análise das justificativas da agremiação partidária, a Asepa afastou algumas irregularidades e manteve outras, no montante de R$ 26.012,75, devido à não comprovação do vínculo do gasto com a atividade partidária, sugerindo o ressarcimento dessa quantia ao erário.3.6.1.2. Na espécie, há comprovação que as refeições existiram e que tiveram finalidade partidária, não cabendo ao órgão técnico fazer juízo de valor quanto às reuniões da grei, ainda que se trate de confraternização dos respectivos membros. Irregularidade afastada.3.7. Despesas com serviços contábeis de órgãos inferiores3.7.1. No caso, além de haver a descrição dos serviços prestados ("Serviços contábeis – análise PC dos D. Estaduais"), a questão comporta peculiaridade, diante da destinação das atividades aos respectivos diretórios regionais, que, diante do porte diferenciado, justifica a dissonância dos valores pagos, sem que evidenciada qualquer prática acima do mercado ou antieconômica. Irregularidade afastada.3.8. Repasses a diretórios impedidos de receber recursos do Fundo Partidário3.8.1. No caso, verificou–se que os repasses foram realizados após o trânsito em julgado das decisões que rejeitaram as contas dos diretórios regionais favorecidos, em violação ao art. 60 da Res.–TSE nº 23.464/2015. O partido se limita a argumentar que, nos termos do art. 37, § 3º–A, da Lei nº 9.096/1995, inserido pela Lei nº 13.877/2019, a suspensão dos repasses do Fundo Partidário só deve ser efetivada após a juntada de comunicação ao órgão partidário responsável.3.8.2. Esta Corte Superior entende não ser possível aplicar às prestações de contas relativas a exercícios financeiros anteriores à vigência da Lei nº 13.877/2019 as disposições desse novel regramento, ante a incidência do princípio do tempus regit actum – que impõe a observância do arcabouço normativo vigente à época do exercício financeiro a que aludem as contas sob exame. Precedente.3.8.3. No mais, "[...] a base de pesquisa utilizada para averiguação de irregularidades nos repasses de recursos do Fundo Partidário aos Diretórios Estaduais é o SICO (PC–PP nº 0600416–80/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgada em 10.3.2022, DJe de 21.3.2022).3.8.4. A agremiação, embora alegue que "[...] demonstrou o cumprimento das sanções aplicadas aos órgãos partidários periféricos a partir da inequívoca ciência do respectivo Regional Eleitoral" (ID 131663588, fl. 25), não apontou, nos autos, a documentação que sustenta sua alegação, de modo que não há substrato jurídico capaz de desconstituir a informação constante do Sistema de Informações de Contas (SICO), que fundamentou a glosa do órgão técnico. Irregularidade mantida.4. Irregularidades referentes ao Instituto Tancredo Neves de Estudos Políticos e Sociais4.1. Como se sabe, "[...] Compete à Justiça Eleitoral examinar as contas prestadas pelos institutos (art. 44, IV, da Lei 9.096/95), de modo que as irregularidades eventualmente identificadas quanto a este ponto devem ser acrescidas às demais falhas constatadas pela unidade técnica" (PC nº 241–43/DF, rel. designado Min. Luis Felipe Salomão, julgada em 27.4.2020, DJe de 24.9.2020).4.2. Insuficiência do repasse mínimo ao Instituto Tancredo Neves de Estudos Políticos e Sociais4.2.1. O partido repassou ao Instituto Tancredo Neves de Estudos Políticos e Sociais o montante de R$ 5.950.643,80, o que corresponde a 19,96% do total dos recursos públicos recebidos pelo partido no exercício de 2017. Logo, houve uma diferença negativa de R$ 11.293,92, a qual constitui indevida retenção pelo diretório nacional. Sobre o ponto, o DEM se manteve silente. Irregularidade mantida.4.3 Reversão de recursos ao diretório nacional a título de sobra financeira4.3.1. Nos termos da jurisprudência do TSE, o repasse de sobras do instituto é irregular quando comprovado o desvio de finalidade do recurso público que exige a destinação da verba em pesquisa e de doutrinação e educação política (art. 44, IV da Lei 9.096/1995).4.3.1.2. Na hipótese,a despeito da omissão do partido, inexistem indícios do alegado desvio de finalidade, em