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Jurisprudência TSE 060022076 de 13 de marco de 2023

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Raul Araujo Filho

Data de Julgamento

27/02/2023

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, julgou desaprovadas as contas do Diretório Nacional do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) relativas ao exercício financeiro de 2018, impondo¿lhe determinações, nos termos do voto do Relator. Votaram com o Relator os Ministros: Sérgio Banhos, Carlos Horbach, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves e Alexandre de Moraes (Presidente). Falou pelo requerente, Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) Nacional, o Dr. Caio Augusto Tadeu Carvalho de Almeida.Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

Ementa

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE PARTIDO POLÍTICO. PSTU – DIRETÓRIO NACIONAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2018. IRREGULARIDADES QUE TOTALIZAM R$ 337.574,30, VALOR EQUIVALENTE A 11,73% DOS RECURSOS RECEBIDOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. VERBA PÚBLICA IRREGULARMENTE APLICADA. NÃO COMPROVAÇÃO DE GASTOS. AUSÊNCIA DE DOCUMENTAÇÃO. INSUFICIÊNCIA DE APLICAÇÃO DE RECURSOS PÚBLICOS NO FOMENTO À PARTICIPAÇÃO FEMININA NA POLÍTICA. CONTAS DESAPROVADAS, COM DETERMINAÇÕES.1. Prestação de contas do Diretório Nacional do PSTU relativa ao exercício financeiro de 2018, cujo mérito se submete às disposições da Res.–TSE nº 23.546/2017.1.1. A fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral tem por escopo identificar a origem das receitas e a destinação das despesas com as atividades partidárias, mediante avaliação formal dos documentos contábeis e fiscais apresentados pelo partido político.2. Falhas identificadas pelo órgão técnico.2.1. Débitos na conta bancária específica sem a apresentação de documento fiscal ou com documento fiscal irregular.2.1.1. No caso, não foram apresentadas notas fiscais relativas a serviços de assessoria contábil, ao argumento de que os contadores e sociedades por eles constituídas sujeitam–se ao regime de tributação especial, prescindindo de emissão de nota fiscal.2.1.2. Intimado para se manifestar acerca da ausência de nota fiscal, o partido apresentou contrato de prestação de serviços, boletos, comprovantes de pagamento bancários e recibos.2.1.3. Da leitura do contrato firmado, vê–se que o objeto contratual especifica serviços de natureza contábil, estabelece que os honorários profissionais – à época de formalização do pacto (1º.6.2014), correspondentes a R$ 477,84 – seriam reajustados anualmente, bem como que a vigência do contrato se daria por prazo indeterminado. Além disso, em consulta ao CNPJ da SALES ASSESSORIA CONTABIL SOCIEDADE SIMPLES LTDA, 73.950.388/0001–65, verifica–se que seu cadastro está ativo e regular junto à Receita Federal do Brasil, bem como o respectivo CNAE indica "atividades de contabilidade".2.1.4. A Res.–TSE nº 23.546/2017 admite qualquer meio idôneo de prova documental para fins de comprovação de despesa, tais como contrato e comprovantes bancários, bem como recibos, na hipótese em que dispensada a emissão de documento fiscal. Nesse norte, desde que idôneos e hábeis a possibilitar a fiscalização das contas por esta Justiça especializada, o prestador pode juntar qualquer meio de prova capaz de comprovar o gasto público. Tem–se, portanto, que "[a] apresentação de documento fiscal é a regra, e os demais meios de provas são alternativos, razão por que a documentação complementar pode servir como meio de prova e confirmação da regularidade da despesa" (PC–PP 190–95/DF, rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, julgada em 11.2.2021, DJe de 12.3.2021).2.1.5. Desde que idôneos e hábeis a possibilitar a fiscalização das contas por esta Justiça especializada, o prestador pode juntar qualquer meio de prova capaz de comprovar o gasto público. Precedentes.2.1.6. Na hipótese, a documentação constante dos autos é suficiente para comprovar a efetiva prestação dos serviços e sua vinculação com as atividades desenvolvidas pela agremiação, na medida em que os documentos juntados pelo prestador – contrato de prestação de serviços, boletos, comprovantes de pagamento bancários e recibos – são convergentes entre si, o que evidencia a idoneidade. Irregularidade afastada.2.2. Despesas com passagens aéreas e hospedagens.2.2.1. No caso, foram apresentados comprovantes de pagamentos de títulos, planilhas elaboradas pela agremiação e faturas emitidas por agência de viagem.2.2.2. Os gastos com passagens aéreas e hospedagens devem vir acompanhados da documentação prevista nos incisos II e III do § 7º do art. 18 da Res.