Informativo do STJ 660 de 06 de Dezembro de 2019
Publicado por Superior Tribunal de Justiça
SÚMULAS
SÚMULA N. 638 É abusiva a cláusula contratual que restringe a responsabilidade de instituição financeira pelos danos decorrentes de roubo, furto ou extravio de bem entregue em garantia no âmbito de contrato de penhor civil. Segunda Seção, julgado em 27/11/2018, DJe 5/12/2018.
SÚMULAS
SÚMULA N. 639 Não fere o contraditório e o devido processo decisão que, sem ouvida prévia da defesa, determine transferência ou permanência de custodiado em estabelecimento penitenciário federal. Terceira Seção, julgado em 27/11/2018, DJe 5/12/2018.
CORTE ESPECIAL
REsp 1.813.684-SP , Rel. Min. Raul Araújo, Rel. Acd. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 02/10/2019, DJe 18/11/2019
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Recurso. Tempestividade. Feriado local. Comprovação no ato de interposição do recurso. Modulação dos efeitos. Necessidade. Aplicação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança.
É necessária a comprovação de feriado local no ato de interposição do recurso, sendo aplicável os efeitos desta decisão tão somente aos recursos interpostos após a publicação do REsp 1.813.684/SP.
Discute-se a possibilidade de comprovação posterior de causa suspensiva ou interruptiva do prazo recursal. O novo Código de Processo Civil, como cediço, criou regra específica para a solução da controvérsia, por meio do § 6º do art. 1.003. Trata-se de norma jurídica expressa, tollitur quaestio. Reafirma-se, portanto, a interpretação contida no AgInt no AREsp 957.821/MS, Rel. p/ Acórdão Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 20/11/2017, DJe 19/12/2017, no sentido da impossibilidade de comprovação posterior do feriado local. Releva notar que a interpretação sistemática do CPC/2015, especialmente do § 3º do art. 1.029 e do § 2º do art. 1.036, conduz à conclusão de que o novo diploma atribuiu à intempestividade o epíteto de vício grave, não havendo se falar, portanto, em possibilidade de saná-lo por meio da incidência do disposto no parágrafo único do art. 932 do mesmo código. Não se pode ignorar, no entanto, que, ao Superior Tribunal de Justiça, erigido pela Constituição Federal de 1988 à condição de guardião da interpretação da legislação infraconstitucional, cabe zelar pela segurança das relações jurídicas. Nesse diapasão, não se deve perder de vista o elastecido período em que vigorou, no âmbito desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal, o entendimento de que seria possível a comprovação posterior do feriado local. Não parece razoável alterar-se a jurisprudência já consolidada deste Superior Tribunal sem se atentar para a necessidade de garantir a segurança das relações jurídicas e as expectativas legítimas dos jurisdicionados. Nesse contexto, a modulação dos efeitos das decisões em casos excepcionais confere concretude ao princípio da proteção da confiança (Vertrauensschutzgrundsatz), segundo o qual, esclarece a Doutrina, "deve-se proteger a confiança que os atos ou condutas da Administração/Judiciário provocaram no espírito ou na esfera jurídica do administrado/jurisdicionado, fazendo-o acreditar que deveria agir de determinada maneira e que a Administração/Judiciário agiria conforme seus atos e condutas anteriores". Por fim, importante consignar que, malgrado o caso concreto se refira a um feriado específico (segunda-feira de carnaval), o debate travado não ficou restrito a apenas um ou outro feriado local, mas desenvolveu-se ao redor da possibilidade ou não de comprovação posterior de causa suspensiva do prazo recursal representada por todas as hipóteses de feriado local. Dessarte, sob a vigência do CPC/2015, é necessária a comprovação nos autos de feriado local por meio de documento idôneo no ato de interposição do recurso, no entanto, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança, da isonomia e da primazia da decisão de mérito, que sejam modulados os efeitos da presente decisão de modo que seja aplicada, tão somente, aos recursos interpostos após a publicação do acórdão em epígrafe, a teor do § 3º do art. 927 do CPC/2015.
PRIMEIRA TURMA
AREsp 1.280.342-RS , Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 15/10/2019, DJe 11/11/2019
DIREITO TRIBUTÁRIO
Execução fiscal. Decisão que anula ou reforma acórdão favorável a contribuinte. Trânsito em julgado. Início. Prazo prescricional.
O trânsito em julgado da anulação ou da reforma de acórdão favorável a contribuinte marca o início do prazo prescricional para o Fisco cobrar o crédito tributário.