virtude de outros fatores possíveis de serem extraídos dos autos: a) não se tratava de período eleitoral, como no precedente citado; b) o instituto demonstrou gastos na ordem de, aproximadamente, 4 milhões de reais em 2017, o que comprova o regular uso da verba pública; e c) obteve novo superávit financeiro em 2017 (R$ 2.183.488,01). Irregularidade afastada.4.4. Ausência de amparo legal dos atos de gestão praticados pelo Instituto Tancredo Neves4.4.1. A Asepa considerou irregular a integralidade da movimentação financeira efetuada pelo Instituto Tancredo Neves com os recursos do Fundo Partidário recebidos do DEM, no valor total de R$ 5.950.643,80, ante a "[...] a ausência de amparo legal dos atos de gestão praticados pelo Instituto [...]" (ID 128907988, fl. 36), conclusão ratificada pelo MPE em seu parecer (ID 134835288).4.4.2. Idêntica controvérsia foi abordada no julgamento do AgR–PC–PP nº 187–43/DF – de relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, ocorrido em 28.10.2021, DJe de 13.12.2021 –, relativo às contas do exercício financeiro de 2015 do DEM, tendo o Plenário do TSE reconhecido que a suposta ausência de anuência do tesoureiro do Instituto Tancredo Neves configurou mera irregularidade formal, até porque a Asepa analisou toda a documentação juntada pelo partido e considerou parte dela regular, providência igualmente levada a efeito pelo órgão técnico nas presentes contas.4.4.3. A similaridade dos fundamentos da Asepa e dos argumentos defensivos do DEM em ambos os feitos é patente, razão pela qual, inexistindo discrímen em relação ao cenário fático–probatório apreciado por este Plenário no supratranscrito AgR–PC–PP nº 187–43/DF, é de rigor replicar, aqui, idêntica conclusão, em prestígio aos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos jurisdicionados nos pronunciamentos desta Corte Superior. Irregularidade afastada.4.5. Despesas do Instituto Tancredo Neves4.5.1. Gastos com empresas de assessoria e consultoria4.5.1.1. Quanto aos gastos com consultoria, o art. 18, § 7º, I, da Res–TSE nº 23.464/2015 impõe que "os respectivos documentos fiscais devem identificar, no seu corpo ou em relação anexa, o nome de terceiros contratados ou subcontratados e devem ser acompanhados de prova material da contratação", sendo certo que, nos termos do art. 29, § 4º, da Res.–TSE nº 23.464/2015, "a documentação relativa à prestação de contas deve permanecer sob a guarda e responsabilidade do órgão partidário por prazo não inferior a cinco anos, contado da data da apresentação das contas".4.5.1.2. No caso, quanto às despesas de R$ 50.400,00, R$ 85.000,00, R$ 179.077,50, R$ 180.077,50, R$ 18.000,00, R$ 83.000,00, R$ 60.000,00, R$ 220.000,00, as notas fiscais possuem descrições genéricas, não tendo o partido apresentado documentação que pudesse evidenciar o vínculo partidário, o que impossibilitou identificar a que se refere, de modo específico, o pagamento realizado, em afronta ao art. 18 da Res.–TSE nº 23.464/2015. Precedentes.4.5.1.3. Em relação às despesas de R$ 480.000,00, R$ 80.000,00, R$ 205.508,00, R$ 373.000,00, estas se referem a empresas pertencentes a dirigentes partidários.4.5.1.3.1. "O TSE entende que a documentação apta a comprovar gastos entre partes relacionadas (o partido adquirir bens e serviços de empresas pertencentes a seus filiados e membros da diretoria) deve afastar quaisquer indícios de conflito de interesses, de forma a serem refutadas as contratações que não sigam critérios objetivos e que traduzam a impossibilidade de comprovar a sua economicidade" (PC nº 0600385–60/DF, de minha relatoria, julgada em 6.10.2022, DJe de 24.10.2022). Ademais, "inexiste óbice a que, na análise das prestações de contas, a Justiça Eleitoral exerça o controle da observância dos princípios norteadores da realização de despesas com recursos públicos [...] provenientes do Fundo Partidário ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha" (REspEl nº 0601163–94/MS, rel. Min. Sérgio Banhos, julgado em 29.9.2020, DJe de 27.10.2020).4.5.1.3.2. Na hipótese, além de as notas fiscais