Informativo do STJ 585 de 30 de Junho de 2016
Publicado por Superior Tribunal de Justiça
SÚMULAS
SÚMULA N. 573 Nas ações de indenização decorrente de seguro DPVAT, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez, para fins de contagem do prazo prescricional, depende de laudo médico, exceto nos casos de invalidez permanente notória ou naqueles em que o conhecimento anterior resulte comprovado na fase de instrução. Segunda Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.
SÚMULA N. 574 Para a configuração do delito de violação de direito autoral e a comprovação de sua materialidade, é suficiente a perícia realizada por amostragem do produto apreendido, nos aspectos externos do material, e é desnecessária a identificação dos titulares dos direitos autorais violados ou daqueles que os representem. Terceira Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.
SÚMULA N. 575 Constitui crime a conduta de permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor à pessoa que não seja habilitada, ou que se encontre em qualquer das situações previstas no art. 310 do CTB, independentemente da ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na condução do veículo. Terceira Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.
SÚMULA N. 576 Ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida. Primeira Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.
SÚMULA N. 577 É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório. Primeira Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.
SÚMULA N. 578 Os empregados que laboram no cultivo da cana-de-açúcar para empresa agroindustrial ligada ao setor sucroalcooleiro detêm a qualidade de rurícola, ensejando a isenção do FGTS desde a edição da Lei Complementar n. 11/1971 até a promulgação da Constituição Federal de 1988. Primeira Seção, aprovada em 22/6/2016, DJe 27/6/2016.
RECURSOS REPETITIVOS
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXEQUIBILIDADE DE SENTENÇAS NÃO CONDENATÓRIAS (ART. 475-N, I, DO CPC/1973). RECURSO REPETITIVO. TEMA 889. A sentença, qualquer que seja sua natureza, de procedência ou improcedência do pedido, constitui título executivo judicial, desde que estabeleça obrigação de pagar quantia, de fazer, não fazer ou entregar coisa, admitida sua prévia liquidação e execução nos próprios autos. De início, destaca-se que o ponto nodal da controvérsia consiste em definir se há exequibilidade (ou não) em sentenças não condenatórias, notadamente após o acréscimo, pela Lei n. 11.232/2005, do art. 475-N, I, ao CPC/1973 ("Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: I - a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia"), quer a decisão contenha julgamento de procedência, quer de improcedência, dada a natureza dúplice do elemento declaratório presente em toda decisão judicial. Inclusive, a Lei n. 13.105/2015 (CPC/2015) reproduz essa norma: "Art. 515. São títulos executivos judiciais, cujo cumprimento dar-se-á de acordo com os artigos previstos neste Título: I - as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa". Daí a atualidade da matéria. De fato, a execução forçada não se destina ao ajustamento ou à definição do direito do exequente, de modo que sua instauração demanda necessariamente que a situação jurídica do titular do direito tenha sido completa e previamente reconhecida em título executivo, assim entendido, por doutrina, como "o documento que contém um ato de acertamento do direito que o credor pretende executar". É o que se dessume da interpretação conjunta dos arts. 580 e 586 do CPC/1973, reproduzidos respectivamente pelos arts. 786 e 783 do CPC/2015. Com efeito, a decisão de cunho condenatório sempre foi considerada o título executivo judicial por excelência, à evidência da norma inserta no revogado art. 584, I, do CPC/1973 ("Art. 584. São títulos executivos judiciais: I - a sentença condenatória proferida no processo civil"). A grande carga de executividade dessa espécie de decisão decorre do fato de que seu comando consubstancia efetiva manifestação judicial acerca da existência e validade da relação jurídica controvertida e da exigibilidade da pretensão que dela deriva, revestindo-a com o grau de certeza exigido pela lei quanto à obrigação inadimplida, em virtude da identificação de todos os elementos dessa relação jurídica. Às decisões de natureza declaratória, contudo, antes da vigência da Lei n. 11.232/2005, era negada a eficácia executiva, ainda que secundária, ao argumento de que elas se limitavam à declaração de certeza acerca da existência ou da inexistência de relação jurídica (art. 4º do CPC/1973) - o que constituiria o cerne da pretensão exercitada -, não se estendendo ao reconhecimento da existência de prestação a cargo do vencido. Diante disso, para fins de aferição da exequibilidade do provimento judicial, a utilização do critério da natureza da decisão não parece ser o melhor caminho, porquanto enseja polêmicas intermináveis e inócuas, que não oferecem contribuição no campo prático. Na verdade, o exame do conteúdo da decisão mostra-se método mais adequado à discriminação das sentenças passíveis de serem consideradas como título executivo, bastando, de acordo com doutrina, que ela contenha "a identificação integral de uma norma jurídica concreta, com prestação exigível de dar, fazer, não fazer ou pagar quantia". Nesse ponto, é relevante salientar que os referidos dispositivos legais não atribuem eficácia executiva a todas as sentenças declaratórias indiscriminadamente, mas apenas àquelas que, reconhecendo a existência da obrigação, contenham, em seu bojo, os pressupostos de certeza e exigibilidade (art. 586 do CPC/1973), sendo certo que, na ausência de liquidez, é admitida a prévia liquidação, tal qual ocorre com o provimento condenatório. Afinal, há de se considerar os princípios da efetividade jurisdicional e da economia processual como freios ao formalismo excessivo presente na imposição ao titular do direito já reconhecido em sentença declaratória da exigibilidade da obrigação de ajuizamento de demanda condenatória inútil, porquanto até mesmo a ampla análise da pretensão deduzida em juízo estaria impedida pela coisa julgada formada no processo anterior. Precedentes citados: REsp 1.422.401-PR, Primeira Turma, DJe 30/5/2014; AgRg no AREsp 720.870-SP, Segunda Turma, DJe 27/8/2015; AgRg no REsp 1.460.032-RN, Segunda Turma, DJe 14/9/2015; AgRg no REsp 1.018.250-RS, Segunda Turma, DJe 25/9/2014; AgRg no REsp 1.384.913-ES, Terceira Turma, DJe 24/8/2015; e REsp 1.508.910-SP, Terceira Turma, DJe 26/5/2015. REsp 1.324.152-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 4/5/2016, DJe 15/6/2016.
