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Jurisprudência TSE 060003669 de 12 de junho de 2024

Publicado por Tribunal Superior Eleitoral


Relator(a)

Min. Floriano De Azevedo Marques

Data de Julgamento

31/05/2024

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Relator. Acompanharam o Relator, os Ministros André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti e Alexandre de Moraes (Presidente).Composição: Ministros Alexandre de Moraes (Presidente), Cármen Lúcia, Nunes Marques, Raul Araújo, Isabel Gallotti, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares.

Ementa

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PREFEITO. VICE–PREFEITO. GASTOS ILÍCITOS DE CAMPANHA. OMISSÃO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. MANUTENÇÃO. VERBETES SUMULARES 24, 28 E 30 DO TSE. INCIDÊNCIA. DESPROVIMENTO.SÍNTESE DO CASO1. Trata–se de representação, fundada no art. 30–A da Lei 9.504/97, ajuizada em face dos candidatos eleitos aos cargos de prefeito e vice–prefeito do Município de Araguatins/TO, com base em captação e gastos ilícitos de recursos na campanha eleitoral de 2020.2. O Tribunal Regional Eleitoral do Tocantins deu provimento a recurso manejado por Aquiles Pereira de Sousa e Elizabete Rocha, para reformar a sentença que julgou procedente a representação e cassou os diplomas de prefeito e de vice–prefeito do Município de Araguatins/TO, eleitos no pleito de 2020.3. Na origem, foram propostas duas representações eleitorais, autuadas sob os números 0600035–84.2021.6.27.0010 e 0600036–69.2021.6.27.0010, e, ante a possibilidade decisões conflitantes ou contraditórias (art. 55, § 3º, CPC), o Juízo da 10ª Zona Eleitoral do Estado do Tocantins concluiu pela necessidade de apreciação conjunta das duas ações.4. Durante o trâmite dos recursos eleitorais interpostos pelos representados, a relatora considerou necessária também a reunião da AIME 0600001–12.2021.6.27.0010 para julgamento conjunto, seguindo o rito da AIME, por ser mais benéfico à ampla defesa.ANÁLISE DO RECURSO ESPECIALDos fundamentos do aresto recorrido5. Com base em provas documentais juntadas aos autos – as quais não podem ser examinadas por este Tribunal Superior, nos termos do verbete sumular 24 do TSE –, provenientes das informações prestadas pela Receita Estadual, a Corte de origem assentou o seguinte:i) o fato de a prestação de contas dos candidatos eleitos ter sido desaprovada, não implica automática afronta ao art. 30–A da Lei 9.504/97;ii) a emissão de nota fiscal na modalidade eletrônica em determinado CPF ou CNPJ é de livre preenchimento pelo prestador de serviços, independente de qualquer anuência de seu titular, o que impossibilita a presunção, apenas com esses elementos, sobre a existência de arrecadação e gastos não declarados;iii) a extrapolação do limite de gastos previsto em lei, por si só, não evidencia a caracterização do abuso de poder econômico, porquanto essa irregularidade tem natureza contábil, só atingindo dimensão abusiva se ficar demonstrado que as despesas em excesso repercutiram de forma significativa no desequilíbrio do pleito eleitoral;iv) a mera juntada de nota fiscal emitida unilateralmente não constitui elemento apto a demonstrar a omissão de gastos a ensejar a cassação do diploma sem pelo menos indícios de que a mercadoria foi entregue;v) não aceitar a nota fiscal de estorno do produto – tendo em vista que o candidato não tem ingerência sobre esse tipo de procedimento –, quando desacompanhada de quaisquer provas aptas a comprovar de forma cabal a apontada omissão de gastos na campanha eleitoral, contraria a jurisprudência que exige prova robusta para a cassação de mandato;vi) devem prevalecer as afirmações do próprio fornecedor e das demais testemunhas ouvidas em juízo, que confirmaram que o produto não foi entregue em razão do falecimento de um correligionário dos representados e que o cancelamento da nota fiscal não teria sido solicitado por ser um expediente muito dispendioso para o emitente e o tributo já teria sido pago na ocasião da compra na refinaria;vii) não houve a identificação dos eleitores beneficiados com a distribuição de combustíveis em troca de voto, não tendo ficado demonstrado o liame entre os abastecimentos e a alegada distribuição indiscriminada de combustível pelo representado;viii) quanto aos gastos com impulsionamento no Facebook (R$ 35,00), ficou caracterizada arrecadação e gastos eleitorais ilícitos, ainda que estimáveis, porém sem relevância jurídica apta a ensejar a cassação de mandato eletivo, em razão do seu diminuto valor;ix) não é possível se presumir a existência de "caixa dois" e de doação vedada, porquanto a pesquisa registrada no TSE, em nome do Instituto Skala, e a existência de um depósito bancário realizado pela empresa I Monteiro da Silva, pertencente à esposa do representado Aquiles Pereira de Sousa, não é prova robusta suficiente para embasar a cassação dos diplomas dos representados, tendo em vista que não ficou comprovada, de forma cabal, combinação, conluio ou elo entre as empresas envolvidas e a campanha dos candidatos.6. O principal fundamento do decisum regional foi a não comprovação da existência do ato