Jurisprudência TSE 060016443 de 23 de setembro de 2024
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. André Mendonça
Data de Julgamento
17/09/2024
Decisão
(Julgamento conjunto dos Agravos em Recursos Especiais Eleitorais nº 0600.158-36, nº 0600.161-88, nº 0600.162-73 e nº 0600.164-43)O Tribunal, por unanimidade, negou provimento aos agravos, revogou as liminares anteriormente concedidas, determinou que as eleições suplementares do Município de Coreaú/CE sejam realizadas na modalidade indireta, além da comunicação ao Tribunal Regional Eleitoral do Ceará para cumprimento imediato, nos termos do voto do Relator.Acompanharam o Relator, a Ministra Isabel Gallotti, e os Ministros Antonio Carlos Ferreira (substituto), Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Nunes Marques e Cármen Lúcia (Presidente).Registrada a presença, no plenário, do Dr. Paulo Renato Garcia Cintra Pinto, advogado dos agravantes José Edézio Vaz de Souza e Érika Frota Monte Coelho.Composição: Ministros (as) Cármen Lúcia (Presidente), Nunes Marques, André Mendonça, Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira (substituto), Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
ELEIÇÕES 2020. AGRAVOS EM RECURSOS ESPECIAIS ELEITORAIS. AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJEs). FEITOS CONEXOS. JULGAMENTO CONJUNTO NO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CASSAÇÃO DOS DIPLOMAS. INELEGIBILIDADE. MULTA. PRELIMINARES. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL, LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO E NULIDADE DA PROVA ADVINDA DA BUSCA E APREENSÃO. REJEIÇÃO. MÉRITO. PROMESSA E OFERTA DE BENESSES A ELEITORES EM TROCA DE VOTOS. DIÁLOGOS NO APLICATIVO WHATSAPP. APREENSÃO DE DINHEIRO. LISTA DE ELEITORES. MATERIAL DE PROPAGANDA. CONJUNTO PROBATÓRIO ROBUSTO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO Nº 24 DA SÚMULA DO TSE. INCIDÊNCIA. GRAVIDADE. PRESENÇA. NULIDADE DOS VOTOS. RECÁLCULO DOS QUOCIENTES ELEITORAL E PARTIDÁRIO E REALIZAÇÃO DE NOVAS ELEIÇÕES. MODALIDADE INDIRETA. PRECEDENTE. NEGATIVA DE PROVIMENTO.1. Os fundamentos do acórdão recorrido foram suficientes, à luz do art. 93, inciso IX, da CF/1988 e do entendimento assente de desnecessidade de o órgão judicante se manifestar sobre todos os argumentos apresentados pelas partes, bastando que explicite as razões que entendeu suficientes à formação de seu convencimento.2. Nos termos da jurisprudência firmada nesta Corte, aplicável às eleições de 2018 e seguintes, a viabilidade da AIJE não depende da inclusão, no polo passivo, de pessoas apontadas como responsáveis pela conduta abusiva, sem prejuízo de que figurem como litisconsortes facultativos dos candidatos beneficiários. Precedente.3. À luz da jurisprudência firmada nesta Corte, admite–se o uso de elementos probatórios produzidos em procedimento investigativo criminal, desde que resguardados os postulados do contraditório e da ampla defesa no processo em que tais provas serão aproveitadas.4. Na espécie, extrai–se do acórdão regional que a cópia integral do processo criminal, no qual expedido mandado de busca e apreensão por autoridade competente, foi juntada aos autos em atendimento ao despacho saneador prolatado logo após a apresentação das contestações – no início, portanto, da instrução processual –, "ocasião em que tiveram os recorrentes oportunidade para falar sobre cada um dos documentos colacionados, na fase instrutória e em memoriais" (ID 157595054).5. Para afastar a conclusão do Tribunal de origem de que foi assegurado aos recorrentes o exercício do contraditório e da ampla defesa, seria necessário o reexame fático–probatório dos autos, providência incabível em sede de recurso especial, nos termos do Enunciado nº 24 da Súmula do TSE.6. A Corte Regional, além de citar julgado deste Tribunal Superior em que a autorização foi dispensada em virtude de a jurisdição criminal e a cível–eleitoral serem exercidas pela mesma magistrada – situação dos autos –, considerou, ainda, para justificar a validade da prova, peculiaridades do caso concreto.7. Já decidiu esta Corte que "[a] falta de autorização