PRIMEIRA SEÇÃO
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. HIPÓTESE DE NÃO CABIMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. Mesmo após a vigência do CPC/2015, não cabem embargos de declaração contra decisão que não se pronuncie tão somente sobre argumento incapaz de infirmar a conclusão adotada. Os embargos de declaração, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC/2015, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade ou eliminar contradição existente no julgado. O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo inciso IV do § 1º do art. 489 do CPC/2015 ["§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: (...) IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador"] veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo STJ, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão. EDcl no MS 21.315-DF, Rel. Min. Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região), julgado em 8/6/2016, DJe 15/6/2016.
TERCEIRA SEÇÃO
DIREITO PROCESSUAL PENAL. PRISÃO CAUTELAR FUNDADA EM ATOS INFRACIONAIS. A prática de ato infracional durante a adolescência pode servir de fundamento para a decretação de prisão preventiva, sendo indispensável para tanto que o juiz observe como critérios orientadores: a) a particular gravidade concreta do ato infracional, não bastando mencionar sua equivalência a crime abstratamente considerado grave; b) a distância temporal entre o ato infracional e o crime que deu origem ao processo (ou inquérito policial) no qual se deve decidir sobre a decretação da prisão preventiva; e c) a comprovação desse ato infracional anterior, de sorte a não pairar dúvidas sobre o reconhecimento judicial de sua ocorrência. No que concerne às medidas cautelares pessoais, o conceito de periculum libertatis denota exatamente a percepção de que a liberdade do investigado ou acusado pode trazer prejuízos futuros para a instrução, para a aplicação da lei ou para a ordem pública. É válida a prisão preventiva para garantia da ordem pública, de maneira a evitar a prática de novos crimes pelo investigado ou acusado, ante a sua periculosidade, manifestada na forma de execução do crime, ou no seu comportamento anterior ou posterior à prática ilícita. Ademais, não há como escapar da necessidade de aferir se o bem jurídico sob tutela cautelar encontra-se sob risco de dano, o que, no âmbito criminal, se identifica com a expressão periculum libertatis, isto é, o perigo que a liberdade do investigado ou réu representa para a instrução criminal, a aplicação da lei penal ou a ordem pública e/ou econômica. Ao menos no que toca a este último fundamento, sua invocação como motivo para a decretação da cautela extrema funda-se em avaliação concreta da periculosidade do agente, ou seja, a probabilidade de que o autor de um facto-crime repita a sua conduta típica e ilícita. Assim, a probabilidade de recidiva do comportamento criminoso se afere em face do passado do réu ou pelas circunstâncias específicas relativas ao modus operandi do crime sob exame. Lembre-se que, também para fins cautelares, se aceitam como válidos os registros em folha de antecedentes penais ainda não definitivamente convolados em sentenças condenatórias, porquanto se, de um lado, não servem para elevar a pena, permitem ao juiz da causa, por outro lado, avaliar se a prisão do réu/investigado é necessária para preservar a ordem pública, ante a perspectiva de cometimento de novos crimes pelo acusado. Ora, se uma pessoa, recém ingressa na maioridade penal, comete crime grave e possui histórico de atos infracionais também graves, indicadores de seu comportamento violento, como desconsiderar tais dados para a avaliação judicial sobre a sua periculosidade? Sobre essa questão, duas considerações mostram-se importantes para o debate. A primeira delas diz respeito à natureza e ao grau de cognoscibilidade do juízo cautelar, em todo diverso - ainda que em relação de instrumentalidade - ao juízo de condenação. Deveras, para um provimento cautelar qualquer, nomeadamente o que impõe a segregação provisória do réu, basta, em conformidade com o texto do art. 312 do CPP, prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Já para o juízo de condenação, é necessária a prova da existência do crime e a prova cabal de sua autoria. Outrossim, o juízo cautelar labora com aparência (verossimilhança) do direito subjacente à postulação, mero juízo hipotético, alcançado por meio de cognição limitada (na extensão) e perfunctória (na profundidade), ainda assim idônea para permitir ao julgador decidir provisoriamente, tendo em mira a preservação de um interesse ou bem que se encontra ameaçado de perecimento ou dano ante a manutenção do status quo. Por sua vez, o juízo de mérito labora com a certeza sobre os fatos constitutivos, é definitivo e impõe cognição exauriente e ampla sobre os fatos articulados e as provas produzidas, somente com a qual se legitima a condenação do acusado. Dizer, então, que não podem ser extraídas informações sobre os processos por ato infracional para fins processuais, tout court, é, com a mais respeitosa vênia, afirmação sujeita a refutação. Evidentemente não cabe considerar atos infracionais como antecedentes penais, bastando, para dar lastro a tal assertiva, lembrar que ato infracional não é crime, que medida socioeducativa não é pena, inclusive quanto aos fins a que se destina, que o adolescente não é imputável, que a sentença final nos processos por ato infracional não é condenação. Daí, porém, a não poder utilizar, para avaliação judicial de natureza cautelar - que não