Jurisprudência TSE 060041328 de 07 de marco de 2023
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Carlos HorbachRelator designado(a): Min. Mauro Campbell Marques
Data de Julgamento
18/08/2022
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, julgou desaprovadas as contas partidárias do Partido Trabalhista Cristão (PTC) referentes ao exercício financeiro de 2017, nos termos do voto do Relator. E, por maioria, impôs determinações à agremiação, nos termos do voto do Ministro Mauro Campbell Marques, vencidos parcialmente os Ministros Carlos Horbach (Relator) e Benedito Gonçalves, que impunham determinações diversas. Acompanharam a divergência os Ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski e Sérgio Banhos. Redigirá o acórdão o Ministro Mauro Campbell Marques. Composição: Ministros Edson Fachin (Presidente), Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS. PTC. EXERCÍCIO 2017. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA E FONTE VEDADA. RECURSOS PÚBLICOS: TRANSAÇÃO IMOBILIÁRIA COM A FUNDAÇÃO. SIMULAÇÃO. REPASSE INDEVIDO PARA DIRETÓRIOS. INSUFICIÊNCIA NA COMPROVAÇÃO DE GASTOS. FUNDO DE CAIXA. LIMITE. EXTRAPOLAÇÃO. DESCUMPRIMENTO DO PERCENTUAL PARA A PARTICIPAÇÃO FEMININA NA POLÍTICA. CONJUNTO DE IRREGULARIDADES. DESAPROVAÇÃO. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. RECURSOS PRÓPRIOS. SANÇÃO. MULTA. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.1. Transação imobiliária entre a grei e sua fundação. Simulação reconhecida na execução da PC nº 714–68, na medida em que o partido confessa que a negociação teve por finalidade angariar meios para o cumprimento da sanção de ressarcimento ao Erário naquela prestação de contas, relativa ao exercício de 2010, a qual deveria ser satisfeita com recursos próprios, o que não ocorreu.1.1. Conforme consignado no julgamento da PC nº 0601765–55/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 6.5.2022, "o montante mínimo de 20% do fundo público deve ser empregado – friso, obrigatoriamente – no exclusivo atendimento dos fins previstos no multicitado inciso IV do art. 44 da Lei nº 9.096/1995, sob pena de desvio de finalidade".1.2. O não cumprimento do repasse mínimo para a fundação constitui retenção indevida de recursos públicos, devendo essa específica irregularidade – cuja gravidade é inconteste – ser considerada no julgamento das contas. Precedentes. Desse modo, por decorrência lógica da conclusão pela burla à finalidade legal de fomento mínimo às atividades fundacionais, o valor referente à transação simulada deve ser subtraído do cálculo de 20% a que se refere o IV do art. 44 da Lei dos Partidos Políticos.1.3. Decotando–se o valor de R$ 210.000,00 da transação reconhecidamente ilícita do montante repassado pelo partido à fundação (R$ 758.100,88), o total de recursos públicos transferidos à FMCT é de R$ 548.100,88. Considerando que o partido recebeu R$ 2.890.169,17 do Fundo Partidário em 2017, houve descumprimento ao art. 44, IV, da Lei nº 9.096/1995, uma vez que o montante repassado efetivamente à fundação (R$ 548.100,88) equivale a 18,96% do total de recursos públicos direcionados ao partido. Assim, a insuficiência na aplicação mínima de recursos do Fundo Partidário nas atividades da fundação foi de 1,04 %, o que equivale a R$ 30.057,75.2. Quanto à reversão de recursos financeiros da fundação para o partido instituidor a título de sobras financeiras, sabe–se que "conquanto a análise da regularidade dos gastos da fundação vinculada a partido político custeados com verbas do Fundo Partidário somente ocorrerá a partir das contas do exercício financeiro de 2021 – remanesce a competência desta Justiça Eleitoral para aferir o cumprimento da determinação contida no inciso IV do art. 44 da Lei dos Partidos Políticos, que obriga que o partido político a aplicar o mínimo de 20% dos recursos recebidos do Fundo Partidário na criação e manutenção da entidade de pesquisa, doutrinação e educação política vinculada a ele vinculada" (PC nº 0601765–55/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 6.5.2022).2.1. No caso, a controvertida reversão financeira foi levada a efeito pelo ente fundacional no exercício de 2018, de modo que a análise dessa transação – e seus reflexos – somente pode ser feita na PC nº 0600225–98/DF, relativa às contas do exercício financeiro de 2018 do PTC, autos em que, respeitado o devido processo legal e o regramento aplicável, poderão os legitimados apontar eventual malferimento do dever legal que o partido político tem de assegurar o mínimo existencial anual à entidade de pesquisa, doutrinação e educação política a ele vinculada.3. Os apontamentos quanto à forma pela qual se deu o dispêndio com vale–transporte e sobre equiparação salarial extrapolam a competência da Justiça Eleitoral, a serem analisados pela Justiça do Trabalho. Precedentes.4. A sanção de suspensão do recebimento de recursos do Fundo Partidário imposta a outras esferas do partido, em razão da desaprovação de suas contas, deve ser cumprida a partir da publicação da decisão, e não da data em que comunicada pelos tribunais. Os valores recebidos indevidamente por esses diretórios não podem lá remanescer, sob pena de descumprimento da decisão que impedira seu recebimento. Precedentes.5. São irregulares as despesas com recursos do Fundo Partidário em que não comprovadas, por meio de documentação adequada, a efetiva prestação de serviços e a sua vinculação com a atividade partidária, segundo a legislação aplicável e a jurisprudência desta Corte.6. O instrumento normativo das contas do exercício de 2017 não estabelece limites do Fundo de Caixa por fonte de recursos, assim deve ser considerada a soma de todos os eventuais valores que o tenham constituído, visto que é registrado como um fundo único, nos termos do art. 19 da Res.