Jurisprudência TSE 060024067 de 26 de fevereiro de 2024
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. André Ramos Tavares
Data de Julgamento
28/11/2023
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, julgou aprovadas, com ressalvas, as contas do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) - Nacional, relativas ao exercício financeiro de 2018, nos termos do voto do Relator, e, por maioria, determinou que a legenda restitua ao Erário o valor de R$ 891.598,93 (oitocentos e noventa e um mil quinhentos e noventa e oito reais e noventa e três centavos), atualizado e com recursos próprios, nos termos do voto do Ministro Floriano de Azevedo Marques, vencidos parcialmente o Relator e a Ministra Cármen Lúcia. Acompanharam a parcial divergência, os Ministros Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti e Alexandre de Moraes (Presidente). Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO NACIONAL. PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL). EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. CONJUNTO DE IRREGULARIDADES. BAIXO PERCENTUAL. INEXISTÊNCIA DE ÓBICES RELEVANTES À FISCALIZAÇÃO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. PRECEDENTES. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.1. Em razão do caráter jurisdicional das prestações de contas, a defesa é a última oportunidade para produção de provas, motivo pelo qual deve ser indeferido requerimento para juntada de documento em alegações finais ante a ocorrência da preclusão (PC nº 0600432–34, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 19.5.2023).2. Nos termos assinalados pelo Parquet, persiste a inconsistência contábil entre receitas declaradas no SPCA e registros dos extratos bancários no total de R$ 51.953,00 (cinquenta e um mil, novecentos e cinquenta e três reais), uma vez que, a despeito de demonstrados o meio para captação de doações e sua titularidade, consoante o § 2º do art. 7º da Res.–TSE nº 23.546/2017, os valores informados pelo partido são discrepantes daqueles apontados pelo órgão ministerial (ID nº 157102149, fls. 9–21). Ademais, a legenda não demonstrou o lançamento no extrato bancário da conta corrente Outros Recursos das receitas questionadas pelo MPE nos valores de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), referente a doação efetuada por cheque, e R$ 8.590,00 (oito mil, quinhentos e noventa reais), referente a doações efetuadas por transferência eletrônica, o que impossibilita atestar a regularidade dos registros efetuados.3. Segundo jurisprudência do TSE, "a regular escrituração contábil – com documentação que comprove a entrada e a saída de recursos recebidos e aplicados – é imprescindível para que a Justiça Eleitoral exerça a fiscalização sobre as contas" (PC nº 0601364–22, Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 26.6.2023).4. A emissão e a apresentação do recibo eleitoral são etapas imprescindíveis para atestar a regularidade na arrecadação de recursos. No caso, embora seja possível identificar o doador, o PSOL deixou de apresentar o recibo de doação no valor de R$ 20,00 (vinte reais). A despeito do valor irrisório no contexto das contas, essa inobservância constitui irregularidade insanável, conforme previsto no art. 11, I e § 1º, da Res.–TSE nº 23.546/2017. Nesse sentido: PC nº 994–34, Rel. Min. Og Fernandes, DJe de 19.12.2019.5. A comprovação dos gastos com recursos do Fundo Partidário, segundo o disposto no art. 18 da Res.–TSE nº 23.546/2017, requer apresentação de documento fiscal idôneo que contenha descrição detalhada de emitentes e destinatários, produto adquirido ou serviços prestados. Nos termos do referido dispositivo, admite–se, ainda, qualquer outro meio idôneo de prova para tal finalidade.6. Quanto às despesas com assessoria de imprensa no montante de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), além de notas fiscais, o PSOL efetivamente juntou aos autos, ainda na fase de diligências, contrato de prestação de serviços com a aludida empresa, cujo objeto é prestação de serviços de assessoria e comunicação, e relatórios que detalham serviços realizados de produção de conteúdo, assessoria de imprensa e preparação para entrevistas, sabatinas e debates, com indicação dos links dos eventos envolvidos, cumprindo, pois, o que determina a legislação de regência (arts. 18 e 35, § 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017) e a jurisprudência desta Corte (PC nº 266–61, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 2.6.2017).7. No que se refere a pagamento a profissional autônomo no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o PSOL apresentou, na fase de diligências, comprovante