apresentarem descrição genérica e/ou ilegíveis, o art. 18, § 7º, I, da Res–TSE nº 23.464/2015, o partido – mormente por se tratar de transação entre partes relacionadas – não se desincumbiu de apresentar provas materiais e documentos "[...] hábeis a demonstrar a finalidade das despesas e a afastar quaisquer indícios de conflito de interesses, de forma a serem refutadas as contratações que não seguirem critérios objetivos e que traduzam a impossibilidade de comprovar a sua economicidade" (ED–PC nº 0600422–87/DF, rel. Min. Carlos Horbach, julgada em 15.12.2022, DJe de 7.2.2022). Ademais, nem sequer foram apresentados os contratos estabulados.4.6. Despesas com eventos4.6.1. Na linha dos arts. 18, § 7º, I, e 35, § 2º, da Res.–TSE nº 23.464/2015, para a regular comprovação dos serviços relacionados a produções audiovisuais de marketing e comunicação, é imprescindível a juntada de provas materiais (PC nº 0600405–51/DF, rel. Min. Carlos Horbach, julgada em 7.10.2021, DJe de 4.11.2021).4.6.2. Quanto à despesa de R$ 22.000,00, a documentação juntada não se mostra suficiente para comprovar a despesa, notadamente diante da incompatibilidade entre as datas da nota fiscal (24.4.2017) e da realização do evento (21.3.2016) e do fato de a sede da prestadora dos serviços ser em localidade diversa da do evento, circunstâncias que exigem provas complementares hábeis a demonstrar que se tratou de equívoco. Conforme já decidiu esta Corte Superior, "[...] a emissão de notas fiscais em data posterior à efetiva realização do evento macula e compromete a transparência das contas, o que inviabiliza o efetivo controle dos gastos pela Justiça Eleitoral. É dever da agremiação manter a guarda dos documentos que comprovem a efetivação dos gastos de maneira organizada e diligente, a fim de evitar que documentação fiscal seja emitida meses após a realização do serviço" (ED–PC nº 0601850–41/DF, Min. Mauro Campbell Marques, julgados em 16.12.2021, DJe de 3.2.2022).4.6.3. Em relação à despesa de R$ 6.439,87, além dos termos genéricos em que redigido o documento fiscal, o Instituto Tancredo Neves não apresentou documentação alguma relativa à identificação dos hóspedes e dos participantes do evento, em descumprimento ao art. 18, § 7º, III, da Res.–TSE nº 23.464/2015, circunstância que impede atestar a regularidade do gasto.4.6.4. No que tange ao gasto de R$ 6.439,87 e R$ 9.360,00, constam das notas fiscais as seguintes descrições, respectivamente: "REALIZAÇÃO DE EVENTO 16/09/2017 DEM–JOVEM" (ID 46348738, fl. 67), "LOCAÇÃO DE ESPAÇO COM SERVIÇO DE SALA" (ID 223346, fl. 130) e "DESPESA COM EVENTO CONEXÃO DEMOCRATAS REALIZADOS NOS DIAS 17 A 19 DE NOVEMBRO DE 2017 (ID 223340, fl. 51). Além da ausência da lista de participantes, não foram colacionados o conteúdo programático, o nome dos palestrantes nem qualquer prova material que ateste a efetiva realização do evento. Conforme já decidiu o TSE, a comprovação de gastos com eventos demanda "b) registros de presença dos participantes do evento; c) fotos, folders, vídeos, e–mail ou impressos do evento ocorrido no hotel; d) atas de reunião e resumos das deliberações realizadas" (ED–PC–PP nº 245–80/DF, rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgados em 20.5.2021, DJe de 7.6.2021). Irregularidades mantidas.4.7. Despesas com passagens aéreas e hospedagem4.7.1. Em relação à despesa de R$ 24.289,05, o órgão técnico manteve a glosa pelo fato de que, mesmo após prévia comunicação do cancelamento do evento internacional que motivou os gastos com passagens aéreas, "Consta na planilha do ID PJE nº 46348888–pág 6 a informação que o bilhete não foi utilizado. Não localizado documento de estorno do pagamento efetuado, ou utilização do crédito" (ID 128907988, fl. 49). Ao ser intimado para prestar esclarecimentos, o partido se manteve inerte. Irregularidade mantida.4.7.2. No que concerne às despesas de R$ 3.333,00 e R$ 9.902,00, constam dos autos, unicamente, notas fiscais com as seguintes descrições: "REFERENTE AS [sic] HOSPEDAGENS DO PERÍODO 04/08/2017 / 06/08/2017" (ID 46352288, fl. 29) e "Evento Gold Aluguel Salao 5933,00 Olaria 2940,00 Diaria [sic] Referente a Ontem 840,00 ISSQN 189,00" (IDs 223340, fl. 28, e 46352938, fl. 22). inexistem elementos informativos relativos aos beneficiários das hospedagens, em descumprimento ao art. 18, § 7º, III, da Res.