Jurisprudência TSE 060008246 de 12 de dezembro de 2024
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Antonio Carlos Ferreira
Data de Julgamento
12/12/2024
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator os Ministros Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, André Mendonça, Dias Toffoli (substituto) e as Ministras Isabel Gallotti e Cármen Lúcia (Presidente). Falaram: a) o Dr. Leandro Petrin pela recorrente Coligação Ribeirão Pires Para Todos; e b) o Dr. Gabriel Gomes Ferreira de Oliveira Lima pelo recorrido Luiz Gustavo Pinheiro Volpi. Ausente, justificadamente, o Ministro Nunes Marques. Acórdão publicado em sessão. Composição: Ministros (as) Cármen Lúcia (Presidente), André Mendonça, Dias Toffoli (substituto), Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
ELEIÇÃO 2024. REGISTRO DE CANDIDATURA. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ART. 14, §§ 5º E 7º, DA CF. GENITOR ELEITO EM 2020 COM DIPLOMA CASSADO EM 2022, EM RAZÃO DA PROCEDÊNCIA DE RECURSOS CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. ASSUNÇÃO DO FILHO EM CARÁTER INTERINO E, SUCESSIVAMENTE, DE MODO DEFINITIVO. EXERCÍCIO DA CHEFIA DO PODER EXECUTIVO POR PAI E FILHO DENTRO DO QUADRIÊNIO DA MESMA LEGISLATURA (2021–2024). MANDATO ORDINÁRIO E MANDATO–TAMPÃO. FRAÇÕES DO MESMO MANDATO. REELEIÇÃO DO FILHO PARA O QUADRIÊNIO 2025–2028. TERCEIRO MANDATO NÃO CONFIGURADO. REELEIÇÃO ADMITIDA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso especial eleitoral interposto de acórdão de Corte regional que, negando provimento a recurso, deferiu o registro de candidatura do recorrido ao cargo de prefeito nas eleições de 2024. A coligação recorrente alega que, tendo o pai exercido a titularidade do cargo de prefeito entre 1º.1.2021 e 26.9.2022, quando foi cassado, a posterior eleição do filho em pleito suplementar configura segundo mandato do mesmo grupo familiar, tornando inviável a sua reeleição em 2024. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (a) definir se, para fins do art. 14, §§ 5º e 7º, da CF, caracteriza dois mandatos distintos ou constitui frações de um mesmo mandato o exercício seguido do cargo de prefeito pelo pai, eleito em 2020 (posteriormente retirado do cargo em razão de inelegibilidade superveniente reconhecida em RCED, e pelo filho, em caráter interino (por ser o presidente da Câmara Municipal) e, sucessivamente, de forma definitiva (em virtude de êxito no pleito suplementar); (b) determinar se o mandato corresponde ao período quadrienal estabelecido pela eleição ordinária ou se cada pleito eleitoral realizado, seja ordinário ou suplementar, constitui um mandato autônomo. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O mandato do prefeito compreende o período de 4 anos entre eleições ordinárias, de modo que o pleito suplementar ocorrido nesse interstício constitui mera complementação desse quadriênio e, portanto, não configura novo mandato (arts. 29, I, e 81, § 2º, da CF). Precedente. 4. O exercício interino da chefia do Poder Executivo municipal seguido da titularização do cargo por meio de eleição suplementar constitui frações de um mesmo mandato, sendo admitida a reeleição para a próxima legislatura, cujo quadriênio se inicia no ano seguinte à eleição ordinária. Precedentes. 5. A inelegibilidade reflexa prevista no art. 14, § 7º, da CF visa a obstar o monopólio do poder político por grupo familiar, circunstância que se evidencia com a pretensão de exercício pelos integrantes do clã familiar de mais de 2 mandatos consecutivos na chefia do Poder Executivo da mesma circunscrição eleitoral. Precedentes. 6. No caso: (a) o genitor do candidato foi eleito prefeito do Município de Ribeirão Pires/SP no pleito ordinário de 2020 e teve o seu diploma cassado em 13.9.2022, no julgamento do REspEl nº 0600940–19/SP (rel. Min. Sérgio Banhos), cujo acórdão manteve a procedência de recursos contra a expedição de diploma fundamentados na superveniente incidência da causa de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, g, da LC nº 64/1990; (b) à época da cassação do diploma do seu pai, o candidato exercia o cargo de presidente da Câmara Municipal de Ribeirão Pires/SP, razão pela qual veio a ocupar, de forma interina, a chefia do Executivo local até a realização das eleições suplementares, que ocorreram em 11.12.2022, quando logrou ser eleito prefeito de Ribeirão Pires/SP, cumprindo o mandato–tampão em sua inteireza (até 31.12.2024); (c) o recorrido foi eleito prefeito do Município de Ribeirão Pires/SP nas eleições ordinárias de 2024. 7. Sendo a elegibilidade um direito fundamental, o juízo eleitoral deve lhe conferir a máxima eficácia, o que impõe prudência no enquadramento literal dos elementos incontroversos dos autos às normas que, direta ou indiretamente, restrinjam o exercício da capacidade eleitoral passiva, em deferência à imperiosa interpretação restritiva. 