de transferência bancária, RPA preenchido, no qual consta assinatura da beneficiária, e, apesar de ausente número de inscrição no INSS, informou a respectiva inscrição. Juntou, ainda, relatório que detalha atividades desenvolvidas referentes a consultoria para elaboração de programa partidário, cumprindo, assim, o que determina a legislação competente (arts. 18 e 35, § 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017) e a jurisprudência do TSE (PC nº 311–94, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 31.5.2019, e PC nº 245–80, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJe de 12.3.2021).8. A apresentação de recibos de pagamento a autônomo (RPA), acompanhados de certidão do Serviço de Gerenciamento de Informações Partidárias (SGIP), foi suficiente para comprovar a regularidade da despesa no valor de R$ 53.794,12 (cinquenta e três mil, setecentos e noventa e quatro reais e doze centavos) e, consequentemente, das contribuições previdenciárias patronais de 20% recolhidas ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) no montante de R$ 9.690,34 (nove mil, seiscentos e noventa reais e trinta e quatro centavos).9. Os repasses no valor de R$ 874.211,26 (oitocentos e setenta e quatro mil, duzentos e onze reais e vinte e seis centavos) para diretórios regionais que se encontravam impedidos de receber cotas do Fundo Partidário impõem ressarcimento atualizado da quantia correspondente ao Erário. Precedentes.10. A apresentação das faturas emitidas pelas agências de turismo, das quais se extraem nomes dos beneficiários, datas e itinerários, afigura–se suficiente para comprovar a materialidade dos gastos com transporte aéreo e hospedagens, visto que o partido evidenciou o vínculo da despesa com a atividade partidária por meio de relatório, conjunto de notícias e fotografias.11. A orientação jurisprudencial até então consolidada nesta Corte era no sentido de que os encargos decorrentes da não utilização de passagens aéreas e hospedagens, quando não justificados, não encontram previsão no art. 44 da Lei nº 9.096/95, devendo ser restituídos tais valores, se pagos com verbas públicas (PC nº 291–06, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 19.6.2019, e AgR–PC nº 274–38, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 10.8.2017).12. Em nova reflexão sobre o tema, este Tribunal decide nesta assentada que "pagamento de encargos por eventos dessa natureza (desistência, no–show, cancelamento etc.) pode ser admitido até um valor razoável, tendo em vista a dinâmica da vida partidária e a possibilidade de cancelamento de eventos e de compromissos da grei e dos seus integrantes", e, com base em um juízo de proporcionalidade, "não deve ser considerado irregular o gasto com encargos por cancelamento de voos e de diárias que não foram utilizadas, desde que não ultrapassado o montante de 10% do valor total utilizado especificamente na rubrica de despesas com transportes e hospedagens" (PC n° 0600240–67, de minha relatoria, julgada em 28.11.2023).13. Nesse contexto, deve ser afastada a glosa no valor de R$ 8.676,17 (oito mil, seiscentos e setenta e seis reais e dezessete centavos), relativa a essas rubricas nas despesas gerais e da política feminina, por serem diminutos os gastos com encargos por cancelamento de voos e de diárias não utilizadas.14. O pagamento de juros, multas e encargos em decorrência de atraso no pagamento tampouco está amparado pelo art. 17, § 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017 (art. 44 da Lei nº 9.096/95), razão pela qual vedada a utilização de recursos do Fundo Partidário para tal finalidade (PC nº 0601682–39, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 11.5.2022; PC nº 298–95, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 9.5.2019; e PC nº 0601754–26, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe de 3.5.2022).15. A irregularidade das despesas com transporte foi parcialmente afastada, julgando–se regulares gastos no valor de R$ 15.611,56 (quinze mil, seiscentos e onze reais e cinquenta e seis centavos), visto que apresentada documentação que atesta a execução e o vínculo com as atividades partidárias. Mantém–se, contudo, a irregularidade do dispêndio de R$ 5.780,36 (cinco mil, setecentos e oitenta reais e trinta e seis centavos) em virtude da ausência de detalhamento das corridas e dos beneficiários (PC nº 0600866–52, Rel. Min. Carlos Horbach, DJe de 26.6.2023, e PC nº 0600226–83, Rel. Min. Sergio Banhos, DJe de 20.4.2023).16. A descrição genérica do serviço – "despesa com evento R$ 450,00" – inviabilizou relacionar o gasto às atividades partidárias, a teor do disposto nos arts. 44, V, da Lei nº 9.096/95 e 18 da Res.