–TSE nº 23.546/2017, de modo a possibilitar a aferição do vínculo do beneficiário com as despesas custeadas com recursos públicos, bem como a pertinência e relação dos gastos com as atividades partidárias (PC nº 0601826–13/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgada em 7.4.2022, DJe de 11.5.2022).2.2.3. Consoante jurisprudência firmada por esta Corte Superior, além de documento fiscal idôneo, o prestador de contas deve comprovar que os gastos com passagens aéreas e hospedagens possuem vinculação com as atividades partidárias, o que não ocorreu no caso em tela, ante a inexistência de qualquer prova da efetiva realização dos eventos partidários. Precedentes;2.2.4. Inviável atestar a regularidade dessa espécie de gastos quando "ausentes [...] notas explicativas pormenorizadas e prova da vinculação dos hóspedes à atividade partidária (a exemplo de registros fotográficos, notícias jornalísticas, listas de participantes etc)" (167–52/DF, rel. Min. Sergio Silveira Banhos, julgado em 15.4.2021, DJe de 3.5.2021). No mesmo sentido: PC–PP nº 193–50/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 7.4.2021). Irregularidade mantida.2.3. Reembolso de passagens terrestres e aéreas.2.3.1. Na espécie, o partido apresentou tabela por ele produzida em que especifica o vínculo do beneficiário com o partido. Contudo, "[...] documentos produzidos unilateralmente pelo próprio partido são imprestáveis para o fim de ser se comprovar gastos com recursos públicos" (ED–PC nº 0601236–02/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 17.6.2022).2.3.2. Ainda que assim não fosse, a tabela colacionada pelo partido ID 154697438, fls. 35–36), descreve genericamente as finalidades dos deslocamentos como sendo "reunião sobre prestação de contas com a Direção Municipal de Bauru"; "reunião secretaria nacional de negras e negros em 26/5"; "reunião com a Dir Municipal de Belo Hor" "hospedagem no Rio de Janeiro"; "reunião com a Dir Estadual de Minas Gerais" etc.2.3.3. Conforme entende esta Corte Superior, "a ausência de comprovação da realização dos eventos [...] impossibilita o controle das contas pela Justiça Eleitoral" (PC nº 0601850–41/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 7.10.2021).2.4. Despesas com seminários e eventos.2.4.1. No caso, o objeto do contrato celebrado entre o partido e o Hotel Fazenda Aldeia do Vale Ltda. é a realização do X Congresso Nacional da legenda no período de 25.6.2018 a 1º.7.2018. A nota fiscal apresentada descreve genericamente o serviço como "hospedagem com alimentação".2.4.2. O partido se limitou a juntar aos autos eletrônicos boletins de discussão e tabela por ele produzida relativa às passagens compradas.2.4.3. É pacífico o entendimento nesta Corte Superior no sentido de que a comprovação de gastos com hospedagem e alimentação requer a demonstração mínima com a atividade partidária, sendo necessária, para tanto, a identificação dos beneficiários. Precedentes.2.4.4. Não há no feito documentos que comprovem a efetiva realização do evento citado pelos prestadores das contas, nem os beneficiários dos gastos custeados com verbas do Fundo Partidário.2.4.5. O art. 18, § 7º, III, da Res.TSE nº 23.546/2017 expressamente estabelece que "a comprovação de gastos relativos a hospedagem deve ser realizada mediante a apresentação de nota fiscal emitida pelo estabelecimento hoteleiro com identificação do hóspede".2.4.6. Conquanto o partido afirme que "a realização do Congresso pode ser comprovada pelas passagens pagas para alguns dos participantes" (ID 157263062, fl. 43), esta Corte Superior já decidiu que "não é admissível que o julgador decida pela regularidade do dispêndio apenas por presunção", haja vista que "cabe ao responsável pela despesa a prova de que os recursos pagos se destinaram efetivamente ao objeto vinculado ao interesse público, por determinação legal" (ED–PC nº 0601859–03, rel. Min. Sérgio Silveira Banhos, DJe de 20.4.2022).2.4.7. Inviável atestar a regularidade dessa espécie de gastos quando "ausentes [...] notas explicativas pormenorizadas e prova da vinculação dos hóspedes à atividade partidária (a exemplo