Por falta de previsão legal, a sentença favorável ao sujeito passivo impugnada por recurso da Fazenda Pública dotado de efeito suspensivo não suspende a exigibilidade do crédito tributário. Já o acórdão da apelação que confirma essa sentença, no caso de natureza declaratória, produz efeitos desde logo, infirmando a certeza do correspondente crédito inscrito em dívida ativa e, por conseguinte, impedindo o ajuizamento da execução fiscal. Somente depois de anulado ou reformado o aludido acórdão é que, não ocorrendo nenhuma causa de suspensão de exigibilidade (art. 151 do CTN), o Fisco estará autorizado a proceder à cobrança do crédito tributário referente ao direito então controvertido, iniciando-se a contagem da prescrição para o ajuizamento da execução fiscal do trânsito em julgado desse novo provimento judicial.
SEGUNDA TURMA
REsp 1.770.001-AM , Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 07/11/2019
DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO CIVIL
Esbulho possessório praticado por particulares. Serviços de infraestrutura pelo Estado. Desapropriação indireta. Inocorrência.
Não configura desapropriação indireta quando o Estado limita-se a realizar serviços públicos de infraestrutura em gleba cuja invasão por particulares apresenta situação consolidada e irreversível.
Na desapropriação, o poder público recebe o imóvel para si, a fim de dar a respectiva destinação pública - isto é, atender ao interesse social ou à utilidade pública - e em troca dá a indenização ao seu proprietário. A diferença essencial entre a desapropriação direta e a indireta está no modus operandi, porque na primeira há todo o respeito ao devido processo legal, mas na segunda o Poder Público atua como esbulhador, praticando o ato ilícito, que eufemisticamente chama-se "apossamento administrativo", e tomando o imóvel para si sem pagar nenhuma indenização. No caso, não se imputa ao Poder Público a responsabilidade integral por alegada desapropriação indireta quando, em gleba cuja ocupação por terceiros apresenta situação consolidada e irreversível, limita-se a realizar serviços públicos de infraestrutura, sem que tenha concorrido para o esbulho ocasionado exclusivamente por particulares. Isso porque não se pode ter a consecução da atividade pública como um ato ilícito, é dizer, a oferta de saúde pública, de ensino público, constitui na verdade um mandamento constitucional, assim como a urbanização local. Assim, na medida em que o Poder Público não pratica o ato ilícito denominado "apossamento administrativo" nem, portanto, toma a propriedade do bem para si, não deve responder pela perda da propriedade em desfavor do particular, ainda que realize obras e serviços públicos essenciais para a comunidade instalada no local. O caso concreto mais parece ser aquele retratado no art. 1.228, §§ 4º e 5º, do Código Civil, que a doutrina alcunha de "desapropriação judicial", que consiste numa espécie de venda obrigatória da propriedade de bem imóvel na hipótese de este consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de um número considerável de pessoas, caracterizando-se essa "desapropriação judicial" pelo pagamento do preço pelos próprios possuidores e a sua fixação pelo juiz da causa.
REsp 1.815.762-SP , Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 07/11/2019
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Sentença exequenda proferida quando vigente o CPC/1973. Cumprimento de sentença iniciado na vigência do CPC/2015. Aplicação da legislação nova.
É aplicável o CPC/2015 ao cumprimento de sentença, iniciado sob sua vigência, ainda que a sentença exequenda tenha sido proferida sob a égide do CPC/1973.
Nos termos do art. 14 do CPC/2015, a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada. Na linha dos precedentes desta Corte, a aplicação da lei processual nova, como o CPC/2015, somente pode se dar aos atos processuais futuros e não àqueles já iniciados ou consumados, sob pena de indevida retroação da lei. Como bem observa a doutrina, é possível a aplicação da norma processual superveniente a situações pendentes, desde que respeitada a eficácia do ato processual já praticado. Esse entendimento é corroborado pelo Enunciado Administrativo n. 4/STJ, in verbis: "Nos feitos de competência civil originária e recursal do STJ, os atos processuais que vierem a ser praticados por julgadores, partes, Ministério Público, procuradores, serventuários e auxiliares da Justiça a partir de 18 de março de 2016, deverão observar os novos procedimentos trazidos pelo CPC/2015, sem prejuízo do disposto em legislação processual especial". No caso, embora a sentença exequenda tenha sido proferida na vigência do CPC/1973, o cumprimento de sentença iniciou-se na vigência do CPC/2015, razão pela qual é aplicável a nova legislação.
TERCEIRA TURMA
REsp 1.816.095-SC , Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 07/11/2019
DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Escola de Samba. Carnaval. Verba oriunda de parceria público-privada. Penhora. Possibilidade. Interpretação restritiva das impenhorabilidades.
São penhoráveis as verbas recebidas por escola de samba a título de parceria público-privada com a administração pública.