do juízo criminal para o compartilhamento do resultado da interceptação telefônica não acarretou a sua nulidade, pois a jurisdição criminal e a cível–eleitoral eram exercidas pela mesma magistrada" (REspe nº 35–04/GO, rel. desig. Min. Gilmar Mendes, DJe de 2.8.2016).8. Conforme o entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), "diferente do que ocorre no compartilhamento da prova emprestada no âmbito do processo administrativo, o qual se exige autorização do Juízo responsável pela produção da prova (Súmula n. 591/STJ), no processo civil não se exige tal requisito, pois em ambos os feitos haverá um juiz responsável por averiguar a legalidade da prova e observar o contraditório, não se podendo olvidar que o art. 372 do CPC/2015 não exige autorização expressa do magistrado responsável pela produção da prova para que ela seja utilizada em outro processo" (REsp nº 1780715/SP, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 30.3.2021).9. A configuração da captação ilícita ocorre com a presença dos seguintes elementos: (a) prática de qualquer das condutas previstas no art. 41–A da Lei das Eleições; (b) dolo específico de obter o voto do eleitor; (c) ocorrência dos fatos entre a data do registro de candidatura e a eleição; (d) participação, direta ou indireta, do candidato beneficiado ou sua concordância ou conhecimento dos fatos que caracterizam o ilícito. Precedente.10. No caso, extrai–se do acórdão recorrido que as provas advindas da apreensão do celular de uma das investigadas, as quais foram devidamente submetidas ao contraditório na instrução processual, demonstram sofisticado esquema de captação ilícita de sufrágio engendrado pelos candidatos majoritários José Edézio Vaz de Souza e Érika Frota Monte Coelho Cristino e pelo candidato a vereador Francisco Antônio de Menezes Cristino, com a participação de Humberlândia Mesquita de Assis (esposa do candidato a prefeito eleito), Maria do Carvalho de Aragão (cabo eleitoral da campanha dos réus eleitos e proprietária do celular apreendido pela polícia) e Francisco Lima Ximenes Moreira (cabo eleitoral da campanha dos réus eleitos).11. A despeito do posicionamento da relatora originária pelo não reconhecimento dos ilícitos, prevaleceu, no TRE/CE, o entendimento de que a prova consistente na apreensão de valores em dinheiro, santinhos, adesivos de campanha e uma relação com os nomes de eleitores e o correspondente valor pago em troca do voto, na véspera da eleição (fato narrado nas AIJEs 0600158–36.2020.6.06.0064 e 0600164–88.2020.6.06.0064), foi corroborada com a prova apurada nas AIJEs 0600161–88.2020.6.06.0064 e 0600164–43.2020.6.06.0064, obtida a partir de busca e apreensão devidamente autorizada pela justiça.12. A Corte Regional assentou também comprovada a efetiva adesão e participação de todos os investigados no esquema de oferecimento de benesses em troca de votos.13. Rever o quadro fático e a conclusão das instâncias ordinárias, para afastar a ocorrência dos lícitos apurados, demandaria o reexame fático–probatório dos autos, providência incabível nos termos do Enunciado nº 24 da Súmula do TSE.14. A concordância ou anuência aos fatos configuradores do ilícito pode se revelar a partir de elementos que denotem estreito vínculo político ou de cunho afetivo entre o candidato beneficiário e aquele que oferece diretamente a benesse em troca de votos. Precedentes.15. A identificação dos eleitores aos quais a vantagem foi ofertada não é necessária para a configuração da captação ilícita de sufrágio. Precedentes.16. A gravidade apta a violar o equilíbrio do pleito naquela municipalidade se revelou diante da elevada reprovabilidade do constatado esquema de obtenção de votos em troca da distribuição massiva de benesses, com significativo número de eleitores atingidos.17. Diante das peculiaridades do caso, notadamente a proximidade das eleições municipais, mostra–se razoável a realização de eleição indireta, evitando a movimentação da máquina pública e do eleitorado para a eleição de titular do executivo cujo mandato findará em poucos meses. Precedentes.18. Agravos em recursos especiais desprovidos.