supostamente abusivo, pois "no cenário dos autos, as provas não são convergentes, tampouco incontestes e o contido nos documentos fiscais produzidos unilateralmente não foi corroborado pela testemunha compromissada, por isso não aptas a ensejar a cassação dos diplomas dos candidatos e a realização de novas eleições".Da unilateralidade dos documentos fiscais7. Em consonância com o afirmado pelo Tribunal a quo, a emissão de nota fiscal eletrônica é de livre registro pelo prestador dos serviços, tanto assim o é que estão sujeitas a confirmação ou cancelamento pelo destinatário.8. Segundo consta no acórdão recorrido, em que pese o volume de notas fiscais emitidas, elas não foram detectadas pelo batimento eletrônico realizado pela Justiça Eleitoral e não foi encontrado nenhum possível beneficiário dos combustíveis, o que leva a crer que os próprios candidatos também não tinham conhecimento de sua emissão.Dos gastos com combustíveis9. Durante a instrução processual, a Secretaria da Fazenda de Tocantins informou que o estabelecimento WF Combustíveis Ltda. emitiu 684 documentos auxiliares de nota fiscal eletrônica no CNPJ dos representados, no período de 4 a 21.11.2020, no total de R$ 160.589,15.10. O Tribunal a quo assentou que, pela expressiva quantidade de notas de consumidor que foram emitidas, haveria indícios da existência de eleitores beneficiados. Entretanto, ressaltou que não houve uma única testemunha que sustentasse essa versão.11. Para caracterizar o abuso não é suficiente a existência de desconformidade contábil no fornecimento do bem, mas há que se provar a participação do investigado e, minimamente, a destinação irregular dos bens ou valores a eleitores.12. Nas audiências de instrução, o proprietário do estabelecimento WF Combustíveis Ltda. afirmou que emitiu as notas do consumidor para dar baixa no seu estoque de combustíveis.13. Para afastar a conclusão da Corte Regional, no que concerne à veracidade do descrito nos documentos fiscais ou à eventual distribuição de combustível, seria necessário nova incursão no acervo probatório, providência vedada no recurso especial, a teor do disposto no verbete sumular 24 do TSE.Da despesa com impulsionamento no Facebook14. Mesmo que se considere que houve omissão da despesa e, portanto, ocultação do gasto na prestação de contas, tal ocorrência não teria como influenciar na lisura do pleito, ante o seu montante insignificante (R$ 35,00).Das doações estimáveis em dinheiro recebidas de pessoa jurídica15. O voto condutor do acórdão recorrido entendeu que não é possível se considerar "caixa dois" ou doações vedadas, isto porque a pesquisa registrada no TSE em nome do aludido instituto e a constatação de apenas um depósito bancário realizado pela empresa I Monteiro da Silva, sem o atesto da ilicitude da operação por sequer uma única testemunha, não tem a robustez necessária para ensejar a cassação dos diplomas dos representados.16. Das premissas do aresto regional, é possível se verificar que o montante recebido de pessoa jurídica (R$ 4.000,00) perfaz apenas 1% do limite de campanha (R$ 406.706,57).17. Ainda que se considerem reprováveis e mesmo ilícitas as doações recebidas, não merece reparos a decisão regional, porquanto, no contexto da campanha eleitoral em exame, não ostentam relevância jurídica essencial para comprometer a normalidade e legitimidade das eleições. Na espécie, a decretação da cassação dos mandatos eletivos com base exclusivamente nessa ilicitude contrariaria os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, dada a ausência de gravidade da conduta.18. Este Tribunal já firmou entendimento de que "a imposição da cassação do mandato pela prática de ilícito prevista no art. 30–A da Lei nº 9.504/1997 depende de aferição, em concreto, da relevância jurídica da conduta, do comprometimento da lisura do pleito e da proporcionalidade da medida. Precedentes" (AgR–REspe 724–88, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 13.5.2019). Na mesma linha: AgR–AI 2–52, rel. Min. Tarcisio Vieira De Carvalho Neto, DJE de 8.11.2018; AgR–AI 541–21, rel. Min. Og Fernandes, DJE de 21.8.2019.Da incidência do verbete sumular 24 do TSE19. Não há como concluir de forma diversa da Corte Regional a respeito da ausência de prova robusta a embasar a aplicação do severo sancionamento previsto no art. 30–A, § 2º, da Lei das Eleições, sem a realização do revolvimento de matéria fático–probatória, providência vedada em sede de recurso especial, conforme se tem reiteradamente decidido com apoio no verbete da Súmula 24 do TSE.Da incidência do verbete da Súmula 30 do TSE20. O acórdão regional está alinhado à jurisprudência desta Corte, segundo a qual eventual desaprovação das contas de campanha não induz, por si só, à existência de abuso punível, tendo em consideração que as decisões condenatórias em sede de AIJE exigem, nos termos do art. 22, caput, da LC 64/90, a presença de circunstâncias extraordinariamente graves à luz dos bens jurídicos tutelados (AgR–AgR–RO 5376–10, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 13.3.2020).CONCLUSÃORecurso especial a que se nega provimento.


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