O Código de Processo Civil de 2015 estabelece que são impenhoráveis "os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução", bem como "os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social" (art. 833, I, IX). Igualmente, "não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis" (art. 832). Por se tratar de artigos referentes a impenhorabilidades sua interpretação deve ser restritiva, sempre com foco no núcleo essencial que justifica a própria instituição da regra, isto é, o almejado equilíbrio entre a satisfação do crédito para o credor e a menor onerosidade para o devedor. O art. 35, § 5º, da Lei n. 13.019/2014 dispõe que os "equipamentos e materiais permanentes" adquiridos com recursos provenientes da celebração da parceria serão gravados com cláusula de inalienabilidade. Portanto, não são os recursos o objeto da restrição legal, mas o produto do seu investimento necessário à consecução do projeto de parceria. Nesse sentido, também afasta-se a hipótese de bens não sujeitos à execução por ato voluntário, pois as verbas adquiridas pela escola de samba seguem regramento estabelecido na Lei n. 13.019/2014, sem qualquer dispositivo que faça menção de sua impenhorabilidade. Saliente-se que é inquestionável o valor social, cultural, histórico e turístico do carnaval brasileiro, uma das maiores expressões artísticas nacionais com alcance mundial. Este reconhecimento de envergadura nacional e internacional, todavia, não autoriza dizer por lei que sua promoção visa compulsoriamente à educação e à assistência social. A própria Lei n. 13.019/14 considera que a parceria entre a administração pública e as organizações da sociedade civil é feita "para a consecução de finalidades de interesse público e recíproco" (art. 2º, III) jamais restringindo seu âmbito "para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social" (art. 833, IX, do CPC).
REsp 1.510.503-ES , Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por maioria, julgado em 05/11/2019, DJe 19/11/2019
DIREITO CIVIL
Locação. Sub-rogação legal. Fiador. Comunicação diversa da prevista no art. 12, § 2º, da Lei n. 8.245/1991. Prazo para exoneração da fiança. Termo inicial. Ciência inequívoca. Princípio da instrumentalidade das formas.
O prazo para o fiador exonerar-se da fiança inicia-se do efetivo conhecimento da sub-locação, ainda que a ciência não ocorra pela comunicação do locatário sub-rogado.
O § 2º do art. 12 da Lei n. 8.245/1991 estabelece a existência de um prazo de 30 dias (contado do recebimento da comunicação da sub-rogação) para o fiador exonerar-se da garantia prestada, ficando responsável pelos efeitos da fiança durante 120 dias após a notificação do locador sobre a exoneração. A formalidade da comunicação do fiador, não obstante o art. 12, § 2º, da Lei n. 8.245/1991 disponha que o referido ato deve ser realizado pelo locatário sub-rogado, é passível de relativização por meio da aplicação do princípio da instrumentalidade das formas. Assim, é possível manter a validade do ato realizado de forma diversa do previsto na lei, quando for alcançada sua finalidade, consoante o art. 244 do CPC/1973 (art. 277 do CPC/2015).
REsp 1.660.947-TO , Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 07/11/2019
DIREITO CIVIL
Separação de fato. Período razoável. Equiparação dos efeitos da separação judicial. Fluência do prazo prescricional. Art. 197, I, do Código Civil de 2002.
A separação de fato por tempo razoável mitiga a regra do art. 197, I, do Código Civil de 2002.
Inicialmente cumpre salientar que a interpretação literal dos artigos 197 e 1.571, ambos do Código Civil, de fato, conduz ao entendimento de que a prescrição entre os cônjuges somente flui pela morte de um deles, pela nulidade ou anulação do casamento, pela separação judicial e pelo divórcio, ou seja, diante de uma das causas do término da sociedade conjugal, não abarcando a legislação em comento, a hipótese da separação de fato. Ocorre que tanto a separação judicial (negócio jurídico), como a separação de fato (fato jurídico), comprovadas por prazo razoável, produzem o efeito de pôr termo aos deveres de coabitação, de fidelidade recíproca e ao regime matrimonial de bens (elementos objetivos), e revelam a vontade de dar por encerrada a sociedade conjugal (elemento subjetivo). Apesar do art. 1.571 do CC/2002 não incluir nos seus incisos a separação de fato no rol das causas da dissolução da sociedade conjugal, dele consta a separação judicial, cujas consequências jurídicas são semelhantes. Assim, não subsistindo a finalidade de preservação da entidade familiar e do respectivo patrimônio comum, não há óbice em considerar passível de término a sociedade de fato e a sociedade conjugal. Por conseguinte, não há empecilho à fluência da prescrição nas causas envolvendo direitos e deveres matrimoniais.
REsp 1.777.769-SP , Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 08/11/2019
DIREITO CIVIL
Usuário. Identificação. Endereço IP. Porta lógica de origem. Guarda e apresentação dos dados. Obrigatoriedade.
É obrigatória, por parte dos provedores de conexão e de aplicação, a guarda e apresentação dos dados relacionados à porta lógica de origem associadas aos endereços IPs.