–TSE nº 23.464/2015.7. No exercício de 2017, o PTC deixou de destinar para a participação feminina na política a quantia de R$ 70.091,94 (setenta mil, noventa e um reais e noventa e quatro centavos), a ser acrescida do montante de R$ 149.937,05 (cento e quarenta e nove mil, novecentos e trinta e sete reais e cinco centavos), não aplicado no exercício de 2010, que também deveria ser cumprido em 2017.7.1. Como se sabe, em 5.4.2022, o Congresso Nacional promulgou a Emenda Constitucional nº 117/2022, tendo estabelecido a seguinte anistia: "Art. 2º Aos partidos políticos que não tenham utilizado os recursos destinados aos programas de promoção e difusão da participação política das mulheres ou cujos valores destinados a essa finalidade não tenham sido reconhecidos pela Justiça Eleitoral é assegurada a utilização desses valores nas eleições subsequentes, vedada a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional".7.2. Os dispositivos da EC nº 117/2022 são de aplicabilidade imediata, cabendo ao Juízo Eleitoral considerá–los, de ofício ou a requerimento da parte, haja vista se tratar de fato superveniente com influência no julgamento do mérito surgido – na hipótese – após o início do julgamento. Nesse sentido: PC nº 0601826–13/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, DJe de 11.5.2022.7.3. Embora a incidência do dispositivo anistiador impeça a imposição de sanções nos processos que não tenham transitado em julgado até a data de promulgação da emenda constitucional, não afasta a configuração dessa grave irregularidade nem o dever ressarcir o erário dos valores considerados irregulares e/ou não comprovados, haja vista não se tratar de sanção, mas de mera recomposição de valores públicos malversados.7.4. No caso, deve o montante de R$ 70.091,94, atualizado, ser transferido para a conta específica da ação afirmativa, de modo que os respectivos valores sejam utilizados em candidaturas femininas nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão.7.5. Uma vez que a anistia não alcança a sanção imposta às contas do PTC do exercício de 2010 (cuja decisão transitou em julgado em 5.6.2017), o montante de R$ 149.937,05 deve ser transferido para a conta específica da mulher, sendo vedada sua aplicação para finalidade diversa, de modo que o saldo remanescente deverá ser aplicado dentro do exercício financeiro subsequente ao trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de acréscimo de 12,5% do valor previsto no inciso V do caput do art. 44 da Lei nº 9.096/1995.8. O conjunto de todas as irregularidades alcança o montante de R$ 836.508,41 (oitocentos e trinta e seis mil, quinhentos e oito reais e quarenta e um centavos), o que equivale ao percentual de 28,94% do total dos recursos do Fundo Partidário recebidos pela grei em 2017. As falhas, sejam elas pela natureza, pelo valor ou pelo percentual envolvido, comprometem as contas, que devem ser desaprovadas.9. O partido deverá devolver ao Tesouro, com recursos próprios e atualizado, o valor de R$ 582.072,26, acrescido de multa de 5% a ser descontada dos futuros repasses do Fundo Partidário, no período de 3 (três) meses, conforme decidido no julgamento da PC nº 0601858–18 e da PC nº 0601752–56, Rel. Min. Alexandre de Moraes, na sessão virtual de 25.6.2021 a 1º.7.2021.10. A grei também deve ser notificada para recolher ao Erário R$ 7.072,24 (sete mil, setenta e dois reais e vinte e quatro centavos), referentes ao recebimento de recursos de origem não identificada e de fonte vedada, atualizados e com recursos próprios.11. A agremiação deverá transferir o valor de R$ 70.091,94, devidamente atualizado, para a conta específica da ação afirmativa, a fim de que seja utilizado em candidaturas femininas nas eleições subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão (art. 2º, EC nº 117/2022). Além disso, o montante de R$ 149.937,05 deve ser transferido para a conta específica do programa de incentivo à participação feminina na política, sendo vedada sua aplicação para finalidade diversa, de modo que o saldo remanescente seja aplicado dentro do exercício financeiro subsequente ao trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de acréscimo de 12,5% do valor previsto no inciso V do caput do art. 44 da Lei nº 9.096/95. Mantidas as demais conclusões do ilustre relator.12. Contas partidárias desaprovadas, com determinações.