–TSE nº 23.546/2017. Da mesma forma, as despesas com locações de bens e equipamentos no total de R$ 1.200,00 (um mil e duzentos reais), em razão da generalidade dos documentos apresentados. (PC nº 0600385–60, Rel. Min. Raul Araújo Filho, DJe de 24.10.2022, e PC nº 245–80, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, DJe de 12.3.2021).17. São regulares as despesas referentes a serviços de publicidade no valor de R$ 793.800,00 (setecentos e noventa e três mil e oitocentos reais), diante do farto conjunto documental que comprova a execução material dos serviços e seu vínculo com as atividades partidárias, em conformidade com os arts. 44 da Lei nº 9.096/95 e 35, II e § 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017.18. Afasta–se parcialmente a irregularidade relativa a despesas com serviços gráficos no valor de R$ 14.740,14 (quatorze mil, setecentos e quarenta reais e quatorze centavos), uma vez que foram atestadas por documentos fiscais cujo detalhamento elenca aquisição de material condizente com atividades partidárias. Remanesce irregular, contudo, o dispêndio de R$ 11.555,00 (onze mil, quinhentos e cinquenta e cinco reais), diante da falta de documentação fiscal idônea ou de descrição pormenorizada do serviço ou do material, em afronta ao disposto nos arts. 44, V, da Lei nº 9.096/95 e 18 da Res.–TSE nº 23.546/2017.19. Mantida a irregularidade do gasto com Kalunga Comércio e Indústria Gráfica Ltda, no valor de R$ 178,20 (cento e setenta e oito reais e vinte centavos) em razão da impossibilidade de análise da nota fiscal, dada a precariedade da impressão (PC nº 169–22, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 2.2.2021).20. Este Tribunal tem reiterado, por seguidos exercícios financeiros – PC nº 0601855–63, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 10.5.2022; PC nº 173–59, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe de 26.3.2021; e PC nº 294–58, Rel. Min. Jorge Mussi, DJe de 31.5.2019 –, que despesas administrativas como pagamento de pessoal, aluguéis e serviços de telefonia desvirtuam o propósito legal de mitigar a sub–representatividade feminina na política, visto serem gastos ordinários, ainda que relacionados às sedes ou aos órgãos voltados ao incentivo das mulheres na política.21. Quanto à contratação de segurança para proteção de candidatas, dirigentes e filiadas, bem como a inclusão dessa despesa no cômputo do incentivo à participação feminina na política, esta Corte consignou, nesta assentada, que, considerando que a Lei n° 14.192, de 4.8.2021, incluiu o inciso X no art. 15 da Lei 9.096/95, com intuito de exigir que os estatutos partidários passem a conter normas sobre prevenção, repressão e combate à violência política contra a mulher e tendo em vista que no caso vertente há comprovação efetiva de dispêndio com a segurança de candidata, deve–se inserir tal despesa nessa rubrica específica, sempre com a perspectiva de que não haja desvio da verba para fins de contratações outras, como cabos eleitorais.22. Dessa forma, reputa–se regular a despesa com profissional autônomo para segurança de candidata no valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais).23. No caso dos autos, o diretório nacional do PSOL cumpriu a obrigação legal de destinação mínima de 5% do Fundo Partidário, recebido em 2018, para fomento da participação das mulheres na política (art. 44, V, da Lei nº 9.096/95, com a redação da Lei nº 13.165/2015).24. O conjunto de irregularidades alcança R$ 943.571,93 (novecentos e quarenta e três mil, quinhentos e setenta e um reais e noventa e três centavos), valor equivalente a 5,80% dos recursos recebidos do Fundo Partidário pela legenda em 2018. O percentual e o quantitativo considerados irregulares se mostraram relativamente baixos no contexto geral das contas e, não havendo indícios de má–fé ou óbices relevantes à fiscalização em sua totalidade, atraem a incidência dos comandos da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovação das contas com ressalvas, nos termos da jurisprudência do TSE.25. Determina–se a devolução ao Erário do valor de R$ 891.598,93 (oitocentos e noventa e um mil, quinhentos e noventa e oito reais e noventa e três centavos), atualizado e com recursos próprios. Precedentes.26. O recolhimento do aludido montante mediante desconto no futuro repasse das cotas do Fundo Partidário poderá ser admitido na fase de cumprimento de sentença, etapa processual adequada para o exame de medidas satisfativas ao julgado. Nessa esteira, confiram–se os recentes julgados: ED–PC nº 0600395–07 e ED–PC nº 0600423–72, Rel. Min. Raul Araújo, julgados em 13.6.2023 e 15.6.2023, respectivamente.