Os endereços IPs são essenciais na arquitetura da internet, que permite a bilhões de pessoas e dispositivos se conectarem à rede, permitindo que trocas de volumes gigantescos de dados sejam operadas com sucesso. Nesses termos, a doutrina define que "o endereço IP (internet protocol) é a cédula de identidade de cada terminal, somente sendo admitido um terminal para cada número IP disponível, de modo que seja impossível a conexão de dois dispositivos à rede com o mesmo número, o que gera conflitos na transmissão e recepção de dados e, comumente, faz com que a própria rede derrube o acesso de todos os dispositivos com números colidentes". Para o próprio funcionamento da internet, é essencial que todos os identificadores sejam realmente únicos. Em especial, os números IPs ainda são utilizados para a identificação dos usuários da internet que tenham cometido atos ilícitos de qualquer natureza. No entanto, os números IPs - assim como outros recursos críticos da internet - são finitos, necessitando de adaptações e novas versões que permitam sua expansão. Historicamente, os números IPs da versão 4 foram distribuídos de forma irregular entre as diversas regiões mundo. Os números alocados para a América Latina e do Caribe se esgotaram em 2014. Em outras regiões do globo, os IPs se esgotaram ainda mais rapidamente. Na tentativa de resolver esse problema, diversas ferramentas foram desenvolvidas para permitir que provedores de conexão continuassem expandindo o acesso em suas regiões de atuação. Uma delas é oferecida pelo sistema de Tradução de Endereço de Rede (Network Address Translation - NAT), que permite que o mesmo número IP seja utilizado por diversos terminais. Para a correta compreensão do que seja a porta lógica de origem associada ao número IP é necessário ter em mente que, na expansão do IPv4, uma quantidade determinada de endereços foi reservada para "IPs privados", que seriam utilizados em redes não conectadas à internet. Além desses, um número de IPs públicos ou globais também foi designado, e são esses IPs públicos os utilizados para realizar a maioria das conexões na internet. Como mencionado, é utilizado o sistema NAT (Network Address Translation) a fim de permitir que múltiplos IPs privados sejam conectados à internet global por meio de um único IP público. Para esse compartilhamento, o sistema NAT cria uma tabela de correspondência entre os diversos IPs privados e o IP público comum, por meio do acréscimo de um número ao final do endereço IP. Esse número adicional é a chamada porta lógica de origem. Nesse contexto, no Marco Civil da internet, há duas categorias de dados que devem ser obrigatoriamente armazenados: os registros de conexão e os registros de acesso à aplicação. A previsão legal para guarda desses dados objetiva facilitar a identificação de usuários da internet pelas autoridades competentes e mediante ordem judicial, porque a responsabilização dos usuários é um dos princípios do uso da internet no Brasil, conforme o art. 3º, VI, da mencionada lei. Como afirmado acima, apenas esse número da porta de origem é capaz de fazer restabelecer a univocidade dos números IP na internet e, assim, é dado essencial para o correto funcionamento da rede e de seus agentes operando sobre ela. Portanto, sua guarda é fundamental para a preservação de possíveis interesses legítimos a serem protegidos em lides judiciais ou em investigações criminais. Por fim, a partir da recomendação do grupo de trabalho criado no âmbito da Agência Nacional de Telecomunicações, tanto os provedores de conexão quanto os provedores de aplicação necessitam desse número adicional, a porta de origem, para realizarem suas atividades na internet. De fato, apenas com as duas pontas da informação - conexão e aplicação - é possível resolver a questão da identidade de usuários na internet, que estejam utilizam um compartilhamento da versão 4 do IP. Portanto, é inegável que ambas as categorias de provedores de que dispõe o Marco Civil da Internet possuem a obrigação de guarda e fornecimento das informações da porta lógica de origem associada ao endereço IP.
REsp 1.814.643-SP , Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 22/10/2019, DJe 28/10/2019
DIREITO CIVIL
Procuração. Outorga de poderes expressos de alienação. Quaisquer imóveis em todo território nacional. Poderes especiais. Necessidade. Art. 661, § 1º, do CC/2002.
A procuração que estabelece poderes para alienar "quaisquer imóveis localizados em todo o território nacional" não atende aos requisitos do art. 661, § 1º, do CC/2002, que exige poderes especiais e expressos para tal desiderato.
Dos termos do art. 661 do CC/2002, depreende-se que o mandato em termos gerais só confere poderes para a administração de bens do mandatário. Destarte, para que sejam outorgados poderes hábeis a implicar na disposição, alienação ou gravação do patrimônio do mandante, exige-se a confecção de instrumento de procuração com poderes expressos e especiais para tanto. Os poderes expressos identificam, de forma explícita (não implícita ou tácita), exatamente qual o poder conferido (por exemplo, o poder de vender). Já os poderes serão especiais quando determinados, particularizados, individualizados os negócios para os quais se faz a outorga (por exemplo, o poder de vender tal ou qual imóvel). Na espécie, a procuração outorgada ao mandatário conferia" amplos e gerais poderes para vender, ceder, transferir ou por qualquer forma e título alienar, pelo preço e condições que ajustar, quaisquer imóveis localizados em todo o território nacional (...)". Nesse contexto, outorga de poderes de alienação de "quaisquer imóveis em todo o território nacional' não supre a especialidade requerida pela lei, que exige referência e determinação dos bens concretamente mencionados na procuração.