8. No julgamento do REspEl nº 0600081–32/SP (rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, DJe de 12.12.2023) – no qual mantido o deferimento do pedido de registro de candidatura do ora recorrido nas eleições suplementares de 2022 de Ribeirão Pires/SP –, o Plenário do TSE, ao ratificar a ausência de violação ao art. 14, § 7º, da CF, expressamente assentou: "[...] não obstante tenha dado causa à anulação da eleição ordinária, o pai do recorrido poderia pleitear a reeleição no quadriênio 2024–2028, tendo em vista que estava no exercício do seu primeiro mandato. [...] o deferimento do registro de candidatura do recorrido não importou a extensão indevida da permanência do grupo familiar no poder. Afinal, o mandato que em tese poderia ser disputado pelo pai acabou circunstancialmente sendo disputado pelo filho. [...] o pai do recorrido foi afastado [...] por expressa disposição legal ex vi do art. 216 do Código Eleitoral. De modo similar, a designação das novas Eleições [...] não decorreu de ação do grupo familiar, mas de decisão unilateral da Justiça Eleitoral. [...] [o filho do prefeito afastado, ora recorrido] [...] assumiu a interinidade por expressa disposição legal, em razão do cargo exercido. Não se tratou de conduta premeditada, submetida ao talante do grupo familiar. [...] [...] não se cogita a incidência da norma geral e proibitiva contida no art. 14, § 7º, da Constituição Federal, [...] não havendo falar na utilização da máquina pública em favor do parente, tampouco na perpetuidade no poder de um mesmo grupo familiar na chefia do Poder Executivo." 9. Conquanto compreenda que a qualidade de imutabilidade e indiscutibilidade própria das decisões transitadas em julgado somente se agrega à parte dispositiva dessas e, portanto, não fazem coisa julgada os motivos e os fundamentos da decisão judicial, da mesma forma que "[...] as causas de inelegibilidade e as condições de elegibilidade devem ser aferidas a cada eleição, sem que se possa falar em coisa julgada ou direito adquirido" (AgR–RO nº 0600457–25/ES, rel. Min. Luís Roberto Barroso, PSESS de 23.10.2018), não se pode desconsiderar que incumbe a esta Corte Superior uniformizar a jurisprudência eleitoral, mantendo–a estável, íntegra e coerente (art. 926 do CPC). 9.1. Já decidiu o TSE que, "nesses casos, em que a parte se vê protegida pelos fundamentos determinantes de uma decisão proferida por magistrado eleitoral [...] e que tem por objeto condição de elegibilidade (direito político fundamental), devem ser aplicados os princípios da segurança jurídica e da proteção à confiança legítima, de tal sorte a resguardar a perspectiva do cidadão em participar no prélio eleitoral" (REspEl nº 0600213–59/MG, rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, julgado em 17.8.2023, DJe de 14.11.2023). 10. Aplicadas as premissas interpretativas e jurisprudenciais adotadas pelo TSE aos elementos fáticos incontroversos registrados no acórdão regional, conclui–se que constituem frações do mandato referente ao quadriênio ordinário 2021–2024 os períodos relativos ao exercício pelo genitor do recorrido, entre 1º.1.2021 e 13.9.2022 (decorrente da vitória no pleito ordinário de 2020), e pelo próprio recorrido, em caráter interino, entre o afastamento do pai e 8.1.2023 (em cumprimento ao dever funcional decorrente do exercício da Presidência da Câmara Municipal de Ribeirão Pires/SP) e, sucessivamente, de forma definitiva, entre 9.1.2023 e 31.12.2024 (ante o êxito nas eleições suplementares, que ocorreram em 11.12.2022). 11. Considerando que o mandato referente ao quadriênio 2021–2024 foi o primeiro do núcleo familiar do recorrido no exercício da chefia do Poder Executivo local, faculta–se a quaisquer integrantes do aludido clã a reeleição para o mandato subsequente, qual seja, o quadriênio ordinário 2025–2028, consoante intepretação conjugada dos §§ 5º e 7º do art. 14 da CF. IV. DISPOSITIVO E TESES 12. Recurso desprovido. Teses de julgamento: 1. O mandato da chefia do Poder Executivo corresponde ao quadriênio que se inicia no ano seguinte à eleição ordinária. Havendo, no interstício do mandato, a realização de eleição suplementar, o respectivo período constitui mera complementação do mandato quadrienal ordinário, de modo que não configura novo mandato (arts. 29, I, e 81, § 2º, da CF). 2. Para fins do art. 14, §§ 5º e 7º, da CF: (a) o exercício da chefia do Poder Executivo por integrante de grupo familiar caracteriza um só mandato quando a assunção do cargo – em caráter interino e/ou definitivo – ocorre dentro do quadriênio da respectiva eleição ordinária; (b) sendo o titular do Poder Executivo reelegível, poderão concorrer à sucessão os integrantes do seu clã familiar, sendo admitida uma reeleição – por quaisquer de seus integrantes – para a legislatura subsequente.