pressupõe juízo de culpabilidade, mas de periculosidade do agente - o histórico recente de vida do acusado, ao tempo em que ainda não atingira a maioridade, vai uma grande distância. Os registros sobre o passado de uma pessoa, seja ela quem for, não podem ser desconsiderados para fins cautelares. A avaliação sobre a periculosidade de alguém impõe que se perscrute todo o seu histórico de vida, em especial o seu comportamento perante a comunidade, em atos exteriores, cujas consequências tenham sido sentidas no âmbito social, quais os atos infracionais praticados. Se estes não servem, por óbvio, como antecedentes penais e muito menos para firmar reincidência (porque tais conceitos implicam a ideia de "crime" anterior), não podem ser ignorados para aferir o risco que a sociedade corre com a liberdade plena do acusado. É de lembrar, outrossim, que a proteção estatal prevista na Lei n. 8.069/1990 (ECA), no seu art. 143, é voltada ao adolescente (e à criança), condição que o réu deixou de ostentar ao tornar-se imputável. Com efeito, se, durante a infância e a adolescência do ser humano, é imperiosa a maior proteção estatal, a justificar todas as cautelas e peculiaridades no processo de apuração de atos contrários à ordem jurídica, inclusive com a imposição do sigilo sobre os atos judiciais, policiais e administrativos que digam respeito a crianças e adolescentes a que se atribua autoria de ato infracional (art. 143 do ECA), tal dever de proteção cessa com a maioridade penal. Não existe, portanto, vedação legal a que, no exercício da jurisdição criminal, utilize o juiz, excepcionalmente, dos registros relativos a atos infracionais praticados pelo acusado quando ainda adolescente. A toda evidência, isso não equivale a sustentar a possibilidade de decretar-se a prisão preventiva, para garantia da ordem pública, simplesmente porque o réu cometeu um ato infracional anterior. O raciocínio é o mesmo que se utiliza para desconsiderar antecedente penal que, por dizer respeito a fato sem maior gravidade, ou por registrar fato já longínquo no tempo, não deve, automaticamente, supedanear o decreto preventivo. Não será, pois, todo e qualquer ato infracional praticado pelo acusado quando ainda adolescente que poderá render-lhe juízo de periculosidade e autorizar, por conseguinte, a inflição de custódia ante tempus. Não teria sentido, seria um verdadeiro despropósito atentatório à excepcionalidade da providência cautelar extrema, considerar, por exemplo, atos infracionais equivalentes a crime de furto ou de falsificação de documento como indicadores da necessidade da prisão preventiva. De igual modo, mesmo em se tratando de atos infracionais graves, equivalentes a crimes de homicídio, roubo ou estupro, não se justificaria a segregação cautelar do réu ante a constatação de que tais atos infracionais foram perpetrados há anos, sem que se tenha notícia de novos atos graves posteriores. Seria, pois, indispensável que a autoridade judiciária competente, para a consideração dos atos infracionais do então adolescente, averiguasse: a) a particular gravidade concreta do ato infracional, não bastando mencionar sua equivalência a crime abstratamente considerado grave; b) a distância temporal entre o ato infracional e o crime que deu origem ao processo (ou inquérito policial) no qual se deve decidir sobre a decretação da prisão preventiva; e c) a comprovação desse ato infracional anterior, de sorte a não pairar dúvidas sobre o reconhecimento judicial de sua ocorrência. Assim, propõem-se os mencionados critérios orientadores que o juiz deve considerar na busca de um ponto de equilíbrio no embate, imanente ao processo penal, entre o poder punitivo do Estado e o direito à liberdade do indivíduo. RHC 63.855-MG, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 11/5/2016, DJe 13/6/2016.
DIREITO PROCESSUAL PENAL. FORMA DE CONTAGEM DE PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO CONTRA DECISÃO MONOCRÁTICA DE MINISTRO RELATOR DO STJ. No âmbito do STJ, mesmo após a vigência do CPC/2015, em controvérsias que versem sobre matéria penal ou processual penal, a contagem do prazo para interposição de agravo contra decisão monocrática de relator continua sendo feita de forma contínua (art. 798 do CPP), e não somente em dias úteis (art. 219 do CPC/2015). Isso porque, diferentemente do que ocorreu com outros artigos da Lei n. 8.038/1990 - norma especial que institui normas procedimentais para os processos que especifica perante o STJ e o STF -, não foi revogado o art. 39, o qual prevê: "Da decisão do Presidente do Tribunal, de Seção, de Turma ou de Relator que causar gravame à parte, caberá agravo para o órgão especial, Seção ou Turma, conforme o caso, no prazo de cinco dias."Ademais, tal previsão legal é secundada pelo disposto no caput do art. 258 do RISTJ, cujo teor prescreve que: "A parte que se considerar agravada por decisão do Presidente da Corte Especial, de Seção, de Turma ou de relator, poderá requerer, dentro de cinco dias, a apresentação do feito em mesa, para que a Corte Especial, a Seção ou a Turma sobre ela se pronuncie, confirmando-a ou reformando-a." Além disso, importa lembrar que o art. 798 do CPP, em seu caput e § 1º, determina, respectivamente, que "Todos os prazos correrão em cartório e serão contínuos e peremptórios, não se interrompendo por férias, domingo ou dia feriado" e que "Não se computará no prazo o dia do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento". AgRg nos EDcl nos EAREsp 316.129-SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 25/5/2016, DJe 1°/6/2016.