REsp 1.829.663-SP , Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 07/11/2019
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL
Penhora. Imóvel gerador dos débitos condominiais. Ação de cobrança na qual a proprietária do bem não figurou como parte. Possibilidade. Obrigação propter rem.
O proprietário de imóvel gerador de débitos condominiais pode ter o seu bem penhorado em ação de cobrança ajuizada em face de locatário, já em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo.
Em se tratando a dívida de condomínio de obrigação propter rem e partindo-se da premissa de que o próprio imóvel gerador das despesas constitui garantia ao pagamento da dívida, o proprietário do imóvel pode ter seu bem penhorado na ação de cobrança, em fase de cumprimento de sentença, da qual não figurou no polo passivo. A solução da controvérsia perpassa pelo princípio da instrumentalidade das formas, aliado ao princípio da efetividade do processo, no sentido de se utilizar a técnica processual não como um entrave, mas como um instrumento para a realização do direito material. Destaca-se que a ação de cobrança de débitos condominiais pode ser proposta em face de qualquer um daqueles que tenha uma relação jurídica vinculada ao imóvel. Assim, se o débito condominial possui caráter ambulatório e a obrigação é propter rem, não faz sentido impedir que, no âmbito processual, o proprietário possa figurar no polo passivo do cumprimento de sentença. Em regra, deve prevalecer o interesse da coletividade dos condôminos, permitindo-se que o condomínio receba as despesas indispensáveis e inadiáveis à manutenção da coisa comum.
REsp 1.700.827-PR , Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 08/11/2019
DIREITO CIVIL, DIREITO DO CONSUMIDOR
Investigação de paternidade. Exame de DNA. Falso negativo. Defeito na prestação do serviço pelo laboratório. Responsabilidade objetiva. Ofensa à honra da mulher. Danos morais. Caracterização.
O laboratório responde objetivamente pelos danos morais causados à genitora por falso resultado negativo de exame de DNA, realizado para fins de averiguação de paternidade.
Consoante a reiterada jurisprudência do STJ, caracteriza-se como de consumo e, portanto, sujeito às disposições do Código de Defesa do Consumidor o serviço prestado por laboratórios na realização de exames médicos em geral, a exemplo do teste genético para fins de investigação de paternidade. Em se tratando da realização de exames médicos laboratoriais, tem-se por legítima a expectativa do consumidor quanto à exatidão das conclusões lançadas nos laudos respectivos, de modo que eventual erro de diagnóstico de patologia ou equívoco no atestado de determinada condição biológica implica defeito na prestação do serviço, a atrair a responsabilidade objetiva do laboratório, com base no art. 14, caput e § 1º, do CDC. Seguindo esta linha de pensamento, esta Corte consolidou o entendimento de que os laboratórios possuem, na realização de exames médicos, verdadeira obrigação de resultado, e não de meio, restando caracterizada sua responsabilidade civil na hipótese de falso diagnóstico. No caso, ante a "sacralização" do exame de DNA - corriqueiramente considerado pelo senso comum como prova absoluta da (in)existência de vínculo biológico - a indicação de paternidade que, em exame genético, se mostra inexistente, sujeita a mãe a um estado de angústia e sofrimento íntimo, pois lança dúvidas quanto ao seu julgamento sobre a realidade. O simples fato do resultado negativo do exame de DNA agride, ainda, de maneira grave, a honra e reputação da mãe, ante os padrões culturais que, embora estereotipados, predominam socialmente. Basta a ideia de que a mulher tenha tido envolvimento sexual com mais de um homem, ou de que não saiba quem é o pai do seu filho, para que seja questionada sua honestidade e moralidade.
REsp 1.793.840-RJ , Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 05/11/2019, DJe 08/11/2019
DIREITO CIVIL, DIREITO DO IDOSO
Ação de cobrança. Custeio das despesas de acompanhante. Paciente idoso. Responsabilidade. Operadora do Plano de Saúde. Estatuto do idoso. Aplicação imediata.
Compete à operadora do plano de saúde o custeio das despesas de acompanhante do paciente idoso no caso de internação hospitalar.