–TSE nº 23.464/2015. Irregularidade mantida.4.8. Despesas com refeições4.8.1. Sobre a temática, entende esta Corte Superior que "a utilização de recursos do fundo partidário está regulada no art. 44 da Lei nº 9.096/95. Para que as despesas de transporte e alimentação sejam enquadradas no inciso I do referido artigo é essencial que o partido político demonstre, ainda que sucintamente, a correlação entre o uso do dinheiro público e a atividade partidária (PC 0000228–15/DF rel. Min. Rosa Weber, DJe de 6/6/2018)" (AgR–PC–PP nº 184–88/DF, rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 19.8.2021, DJe de 15.9.2021).4.8.2. No que tange às despesas de R$ 1.064,00, R$ 944,00, R$ 1.940,29 e R$ 2.200,00, as notas fiscais são genéricas e inexistem informações relativas aos beneficiários/participantes dos eventos que motivaram o gasto com alimentação, o que impossibilita comprovar o necessário vínculo com as atividades do instituto.4.9. Despesas com plano de saúde4.9.1. Conquanto seja lícita despesa com plano de saúde dos empregados, é necessária a juntada das faturas ou de documento que possibilite aferir a vinculação dos beneficiários com a agremiação e os respectivos valores pagos. No caso, os prestadores não juntaram, no tempo oportuno, fatura com a relação dos beneficiários e com os valores individualmente considerados, em descumprimento ao art. 18, § 2º, da Res.–TSE nº 23.464/2015. Irregularidade mantida.4.10. Despesas sem documentação fiscal4.10.1. No ponto, o partido se limitou a apresentar comprovante bancário, boleto de pagamento e ou ordem de serviço. Como se sabe, empresas que possuem inscrição no CNPJ devem emitir nota fiscal, conforme a legislação de regência. Precedentes. Irregularidades mantidas.4.11. Despesas sem vinculação com as atividades do Instituto Tancredo Neves4.11.1. O Instituto Tancredo Neves transferiu o valor de R$ 2.127,57 ao Módulo Cultural Hispanoamericano, localizado no México, a título de reembolso de despesas sem prova da regular filiação ao referido organismo internacional – requisito indispensável para a regularidade de gastos com mensalidades, anuidades e congêneres devidos a organismos partidários internacionais que se destinem ao estudo, à doutrinação e à educação política, conforme exige o inciso VI do art. 44 da Lei dos Partidos Políticos.4.11.2. Quanto ao gasto de R$ 13.000,00, a descrição genérica ("Produção de conteúdo") e a inexistência de outros documentos descritivos dos serviços prestados impossibilitam identificar se as atividades custeadas pelo Instituto Tancredo Neves possuem vínculo com as suas finalidades.4.11.3. No que se refere à despesa de R$ 18.000,00, para "TREINAMENTO PARA DESENVOLVIMENTO DE PESSOAS" (ID 223340, fl. 190) no quantitativo de nove participantes, na cidade de João Pessoa/PB, o Instituto Tancredo Neves não se desincumbiu de apresentar documentação que permita identificar os beneficiários e a efetiva participação destes no evento, em descumprimento ao art. 18, caput e § 1º, II, c/c o art. 35, § 2º, da Res.–TSE nº 23.464/2015. Precedente.5. Programa de incentivo à participação feminina na política5.1. Nos termos do art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995, as agremiações políticas devem aplicar, em cada exercício financeiro, no mínimo, 5% do valor que receberam, no período, do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.5.2. Para o cálculo do percentual mínimo, a quantia devolvida ao partido pelo Instituto Tancredo Neves (R$ 2.767.491,42) deve ser somada ao valor recebido do Fundo Partidário para se determinar o montante a ser destinado aos fins do art. 44, V, da Lei dos Partidos Políticos, conforme estabelece o art. 20, § 2º, III, c/c o art. 22 da Res.