PRIMEIRA TURMA
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXTENSÃO DOS EFEITOS DE COISA JULGADA COLETIVA A AUTORES DE AÇÕES INDIVIDUAIS NÃO SUSPENSAS. Os autores de ações individuais em cujos autos não foi dada ciência do ajuizamento de ação coletiva e que não requereram a suspensão das demandas individuais podem se beneficiar dos efeitos da coisa julgada formada na ação coletiva. Ao disciplinar a execução de sentença coletiva, o art. 104 da Lei n. 8.078/1990 (CDC) dispõe que os autores devem requerer a suspensão da ação individual que veicula a mesma questão em ação coletiva, a fim de se beneficiarem da sentença que lhes é favorável no feito coletivo. Todavia, compete à parte ré dar ciência aos interessados da existência desta ação nos autos da ação individual, momento no qual começa a correr o prazo de 30 dias para a parte autora postular a suspensão do feito individual. Constitui ônus do demandado dar ciência inequívoca da propositura da ação coletiva àqueles que propuseram ações individuais, a fim de que possam fazer a opção pela continuidade do processo individual, ou requerer a sua suspensão para se beneficiar da sentença coletiva. REsp 1.593.142-DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 7/6/2016, DJe 21/6/2016.
SEGUNDA TURMA
DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RETENÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS SOBRE A DIFERENÇA DE VALORES DE REPASSE AO FUNDEF. No caso em que Município obtenha êxito em ação judicial destinada à complementação de repasses efetuados pela União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), será legítima a retenção de parte das referidas verbas complementares para o pagamento de honorários advocatícios contratuais (art. 22, §4º, da Lei n. 8.906/1994). Destaca-se, inicialmente, que "É pacífico, no Superior Tribunal de Justiça, o entendimento de que é possível ao patrono da causa, em seu próprio nome, requerer o destaque da verba honorária, mediante juntada aos autos do contrato de honorários, nos termos do artigo 22, § 4º, da Lei 8.906/94, até a expedição do mandado de levantamento ou precatório" (AgRg no AREsp 447.744-RS, Segunda Turma, DJe 27/3/2014). A peculiaridade da hipótese em análise é que a retenção de honorários advocatícios contratuais refere-se a valores apurados em execução contra a União relativos a diferenças de repasses ao FUNDEF. Pois bem, a Segunda Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.509.457-PE (acórdão pendente de publicação), em idêntica questão jurídica, firmou compreensão de que é legítima a retenção da verba honorária, pois a previsão constitucional de vinculação à educação da dotação do FUNDEF não retira do patrono o direito de retenção dos honorários. REsp 1.604.440-PE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 14/6/2016, DJe 21/6/2016.
DIREITO TRIBUTÁRIO. CÁLCULO DO ICMS-SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. Ainda que se adote a substituição tributária como forma de arrecadação de ICMS, é legal a sistemática do "cálculo por dentro". No que se refere à regra geral, a base de cálculo do ICMS, definida como o valor da operação de circulação de mercadoria, inclui o próprio montante do ICMS incidente, pois ele faz parte da importância paga pelo comprador e recebida pelo vendedor na operação. O STF reconheceu a constitucionalidade da sistemática do "cálculo por dentro", na qual se utiliza a base de cálculo do ICMS relativo ao custo da operação ou prestação de serviço acrescido ao valor do próprio imposto (RE 212.209-RS, Tribunal Pleno, DJ 14/2/2003; RE 582.461 RG-SP, Tribunal Pleno, DJe 18/8/2011). No mesmo sentido, firmou-se a jurisprudência do STJ, segundo a qual o ICMS integra a sua própria base de cálculo, sendo, portanto, legal a sistemática do "cálculo por dentro" para aferição da base de cálculo do ICMS, nos termos do art. 13, § 1º, I, da LC n. 87/1996 (EREsp 1.190.858-BA, Primeira Seção, DJe 12/8/2013; AgRg no Ag 1.248.264-RS, Segunda Turma, DJe 30/6/2010; REsp 1.041.098-SP, Segunda Turma, DJe 21/8/2009; AgRg no AgRg no REsp 704.881-RS, Segunda Turma, DJe 18/12/2009; AgRg no Ag 1.093.386-RS, Primeira Turma, DJe 2/4/2009). Ora, o ICMS-Substituição Tributária (ICMS-ST) não é um tributo diferente do ICMS "comum", mas um regime ou sistema utilizado com o objetivo de simplificar a tributação, facilitando a fiscalização e diminuindo os ônus administrativos para os próprios contribuintes, considerando que concentra em apenas um deles, de regra o mais capacitado do ponto de vista organizacional para o recolhimento do imposto e todas as obrigações acessórias correspondentes a várias etapas de circulação da mercadoria. A base de cálculo do ICMS não sofre qualquer modificação quando se trata de arrecadação mediante substituição tributária. Nessa toada, ainda que não haja referência expressa quanto à inclusão do ICMS em sua base de cálculo na modalidade substituição, não se pode extrair desse fato interpretação diversa daquela prevista no art. 13 da LC n. 87/1996, que ao estabelecer regra geral, não foi excluída pelo art. 8º (que regulamenta a substituição tributária) da mesma lei. REsp 1.454.184-MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 5/5/2016, DJe 9/6/2016.