Inicialmente cumpre salientar que o Ministério da Saúde, antes mesmo do advento da Lei n. 10.741/2003, editou a Portaria MS/GM n. 280/1999 determinando que os hospitais contratados ou conveniados ao Sistema Único de Saúde permitam a presença de acompanhante para os pacientes internados maiores de 60 (sessenta) anos e autorizando ao prestador do serviço a cobrança das despesas previstas com o acompanhante de acordo com as tabelas do SUS, nas quais estão incluídas a acomodação adequada e o fornecimento das principais refeições. No âmbito da saúde suplementar, contudo, a Lei n. 9.656/1998 previu que, na hipótese em que o contrato de plano de saúde incluir internação hospitalar, a operadora é responsável pelas despesas de acompanhante. Posteriormente, o artigo 16 do Estatuto do Idoso - Lei n. 10.741/2003 - estabeleceu que ao paciente idoso que estiver internado ou em observação é assegurado o direito a um acompanhante, em tempo integral, a critério do médico. Cumpre observar que, embora a Lei dos Planos inclua a obrigação de cobertura de despesas de acompanhante apenas para pacientes menores de 18 (dezoito) anos, a redação desse dispositivo é de 1998, portanto, anterior, ao Estatuto do Idoso, de 2003. Assim, diante da obrigação criada pelo referido estatuto e da inexistência de regra acerca do custeio das despesas de acompanhante de paciente idoso usuário de plano de saúde, a Agência Nacional de Saúde Suplementar definiu, por meio de resoluções normativas n. 211/2010, n. 387/2015 e n. 428/2017 , que cabe aos planos de saúde o custeio das despesas referentes ao acompanhante desse paciente, as quais devem incluir a totalidade dos serviços oferecidos pelo prestador de serviço e relacionadas com a permanência do acompanhante na unidade de internação. Ademais, ainda que o contrato seja anterior ao Estatuto do Idoso, inafastável a obrigação da operadora do plano de saúde de custear as despesas do acompanhante, pois a Lei n. 10.741/2003 é norma de ordem pública, de aplicação imediata.
REsp 1.758.799-MG , Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 12/11/2019, DJe 19/11/2019
DIREITO DO CONSUMIDOR
Informações pessoais. Bancos de dados. Disponibilização/comercialização. Ausência de comunicação. Dano moral in re ipsa . Configuração.
Configura dano moral in re ipsa a ausência de comunicação acerca da disponibilização/comercialização de informações pessoais em bancos de dados do consumidor.
As informações sobre o perfil do consumidor, mesmo as de cunho pessoal, ganharam valor econômico no mercado de consumo e, por isso, o banco de dados constitui serviço de grande utilidade, seja para o fornecedor, seja para o consumidor, mas, ao mesmo tempo, atividade potencialmente ofensiva a direitos da personalidade deste. Nessa toada, a gestão do banco de dados impõe a estrita observância das respectivas normas de regência - CDC e Lei n. 12.414/2011. Dentre as exigências da lei, destaca-se o dever de informação, que tem como uma de suas vertentes o dever de comunicar por escrito ao consumidor a abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo, quando não solicitada por ele, consoante determina o § 2º do art. 43 do CDC. Tal imposição vinha expressamente prevista na redação originária da Lei n. 12.414/2011, que teve seu texto alterado recentemente pela Lei Complementar n. 166/2019. Embora o novo texto da Lei n. 12.414/2011 se mostre menos rigoroso no que diz respeito ao cumprimento do dever de informar ao consumidor sobre o seu cadastro - já que a redação originária exigia autorização prévia mediante consentimento informado por meio de assinatura em instrumento específico ou em cláusula apartada -, o legislador não desincumbiu o gestor de proceder à efetiva comunicação. Isso porque, tanto sob a enfoque do registro de informações negativas como também para o registro de informações positivas, tem o consumidor o direito de tomar conhecimento de que informações a seu respeito estão sendo arquivadas/comercializadas por terceiro, sem a sua autorização, porque desse direito decorrem outros dois que lhe são assegurados pelo ordenamento jurídico: o direito de acesso aos dados armazenados e o direito à retificação das informações incorretas. A inobservância dos deveres associados ao tratamento (que inclui a coleta, o armazenamento e a transferência a terceiros) dos dados do consumidor - dentre os quais se inclui o dever de informar - faz nascer para este a pretensão de indenização pelos danos causados e a de fazer cessar, imediatamente, a ofensa aos direitos da personalidade. O fato, por si só, de se tratarem de dados usualmente fornecidos pelos próprios consumidores quando da realização de qualquer compra no comércio, não afasta a responsabilidade do gestor do banco de dados, na medida em que, quando o consumidor o faz não está, implícita e automaticamente, autorizando o comerciante a divulgá-los no mercado; está apenas cumprindo as condições necessárias à concretização do respectivo negócio jurídico entabulado apenas entre as duas partes, confiando ao fornecedor a proteção de suas informações pessoais.
REsp 1.601.552-PE , Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, por maioria, julgado em 05/11/2019, DJe 08/11/2019
DIREITO EMPRESARIAL
Título de crédito. Duplicata. Fatura. Número. Incorreção. Nulidade. Inexigibilidade.
