Jurisprudência TSE 060008095 de 14 de maio de 2025
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. André Ramos Tavares
Data de Julgamento
05/05/2025
Decisão
O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao agravo e ao recurso especial, a fim de condenar o recorrido ao pagamento de multa no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), e de determinar o encaminhamento de cópia deste acórdão à Procuradoria-Geral Eleitoral, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator os Ministros Nunes Marques, André Mendonça, Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Floriano de Azevedo Marques e Cármen Lúcia (Presidente). Composição: Ministros (as) Cármen Lúcia (Presidente), Nunes Marques, André Mendonça, Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.
Ementa
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2024. PREFEITO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. REDES SOCIAIS. VEICULAÇÃO DE GESTO ASSOCIADO À SUPREMACIA BRANCA. COMPORTAMENTO REPROVÁVEL NO CONTEXTO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO. VEDAÇÃO À DISCRIMINAÇÃO. COMBATE AO RACISMO. LIMITES À LIBERDADE DE EXPRESSÃO. ART. 57–D, § 2º, DA LEI Nº 9.504/97. MULTA. PROVIMENTO. 1. Trata–se de agravo interposto contra a inadmissão de recurso especial manejado em face de acórdão pelo qual o Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (TRE/PB) manteve a improcedência de representação na qual se aponta a irregularidade de propaganda eleitoral veiculada em rede social tendo em vista o uso de símbolo de ódio associado a grupos de supremacia branca. 2. O agravante afirma, em síntese, que a utilização na propaganda de símbolos de ódio, ainda que de maneira velada ou dissimulada, produz efeitos nocivos e fomenta atitudes preconceituosas e discriminatórias, em afronta à Constituição do Brasil e contrariedade à jurisprudência deste Tribunal Superior acerca dos limites à liberdade de expressão. 3. Infirmados os fundamentos da decisão de inadmissão, dá–se provimento ao agravo e passa–se à análise do recurso especial, nos termos do art. 36, § 4º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral. 4. A Ordem Constitucional vigente atribui ampla centralidade ao combate à discriminação e ao racismo. No âmbito internacional, o Brasil é signatário das principais normas voltadas à antidiscriminação e recebeu recomendações do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, que reconheceu a necessidade de maior ação estatal contra a discriminação racial no país. 5. A aplicação desse robusto arcabouço normativo pressupõe a compreensão de que, na atualidade, o racismo também se manifesta em comportamentos sutis e, à primeira vista, inofensivos. Dessa forma, o Poder Judiciário deve reconhecer a ilicitude de manifestações, contra uma leitura excessivamente permissiva supostamente lastreada na "dubiedade", bem como contra leituras que possam ser sugeridas como "singelas", mas que contêm o preconceito e a discriminação em seu cerne. 6. O gesto veiculado pelo candidato, cuja análise é objeto destes autos, está fortemente relacionado à supremacia branca e consta da lista de símbolos de ódio de renomada organização não governamental internacional. 7. O argumento de que o símbolo seria mera representação do número de urna do recorrido (30) não é minimamente verossímil, uma vez que tal gesto não é utilizado socialmente para representar esse numeral. Em outras palavras, a estratégia de comunicação do recorrido não seria essa se seu objetivo realmente fosse a divulgação de sua candidatura de forma eficaz e indene de dúvidas. De fato, é justamente o caráter impreciso e ambíguo do gesto que denuncia a mensagem inaceitável que o candidato busca passar. 8. A liberdade constitucional de expressão e a manifestação de pensamento pela internet não tutelam qualquer ato de comunicação, independentemente de conteúdo e contextos. Nesse sentido, como já afirmei: "Essa liberdade de difundir e propagar de maneira exponencial e instantânea encontra as limitações tradicionais e, certamente, novas limitações, que se fazem presentes em virtude do potencial lesivo que o instrumental tecnológico representa para a sociedade como um todo" (TAVARES, André Ramos. A Nova Matrix: Direito (re)programado na civilização plataformizada. São Paulo: Etheria, 2024, p. 271). 9. Ademais, o TSE consolidou o entendimento de que a multa prevista no art. 57–D, caput, § 2º, da Lei nº 9.504/97 é aplicável "nos casos de discurso de ódio, de ideias contrárias à ordem constitucional e ao Estado Democrático e de mensagens injuriosas, difamantes ou mentirosas" (Rp 0601562–20/DF, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe de 26.6.2023). 10. A partir de todos esses fundamentos, conclui–se que o recorrido veiculou propaganda eleitoral irregular em suas redes sociais, haja vista a exibição de símbolo de ódio associado a grupos de supremacia branca. Em vista da gravidade e da reprovabilidade da infração, considera–se que a multa deve ser aplicada em patamar máximo, no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) (art. 57–D, § 2º, da Lei nº 9.504/97). 11. Além disso, nos termos do art. 40 do Código de Processo Penal (CPP) e conforme pedido constante do recurso, deve–se encaminhar cópia deste acórdão à Procuradoria–Geral Eleitoral, a fim de que avalie a potencial repercussão criminal dos atos do recorrido. 12. Agravo e recurso especial providos.