TERCEIRA TURMA
DIREITO CIVIL. INEXISTÊNCIA DE DIREITO DE RETENÇÃO POR BENFEITORIAS REALIZADAS ANTES DE ADJUDICAÇÃO DE IMÓVEL VINCULADO AO SFH. O ex-mutuário de imóvel dado em garantia hipotecária em financiamento do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) não tem direito à retenção pelas benfeitorias realizadas no bem antes da adjudicação. De fato, sob a ótica do princípio da gravitação jurídica (accessorium sequitur principale - o acessório segue o principal), observa-se que as benfeitorias, por serem bens acessórios, incorporam-se ao imóvel (bem principal), ficando também sujeitas à garantia hipotecária. No CC/2002, há previsão específica nesse sentido, conforme se verifica no enunciado normativo do art. 1.474, segundo o qual "A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. Subsistem os ônus reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o mesmo imóvel". Inclusive, esse dispositivo mantém a mesma redação do art. 811 do CC/1916. Ademais, há entendimento doutrinário que aborda essa questão como um dos efeitos da hipoteca: "Efeito ainda da hipoteca em relação ao bem gravado é sua extensão a benfeitorias, acréscimos ou acessões trazidas ao bem hipotecado, seja em virtude da obra humana, seja por ação dos fatos naturais (aluvião, avulsão etc.)." Assim, a adjudicação de imóvel realizada no curso de execução extrajudicial de garantia hipotecária, com base no art. 32 do Decreto-Lei n. 70/1966 c/c o art. 7º da Lei n. 5.741/1971, transfere ao adjudicatário a propriedade do bem com todas as benfeitorias, por força do disposto no art. 1.474 do CC/2002. Desse modo, não há falar em direito de retenção ou indenização contra adjudicatário, pois benfeitorias são abarcadas por hipoteca. Esclareça-se, ainda, que não se vislumbra enriquecimento sem causa de credor hipotecário ou de terceiro adquirente, pois o preço de adjudicação é utilizado para extinguir saldo devedor (art. 7º da Lei n. 5.741/1971), em benefício de ex-mutuário. Sob outra ótica, considerando as especificidades das normas do SFH, ex-mutuário também não faz jus ao direito de retenção, pois existe norma específica excluindo esse direito (art. 32, § 2º, in fine, do Decreto-Lei n. 70/1966). Portanto, por esse fundamento, também se afasta a possibilidade de ex-mutuário exercer direito de retenção quanto a benfeitorias realizadas antes da adjudicação. REsp 1.399.143-MS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 7/6/2016, DJe 13/6/2016.
DIREITO CIVIL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA APARÊNCIA EM PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO DO SEGURO DPVAT. É válido o pagamento de indenização do Seguro DPVAT aos pais - e não ao filho - do de cujus no caso em que os genitores, apresentando-se como únicos herdeiros, entregaram os documentos exigidos pela Lei n. 6.194/1974 para o aludido pagamento (art. 5º, § 1º), dentre os quais certidão de óbito a qual afirmava que o falecido era solteiro e não tinha filhos. De antemão, esclareça-se que, de acordo com o art. 5º, § 1º, a, da Lei n. 6.194/1974, que dispõe sobre seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, o segurador deverá efetuar o pagamento de indenização mediante simples prova do acidente e do dano decorrente, após a entrega dos seguintes documentos: certidão de óbito, registro da ocorrência policial e prova da qualidade de beneficiário. O art. 309 do CC, por sua vez, estabelece que o pagamento feito de boa-fé ao credor putativo é válido, mesmo que provado depois que não era ele credor. Nesse sentido, pela aplicação da teoria da aparência, é válido o pagamento realizado de boa-fé a credor putativo. De fato, para que o erro no pagamento seja escusável, é necessária a existência de elementos suficientes para induzir e convencer o devedor diligente de que o recebente é o verdadeiro credor. No caso aqui analisado, verifica-se que a indenização do Seguro DPVAT foi paga de boa-fé aos credores putativos. Além disso, não há previsão de obrigação da seguradora em averiguar a existência de outros beneficiários da vítima. REsp 1.601.533-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016, DJe 16/6/2016.
DIREITO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE CONVALIDAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO CELEBRADO MEDIANTE A FALSIFICAÇÃO DE ASSINATURA DE SÓCIO. Não são convalidáveis os negócios jurídicos celebrados com o intuito de alterar o quadro societário de sociedade empresária por meio da falsificação de assinatura de sócio, ainda que o próprio sócio prejudicado pelo falso tenha, por escritura pública, concedido ampla, geral e irrevogável quitação, a fim de ratificar os negócios jurídicos. Com efeito, a questão posta em discussão não trata de nulidade relativa, mas, sim, de evidente nulidade absoluta, pois o art. 166, II, do CC, proclama ser nulo o negócio quando for ilícito o seu objeto, valendo ressaltar que essa ilicitude não é apenas do bem da vida em discussão, mas, também, da própria operação jurídica realizada. Na hipótese em análise, por exemplo, embora não haja qualquer vício no objeto propriamente dito do negócio jurídico (cessão das cotas sociais de sociedade empresária), a operação realizada para esse fim revela-se manifestamente ilícita (falsificação da assinatura de um dos sócios), configurando, inclusive, crime previsto no CP. Ademais, a falsificação da assinatura de uma das partes ofende não só o interesse particular dos envolvidos, mas, sim, viola todo o ordenamento jurídico e, por consequência, o interesse público. Há verdadeiro repúdio social intenso a qualquer forma criminosa em que se realize determinado negócio jurídico. Como consequência, os arts. 168, parágrafo único, e 169, ambos do CC, os quais, dentre outros, consubstanciam a chamada teoria das nulidades, proclamam que o negócio jurídico nulo é insuscetível de confirmação, não sendo permitido nem mesmo ao Juiz suprimir a nulidade, ainda que haja expresso requerimento das partes. É preciso pontuar, no entanto, a diferença entre convalidação (ratificação) e renovação (repetição) do negócio jurídico. Isso