A aposição de número incorreto da fatura na duplicata invalida o título de crédito, retirando-lhe a exigibilidade executiva extrajudicial.
Controverte-se acerca da validade de duplicatas cujo campo relativo ao número da fatura foi preenchido de maneira equivocada, com numerações diversas daquelas das respectivas faturas. Em decorrência dos princípios da literalidade, da cartularidade, da incorporação, da autonomia, da independência e da tipicidade, os títulos de crédito desempenham a sua finalidade maior de promover a circulação de riquezas. Isso porque, abstraídos da causa que lhes tenha dado origem, cumpridos os requisitos legais para a formação da cártula, o título de crédito goza dos atributos da circulabilidade, da negociabilidade, da exigibilidade e da executoriedade, indispensáveis para que os princípios retromencionados possam se concretizar. Segundo dispõe o art. 2º, § 1º, da Lei n. 5.474/1968 (Lei das Duplicatas), são requisitos das duplicatas: "(...) § 1º A duplicata conterá: I - a denominação 'duplicata', a data de sua emissão e o número de ordem; II - o número da fatura; III - a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista; IV - o nome e domicílio do vendedor e do comprador; V - a importância a pagar, em algarismos e por extenso; VI - a praça de pagamento; VII - a cláusula à ordem; VIII - a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada pelo comprador, como aceite, cambial; IX - a assinatura do emitente." De fato, como se observa na leitura do inciso II acima transcrito, a data da fatura é requisito legal da duplicata. Com efeito, a incorreção no preenchimento desse campo específico no título de crédito torna-o inválido e inexigível no que se refere, especialmente, ao atributo da executoriedade, disposto no art. 15 da Lei das Duplicatas, visto que ferido o princípio da literalidade.
REsp 1.840.910-RJ , Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 07/11/2019
DIREITO MARCÁRIO
Patente. Sistema mailbox . Prazo de vigência. 20 anos contados da data do depósito.
O prazo de vigência das patentes concedidas pelo sistema mailbox é de 20 anos contados da data do depósito.
O sistema denominado mailbox consistiu em mecanismo transitório adotado para salvaguarda de pedidos de patentes relacionadas a produtos farmacêuticos e produtos agroquímicos, cuja tutela jurídica resultou da internalização no País, em 01/01/1995, do Acordo TRIPS (Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio). O privilégio garantido pelas patentes de invenção, consoante previsto no art. 40, caput, da Lei de Propriedade Industrial, perdura pelo prazo de 20 anos contados da data do respectivo depósito. Esse lapso temporal, segundo a regra do parágrafo único do mesmo dispositivo, não pode - excetuadas as hipóteses de o INPI estar impedido de proceder ao exame do pedido por pendência judicial ou força maior - ser inferior a 10 anos da respectiva concessão. Tratando-se, contudo, de patentes excepcionalmente depositadas pelo sistema mailbox, a Lei de Propriedade Industrial, em suas disposições finais e transitórias (art. 229, parágrafo único), estabeleceu regra expressa assegurando proteção limitada unicamente ao lapso de 20 anos contados do dia do depósito (conforme estipulado pelo citado art. 40, caput). A norma que prescreve que o prazo de vigência de patente de invenção não deve ser inferior a 10 anos da data de sua concessão está inserida em capítulo da LPI que versa sobre regras gerais, aplicáveis ao sistema ordinário de concessão de patentes, de modo que, à míngua de remição legal específica, não irradia efeitos sobre matéria a qual foi conferido tratamento especial pela mesma lei. Portanto, segundo a dicção legal, o privilégio analisado garante proteção a partir da data da concessão pelo órgão competente até o limite de 20 anos contados do dia em que o pedido foi depositado.
REsp 1.803.251-SC , Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por maioria, julgado em 22/10/2019, DJe 08/11/2019
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Ação autônoma de exibição de documentos. Código de Processo Civil de 2015. Possibilidade. Procedimento comum. Aplicabilidade.
É possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos, sob o rito do procedimento comum, na vigência do Código de Processo Civil de 2015.
