Jurisprudência TSE 060002737 de 26 de setembro de 2022
Publicado por Tribunal Superior Eleitoral
Relator(a)
Min. Sergio Silveira Banhos
Data de Julgamento
24/02/2022
Decisão
O Tribunal, por maioria, deu parcial provimento ao agravo interno para determinar o retorno dos autos para análise das inelegibilidades, nos termos do voto divergente do Ministro Mauro Campbell Marques, vencidos os Ministros Sérgio Banhos (Relator), Carlos Horbach e Edson Fachin (Presidente). Votaram com o Relator os Ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Benedito Gonçalves. Redigirá o acórdão o Ministro Mauro Campbell Marques.Composição: Ministros Edson Fachin (Presidente), Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.
Ementa
ELEIÇÕES 2020. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AIRC. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. CANDIDATO A PREFEITO. REGISTRO DEFERIDO. REJEIÇÃO DE CONTAS. INELEGIBILIDADE DO ART. 1º, I, ALÍNEA G, DA LC nº 64/1990. SUSPENSÃO DOS EFEITOS DOS ACÓRDÃOS CONDENATÓRIOS POR LIMINAR DA CORTE DE CONTAS. SUCESSIVAS DECISÕES LIMINARES, ADMINISTRATIVAS E JUDICIAIS, SUPERVENIENTES AO REGISTRO DE CANDIDATURA. DATA DA DIPLOMAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE. VALIDADE DOS EFEITOS DO JULGAMENTO DAS CONTAS. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA NOVA ANÁLISE DA CAUSA DE INELEGIBILIDADE. PARCIAL PROVIMENTO.1. O TRE/MA, por unanimidade, negou provimento aos recursos eleitorais e manteve a sentença que julgou improcedentes os pedidos contidos nas AIRCs apresentadas pela Coligação Juntos Somos Mais Fortes e pelo MPE e deferiu o pedido de registro de candidatura de Raimundo Silva Rodrigues da Silveira para concorrer ao cargo de prefeito do Município de Parnarama/MA, nas eleições de 2020.2. Pedido de registro de candidatura do candidato impugnado ao fundamento de que pendiam em seu desfavor inúmeras decisões da Corte de Contas do estado transitadas em julgado, as quais, em tese, atraíam a causa de inelegibilidade prevista na alínea g do inciso I do art. 1º da LC nº 64/1990.2.1. O TRE/MA, ao verificar que, em 17.12.2020 – um dia antes da data limite fixada para a diplomação –, o candidato obteve decisão do Tribunal de Contas do Estado que teria o condão de afastar os efeitos das decisões do TCE mencionadas na impugnação.2.2. Ficou consignado no acórdão regional que a decisão exarada no processo nº 6.932/2020 do TCE/MA suspendeu os efeitos dos dez acórdãos de desaprovação de contas e, por conseguinte, a inserção do nome do recorrido da lista de gestores com contas julgadas irregulares.3. Conquanto não se desconheça o entendimento do TSE acerca da data da diplomação como marco final para a consideração de fatos supervenientes ao registro de candidatura que repercutam na elegibilidade de candidato, existem julgados desta Corte Superior – inclusive relativos ao presente pleito de 2020 –, nos quais, diante das peculiaridades de cada caso concreto, se adotou compreensão diversa quanto à consideração de fatos ocorridos tanto após o pleito quanto depois da diplomação.4. O calendário eleitoral do pleito de 2020 estabeleceu o período de 31.8.2020 a 26.9.2020 para a apresentação dos pedidos de registro de candidatura.4.1. O trânsito em julgado dos dez acórdãos do TCE/MA objeto da presente controvérsia ocorreu nas seguintes datas: 30.4.2014, 24.10.2014, 29.4.2015, 28.5.2015, 5.2.2020 e 17.6.2020.4.2. A ação anulatória apresentada pelo ora candidato durante o plantão do Juízo da Comarca de São Luís – que desencadeou a guerra de liminares observada neste feito – somente foi ajuizada no prazo final para a apresentação do presente pedido de registro de candidatura, visto que a decisão liminar do juiz plantonista foi prolatada em 26.9.2020.5. Este Tribunal Superior, ao analisar o AgR–REspe nº 29.201/RS, redator para o acórdão o Ministro Fernando Gonçalves (julgado e publicado na sessão de 2.10.2008), desconsiderou decisão liminar que afastava os efeitos da rejeição de contas que pendia em desfavor do candidato, tendo em vista a constatação de que a "[...] ação declaratória de nulidade do ato administrativo com pedido de antecipação de tutela contra a decisão do Tribunal de Contas [...] foi proposta somente três anos depois da rejeição de suas contas e após o pedido de registro do recorrente [...]". Entendeu–se que deveria ser "[...] aplicado o [...] raciocínio [...] referendado por este Tribunal no julgamento do RO nº 963/SP, rel.. Min. Carlos Ayres Britto, DJ de 13.9.2006, de que '[...] O dilatado tempo entre as decisões que rejeitaram as contas e a propositura das ações anulatórias evidencia o menosprezo da autoridade julgada para com os seus julgadores'". Assim, se, no momento do pedido de registro de candidatura, "[...] o pré–candidato [...] já tinha conhecimento de que era necessário o provimento liminar para afastar a sua inelegibilidade [...]" e que "[...] se não obteve a suspensão da decisão antes de formular o pedido, não há que se afastar os efeitos da decisão do TCE".5.1. Na hipótese, tendo em vista que os registros