porque, conquanto não seja possível a convalidação do negócio jurídico nulo, revela-se perfeitamente admissível a renovação do ato, sem os vícios que o macularam anteriormente. Tratando-se de renovação de ato, não há efeito retroativo (ex tunc) em relação à data do negócio jurídico nulo celebrado. Trata-se de um novo negócio, completamente autônomo em relação ao primeiro (nulo), tendo validade, portanto, a partir da data em que for celebrado, desprezando-se completamente o tempo transcorrido entre o negócio jurídico nulo e o novo negócio realizado. Nesse contexto, a escritura pública posteriormente celebrada pelo sócio prejudicado não pode ratificar (convalidar) o negócio jurídico nulo, correspondente à alteração, mediante a falsificação de assinatura, do quadro societário da sociedade empresária. Se as partes signatárias da escritura pública tinham interesse em manter a transferência das cotas da sociedade empresária, deveriam renovar (repetir) o negócio jurídico, sem a falsificação da assinatura de quaisquer dos envolvidos, ocasião em que os efeitos seriam válidos a partir de então, isto é, a alteração do quadro societário somente se daria no momento do novo negócio. Não se desconhece entendimento de doutrina que defende que "se, por si só, a renovação do negócio nulo não retroage, nada impede que, pela autonomia da vontade, os contratantes deem ao negócio novo uma eficácia convencional com vigência a partir do tempo do negócio anterior (nulo)". Entretanto, no caso em análise, não é possível considerar a escritura pública celebrada como renovação do negócio jurídico nulo, muito menos com efeito retroativo convencionado pelas partes. Ora, por se tratar de alteração de quadro societário, a renovação do negócio jurídico somente seria possível se as partes procedessem ao devido arquivamento dos atos perante o órgão registrador, qual seja, a respectiva Junta Comercial. Assim, a referida escritura pública não se presta para o fim de convalidar o negócio jurídico em questão, por ser o mesmo nulo de pleno de direito, tampouco é possível considerá-la como renovação do ato, tendo em vista a ausência de arquivamento na Junta Comercial. Vale registrar, ainda, que não se aplica ao caso o art. 170 do CC, o qual dispõe que: "Se, porém, o negócio jurídico nulo contiver os requisitos de outro, subsistirá este quando o fim a que visavam as partes permitir supor que o teriam querido, se houvessem previsto a nulidade." De fato, somente é possível converter substancialmente o negócio jurídico nulo em outro válido, isto é, dar-lhe nova roupagem jurídica, se preenchidos dois requisitos legais, um objetivo e outro subjetivo. O primeiro, refere-se à necessidade de que o negócio jurídico nulo contenha os mesmos requisitos do negócio que será convertido (validado). O segundo, de natureza subjetiva, consiste na vontade presumida das partes em realizar aquele outro negócio jurídico, caso houvessem previsto a nulidade. Na presente hipótese, contudo, não houve manifestação de vontade de uma das partes acerca da realização do negócio jurídico em comento, isto é, da alteração societária da sociedade empresária, pois houve a falsificação da assinatura do sócio prejudicado, o que ensejou na transferência do controle societário sem o seu conhecimento. Logo, o sócio prejudicado não participou do ato nem teve ciência da transferência de suas cotas para terceiros, inexistindo, portanto, qualquer manifestação de vontade por ocasião da celebração do negócio jurídico, razão pela qual inexiste o requisito subjetivo previsto no aludido dispositivo legal para poder viabilizar o instituto da conversão. Além disso, não se revela possível buscar a suposta manifestação de vontade do sócio prejudicado formulada na escritura pública celebrada posteriormente para tentar justificar a manutenção da alteração societária. A análise do requisito subjetivo deve ser aferida no próprio negócio declarado nulo, sob pena de se fazer letra morta o dispositivo do art. 169 do CC, que determina a impossibilidade de convalidação do negócio jurídico nulo. Ainda que assim não fosse, a conversão, na hipótese em foco, seria manifestamente inadmissível, porquanto a falsificação da assinatura de uma das partes corresponde a um ato ilícito, configurando, inclusive, crime previsto no CP, o que impossibilita a produção de qualquer efeito pelo ordenamento jurídico vigente. Da mesma forma, também não há que se falar em aplicação do art. 167 do CC: "É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma." Com efeito, o § 1º deste dispositivo legal disciplina que "Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados." Ora, no caso em apreço, não se está diante de nenhum dos requisitos elencados acima que caracterizam a simulação. A simulação pressupõe um acordo entre os declarantes para a realização de um determinado negócio jurídico a fim de infringir a lei ou prejudicar terceiros de forma deliberada. Isto é, há verdadeiro conluio entre os contraentes do negócio jurídico celebrado, o que não ocorreu na espécie. Ora, se não houve a participação (manifestação de vontade) de um dos envolvidos no negócio jurídico, visto que sua assinatura foi falsificada, não há como se falar em existência de conluio entre as partes para fraudar terceiros. No caso, o sócio prejudicado não participou do negócio referente à cessão das cotas da sociedade empresária a terceiros, só tendo ciência da falsificação de sua assinatura muito tempo depois, razão pela qual se revela equivocado aplicar o art. 167 do CC. Diante do exposto, verifica-se a ocorrência de nulidade absoluta, consubstanciada na alteração contratual da sociedade empresária mediante a falsificação da assinatura do sócio prejudicado, sendo impossível a convalidação do ato pelas partes mediante escritura pública, tampouco reconhecer que houve renovação do negócio jurídico de forma válida, além de não ser a hipótese de conversão substancial (art. 170 do CC), nem de subsistência de negócio dissimulado (art. 167 do CC). REsp 1.368.960-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 7/6/2016, DJe 10/6/2016.