de registros fotográficos, notícias jornalísticas, listas de participantes etc)" (167–52/DF, rel. Min. Sergio Silveira Banhos, julgado em 15.4.2021, DJe de 3.5.2021). No mesmo sentido: PC–PP nº 193–50/DF, rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 7.4.2021). Irregularidade mantida.3. Despesas diversas.3.1. Em relação aos gastos com Sales Assessoria Contábil Sociedade Simples Ltda., não foi demonstrada a correlação entre o pagamento de exame médico demissional e as atividades partidárias, não havendo sequer, no recibo, o nome do suposto empregado, o que contraria o disposto no art. 35, § 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017.3.2. No que concerne à empresa Transestevao Locação e Transporte Ltda. ME, a despesa com locação de ônibus para transporte ao congresso no Hotel Fazenda Aldeia do Vale é irregular, haja vista impossibilidade de identificar os beneficiários. Irregularidade mantida. Precedente.4. Programa de incentivo à participação das mulheres na política. Insuficiência de documentação para comprovação de despesas.4.1. O partido efetuou pagamentos em favor da empresa Maiorca Passagens e Turismo sem comprovar a vinculação da despesa – passagens aéreas – com a atividade partidária.4.2. Segundo entende o TSE, "para a regular comprovação de despesas com passagens aéreas e hospedagens, faz–se mister, além da apresentação de documento fiscal que preencha os requisitos do art. 18, § 7º, II e III, da Res.–TSE nº 23.546/2017, a comprovação do vínculo das viagens com a atividade partidária, consoante dispõe o art. 44 da Lei nº 9.096/1995" (ED–PC nº 0600225–98/DF, de minha relatoria, julgados em 6.10.2022, DJe de 24.10.2022).4.3. É pacífico o entendimento nesta Corte Superior de que atividades–meio com vistas à realização de atividades especificamente voltadas para a promoção da mulher na política, a exemplo dos serviços administrativos e despesas com transporte para reuniões e eventos do partido. Precedente: PC–PP nº 0601765–55/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgada em 7.4.2022, DJe de 6.5.2022:4.4. No caso, o partido sequer demonstrou a efetiva realização do evento que, segundo alega, ensejou as despesas com passagens, a exemplo fotos, vídeos, folders e outros documentos, o que contraria o disposto nos arts. 18 e 35, § 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017. Também não se desincumbiu do ônus de demonstrar o vínculo das passageiras com a agremiação. Irregularidade mantida. Precedente.5. Insuficiência na aplicação de recursos do Fundo Partidário em incentivo à participação das mulheres na política.5.1. A EC nº 117/2022 não excluiu a possibilidade de a Justiça Eleitoral, no exercício de sua competência fiscalizatória, aferir a regularidade do uso das verbas públicas relativas ao programa de promoção e difusão da participação política das mulheres e ao financiamento das candidaturas de gênero. A gravidade dessa espécie de falha, aliás, tornou–se ainda mais evidente com a constitucionalização da ação afirmativa (PC–PP nº 0601765–55/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgada em 7.4.2022, DJe de 6.5.2022).5.2. No caso, o partido deveria ter aplicado no programa de incentivo à participação política feminina o mínimo de R$ 143.820,94. Contudo, da análise da quantia destinada à ação afirmativa, ele comprovou regularmente a aplicação de R$ 140.610,88. Assim, a insuficiência da destinação mínima de recursos a que se refere o art. 44, V, da Lei nº 9.096/1995 é de R$ 3.210,06, montante que deve ser aplicado nas eleições subsequentes, consoante dispõe o art. 2º da EC nº 117/2022.6. Concentração de recursos no diretório nacional.6.1. O PSTU "[e]sclarece que o não repasse às outras esferas partidárias refere–se à uma política da agremiação, estando sua postura perfeitamente conforme ao princípio constitucional da autonomia partidária" (ID 154697438, fl. 27). No mais, aduz que o estatuto partidário legitima tal proceder.6.2. O TSE, no julgamento da PC nº 185–73/DF, rel. Min. Edson Fachin, DJe de 11.5.2021, rechaçou a possibilidade de disposição estatutária definir critérios para a distribuição de recursos públicos para os órgãos inferior, por malferir o caráter nacional dos partidos.6.3.Consoante a jurisprudência desta Corte Superior, "o caráter nacional dos partidos pressupõe a pulverização de representatividade, razão pela qual as legendas devem possuir capilaridade no território