do trânsito em julgado das decisões do TCE/MA datam de 2014, 2015 e 2020, bem como que a concessão da primeira liminar que beneficiou o candidato ocorreu em 26.9.2020 – cerca de 5 e 6 anos após o surgimento da coisa julgada –, é inegável o alargado lapso temporal entre a ocorrência da coisa julgada administrativa e o ajuizamento da demanda judicial anulatória pelo candidato.5.2. É indene de dúvida que o candidato já tinha pleno conhecimento de que sua candidatura apenas seria viabilizada mediante a obtenção de medida liminar capaz de sustar os efeitos das decisões do TCE/MA que rejeitaram suas contas. Do contrário, o agravado não teria pleiteado a medida urgente – como o fez – no plantão do Juízo da Comarca de São Luís apenas na data final para a apresentação do registro de candidatura, mormente por se tratar de decisões respaldadas pela coisa julgada.6. Os efeitos da liminar concedida em 26.9.2020 foram cassados por decisão do TJAM exarada em 22.10.2020, em recurso de agravo manejado pelo candidato contra a decisão que determinou a emenda da inicial da ação anulatória em que obtida a sobredita liminar. Após, o candidato apresentou pedido de desistência, o qual foi homologado em 22.10.2020, tendo sido consignada a insubsistência dos efeitos da decisão que havia cassado os efeitos da liminar primeva.6.1. Em 23.10.2020 o Juízo da 36ª Zona Eleitoral de Parnarama/MA julgou improcedentes as impugnações e deferiu o RRC de Raimundo do candidato, tendo TRE/MA confirmado a sentença em acórdão exarado em 25.10.2020, no qual foi ressaltado que "[...] houve a concessão de decisão judicial acerca da rejeição das contas do recorrido, circunstância que tem o condão de afastar o caráter irrecorrível do julgado e, via de consequência, a incidência da causa de inelegibilidade prevista na alínea 'g' do inciso I do art. 1º da LC nº 64/90, por força da norma inserta no art. 11, § 10, da Lei nº 9.504/97" (ID 142863388).6.2. Em 14.12.2020, foi concedida tutela de urgência pelo desembargador Marcelo Carvalho Silva, do TJMA, para anular a decisão liminar que sustentou a conclusão do aresto regional.6.3. Em 17.12.2020 o presidente do TCE/MA, ao analisar "petição avulsa" apresentada por Raimundo Silva Rodrigues da Silveira, proferiu decisão, ad referendum do Plenário, na qual determinou, "[...] exclusivamente, a suspensão dos efeitos de 10 (dez) acórdãos daquele Tribunal, com a retirada do nome [...] da lista de gestores com contas julgadas irregulares e a abstenção de cobranças referentes aos respectivos acórdãos" (ID 142864788).6.4. Em 25.12.2020, o presidente do TJMA cassou os efeitos da decisão liminar do presidente do TCE/MA de 17.12.2020.6.5. Em 27.1.2021, o próprio presidente do TCE/MA revogou a liminar por ele concedida em 17.12.2020.7. O cenário fático–jurídico exposto revela, nas palavras do eminente Ministro Alexandre de Moraes proferidas no julgamento do AgR–REspEl nº 0600261–70/SP (acórdão de 16.9.2021, DJe de 20.10.2021), a "[...] flagrante a batalha judicial que os candidatos sabidamente inelegíveis travam na Justiça Comum, às vésperas do pleito ou no curso do período eleitoral, para alcançar decisão liminar que ampare o deferimento do seu registro", sendo certo que "[...] essa incessante judicialização dos decretos condenatórios que amparam a restrição à capacidade eleitoral dos candidatos deve ser examinada pelos tribunais eleitorais, especialmente diante da finalidade clara de não só alcançar a liminar pretendida, mas de ultrapassar os marcos impostos pela legislação eleitoral. Trata–se de evidente hipótese de abuso de direito, na qual admitir o registro do candidato nesta condição apenas incentiva atitudes do mesmo jaez por parte de outros concorrentes".7.1. No caso, o candidato – após a superveniência de decisão judicial, que anulou por completo, em 14.12.2021, os efeitos da liminar de 26.9.2020 que lhe beneficiava – logrou obter na seara administrativa, em 17.12.2020, decisão da lavra do presidente da Corte de Contas na qual foram suspensos os efeitos de dez acórdãos daquele TCE transitados em julgado.7.2. Além da liminar administrativa do presidente do TCE/AM não ter sido proferido no meio impugnativo próprio para desconstituir julgados no âmbito do órgão de contas – já que exarada em mera petição avulsa –, seu conteúdo é diametralmente contrário à liminar concedida pelo TJMA em 14.12.2020, que restabeleceu os efeitos de dez acórdãos do TCE/MA aqui debatidos.8. Na hipótese de inelegibilidade preexistente, a sustação dos efeitos da liminar que amparou o deferimento de RRC tem o condão de restaurar a causa de inelegibilidade que incidia sobre o candidato, não cabendo sequer cogitar de surpresa do eleitorado, mormente quando a liminar cassada perdura por exíguo tempo e é revogada antes da data final para a diplomação. Precedentes.9. Agravo interno parcialmente provido para determinar o retorno dos autos ao TRE/MA a fim de que este proceda a novo julgamento do recurso eleitoral, devendo ser considerado que, na data da diplomação, vigoravam todos os efeitos dos acórdãos do TCE/MA.