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA IMÓVEL DADO EM HIPOTECA NÃO REGISTRADA. A ausência de registro da hipoteca em cartório de registro de imóveis não afasta a exceção à regra de impenhorabilidade prevista no art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1990, a qual autoriza a penhora de bem de família dado em garantia hipotecária na hipótese de dívida constituída em favor de entidade familiar. A hipoteca é um direito real de garantia (art. 1.225, IX, do CC) incidente, em regra, sobre bens imóveis e que dá ao credor o poder de excutir o bem, alienando-o judicialmente e dando-lhe primazia sobre o produto da arrematação para satisfazer sua dívida. Por um lado, a constituição da hipoteca pode dar-se por meio de contrato (convencional), pela lei (legal) ou por sentença (judicial) e, desde então, já tem validade inter partes como um direito pessoal. Por outro lado, nos termos do art. 1.227 do CC, só se dá a constituição de um direito real após a sua inscrição no cartório de registro de imóveis da circunscrição imobiliária competente. Assim é que essa inscrição confere à hipoteca a eficácia de direito real oponível erga omnes. Nesse sentido, há entendimento doutrinário de acordo com o qual "Somente com o registro da hipoteca nasce o direito real. Antes dessa providência o aludido gravame não passará de um crédito pessoal, por subsistente apenas inter partes; depois do registro, vale erga omnes". Se a ausência de registro da hipoteca não a torna inexistente, mas apenas válida inter partes como crédito pessoal, a ausência de registro da hipoteca não afasta a exceção à regra de impenhorabilidade prevista no art. 3º, V, da Lei n. 8.009/1990. REsp 1.455.554-RN, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 14/6/2016, DJe 16/6/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. HIPÓTESE DE NÃO CABIMENTO DE HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS EM DESFAVOR DO INPI EM AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA. Em ação de nulidade de registro de marca a que o INPI não deu causa nem apôs resistência direta, não cabe condenação do instituto em honorários advocatícios sucumbenciais. Recentemente, a Terceira Turma do STJ debateu a condição da atuação obrigatória do INPI nas ações anulatórias de registro de marca, exigida nos termos do art. 175 da Lei n. 9.279/1996. Naquela oportunidade, a despeito de se ter reconhecido a legitimidade passiva do INPI, consignou-se a existência de uma intervenção sui generis, peculiar ao INPI, sendo que "o INPI, ao menos em tese, tem posição processual própria e independente da vontade das partes litigantes" (REsp 1.258.662-PR, DJe 5/2/2016). Desse modo, a legitimidade ad causam do INPI, como em todas as demais situações processuais, dependerá de exame casuístico e particularizado e exige-se do magistrado tomar em consideração também a conduta processual inicialmente adotada pelo instituto, para além da tradicional avaliação in status assertionis. Noutro giro, a exigência legal de participação do INPI em demandas anulatórias de registro de marca não tem por consequência a imposição de um litisconsórcio passivo necessário, tampouco resulta no afastamento automático de sua legitimidade passiva, modificando-se à luz da teoria da causalidade e da própria resistência oferecida no bojo da demanda. Inexistindo resistência direta à pretensão e não sendo imputável ao instituto a causa da propositura da demanda, sua atuação processual lateral afasta a legitimação passiva e, por consequência, sua condenação sucumbencial. REsp 1.378.699-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 7/6/2016, DJe 10/6/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE MOTIVOS PARA A FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO ATIVO FACULTATIVO ENTRE O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL E O FEDERAL. Em ação civil pública, a formação de litisconsórcio ativo facultativo entre o Ministério Público Estadual e o Federal depende da demonstração de alguma razão específica que justifique a presença de ambos na lide. Isso porque o art. 127, § 1º, da CF proclama como um dos princípios institucionais do Ministério Público a unicidade. Porém, em homenagem ao sistema federativo, o Ministério Público organiza-se, no que diz respeito à jurisdição comum, de forma dual, cada qual com suas atribuições próprias, estabelecidas em leis complementares (art. 128, § 5º, da CF). Se assim não fosse, desnecessária seria essa forma de organização. É certo que tanto o Ministério Público Federal quanto o Ministério Público Estadual possuem, entre suas atribuições, a de zelar pelos interesses sociais e pela integridade da ordem consumerista. Isso não quer significar, contudo, que devam atuar em litisconsórcio numa ação civil pública sem a demonstração de alguma razão específica que justifique a presença de ambos na lide. Ora, o instituto do litisconsórcio é informado pelos princípios da economia (obtenção do máximo de resultado com o mínimo de esforço) e da eficiência da atividade jurisdicional. Cada litisconsorte é considerado, em face do réu, como litigante distinto e deve promover o andamento do feito e ser intimado dos respectivos atos (art. 49 do CPC/1973). Nesse contexto, a formação desnecessária do litisconsórcio poderá, ao fim e ao cabo, comprometer os princípios informadores do instituto, implicando, por exemplo, maior demora do processo pela necessidade de intimação pessoal de cada membro do Parquet, com prazo específico para manifestação. REsp 1.254.428-MG, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 2/6/2016, DJe 10/6/2016.