nacional, afigurando–se vedada a concentração de recursos do fundo partidário em detrimento da subsistência de diretórios estaduais, nos termos da jurisprudência do Tribunal (PC 237–74, rel. Min. Admar Gonzaga, DJE de 13.4.2018; PC 300–65, rel. Min. Og Fernandes, DJE de 13.5.2019)" (PC–PP nº 180–51/DF, rel. Min. Sérgio Banhos, julgada em 15.4.2021, DJe de 28.4.2021). Irregularidade mantida.7. Irregularidades relativas ao recebimento de recursos próprios sujeitas a ressarcimento ao erário. Recursos de origem não identificada recebidos nas contas específicas de recursos próprios.7.1. Na espécie, foram identificados créditos em contas–correntes – Outros Recursos – sobre os quais não foi possível verificar a origem nos demonstrativos das doações e das contribuições recebidas.7.2. O partido juntou planilhas por ele elaboradas e documentos de retorno de instituições financeiras, cujas informações já haviam sido apresentadas por meio do SPCA.7.3. Consoante preceitua o art. 8º, § 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017: "O depósito bancário previsto no § 1º deve ser realizado na conta ¿Doações para Campanha' ou na conta ¿Outros Recursos', conforme sua destinação, sendo admitida a efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou contribuinte ou o CNPJ, no caso de partidos políticos ou candidatos, seja obrigatoriamente identificado".7.4. No ponto, não foi possível identificar o CPF dos doadores, o que contraria o disposto no art. 8º, §§ 1º e 2º, da Res.–TSE nº 23.546/2017. Além disso, não foram apresentados documentos bancários que indicassem a origem dos créditos.7.5. É certo que a "arrecadação eleitoral por meio de cartões de crédito ou de débito, atribui aos próprios candidatos a responsabilidade de emitir recibos e verificar se as doações estão em conformidade com as exigências legais" (PC 0601231–77/DF, rel. Min. Benedito Gonçalves, julgada em 15.12.2022, DJe de 26.1.2023). Irregularidade mantida.8. Irregularidades apontadas pelo Ministério Público Eleitoral.8.1. Documentação insuficiente para comprovação da prestação de serviços e/ou vínculo com as atividades da Fundação José Luiz e Rosa Sundermann.8.1.1. Na sessão jurisdicional de 27.10.2020, na questão de ordem suscitada pelo MPE na PC nº 192–65/DF, rel. designado Min. Luis Felipe Salomão, o Plenário desta Corte decidiu, por maioria, que, a partir do exercício financeiro de 2021, caberá também à Justiça Eleitoral fiscalizar as contas da fundação, não sendo, portanto, aplicável esse novo entendimento no caso dos autos, tendo em vista que trata de prestação de contas do exercício financeiro de 2018.9. Conclusão: contas desaprovadas.9.1. O total de irregularidades encontrado nas contas do PSTU relativas ao exercício financeiro de 2018, sujeitas a ressarcimento ao erário, é de R$ 330.648,26, (valor que se refere aos recursos do Fundo Partidário irregularmente utilizados, ou que não foram devidamente comprovados, e recursos de origem não identificada recebidos na conta de recursos próprios), o que representa 1149% do total que o partido recebeu do aludido fundo público em 2018 (R$ 2.876.418,73).9.2. Esta Corte Superior entende que "inexiste fórmula fixa predeterminada que estabeleça a utilização de critério meramente percentual no julgamento das contas, de modo que tanto a aprovação quanto a rejeição delas dependem, necessariamente, da análise dos elementos do caso concreto, providência que compete, exclusivamente, ao julgador, que verificará se o conjunto das irregularidades implicou, na hipótese, malferimento – ou não – à transparência, à lisura e ao indispensável zelo no uso dos recursos públicos" (ED–PC nº 154–53/DF, rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgados em 10.6.2021, DJe de 25.6.2021).9.3. Dentre as irregularidades verificadas nas presentes contas, constatou–se a concentração de recursos na esfera nacional e a violação ao fomento do programa de participação feminina na política, falhas de natureza grave. Precedentes.10. Determinações.10.1. Ressarcimento ao erário do valor de 330.648,26, aplicação de multa de 6% sobre o montante tido por irregular, a ser paga mediante desconto nos futuros repasses do Fundo Partidário e aplicação nas eleições subsequentes do montante de R$ 3.210,06 no programa de incentivo à participação da mulher na política, consoante dispõe o art. 2º da EC nº 117/2022.


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