Consigna-se inicialmente que a Quarta Turma do STJ, ao enfrentar o tema, compreendeu afigurar-se possível o ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos pelo procedimento comum. Registra-se que a partir da vigência do Código de Processo Civil de 2015, que não reproduziu, em seu teor, o Livro III, afeto ao Processo Cautelar, então previsto no diploma processual de 1973, adveio intenso debate no âmbito acadêmico e doutrinário, seguido da prolação de decisões díspares nas instâncias ordinárias, quanto à subsistência da ação autônoma de exibição de documentos, de natureza satisfativa (e eventualmente preparatória), sobretudo diante dos novos institutos processuais que instrumentalizam o direito material à prova, entre eles, a "produção antecipada de provas" (arts. 381 e seguintes) e a "exibição incidental de documentos e coisa" (arts. 496 e seguintes). Relevante, no ponto, consignar que o Código de Processo Civil de 2015 buscou reproduzir, em seus termos, compreensão há muito difundida entre os processualistas de que a prova, na verdade, tem como destinatário imediato não apenas o juiz, mas também, diretamente, as partes envolvidas no litígio. Nesse contexto, reconhecida a existência de um direito material à prova, autônomo em si - que não se confunde com os fatos que ela se destina a demonstrar (objeto da prova), tampouco com as consequências jurídicas daí advindas, podendo (ou não) subsidiar outra pretensão -, a lei adjetiva civil estabelece instrumentos processuais para o seu exercício, que pode se dar incidentalmente, no bojo de um processo já instaurado entre as partes, ou por meio de uma ação autônoma (ação probatória lato sensu). Afigura-se possível, ainda, que o direito material à prova consista não propriamente na produção antecipada de provas, mas no direito de exigir, em razão de lei ou de contrato, a exibição de documento ou coisa - já existente/já produzida - que se encontre na posse de outrem. Para essa situação, afigura-se absolutamente viável - e tecnicamente mais adequado - o manejo de ação probatória autônoma de exibição de documento ou coisa, que, na falta de regramento específico, há de observar o procedimento comum, nos termos do art. 318 do novo Código de Processo Civil, aplicando-se, no que couber, pela especificidade, o disposto nos arts. 396 e seguintes, que se reportam à exibição de documentos ou coisa incidentalmente.
REsp 1.835.174-MS , Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 11/11/2019
DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Execução. Prescrição intercorrente. Ausência de localização de bens do executado. Princípio da causalidade. Ausência de sucumbência do exequente.
A prescrição intercorrente por ausência de localização de bens não afasta o princípio da causalidade em desfavor da parte executada, nem atrai a sucumbência para a parte exequente.
Uma leitura superficial do art. 85 do CPC/2015 dá a entender, a princípio, que o "vencedor" e o "vencido" são, respectivamente, os únicos sujeitos passíveis de serem credores e devedores de honorários advocatícios sucumbenciais. Contudo, há situações, não raras, em que, mesmo não sucumbindo no plano do direito material, a parte vitoriosa é considerada como geradora das causas que produziram o processo e todos os dispêndios a ele inerentes. Isso porque, para efeito de distribuição dos ônus sucumbenciais, ao lado do princípio da sucumbência, deve-se ter em mente o princípio da causalidade. Com efeito, no caso de extinção do processo de execução pela prescrição intercorrente por ausência de localização de bens do devedor, a despeito de não haver derrota ao executado no plano jurídico - uma vez que a prescrição fulmina a pretensão executória -, as circunstâncias fáticas em que envolvem a causa (dívida não quitada a tempo e modo e recalcitrância do devedor durante a tramitação do processo executivo) demonstram que este deu causa à existência do processo, devendo, em que pese não seja tecnicamente sucumbente, suportar os ônus sucumbenciais em virtude da aplicação do princípio da causalidade.
QUINTA TURMA
AgRg no AREsp 1.422.129-SP , Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 12/11/2019.
DIREITO PENAL
Estatuto do estrangeiro. Revogação. Lei n. 13.445/2017. Declaração falsa em pedido de residência provisória. Alteração da capitulação jurídica. Continuidade normativo típica. Art. 299 do Código Penal.
A conduta prevista no revogado art. 125, XIII, da Lei n. 6.815/1980, subsume-se agora ao art. 299 do Código Penal.
Insta salientar, inicialmente, que a Lei n. 6.815/1980 foi expressamente revogada pela Lei n. 13.445/2017. No entanto, a conduta de fazer declaração falsa em processo de transformação de visto, de registro, de alteração de assentamentos, de naturalização, ou para a obtenção de passaporte para estrangeiro, laissez-passer ou, quando exigido, visto de saída, prevista no art. 125, XIII, da Lei n. 6.815/1980, não deixou de ser crime no Brasil com a revogação da referida lei, não havendo que se falar em abolitio criminis, mas subsume-se agora ao art. 299 do Código Penal. Operou-se, na espécie, o princípio da continuidade normativa típica.
RECURSOS REPETITIVOS - AFETAÇÃO
ProAfR no REsp 1.819.826-SP , Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 05/11/2019, DJe 07/11/2019 ( Tema 1035 )
DIREITO CIVIL
A Segunda Seção acolheu a proposta de afetação do recurso especial ao rito dos recursos repetitivos, conjuntamente com o REsp 1.823.911/PE, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: definir o prazo prescricional da pretensão de cobrança de despesas de sobre-estadia de contêineres ( demurrage ) fundadas em contrato de transporte marítimo (unimodal).