QUARTA TURMA
DIREITO EMPRESARIAL. LEGALIDADE DE CLÁUSULA DE RAIO EM CONTRATO DE LOCAÇÃO DE ESPAÇO EM SHOPPING CENTER. Em tese, não é abusiva a previsão, em normas gerais de empreendimento de shopping center ("estatuto"), da denominada "cláusula de raio", segundo a qual o locatário de um espaço comercial se obriga - perante o locador - a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância contado a partir de certo ponto do terreno do shopping center. Para o sucesso e viabilização econômica/administrativa do shopping center, os comerciantes vinculam-se a uma modalidade específica de contratação. Entre as diversas cláusulas extravagantes insertas no contrato de shopping center - a despeito da existência de severa discussão doutrinária a respeito da natureza jurídica do ajuste, podendo ser considerado sociedade, locação, contrato coligado, misto, atípico, de adesão, entre outros -, há efetivo consenso de que todas servem para justificar e garantir o fim econômico almejado pelas partes. Nessa conjuntura, é possível citar, dentre essas disposições contratuais: res sperata, aluguel mínimo, aluguel percentual, aluguel dobrado no mês de dezembro, fiscalização da contabilidade, imutabilidade do ramo de negócio, impossibilidade de cessão ou sublocação e, também, a denominada "cláusula de raio", objeto do caso aqui analisado. De acordo com a "cláusula de raio", o locatário de um espaço comercial se obriga, perante o locador, a não exercer atividade similar à praticada no imóvel objeto da locação em outro estabelecimento situado a um determinado raio de distância daquele imóvel. Em que pese a existência de um shopping center não seja considerado elemento essencial para a aplicação dessa cláusula, é inquestionável que ela se mostra especialmente apropriada no contexto de tais centros comerciais, notadamente em razão da preservação dos interesses comuns à generalidade dos locatários e empreendedores dos shoppings. Além disso, a "cláusula de raio" não prejudica os consumidores. Ao contrário, os beneficia, ainda que indiretamente. O simples fato de consumidor não encontrar em todos os shopping centers que frequenta determinadas lojas não implica efetivo prejuízo a ele, pois a instalação dos lojistas em tais ou quais empreendimentos depende, categoricamente, de inúmeros fatores. De fato, a lógica por detrás do empreendimento se sobrepõe à pretensão comum do cidadão de objetivar encontrar, no mesmo espaço, todas as facilidades e variedades pelo menor preço e distância. Ademais, nos termos do ordenamento jurídico pátrio, ao proprietário de qualquer bem móvel ou imóvel - e aqui se inclui o(s) dono(s) de shopping center - é assegurado o direito de usar, gozar e dispor de seus bens e, ainda, de reavê-los do poder de quem injustamente os possua. Denota-se que, para o exercício desses atributos inerentes à propriedade, principalmente a permissão do uso por terceiros, pode o proprietário impor limites e delimitar o modo pelo qual essa utilização deverá ser realizada. Assim, diversas são as restrições que pode o dono impor aos usuários do estabelecimento (vestimentas, ingresso com animais, horário de funcionamento, entre outros) e, como já mencionado antecedentemente, inúmeras são as cláusulas contratuais passíveis de inserção nos contratos de locação atinentes aos centros comerciais híbridos, sem que se possa afirmar, genérica e categoricamente, sejam elas abusivas ou ilegais, uma vez que, em última análise, visam garantir a própria viabilidade do uso, a implementação do empreendimento e, pois, o alcance e incremento real da função social da propriedade. Além do mais, o fato de shopping center exercer posição relevante no perímetro estabelecido pela "cláusula de raio" não significa que esteja infringindo os princípios da ordem econômica estampados na CF, visto que inserções de "cláusulas de raio" em determinados contratos de locação são realizadas com o propósito de servir à logística do empreendimento. Aliás, a conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência de agente econômico em relação a seus competidores não caracteriza ilícito, tanto que prevista como excludente de infração da ordem econômica (§ 1º do art. 36 da Lei n. 12.529/2011). Por fim, não se diga que o STF analisou a constitucionalidade da "cláusula de raio" por ofensa ao princípio da livre concorrência. Afinal, a Súmula n. 646 do STF, a qual prevê que "Ofende o princípio da livre concorrência lei municipal que impede a instalação de estabelecimentos comerciais do mesmo ramo em determinada área", não diz respeito às cláusulas contratuais estabelecidas em pactos firmados entre locador e locatário, mas sim a imposições de política pública municipal, ou seja, a situações em que o próprio poder público impede e inviabiliza a implementação do princípio da livre concorrência. REsp 1.535.727-RS, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 10/5/2016, DJe 20/6/2016.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INCOMPETÊNCIA PARA CANCELAR GRAVAME EM MATRÍCULA DE IMÓVEL ARREMATADO. Arrematado bem imóvel, o Juízo da execução que conduziu a arrematação não pode determinar o cancelamento automático de constrições determinadas por outros Juízos de mesma hierarquia e registradas na matrícula do bem, mesmo que o edital de praça e o auto de arrematação tivessem sido silentes quanto à existência dos referidos gravames. Isso porque, além de o Juízo da execução não deter competência para o desfazimento ou cancelamento de constrições e registros determinados por outros Juízos de mesma hierarquia, os titulares dos direitos decorrentes das decisões judiciais proferidas em outros processos, as quais geraram as constrições e registros imobiliários que os arrematantes pretendem cancelar, têm direito ao devido processo legal, com seus consectários contraditório e ampla defesa. Ademais, as possíveis falhas nos atos judiciais que antecederam a arrematação, porque não mencionavam as outras constrições de outros Juízos sobre o imóvel a ser arrematado, não possibilitam ao Juízo da arrematação determinar a baixa de outras constrições levadas a efeito por outros juízos. RMS 48.609-MT, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 19/5/2016, DJe 8/6/2016.
RECURSOS REPETITIVOS - AFETAÇÃO
DIREITO CIVIL. TEMA 954. Recurso especial afetado à Segunda Seção como representativo da seguinte controvérsia: "inclusão, nos cálculos dos proventos de complementação de aposentadoria das horas extraordinárias habituais, incorporadas ao salário do participante de plano de previdência privada por decisão da justiça trabalhista". REsp 1.312.736-RS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe 15/6/2016.