–TSE nº 23.464/2015.5.3. Na hipótese, o DEM recebeu do Fundo Partidário em 2017 o valor de R$ 29.809.688,58, que, somado à quantia de R$ 2.767.491,42, alcança o montante de R$ 32.577.180,00. Dessa forma, o partido deveria ter aplicado, no mínimo, R$ 1.628.859,00 para os fins do art. 44, V, da Lei dos Partidos Políticos.5.4. O órgão técnico, antes de atestar se as despesas atendem à finalidade do inciso V do art. 44 da Lei nº 9.096/1995, verifica se o gasto se encontra comprovado à luz do art. 18 da Res.–TSE nº 23.464/2015. Somente após o reconhecimento da regularidade da despesa é que se verifica se houve o atendimento à específica finalidade do fomento à participação política feminina. Precedente.5.4. No caso, a unidade técnica observou o seguinte: (a) despesas regulares com observância da finalidade legal, no valor de R$ 0,00; (b) despesas regulares sem observância da finalidade legal, no valor de R$ 99.104,78; e (c) despesas irregulares, no valor de R$ 190.000,00.5.4.1. Quanto às despesas com pessoal, no valor de R$ 99.104,78, embora legítimas, não podem ser computadas para os fins do art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995, conforme entendimento pacífico deste Tribunal. Precedentes.5.4.2. Em relação às despesas com propaganda do Democratas Mulher, no valor de R$ 190.000,00, estas não foram devidamente comprovadas, pois não foi apresentado contrato, tampouco foi comprovada a efetiva realização do serviço, já que, conforme apontou a Asepa, não foram apresentados vídeos ou outros materiais que comprovassem que a publicidade em questão atendeu ao previsto na legislação.5.5. No que tange à argumentação do partido relativa à aplicação, ao presente caso, das previsões contidas nos arts. 55–A, 55–B e 55–C da Lei nº 9.096/1995 (acrescidos pela Lei nº 13.831/2019), é certo que, (a) no que concerne ao art. 55–A, este não isenta a agremiação das penalidades pelo descumprimento do art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995, uma vez que o partido não comprovou que os recursos não utilizados no programa de incentivo à participação política feminina em 2017 foram destinados a essas candidaturas até as eleições de 2018; (b) com relação ao art. 55–B, o partido nada informou; e (c) em relação ao art. 55–C, esta Corte Superior entende não ser aplicável quando verificadas outras irregularidades na análise das contas partidárias.5.6. A EC nº 117/2022 não excluiu a possibilidade de a Justiça Eleitoral, no exercício de sua competência fiscalizadora, aferir a regularidade do uso das verbas públicas relativas ao programa de promoção e difusão da participação política das mulheres e ao financiamento das candidaturas de gênero. A gravidade dessa espécie de falha, aliás, tornou–se ainda mais evidente com a constitucionalização da ação afirmativa (PC–PP nº 0601765–55/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgada em 7.4.2022, DJe de 6.5.2022).5.7. Em conclusão, o partido não teve êxito em comprovar a aplicação de valor algum em manutenção ou em programas destinados à participação feminina na política (R$ 1.628.859,00), "[...] circunstância grave que deve ser sopesada negativamente no julgamento das contas" (PC nº 178–81/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 2.6.2021).6. Conclusão: contas aprovadas com ressalvas6.1. O total de irregularidades encontrado nas contas, já decotado o montante objeto da anistia da EC nº 117/2022 (R$ 1.628.859,00), é de R$ 1.670.835,61, o que representa 5,6% do total que o partido recebeu do referido fundo público em 2016 (R$ 29.809.688,58).6.2. Conforme a jurisprudência do TSE, para a aprovação das contas, ainda que com ressalvas, é essencial a baixa repercussão das falhas dentro do conjunto contábil das contas, a ausência de falhas graves e o baixo valor nominal das irregularidades, circunstâncias que evidenciam o compromisso do Partido em prestar as contas de maneira transparente, aliada à aplicação dos recursos dentro da legalidade estrita.6.3. Determinações: (a) ressarcimento ao erário do valor de R$ 1.670.835,61; e (b) aplicação do valor de R$ 1.628.859,00 em candidaturas femininas nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão.